Parteiras, Medicina e Ciência: políticas do parto e diálogos necessários na atenção à saúde da mulher
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Parteiras, Medicina e Ciência - Felipe Medeiros Pereira
AGRADECIMENTOS
O percurso que se finda na produção de um trabalho acadêmico passa por caminhos sinuosos, onde a presença de grandes amigas é preciosa. Em meados da minha graduação em Antropologia, na Universidade de Brasília, me dei conta que o fazer das Ciências Sociais põe em xeque nossas crenças, valores e os sentidos que atribuímos ao mundo. Seja por meio de abstração teórica, ou através da concretude e dureza da realidade que se apresenta na experiência de campo, a transformação pessoal é inevitável. Ao chegar ao fim, devemos reconhecer aquelas personagens fundamentais em nosso aprendizado pessoal e enquanto pesquisadoras.
Em primeiro lugar eu gostaria de agradecer as instituições públicas de ensino superior. Enquanto a educação no Brasil for um privilégio, devemos lutar pela ampliação de nosso sistema educacional para que, um dia, possamos estar livres do sistema meritocrático que reforça a estratificação social e perpetua a sociedade de classes. Como uma das privilegiadas por esse sistema, reconheço como dever pessoal a luta para que um dia a educação seja para todas, ao lado de um Sistema Único de Saúde que corresponda aos princípios da universalidade, da equidade e da integralidade. Agradeço, particularmente, à Fiocruz por proporcionar meu encontro com a área da saúde, além de acreditar no meu trabalho o suficiente para investir dois anos de recursos em minha formação profissional.
Não podemos esquecer, contudo, que qualquer instituição é formada por pessoas. De tal forma, os valores veiculados por essas instituições são fruto do suor e sangue daquelas que ali trabalham. Nesse sentido, gostaria de agradecer algumas pessoas que foram fundamentais para a conclusão desta etapa em minha formação acadêmica.
À professora Dra. Carla Costa Teixeira, do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília, que sempre me incentivou e acreditou que eu poderia encontrar meu lugar fazendo pesquisa. Não somente, esteve sempre disponível para atuar como guia em momentos que me sentia anuviada.
À professora Dra. Soraya Fleischer, também do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília, tutora nas aulas de metodologia em tempos graduação, e presença marcante no processo de qualificação desta pesquisa.
Às professoras Dra. Fernanda Severo, Dra. Francini Lube e Dr. Felipe Cavalcanti, pela construção um espaço para reflexões na área de humanidades e saúde dentro da Fiocruz, onde pude ser acolhida de maneira carinhosa, partilhando das inquietações e desafios apresentados ao se pensar Políticas Públicas em Saúde no Brasil.
À professora Dra. Rosamaria Giatti, inicialmente referência bibliográfica, posteriormente estimuladora do meu trabalho. O encontro proporcionado pela Reunião de Antropologia da Saúde me instigou a pensar as conexões que nossas trajetórias pessoais guardam com nossas pesquisas.
Ao Dr. Gerson Penna, pelo apoio e carinho demonstrados desde o início do percurso da pesquisa. O reconhecimento das pessoas que são referência para nós é sempre estimulante.
À Dra. Suzzane Jacob Serruya, pelo carinho e por aceitar o desafio de contribuir com meu trabalho mesmo à distância, reservando sempre horários preciosos para conversas em suas breves passagens pelo Brasil.
Às amigas Mariana Almeida, Juliana de Sant’anna, Ritta Caribé, Keyane Dias e Dione Ferreira, principais mestras na caminhada de aprendizado sobre o partejar, os saberes femininos e a sensibilidade que guia a prática e o cuidado com a saúde.
Às amigas Ana Júlia Tomasini, Izabela Amaral, Layla Jorge, Daniel Jorge, Camila Soares e Maria Joana, presenças importantes nos momentos de reflexões, desabafos e aprendizados nesse caminhar. A presença das amigas é fundamental no trilhar e na partilha dos desafios da vida.
À Renata Bernardes David, que com muito respeito e carinho prestou-se a revisar este texto, além de partilhar reflexões e debates sobre feminismos.
À Dra. Luciana Sepúlveda, orientadora, professora, chefe e amiga. Acima de tudo, por acreditar no potencial do meu trabalho, aceitar levar adiante a empreitada desta pesquisa ao meu lado, servindo de guia, oferecendo seus conhecimentos, problematizando questões importantes e disponibilizando todo o carinho e cuidado muito além do que a relação de orientação poderia requerer.
Ao meu pai Ricardo e meus avós Américo e Marlene, que mesmo a distância sempre se mostraram entusiastas e apoiadores do meu trabalho.
Às minhas irmãs Bruna, Juliana e Amanda, que compõem a tríade de referências femininas em minha trajetória pessoal. Sempre trazendo novos aprendizados para um homem que cresceu rodeado de mulheres.
À Emilia Oliveira Gontijo, minha companheira, sempre ao meu lado dividindo os desafios e alegrias da vida. Poder partilhar dessa trajetória contigo é o maior dos privilégios.
Por fim, gostaria de agradecer à minha mãe, Elaine Medeiros de Morais, cuja importância transcende as barreiras entre o profissional e o pessoal. Como origem de tudo, sem ela nada disso seria possível. O apoio, carinho, cuidado e incentivo, refletem muitos dos aprendizados em campo sobre a maternidade, com a presença necessária, sempre colocando suas filhas acima de tudo.
