Igreja-Comunhão
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Igreja-Comunhão - Chiara Lubich
Apresentação da coleção
Deixa a quem te segue apenas o Evangelho.
Chiara Lubich esquadrinhou esse Evangelho de muitíssimos modos, concentrados em doze eixos: Deus Amor, a Vontade de Deus, a Palavra de Deus, o Amor ao próximo, o Mandamento Novo, a Eucaristia, o dom da Unidade, Jesus Crucificado e Abandonado, Maria, a Igreja-comunhão, o Espírito Santo, Jesus presente em nosso meio.
Tais pontos são um clássico
escrito na alma e na vida de milhares de pessoas de todas as latitudes, mas faltava um texto póstumo onde fossem reunidos trechos, inclusive inéditos, que os ilustrassem por meio de:
– uma dimensão de testemunho pessoal, ou seja, como Chiara Lubich os entendeu, aprofundou e viveu;
– uma dimensão de penetração no mistério de Deus e do homem;
– uma dimensão de encarnação nas realidades humanas, com um cunho comunitário, em sintonia com o Concílio Vaticano II (cf. Lumen gentium, n. 9).
Essa coleção contém doze livros úteis para quem deseja:
– ser acompanhado na vida espiritual por uma grande mestra do espírito;
– aprofundar o aspecto comunial da vida cristã e seus desdobramentos na Igreja e na humanidade;
– encontrar Chiara Lubich na vida de cada dia, conhecer o seu pensamento e obter pormenores autobiográficos dela.
Introdução
O que podemos fazer para melhorar a Igreja?
. Ah, veja, é muito simples: vamos começar por mim e por você!
– Assim é relatado o breve diálogo entre um jornalista e Madre Teresa de Calcutá. Palavras que, na verdade, dizem respeito a todos nós, nesta mudança de época na qual a Igreja Católica e as outras igrejas sentem a urgência de um novo começo, que seja contemporaneamente um retorno às origens.
Na atual sociedade global, multirreligiosa e multicultural, marcada pela mobilidade e pelas migrações, pelos novos areópagos
da economia, da política e dos meios de comunicação, percebe-se nitidamente a urgência de uma renovação. Não é por acaso que, há quase um século, o próprio movimento ecumênico nasceu da exigência de oferecer à humanidade um testemunho da mensagem de Jesus que seja comum e, com isso, mais incisivo.
Evento de relacionamentos:
uma história de amor
Chiara Lubich, com o seu modo de conceber e viver a Igreja, coloca-se nessa trilha e, com o seu Carisma da Unidade, oferece chaves importantes para esta passagem epocal¹. Desde o início de sua aventura espiritual, ela teve uma abordagem que pode ser tudo, menos passiva; ao contrário, é participativa e geradora para a Igreja. Ela nunca a considerou como uma instituição externa ou acima dos fiéis, mas a descobriu e fez com que a descobrissem como uma realidade viva, como um evento de comunhão, uma rede de relações de grande densidade pessoal. Para enunciá-la com uma expressão feliz do papa Francisco: é como uma história de amor
². Como mulher e como leiga fiel, Chiara deu uma contribuição notável para a história do cristianismo no mundo de hoje.
As primeiras cartas da década de 1940, quando ela tinha pouco mais de 20 anos, testemunham isso. Quando lhe perguntavam sobre a Igreja, ela sempre respondia com novos matizes: somos nós, todos os batizados, requisitados em primeira pessoa, o Povo de Deus, todos na primeira fila! E contribuiu com eficácia para a realização dessa perspectiva com sua Espiritualidade de Comunhão e Unidade, dirigindo a pessoas de todas as idades, condição de vida e vocação o convite para uma experiência evangélica radical, não só enquanto indivíduos, mas também enquanto comunidade: precisamente como Igreja, como povo.
Muitos – Um
Em um período de luz especial, após os primeiros anos de vida intensa do Evangelho, Chiara vai mais em profundidade, antecipando algumas das grandes diretrizes do Concílio Vaticano II. Em particular, ela experimenta como participar, em Cristo, da vida de Deus Uno e Trino, para que muitos possam viver como uma só alma, e reconhece nisso o ser profundo da Igreja.
Na verdade, com isso, ela se insere em perspectivas genuinamente bíblicas. É suficiente pensar naquela frase: A multidão dos que haviam crido eram um só coração e uma só alma
dos Atos 4,32; ou nas admoestações de Paulo para viver unânimes
(1Cor 1,10; Fil 1,27 e 2,2), com os mesmos sentimentos uns para com os outros (Rm 12,15-16, 1Cor 12,26).
Além disso, a ideia também é encontrada em alguns dos primeiros grandes teólogos, que são os Padres. Para Orígenes, por exemplo, e para Ambrósio, a maturidade cristã está em se tornar uma alma eclesiástica
³. Também Agostinho, como a sua Regra e os seus escritos testemunham, tem por ideal viver com os outros em profunda unidade de alma. Tomás de Aquino, por sua vez, não hesita em falar da Igreja como quase uma só pessoa mística
⁴.
Pode parecer uma particularidade, no entanto é algo pleno de consequências: olhar a Igreja como alma
significa
não somente focar em seu perfil espiritual e em sua íntima unidade, mas também tomar consciência daquilo que o Povo de Deus é chamado a ser no seio da humanidade. Em poucas palavras, o que a alma é no corpo, isso são os cristãos no mundo
, escreve o autor anônimo da Carta a Diogneto⁵, no segundo século depois de Cristo. Emerge, então, o perfil de uma Igreja que não vive para si mesma, mas é fermento na sociedade, projetada em saída, em uma veste que é tudo, menos sacra, aliás é comum, leiga.
