Drones armados na guerra moderna: existem regras no Brasil?
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Drones armados na guerra moderna - Webert Leandro Barreto da Silva
Bibliografia
1. INTRODUÇÃO
Era o ano de 2016, quando aluno do Curso de Direito Internacional dos Conflitos Armados, na Escola Superior de Guerra em Brasília-DF, calcado pelos sentimentos de patriotismo e apego ao dever profissional que me forja, apareceu-me o interesse sincero em entender como justificar um ataque de drone
(aeronave não tripulada) em um conflito armado? Existiria alguma especificidade?
Comecei, então, a perceber que um sistema de aeronave remotamente pilotada tem transformado o modo que se luta nos conflitos modernos. As mudanças originadas pela tecnologia têm sido muitas e perceptíveis, principalmente com os novos conhecimentos e as novas armas que revolucionaram as hostilidades desde tempos imemoriais. Basta pensar na invenção da carruagem, dos tanques, do avião ou da bomba nuclear para lembrar como a ciência mudou a paisagem da guerra.
Ao passar os olhos na Declaração de São Petersburgo de 1868, que proibiu o uso de projéteis de menos de 400 gramas, e no art. 23 da IV Convenção de Haia de 1907, que proibiu o emprego de armas envenenadas, percebeu que a comunidade internacional tentou regular os artifícios usados no embate. De maneira paralela, o moderno Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA) tem sido visivelmente desenvolvido em resposta a novos desafios levantados pelos novos armamentos.
Em razão disso, a regulamentação de novos meios e métodos de guerra desenvolveu-se em duas premissas básicas: a uma, princípios e regras gerais que se aplicam a todos os meios e métodos de guerra, colocando limites à sua escolha e uso; e a dois, os acordos internacionais que proíbem ou limitam o uso de armas específicas – como armas químicas e biológicas, armas incendiárias, minas antipessoais ou munições cluster.
Os princípios gerais e as regras do DICA protegem os combatentes contra armas que causam danos supérfluos ou sofrimento desnecessário, mas também se desenvolveram para proteger os civis dos efeitos das hostilidades. Informado por essas proibições gerais fundamentais, o Direito Internacional dos Conflitos Armados foi projetado para ser flexível o suficiente a fim de se adaptar aos desenvolvimentos tecnológicos, incluindo aqueles que nunca poderiam ter sido antecipados à época.
Não há dúvida de que esse Direito se aplica ao novo armamento e a todas as novas tecnologias utilizadas nas convulsões bélicas. Isso é evidenciado no art. 36 do Protocolo Adicional I às Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949, segundo o qual, quando uma Alta Parte Contratante estude, desenvolve, adquire ou adote uma nova arma, ou novos meios ou métodos de combate, terá a obrigação de verificar se seu emprego, em certas condições ou em todas as circunstâncias, estaria proibido pelo presente Protocolo ou por qualquer outra norma de Direito Internacional aplicável a essa Alta Parte Contratante.
A aplicação, porém, de vertentes jurídicas já existentes faz emergir um questionamento sobre a claridade dessas regras às características do novo equipamento, bem como da previsibilidade de impacto para a humanidade.
Nesse aspecto, a meu viso, o uso de um novo sistema de armas em situações de conflito armado está claramente sujeito às regras do DICA. Surge, por conseguinte, uma preocupação jurídica de como e por quem essas inovações serão operadas. E no cenário do campo de batalha, o Sistema de Aeronave Remotamente Pilotada (RPAS)¹ é o exemplo mais evidente de tais novas tecnologias, as quais se constituem como um passo adicional em um contínuo estratégico de longa data para mover soldados cada vez mais longe de seus adversários e da zona de combate real.
Assim sendo, quanto às revoluções de assuntos militares e às preocupações humanitárias e legais atuais, o uso do RPAS aumentou de forma significativa nos últimos anos. Em verdade, ele constitui o recente passo na evolução da história dos aviões de combate, o que significa um grande salto tecnológico na frente dos inimigos e dos próprios combates aéreos.
