Diagramas, transposições e espaço: Alternativas para a complexidade urbana contemporânea
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Diagramas, transposições e espaço - Marcel Rofatto
INTRODUÇÃO
Durante o período de ebulição cultural das décadas de 1960 e 1970, metodologias de projeto foram estruturalmente revistas. Paralelamente outras abordagens emergiram, e o dinamismo da vida urbana aflora como um novo ethos em contraposição à compreensão estática da arquitetura como escultura solitária. Como resultado, transferir para a arquitetura noções de movimento e performance torna-se relevante e, para traduzir essas categorias para o projeto, diagramas foram revisitados e teorizados. Atualmente vivemos um período de complexidade social estrutural, com o deslocamento dos perímetros culturais e o rearranjo das escalas que costumavam definir fronteiras econômicas e políticas.
O cenário revelado pela cidade contemporânea conduz a uma investigação da prática diagramática a partir de uma nova perspectiva, que considere não apenas estágios complexos inerentes ao raciocínio diagramático, como também linhas de investigação capazes de desdobrar caminhos para abordar a complexidade urbana por meio de uma aparente simplicidade, que contudo entrega mais do que aparenta.
Arquitetura Diagrama (Diagram Architecture, no termo original), um conceito que ganhou notoriedade como descrição do raciocínio de projeto de Kazuyo Sejima, estrutura o núcleo da obra. Percorrendo escalas, argumentamos que este conceito, que diz respeito à transposição de diagramas para o espaço, é tanto quanto valioso para o Urbanismo. O objetivo é revelar sua aplicação propícia na escala urbana. Além disso, a análise é complementada pelo legado de Mies van der Rohe, ressignificado sob um novo viés e vinculado a Sejima por meio de outros argumentos. Sejima e Mies empregam elementos de inteligência espacial similares que vão além do óbvio: eles sustentam mudanças sutis, entretanto, transformadoras.
A obra organiza-se em três capítulos, alternando-se entre escalas. O primeiro apresenta um relato da condição da cidade contemporânea. Por sua vez, o segundo capítulo altera a escala de observação e examina profundamente o conceito de Arquitetura Diagrama e os elementos da interioridade da arquitetura de Sejima e Mies (segundo conceito de interioridade elaborado por Peter Eisenman¹), bem como escritórios reconhecidos que sustentam uma prática diagramática, como OMA. Por fim, o último capítulo retorna à escala urbana, interpolando questões de projeto, desenho e representação.
Diferentes autores contribuem para o argumento apresentado. Entre estes, Stan Allen (1956) desempenha um papel relevante. A dissertação expande alguns de seus argumentos, estabelecendo outras associações em novas escalas, bem como diálogos com diversos autores.
Nota
1. Peter Eisenman, Diagram Diaries. London: Thames & Hudson, 1999, p. 27.
[Escala Urbana I]
COMPLEXIDADE E POESIA SOB A LEITURA DA CIDADE
No dia 15 de julho de 1989, um concerto da banda Pink Floyd em Veneza² ressignificou a leitura do espaço público veneziano. Mesmo se após o show a administração municipal foi obrigada a lidar com uma considerável quantidade de lixo espalhado por toda a cidade – razão pela qual outro espetáculo de tal proporção nunca mais aconteceu em Veneza – o show foi um evento memorável. Piazza San Marco, Grande Canale, San Giorgio Maggiore de Palladio e um impressionante palco-ilha
temporário, proporcionalmente comparável a uma das pequenas ilhas de Veneza, performaram diagramaticamente com um único espaço-evento³. O que confirma como um lugar que retém espessas camadas de memória e significado ainda é capaz de ser poeticamente redefinido por seus usuários.
Além de um novo layer diagramático para Veneza, o espetáculo entrega figurativamente uma meta para o urbanismo contemporâneo: o todo é potencialmente maior que a soma das partes. O show do Pink Floyd em Veneza liricamente desmonta as teorias sobre forma-conteúdo e levanta uma questão: quais seriam as características do diagrama capazes de desdobrar estruturas de eventos na cidade contemporânea e que permitem alcançar mais que a soma das partes?
Muitos autores atualmente categorizam a cidade contemporânea como sendo ela mesma diagramática. Reciprocamente – como um pingue-pongue etimológico – definições do diagrama são elaboradas por meio de descrições da condição urbana atual, visto que essa expressa uma estrutura de leitura para compreender a primeira. Conforme ilustram as formulações do diagrama de Robert Somol:
O papel do arquiteto nesse modelo é dissipado, à medida que ele ou ela se torna um organizador e canal de informação, uma vez que, em vez de limitar-se ao decididamente vertical – o controle e a resistência à gravidade, cálculos de estabilidade e carga –forças
emergem, horizontais e não específicas (econômicas, políticas, culturais, sociais e globais). E é por meio do diagrama que esses novos tópicos e atividades, junto com suas diversas ecologias e multiplicidades, podem se tornar visíveis e associadas.⁴ (Tradução nossa)
A cidade contemporânea é continuamente atravessada por forças multivetoriais de natureza física ou imaterial. Um território sobreposto por camadas de fluxos e forças. O surgimento da globalização produziu transformações estruturais na organização social e espacial das cidades. Durante séculos, as cidades sofreram processos de transformação social, econômica e política. No entanto, a globalização sinaliza uma ruptura na forma, velocidade e escala dessas mudanças. Ademais, essa ruptura é profundamente marcada por um crescente desenvolvimento das tecnologias de informação.
Esses fluxos imateriais que cruzam a superfície da cidade na era da informação descortinam um território ambíguo para interpretação. No intuito de estabelecer um posicionamento e intervir, arquitetos podem facilmente ser iludidos por fórmulas nostálgicas ou pela tentação da tradução literal. De acordo com Stan Allen:
Alguns profissionais propuseram uma retirada, sugerindo que a arquitetura deve mais uma vez definir-se como estável e ancorada em contraste com a fluidez da informação. Outros propuseram que a solidez