Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

A (In)transmissibilidade da herança digital na sociedade da informação
A (In)transmissibilidade da herança digital na sociedade da informação
A (In)transmissibilidade da herança digital na sociedade da informação
E-book215 páginas8 horas

A (In)transmissibilidade da herança digital na sociedade da informação

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

A única certeza da vida é a morte, fato jurídico que acometerá todo e qualquer ser humano, sem distinção. Tratar da sucessão causa mortis sempre foi um assunto indigesto. Atualmente, com a cibercultura e as inovações tecnológicas, até mesmo a repercussão da morte ganhou novas conotações. A concepção clássica do instituto do inventário reconfigura-se a partir da herança digital. Se no passado recente, suceder, inventariar e partilhar bens estava delimitado à herança de pessoas mais abastadas e relativamente mais velhas, a herança digital vem democratizar os procedimentos de inventário e de partilha, abarcando sujeitos de todas as classes sociais, étnicas, gêneros e idades. Diversas pessoas podem não ter bens imóveis, veículos e contas bancárias milionárias, mas é alta a probabilidade de possuírem uma conta em rede social e bens digitais dos mais variados tipos. A herança de bens digitais é uma realidade cada vez mais tangível na sociedade e reflexões em torno da sua (in)transmissibilidade se mostram impreteríveis.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de out. de 2021
ISBN9786525209333
A (In)transmissibilidade da herança digital na sociedade da informação

Relacionado a A (In)transmissibilidade da herança digital na sociedade da informação

Ebooks relacionados

Direito para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Avaliações de A (In)transmissibilidade da herança digital na sociedade da informação

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    A (In)transmissibilidade da herança digital na sociedade da informação - Júlia Schroeder Bald Klein

    1. A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO E O SURGIMENTO DE NOVAS PERSPECTIVAS DE DIREITOS

    Com o avanço ofertado pelas inovações tecnológicas no meio digital, a relação do ser humano com a máquina deixou de ser apenas utilitária, para transformar-se em uma sociedade amparada na tecnologia da informação. Esse fenômeno social recebeu diferentes denominações, tais como: Sociedade da Informação, Sociedade em Rede, Sociedade Virtual e Sociedade da Comunicação. Independente da nomenclatura utilizada, fato é que as relações sociais se transpuseram para além do ambiente atual, desenrolando-se, igualmente, no mundo virtual (ASCENSÃO, 2002; CASTELLS, 2016; LÉVY, 2011).

    Surgiram neologismos como o ciberespaço e a cibercultura a fim de delinear os modernos âmbitos de interação jurídica e social. A quantidade e a velocidade dos meios de informação na Internet repercutem globalmente e de forma descentralizada, conectando pessoas físicas, instituições, empresas e governos, originando novas perspectivas para a sociedade como um todo. A despeito disso, os direitos da personalidade, os quais são inatos à qualidade dos seres humanos, enfrentam outros vieses além daqueles apresentados tradicionalmente pela doutrina.

    A intimidade, a vida privada, a honra e a imagem ampliam-se para abarcar as situações oriundas da sociedade em rede. A autodeterminação informativa e o direito ao esquecimento, cujo aprofundamento será feito no item 2.3 do segundo capítulo, interligam-se aos direitos arrolados no ordenamento jurídico constitucional e civilista, posto que, atualmente, as concepções dos direitos subjetivos essenciais diferem das gerações anteriores da humanidade.

    Ao lado da expansão do rol dos direitos da personalidade, os direitos fundamentais típicos igualmente ganham novas conotações com as inovações tecnológicas. O direito fundamental à herança – elencado no artigo 5º da Constituição Federal de 1988 – dilata-se para além dos bens convencionalmente sucedidos por causa mortis para abranger, da mesma forma, aqueles oriundos do mundo virtual. Os bens e dados digitais já são uma realidade para milhares de brasileiros e o direito não pode abster-se de lhes conferir proteção e efeitos jurídicos.

    Dessa forma, neste primeiro capítulo são feitas considerações gerais acerca do progresso das tecnologias e dos seus reflexos no desenvolvimento das relações jurídicas e sociais, bem como é apreciada a eclosão de novas facetas de direitos fundamentais da pessoa natural perante as inovações do ciberespaço. Diante do interesse central do presente estudo de averiguar como transmitir a herança digital aos herdeiros legítimos, resguardando-se os direitos da personalidade do de cujus, faz-se necessário o resgate da historiografia e do avanço dessa temática no âmbito da Ciência Jurídica e Social.