PREFÁCIO
O caminho proposto por esta escrita, nos conduzirá a um universo delicado e discreto: aquele de um grupo de mulheres cujas vidas se entrelaçaram com o objetivo de praticar uma educação voltada ao empoderamento de outras mulheres (e seus companheiros e companheiras), no processo do partejar, incluindo o cuidado durante a gestação, o parto e o puerpério.
Um universo ainda invisível ou pouco conhecido pela maior parte de mulheres e homens que se conformam ao modelo hegemônico do nascimento no Brasil.
Este livro fala, em primeiro lugar, sobre escolhas possíveis. Conta sobre a autodeterminação corajosa daquelas que enveredam por caminhos periféricos, rotas singulares de existência individual e coletiva.
O parto, o ponto de confluência escolhido, como experiência de observação nesta pesquisa, onde se encontram a vivência subjetiva de um processo biológico, cultural, social, econômico e político. O mesmo poderia ser dito sobre a alimentação, a sexualidade ou ainda a morte, dimensões da vida abraçadas pelas ciências da saúde, dos seres humanos e da sociedade, mas também pelas tradições, conhecimentos e práticas culturais enraizados nos territórios.
A história deste livro é também o percurso de busca por uma fala plural e complexa. Um ponto de vista enraizado na etnografia, situado nas fronteiras epistêmicas onde não apenas se encontram as diferentes disciplinas científicas, que rodeiam o partejar enquanto fenômeno a ser compreendido, mas onde a ciência ensaia prosear com outros saberes.
O texto é tecido nas intersecções entre as histórias das protagonistas, educadoras populares, doulas e parteiras do projeto Prosas Paridas e do autor, Felipe Medeiros Pereira, no contexto de um trabalho acadêmico gestado, por sua vez, em um ambiente educacional propício às ousadias. Reli, há pouco tempo, o texto de um sociólogo da educação brasileiro, onde ao analisar a natureza da avaliação qualitativa e da pesquisa participante, desencorajava aos estudantes de mestrado incursões em estudos desta natureza. Dentre os obstáculos apontados, sublinhava a dificuldade de um pesquisador, com pouca experiência, ser bem-sucedido em construir uma relação horizontal, dialógica e responsável, com os sujeitos de sua pesquisa. Com relação a este ponto, Felipe contrariou o problema levantado, com sensatez, pelo eminente sociólogo. Demonstrou grande sensibilidade, empatia e disposição ao deslocamento, características suas, que acredito, devam ser desenvolvidas como competências e habilidades indispensáveis ao trabalho etnográfico, tal como nós o entendemos, dentro de uma abordagem ética e engajada da construção de conhecimento.
Finalmente, mas não menos especial e importante, foi o desafio de compreender uma experiência biológica, cultural e social tão marcada pelas questões de gênero, trazendo como contadora desta história, um jovem que ainda não experimentara a paternidade e cuja relação com a maternidade não poderia deixar de ser mediada.
A leitura de PARTEIRAS, MEDICINA E CIÊNCIA: Políticas do parto e diálogos necessários na atenção à saúde da mulher é um convite a múltiplos e sutis descolamentos e tessituras. Interpela a soberania do modelo biomédico de atenção ao parto, que, desde alguns anos atrás, é questionado por especialistas e inspirou políticas públicas na saúde, mas que segue predominante, principalmente na atual sociedade brasileira, ainda com fortes traços conservadores, no que toca os direitos e a proteção da mulher contra todo o tipo de violência. Provoca os caminhos assentados do fazer ciência, nos convidando a sair da zona de conforto e adentrar os espaços onde habitam a transdisciplinaridade e o multiculturalismo, o inusitado, a criatividade e a superação da cisão entre sujeito e objeto. Finalmente, este livro, além de expor violências contra mulheres que atravessam a experiência do parto, nos revela forças e possibilidades sociais e epistêmicas de transformação, que chegam até nós em um momento intenso, povoado por incertezas e disputas. Por isso, é tão importante essa leitura, com o frescor da compreensão, da incompletude, do movimento e das relações que prospectam alternativas.
Brasília, 06 de julho de 2020.
Luciana Sepúlveda Köptcke
APRESENTAÇÃO
Ingressei no curso de Antropologia em 2009, na Universidade de Brasília, onde me aproximei das discussões de gênero por interesse pessoal e pela oportunidade que o ambiente universitário proporciona para o debate e a troca construtiva de ideias. Falar de gênero converge ciência e experiência, academia e sociedade num entremeado que ferve de projetos e espaços para discussões, propostos por docentes e discentes. O interesse me levou a aproveitar esse ambiente de privilégio, frutífero por proporcionar seminários, rodas de conversa, mostras de filmes, assembleias, atos, dentre outros espaços de troca cuja temática de gênero era tangencial ou estruturante. Estudar antropologia é colocar a sociedade em questão, e problematizar as experiências cotidianas se torna um exercício pedagógico.
Em 2012, ainda durante a graduação, ingressei no Programa Educação, Cultura e Saúde (PECS) para trabalhar no projeto Rede Saúde e Cultura, junto a orientadora desse percurso de pesquisa, Luciana Sepúlveda, oportunidade que proporcionou contato direto com a área da saúde pública e o SUS, em um projeto que propunha abordar a saúde a partir de um viés intimamente imbricado com a cultura. Através dos anos de aprendizado que tive trabalhando no PECS, me apaixonei pela área da saúde pública por sua característica, a meu ver, mais importante: o compromisso existente na relação entre ciência e sociedade, produzindo, em conjunto, conhecimentos com o objetivo de reduzir as iniquidades em saúde. Passado