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Da autonomia privada da mulher à humanização do parto: uma busca por uma relação horizontal entre paciente e médico
Da autonomia privada da mulher à humanização do parto: uma busca por uma relação horizontal entre paciente e médico
Da autonomia privada da mulher à humanização do parto: uma busca por uma relação horizontal entre paciente e médico
E-book156 páginas2 horas

Da autonomia privada da mulher à humanização do parto: uma busca por uma relação horizontal entre paciente e médico

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Sobre este e-book

O papel de protagonista da mulher no parto está diretamente ligado à sua autonomia privada, e não existiria esse protagonismo sem que houvesse uma assistência humanizada ao parto. Considera-se relevante reconhecer que a autonomia da mulher implica em autorregular-se, decidir sobre sua vida e seu próprio corpo de maneira livre, defendendo seus interesses e efetivando a proteção à dignidade da pessoa humana. Para tanto, é necessário analisar como e em que medida a sociedade patriarcal pode influenciar de maneira negativa no exercício dessa autonomia, reprimindo, por vezes, o direito da mulher à autorregulação de acordo com seus próprios princípios. Além disso, o vínculo existente na relação entre médico e paciente não deve se basear em autoritarismo, mas sim em algo consensual, em que deve predominar a liberdade de escolha da mulher, pois a autonomia da parturiente é o que move essa relação, da qual resultam diversos direitos e deveres extrapatrimoniais, enfatizando o dever do médico de informar. Assim, com uma relação baseada em confiança e respeito entre médico e paciente e empoderadas pela informação adquirida durante toda a gestação, as mulheres estarão mais preparadas para o parto, cientes de que, se algum tipo de violência obstétrica ocorrer, os agentes de tais condutas poderão ser responsabilizados civilmente pelos seus atos.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento10 de jun. de 2022
ISBN9786525249131
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    Da autonomia privada da mulher à humanização do parto - Helaine Magalhães Medeiros Ibiapina

    1 INTRODUÇÃO

    A nutricionista G.O deu à luz a filha através de parto cesárea. No Hospital da Mulher, onde ocorreu o parto – além de oferecer atendimento humanizado pelo Sistema Único de Saúde -, a experiência que deveria ser especial foi traumática: O médico estourou a bolsa sem me avisar. Simplesmente veio em mim fazer o toque, sem pedir licença. Tinha uma enfermeira muito grossa que me tratou mal durante toda a cirurgia, desde a hora que cheguei até a hora de ela ir embora para trocar de plantão.

    Quando uma mulher engravida, a idealização do momento do primeiro encontro com o bebê se inicia prontamente. A partir da hora em que a gestação é descoberta, a mãe passa a sonhar com o momento do parto, pensando não apenas no primeiro encontro com o filho, mas também se preparando física e psicologicamente para essa experiência irremediável que, mais cedo ou mais tarde, acontecerá. Contudo, apesar de muito sonhado, o parto nem sempre é uma experiência que marca positivamente a vida da mãe e do bebê, pois, não raras vezes, ouvem-se histórias de mulheres que tiveram suas expectativas frustradas por terem sua autonomia privada cerceada diante da autoridade do médico ou da equipe.

    Apesar de ainda não haver uma lei federal que verse exclusivamente sobre a assistência humanizada ao parto e ao nascimento, é importante que essa discussão seja cada vez mais trazida à tona. Para isso, utilizar-se-á primordialmente o método de pesquisa bibliográfica, com o intuito de estudar o assunto partindo de doutrinas e artigos já publicados. Nesse sentido, a pesquisa será desenvolvida através da análise literária que se debruce sobre o tema em questão, produzindo mais conhecimento acerca da autonomia privada da mulher, a humanização do parto e os reflexos e responsabilidades jurídicas da relação entre médico e paciente. Com isso, propõe-se a discutir a temática com base em pautas e discussões previamente realizadas, refletindo e aprofundando o debate do assunto, a fim de compreender o que causa o bloqueio para o exercício da autonomia privada de uma mulher na hora do parto e como é possível a responsabilização cível quando algum dano é causado pelo médico dentro da relação jurídica entre médico e paciente.