Palavra-chave: os carismas
Os escritos de Chiara Lubich reunidos neste volume nos levam a uma compreensão e a uma experiência de Igreja com um conteúdo vital, dinâmico e relacional vigoroso. É marcadamente carismática, tanto pelo papel atribuído ao Espírito em todos os fiéis como pela atenção àqueles dons particulares – os carismas – que o Senhor suscita ao longo dos séculos. Estes, respondendo às necessidades específicas de cada época, em alguns casos, incidem até mesmo na vida de todo o Povo de Deus, direcionando-o para novos objetivos e remodelando sua fisionomia segundo os sinais dos tempos.
Ao mesmo tempo, a visão de Igreja que nos é proposta por Chiara não é por nada espiritualista. Não apenas pela concretude e pela cotidianidade com que concebe que todos são irmãos e irmãs, concorpóreos e consanguíneos⁶, até à prática da comunhão de bens, mas também pela ancoragem firme no ministério apostólico; através dele, no seio do Povo de Deus, Cristo está presente como cabeça
: não como aquele que comanda
, mas que, como fonte insubstituível e indispensável, gera e regenera o seu corpo
, que somos nós-Igreja.
Desde os primeiros passos do Movimento dos Focolares em Trento, Chiara reconhece a tarefa específica do carisma apostólico e a graça particular que age nos bispos⁷; de maneira peculiar, em Pedro, ou seja, no papa que – assim ela afirma – tem o dom de representar a Igreja em uma só pessoa
⁸. Aqui também, o que a ilumina é uma frase do Evangelho: Quem vos ouve a mim ouve
(Lc 10,16). Para além dos limites que os ministros ordenados possam ter – como todos! –, Chiara os vê e ensina a vê-los como instrumentos e presença de Jesus, que guia, corrige, instrui, anima, nutre e sustenta os seus. A tal ponto que, referindo-se à autoridade eclesiástica, ela fala da Igreja Mãe
, e isso também, e de maneira especial, quando prova e purifica.
Igreja em pequenas células
O Carisma da Unidade não nos propõe uma experiência de Igreja segundo um modelo piramidal, como havia prevalecido durante muitos séculos na compreensão da Igreja Católica, mas em um estilo radicalmente fraterno e sinodal: a Igreja como vida e caminho com Cristo no meio dos seus, segundo a promessa: Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles
(Mt 18,20). Pela presença do Ressuscitado, que se manifesta quando nos amamos sem reservas (cf. Jo 13,35 e 15,13), a vida e a missão da Igreja podem ser atualizadas até mesmo em pequenas células espalhadas por toda a sociedade, começando por aquela realidade fundamental que é a família: a eclesíola, como os Padres a chamavam. Além disso, Tertuliano estava convicto de que Onde três [estão reunidos], mesmo que sejam leigos, ali está a Igreja
⁹. Uma visão especialmente popular da Igreja e, ao mesmo tempo, altamente mística e social!
Chiara indica um caminho particularmente interessante não apenas para a evangelização, mas também para essa instância importante que hoje é chamada de eclesiogênese, ou seja, a geração e sempre nova regeneração da Igreja em vários contextos sociais e culturais; uma instância à qual ela responde não através de alguma descoberta moderna, mas sorvendo da mais autêntica tradição eclesial. Segundo os Padres da Igreja, tanto em uma dimensão pequena como em uma dimensão mais ampla e até mesmo global, nós somos gerados e nutridos em duas mesas: na mesa da Palavra e na mesa da Eucaristia (e consecutivamente, de todos os sacramentos).
Falando desses pilares sobre os quais o Povo de Deus se sustenta, Chiara não se detém simplesmente na proclamação da Palavra ou na fé com a qual ela deve ser acolhida, mas direciona para a vida da Palavra. Da mesma forma, no caso da Eucaristia, ela não pensa unicamente na celebração e na comunhão sacramental, mas também, de nossa parte, em nos tornarmos Eucaristia, hóstia que é acessível e se dá como alimento até mesmo para àqueles que efetivamente não frequentam a Igreja e, assim, transforma pouco a pouco a sociedade.
Quem é a Igreja?
Com tudo isso, Chiara Lubich descerra o perfil mariano da Igreja que, segundo o teólogo H. U. von Balthasar, desde o início, sempre esteve ao lado do perfil petrino e hoje é particularmente enfatizado pelos papas, começando com João Paulo II¹⁰. A espiritualidade da unidade enfatiza e promove na vida eclesial tudo aquilo que diz respeito à santidade, à vida de fé, à prática da caridade, à autenticidade da vida etc. – atitudes e valores que encontramos personificados de maneira exemplar em Maria.
Em seus escritos, especialmente os de 1949-50, Chiara reforça ainda mais essa perspectiva, delineando uma visão muito vasta, que – em sintonia especial com o Oriente cristão – vê Maria, a Igreja e a própria Criação intimamente inter-relacionadas. Se é válido para o papa que ele é a Igreja em uma só pessoa
, isso pode ser dito ainda mais de Maria, inclusive em uma dimensão cósmica.
Daqui provém uma resposta estimulante à pergunta: o que é a Igreja? A Igreja – Chiara leva a entender – não é algo, mas alguém: é Jesus no meio dos seus, é – repetindo as palavras do apóstolo Paulo – o seu Corpo
, que lhe dá visibilidade e incidência na realidade humana; é – segundo uma expressão acertada do grande teólogo evangélico D. Bonhoeffer – Cristo existindo como comunidade
; e, ao mesmo tempo, é Maria, ou seja, modela-se em Maria¹¹.
Para que serve a Igreja? O que ela faz? É isso o que o mundo contemporâneo nos pergunta em termos inequívocos. No mundo ecumênico, penetra cada vez mais a convicção de que ela tem a tarefa de ser fermento de unidade no meio da humanidade; e ela é e pode ser isso, pois extrai