    1.1 Avanços tecnológicos e a transformação das relações jurídicas e sociais

    A palavra tecnologia tem origem grega e deriva dos vocábulos tekhné (arte, habilidade, ofício) e logos (razão, argumento, discussão). Então, inicialmente, tecnologia traduzia-se como o conjunto de argumentos e razões em volta de uma arte, de um ofício. Todavia, com o decorrer dos anos, a noção incipiente de tecnologia afastou-se da arte. Para a sociedade contemporânea, os termos invenção, inovação e tecnologia são indissociáveis (MAGRANI, 2018). Na hodiernidade, vivencia-se uma nova estrutura de sociedade delineada pela convergência entre a evolução histórica e a transformação tecnológica.

    As redes digitais de comunicação constituem-se por múltiplas formas ao redor do mundo variando conforme a história, a cultura e as instituições de cada nação. Sendo a comunicação a essência da atividade humana, o uso disseminado da Internet tem modificado diversos âmbitos da vida social. A Internet é o principal ambiente de comunicação na atualidade (CASTELLS, 2003). No Brasil, embora a economia esteja retraída nos últimos anos, os gastos e os investimentos em tecnologias da informação continuam progredindo, assim como o uso de dispositivos digitais.

    O acesso à Internet para uso pessoal dentre brasileiros com idade acima de dez anos foi objeto de análise do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na ocasião, verificou-se que 74,8% dos residentes de áreas urbanas utilizavam a Internet, em paralelo com 39% dos habitantes de áreas rurais, constatando-se um aumento deste último em 6,4% no decorrer de um ano. Também foi apurado que 96% das pessoas que detêm escolaridade com grau superior completo usufruem da grande rede de computadores em sua rotina (IBGE, 2018). A Internet tem se mostrado facilitadora e, em diversas ocasiões, imprescindível para a maioria dos brasileiros.

    Nessa toada, dados da pesquisa do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC), apontaram que 70% da população brasileira, do total de 209,5 milhões de habitantes, já usavam a Internet, revelando um crescimento de 31% se comparado ao ano de 2009. Alusivo ao acesso à rede mundial de computadores pelas classes socioeconômicas D e E, cuja renda familiar é de até quatro salários mínimos, o percentual que em 2015 era de 30%, expandiu para 48% no ano de 2018. Já, o acesso dentre os jovens na faixa etária de 16 a 24 anos, o percentual chegou a 90%, indicando que a Internet passou a constituir um elemento fundamental de socialização (CETIC, 2019).

    A expansão do número de usuários de Internet no Brasil é oriunda de uma soma de fatores, tais como: a redução dos custos de acesso à rede mundial de computadores; a expansão das redes públicas de WiFi; o surgimento de diversas e atrativas plataformas digitais; a difusão das conexões realizadas por meio de telefonia móvel. A principal forma de acesso à Internet se dá pelo uso do telefone celular, aparelho de comunicação mais popular entre todas as classes sociais.

    De acordo com a 30ª edição da Pesquisa Anual de Administração e Uso de Tecnologia da Informação nas Empresas divulgada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) em abril do ano de 2019, existiam 420 milhões de dispositivos digitais em uso no Brasil, tais como: notebooks, tablets e smartphones, perfazendo dois dispositivos digitais por habitante. Ademais, conforme a referida pesquisa, havia cerca de 230 milhões de celulares inteligentes em uso no território brasileiro, totalizando mais de um smartphone por habitante (FGV, 2019).

    Com esse aumento vertiginoso de eletrônicos portáteis, a quantidade de dados digitais disponíveis multiplica-se de forma exponencial. A cada ano, os processadores de dados tornam-se menores, mais potentes, confiáveis e baratos. Nesse sentido, tem-se mostrado certeira a previsão feita em 1965 por Gordon Moore – cofundador da Intel – a qual dispõe que a capacidade de processamento de dados pelos microprocessadores dobraria, em média, a cada vinte e quatro meses (ROTMAN, 2020). O ritmo da evolução digital moderna está levando a progressos e descobertas inimagináveis.