    A presente pesquisa se dividirá em três capítulos. O primeiro versará sobre a autonomia privada da mulher e a subintegração em uma sociedade patriarcal, abordando o princípio da autonomia e o poder de autodeterminar-se, a liberdade de escolha da parturiente em relação à via de parto e as limitações da autonomia privada da mulher diante da retórica patriarcal predominante na sociedade.

    No segundo capítulo, abordar-se-á a humanização do parto, desde a origem do termo no Brasil e o lado oposto à humanização, que é a violência obstétrica e suas nuances, bem como a assistência humanizada ao parto como efetivação dos direitos humanos das mulheres.

    Já no terceiro e último capítulo, a pauta será a relação jurídica entre médico e paciente, partindo do direito à informação e da relação entre a prestação adequada da informação à parturiente e o exercício da autonomia privada da mulher, ressaltando que esta disposição de seu próprio corpo, (só pode ser exercida de maneira plena quando o dever de informar do médico é devidamente cumprido. Por fim, será abordada a possível responsabilização cível dos médicos em face de algum dano sofrido pelo binômio mãe-bebê durante a assistência ao parto, pretendendo, assim, contribuir para que seja feita uma conscientização das partes que formam essa relação jurídica, de forma que a autonomia da paciente seja preservada, assim como o exercício legítimo da medicina.

    2 AUTONOMIA PRIVADA DA MULHER: A SUBINTEGRAÇÃO EM UMA SOCIEDADE PATRIARCAL

    2.1 Princípio da Autonomia Privada

    O princípio da autonomia privada é um dos basilares para o estudo e compreensão do Direito Civil, além de ser tão antigo quanto este. Inicialmente, de forma concisa, a autonomia privada pode ser definida como sendo:

    […] O poder de estabelecer por si, e não por imposição externa, as regras da própria conduta. É o poder de se autogovernar, e, por consequência, o detentor da autonomia tem a faculdade de se reger por um sistema de regras próprio e ter tais regras conhecidas pelos demais. (RÜGER; RODRIGUES, 2007)

    A faculdade que o indivíduo tem de atuar de acordo com sua vontade chama-se liberdade, que, no direito, tem grande importância pelos limites que se põem à sua atuação, sendo um conceito plurívoco, de extrema complexidade. A liberdade pode apreciar-se sob diversos ângulos, como liberdade natural, social ou política, como liberdade pessoal e jurídica, pontua Amaral Neto (1989).

    O direito, na pessoa do Estado, age como limitador dessa liberdade em diversos aspectos através das leis e princípios, no sentido de permitir ou proibir certas atitudes. Em nome da boa convivência em sociedade, exige-se que algumas liberdades sejam restringidas até certo ponto para não atingir terceiros.

    A liberdade, em sentido amplo, é a possibilidade dos indivíduos de fazer ou não fazer tudo aquilo que a lei permite, sendo um direito fundamental constitucionalmente garantido a todos, dado às pessoas de regerem suas vidas de acordo com a lei, seja a vida pessoal ou em sociedade, conforme seus princípios e valores, desde que não macule nenhuma norma.

    Sendo assim, é um direito básico, intrinsecamente ligado à dignidade da pessoa humana, o direito de ser livre. Cuida-se da liberdade como capacidade de autodeterminação. Diz-se que ela é positiva, porque pressupõe que o indivíduo reúne as condições necessárias para agir, não se esgotando na mera ausência de impedimentos externos (SARMENTO, 2005).

    No direito privado, há uma nuance de liberdade que é justamente a autonomia. Trata-se do direito que é conferido ao indivíduo de viver sua vida de acordo com suas próprias regras, de praticar um ato jurídico. No artigo 5° da Constituição Federal de 1988, que cuida dos direitos e garantias individuais, as palavras livre e liberdade são repetidas por diversas vezes. Dito de outra maneira, podemos conferir que a autonomia privada se refere ao:

    [...] Poder, reconhecido ou concedido pelo ordenamento estatal a um indivíduo ou a um grupo, de determinar vicissitudes jurídicas [...] como consequência de comportamentos – em qualquer medida – livremente assumidos. Na base desta concepção reside, frequentemente, de modo somente tendencial, a liberdade de regular por si as próprias ações ou, mais precisamente, de permitir a todos os indivíduos envolvidos em um comportamento comum determinar as regras daquele comportamento através de um entendimento comum. (PERLINGIERI, 2002)