A saber, de acordo com o DICA, não há proibição expressa para o uso de aeronave remotamente pilotada, nem tampouco pode-se considerar essas aeronaves como equipamentos indiscriminados ou pérfidos.
O Sistema de Aeronave Remotamente Pilotada é um grande avanço na aviação que se pode ter observado desde os usos das armas que foram enviadas para lutar na Primeira Guerra Mundial. Em face disso, procura-se apresentar ao leitor se existem no ordenamento jurídico brasileiro normas específicas que respaldem o emprego desses veículos aéreos em conflitos armados.
De fato, há uma relação forte e importante entre a lei (particularmente o Direito Internacional dos Conflitos Armados) e a tecnologia. Deveras, lei e RPAS estão intrinsecamente ligados à condução dos conflitos e aos problemas resultantes, o que acarreta uma questão de perspectivas legais a serem exploradas. Em situações complexas e imprevisíveis, a distinção e a proporcionalidade serão enfrentadas com um grau de calor humano e compaixão, porém com obediência aos normativos existentes.
Percorrendo, logo, a legislação brasileira que possa tratar do emprego dessas aeronaves em conflitos armados, intenciona-se estabelecer três pontos de referência na avaliação de uma estrutura normativa: primeiro, tem-se que o propósito de uma lei sempre será a regulamentação do interesse competidor do ser humano que resulta da tecnologia; em segundo lugar, o tema da lei continua a ser o último ator a ser tratado, ou seja, o indivíduo humano ou o próprio estado na vanguarda do direito internacional; por fim, o objetivo da lei deve ser constante, quer dizer, a dignidade da pessoa humana. É essa triangulação da lei entre os três polos que determina a eficiência da estrutura normativa. Nas leis que proíbam o uso de algum tipo de armamento, elas não afetam a arma em si. Afetam, verdadeiramente, a capacidade do indivíduo de desenvolver, adquirir, implantar ou usar essas armas.
Em meio, portanto, a um período significativo de proliferação de RPAS, impulsionado por governos, militares e outros combatentes, é pertinente que o Brasil tenha regras contrárias a ataques injustificáveis e use a força militar com a sujeição de rigorosos controles e contrapesos elucidados pelas linhas jurídicas internacionais. Isso porque se houver um conflito armado, a legalidade de qualquer ataque deverá ser avaliada de acordo com o Direito Internacional dos Conflitos Armados e o Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Importa esclarecer ao leitor que alguns termos são usados para o ramo do DICA: direito internacional humanitário, direito da guerra, Jus in bello. Aqui, conforme Swinarski (1988), a expressão Jus in bello é considerada como parte do direito da guerra pela qual é regido o comportamento do Estado em caso de conflito armado. Compreende a proteção internacional das vítimas dos conflitos – o chamado Direito de Genebra – e limitações de meios e métodos de combate – também conhecido como Direito de Haia.
Em essência, Jus in bello diz respeito ao direito na guerra, durante a guerra, e corresponde às normas do DICA que objetivam restringir meios e métodos de combate e proteger quem não participa ou não participa mais dos combates. Já o Jus ad bellum refere-se ao direito de ir à guerra, de fazer a guerra, que compõe outro ramo do direito internacional: o direito relativo à manutenção da paz – em outras palavras, a análise recai sobre a licitude do uso da força pelos Estados uti singuli (a título singular), e, desde 1945, o assunto se circunscreve à esfera de competência da ONU, que tem a missão de manter a paz no mundo.
De qualquer sorte, a independência entre o Jus in bello e o Jus ad bellum é alinhavada à base normativa do DICA, sem o qual o respeito a este ramo do direito fica bastante fragilizado. Ao Direito Internacional dos Conflitos Armados não cabe julgar quem tem a boa causa no conflito, quem tem as razões mais justas. Uma vez deflagrado o conflito, o DICA deve ser respeitado pelas Partes beligerantes, sem qualquer discriminação, independentemente das razões ou dos motivos que levaram ao