    Sob essa perspectiva, em 1980, Alvin Toffler (2005), já antevia que uma renovada civilização, com múltiplas formatações de família, economia, modos de trabalhar e viver, estava emergindo. Foram diversas as tentativas de intitular e descrever a profunda e rápida reestruturação que essa nova sociedade provocara. A esta imponente mudança na história da humanidade, o autor atribuiu o nome de Terceira Onda. Segundo ele, a Primeira Onda de mudança, a revolução agrícola, perdurou por milhares de anos, ao passo que a Segunda Onda, pertinente à ascensão da civilização industrial, permaneceu em evidência por apenas trezentos anos. A Terceira Onda, por sua vez, projeta-se mais acelerada e a propensão é de que se complete em poucas décadas.

    Sob o prisma dessa nova morfologia social, observa-se que as funções e os processos prevalecentes na Era da Informação encontram-se cada vez mais organizados por meio de redes. As redes desempenham papel central na caracterização da intitulada Sociedade da Informação, termo cunhado no final do século XX (CASTELLS, 2016). Não obstante, José de Oliveira Ascensão (2002) entende que o termo Sociedade da Informação não se enquadra como um conceito técnico, mas sim um trivial slogan. Segundo o autor, a denominação correta seria Sociedade da Comunicação, pois o que se estimula entre as pessoas é a comunicação e não a informação propriamente dita, tendo em vista que essa última não se qualifica em toda e qualquer troca de mensagens.

    Corroborando com a crítica à nomenclatura Sociedade da Informação, Maria Cláudia Cachapuz (2006) afirma que a sociedade se encontra, paradoxalmente, hiperinformada e que, concomitantemente, não detém discernimento perante a informação que lhe é disponibilizada. As pessoas estão desinformadas em decorrência do excesso, e não pela ausência da informação. Os múltiplos dispositivos e equipamentos conduzem a um antagonismo entre a democratização de acesso ao conhecimento e a facilidade de disseminação de informações superficiais e equivocadas.

    Todavia, conquanto se verifiquem diversas críticas à terminologia Sociedade da Informação, essa é a designação popularmente utilizada para se reportar à sociedade atual, caracterizada pelas transformações advindas das tecnologias da informação e da comunicação. O aludido termo é, majoritariamente, utilizado pela sociedade, pela comunidade acadêmica e pelas entidades governamentais. Nesse contexto, a própria Organização das Nações Unidas (ONU) realizou, em duas oportunidades, em Genebra, no ano de 2003 e em Túnis em 2005, eventos da denominada Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação – CMSI.

    Na primeira fase da referida Cúpula, em 12 de dezembro de 2003, em Genebra, 175 (cento e setenta e cinco) países adotaram a Declaração de Princípios de Genebra. No documento, as nações declararam o desejo e o compromisso comuns de construir uma Sociedade da Informação com base em propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas, respeitando e defendendo em sua totalidade a Declaração Universal dos Direitos Humanos, tal como se destaca o trecho abaixo.

    Reafirmamos ainda nosso compromisso com as disposições do Artigo 29 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pelo qual toda pessoa tem deveres para com a comunidade em que o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível, e que, no exercício dos seus direitos e liberdades, toda a pessoa estará sujeita apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer às justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos propósitos e princípios das Nações Unidas. Dessa forma, promoveremos uma Sociedade da Informação que respeite a dignidade humana (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2014, p. 17).

    A tecnologia modificou e alterará substancialmente as atitudes e os modos de viver das pessoas nas mais variadas situações cotidianas. As atuais relações sociais, econômicas, educacionais, políticas e culturais estão diretamente concatenadas com as inovações digitais. As fronteiras geográficas estão sendo ultrapassadas por redes de transmissão de informações sem limitação de espaço e de tempo. A informação tornou-se a grande protagonista da transformação da realidade, abarcando diversos âmbitos da sociedade ao redor do mundo.