    Assim, quando se trata do poder que o particular possui de seguir as regras jurídicas de seu próprio comportamento, estamos nos referindo à autonomia privada, que é o poder de criar, nos limites da lei, normas jurídicas, fundamenta Amaral Neto (1989). Penalva (2009) conclui que:

    O conceito de autonomia privada como sendo aquele que legitima a ação do indivíduo, conformada à ordem pública e permeada pela dignidade da pessoa humana, ou, em outras palavras, a autonomia privada garante que os indivíduos persigam seus interesses individuais, sem olvidar da intersubjetividade, da interrelação entre autonomia pública e privada. (PENALVA, 2009)

    Nesse cenário de autodeterminação pessoal, percebe-se que a autonomia privada do indivíduo está intimamente ligada a dignidade da pessoa humana, tendo em vista que possibilita a cada um buscar seus próprios interesses. Assim, Borges (2005) observa:

    [...] Com o poder que o ordenamento jurídico atribui ao sujeito, este se torna apto a estabelecer miniordenamentos jurídicos para situações específicas de sua vida, estabelecendo regras, reconhecidas e validadas pelo ordenamento jurídico, que disciplinem situações concretas de seu dia a dia". (BORGES, 2005)

    Nesse diapasão, observa-se que a autonomia privada se sobressai nas relações interpessoais e existenciais, tornando cada indivíduo responsável por desenvolver seu projeto de vida seguindo seus princípios e vontades. Assim, as limitações a essa autonomia encontram-se não só no direito positivado, mas sim no respeito ao próximo, tornando a intervenção do Estado nessas relações algo excepcional que aconteceria apenas no intuito de proteger os direitos da coletividade. Ainda assim, é importante que a vontade de autonomia individual seja respeitada, desde que não atinja direitos de terceiros. Não havendo repercussão na vida de outrem, as decisões tomadas pelo particular devem reconhecidas.

    Garcia Amigo (1979) diz que, de maneira subjetiva, a autonomia privada é o poder de alguém de dar a si mesmo um ordenamento jurídico. Portanto, na seara do direito privado, a autonomia privada permite aos particulares viver sob uma autorregulação, tornando-os, desse modo e nessas condições, legisladores sobre sua matéria jurídica. Tendo em vista que, tratando-se de relações jurídicas de direito privado, os particulares são os que melhor conhecem seus interesses e valores, o que os torna seus melhores e mais capacitados defensores.

    A autonomia privada se apresenta como sendo o poder que os particulares possuem de regular, através do exercício de sua própria vontade, as relações de que participam, estabelecendo-lhes a respectiva disciplina jurídica. O fundamento ou pressuposto da autonomia privada é, em termos imediatos, a liberdade como valor jurídico, e, mediatamente, a concepção de que o indivíduo e sua vontade livremente manifestada formam a base do edifício social e jurídico, segundo Amaral Neto (1989).

    É relevante enquadrarmos tal conceituação no que tange à moral e à ética, assim como avaliar como esta concepção se adéqua à realidade dos cuidados devidos com a parturiente durante o trabalho de parto, que é o foco do presente estudo. De acordo com Reich (2003), o conceito de autonomia reconhece a capacidade humana de autodeterminação.

    Alves (2010) considera a autonomia privada como um verdadeiro poder de disposição ou poder normativo, no sentido de que o indivíduo, ao exercê-la, ditará as normas jurídicas que serão aplicadas às suas atividades de cunho privado. Uma mulher em trabalho de parto também se encontra em dilemas que envolvem a autonomia privada, acaba por ser vista como alvo de extremos cuidados, como se não estivesse em pleno gozo e exercício de suas faculdades mentais, impedida, muitas vezes, de decidir por si própria e pela vida do bebê, sendo este um fator bloqueante ou limitante do exercício da autonomia da vontade da mulher.

    Teixeira e Rodrigues (2018) asseveram que quem toma decisões em nome de suas liberdades subjetivas de ação não precisa se preocupar se os argumentos que são decisivos para cada um poderiam ser aceitos pelos outros. A autonomia privada circunscreve um espaço do qual o sujeito pode se retirar

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