O sobrado amarelo: um conto infanto-juvenil de amor e amizade
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O sobrado amarelo - Sergio Martins da Silva
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Capítulo I
Cabelos loiros e cacheados
Cabelos loiros e cacheados, ela vinha à janela somente para me ver passar. Bastava um assobio, baixo, carinhoso, e lá estava ela. Rosto redondo, sorriso infantil, olhos vivos e claros. Claros como um dia de céu azul. Havia amor em sua atitude, embora nenhum de nós dois soubesse ainda o seu significado. Éramos duas crianças brincando de amar. À distância, é verdade, e de uma pureza própria das crianças, difícil mesmo de descrever, principalmente agora, um pouco (ou muito) mais velho.
A maioria dos meus amigos morava na mesma rua que eu. Naquele tempo, era assim mesmo. Não tinha esse negócio de playground. As brincadeiras eram na rua (ou num terreno baldio), onde jogávamos futebol, bola de gude, rodávamos pião; além das brincadeiras de polícia e ladrão – essa brincadeira era mais problemática, porque ninguém queria ser polícia – esconde-esconde e de pique. Éramos um grupo de meninos muito unidos, até pelas circunstâncias de nossas vidas. As dificuldades de uns se repetiam nas famílias dos outros. Tínhamos praticamente as mesmas necessidades e as mesmas ambições, com algumas diferenças, porém pouco significativas.
Uma coisa até certo ponto bizarra, engraçada mesmo, eram os apelidos daquele grupo inquieto de meninos: Aranha, Chuchu, Feijão, Mosca, Pirica (que eu não faço a menor ideia do que seja até hoje – e acho que ele também), Mazinho, Maninho, por exemplo, e Tatu, que era o meu apelido – mas não me perguntem a razão, porque eu não sei como o apelido surgiu. Algum amigo um dia me chamou de Tatu e o apelido pegou, continuando comigo a vida toda.
Estudávamos todos na mesma escola e, fora algumas poucas exceções, também na mesma classe. O colégio era dirigido pelos padres da igreja do nosso bairro. Tinha alguma rigidez, não muita, no método de ensino, mas a gente sabia como superar isso. Quando necessário, nós todos nos ajudávamos, estudando juntos, na casa de um ou de outro, principalmente matemática e latim. Acho que podíamos nos chamar de os dez mosqueteiros
(o grupo tinha mais dois, o Cauê e o Tinho).
Capítulo II
Barracão do Tinho
O Tinho sempre foi o melhor aluno da classe e o que recebia as notas mais altas. Sua especialidade eram os idiomas, com destaque para o português e o latim, mas também era craque no inglês e no francês. Ele apenas não gostava de espanhol, mas era uma questão de birra. Tinha um pequeno barracão de madeira no fundo do quintal da casa dele. Passava a maior parte do tempo lá, estudando e escrevendo. Barracão é figura de linguagem, até porque sempre fora muito bem arrumado por ele, com estantes para os livros, mesa de estudo e algumas cadeiras e bancos. Tudo muito