    Na atual Era da Informação, o meio tecnológico mais revolucionário é, indubitavelmente, a Internet. Sua invenção é fruto do trabalho da Agência de Projetos de Pesquisa Avançada – ARPA – do Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América com a finalidade de assegurar uma rede de comunicações segura e eficaz, invulnerável a ataques nucleares. Inicialmente, a rede mundial de computadores foi denominada de ARPANET e entrou em funcionamento em 1969. Em um primeiro momento, a pesquisa era voltada apenas para fins militares. Contudo, a partir da década de 1980, passaram a circular conteúdos de índole comercial, científica e pessoal (CASTELLS, 2016).

    No Brasil, somente por volta dos anos de 1994 e 1995 que a rede começou a ganhar espaço no cotidiano da população. O termo Internet vem da junção das palavras inglesas Interconnected Networks e essa rede interconectada trouxe a possibilidade de interação simultânea de espaço físico, social e informacional (MARTINO, 2015). A Internet foi criada para servir como uma infraestrutura geral em que novas aplicações pudessem ser concebidas. Esses fins gerais tornaram-se evidentes com a criação da world wide web.

    A world wide web, popularmente conhecida apenas por web ou pela sigla www, impulsionou a difusão da Internet na sociedade, uma vez que organizou o teor dos sítios da rede de computadores, disponibilizando aos usuários um sistema fácil de pesquisa de informações. Por essa razão, a web, por vezes é confundida com a própria Internet. No entanto, a world wide web, criação de Tim Burners-Lee em 1989, é considerada o componente mais importante da Internet e progrediu gradualmente desde o seu advento. No ano de 2020, principia sua quarta geração, denominada de web 4.0 (AGHAEI; NEMATBAKHSH; FARSANI, 2012).

    A chamada web 1.0, primeira geração da web, conhecida por "web básica", desenvolveu-se durante os anos de ١٩٩٠. Originou-se como simples local para pesquisa e obtenção de informações em que as interações do usuário eram restritas. Quando do seu surgimento, a web destinava-se somente à leitura. O internauta assumia uma postura puramente passiva, como mero visualizador, limitando-se a ler as informações que lhe eram apresentadas. Não se admitia a publicação e o desenvolvimento de conteúdo nos sites visitados (ALMEIDA, 2017). As páginas da Internet eram estáticas e embora não houvesse um fluxo de informações ativo, já nascia a chamada Era da Informação. Contudo, observa-se que a evolução e a transformação expressiva da rede de abrangência mundial deram-se com o advento da web 2.0.

    Foi entre os anos de 2000 e 2009 que os endereços eletrônicos tornaram-se interativos, instigando a participação dos usuários. A segunda geração da web, notabilizada em 2004, trouxe a revolução na indústria de computadores provocada pela Internet. A web 2.0, nomeada de "web da sabedoria ou social", centralizou suas atenções na participação dos usuários por meio da leitura e da escrita. A interação ativa dos internautas, utilizando diferentes plataformas, alterou drasticamente o cenário da web e o acesso móvel cresceu de forma significativa. Foi nessa geração que a web passou a ser referência de criação e de atualização de conteúdos, sobretudo em blogs, mídias sociais e streaming de vídeo (AGHAEI; NEMATBAKHSH; FARSANI, 2012; ALMEIDA, 2017).

    No ano de 2006, aventou-se a terceira geração da web. Contudo, nota-se que o sólido reconhecimento da web 3.0 ocorreu dentre os anos de 2010 a 2019. Essa geração da web conferiu à tecnologia o poder de vincular, integrar e analisar dados a fim de obter novos fluxos de informações. Foi chamada de "web semântica" justamente em razão do computador passar a deter o poder de personalizar e otimizar as pesquisas. Outrossim, há quem denomine a terceira geração da web de "web inteligente", uma vez que os anúncios são realizados conforme o comportamento e as preferências de cada usuário (AGHAEI; NEMATBAKHSH; FARSANI, 2012; ALMEIDA, 2017).

    Iniciado o ano de 2020, estreia a quarta fase da web, intitulada de web 4.0 ou "web simbiótica ou móvel", em decorrência da interação constante entre os seres humanos e as máquinas. Ao contrário das gerações anteriores, ainda não há uma definição uníssona acerca de sua caracterização, posto que está associada a diversificados conceitos e tecnologias. Contudo, é assente que se trata da geração que avança no uso da inteligência artificial e da big data, desenvolvendo-se por meio

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1