Megaestrutura e Metrópole: Uma Arqueologia do Programa de Rem Koolhaas
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Sobre este e-book
Um livro indispensável para todos que se interessam pela arquitetura global e sua influência na formação espacial das cidades atuais.
Sandra Ferreira, arquiteta.
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Megaestrutura e Metrópole - Adriana Veras
Adriana Veras Vasconcelos
Megaestrutura e Metrópole:
Uma Arqueologia do Programa de Rem Koolhaas
© 2015 Adriana Veras Vasconcelos
Bibliotecária Maria Valéria
Baltar de Abreu Vasconcelos, CRB4-439
V331m Vasconcelos, Adriana Veras.
Megaestrutura e metrópole: uma arqueologia do
Programa de Rem Koolhaas / Adriana Veras Vasconcelos.
– Recife: O Autor, 2011.
Orientador: Fernando Diniz Moreira.
Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Pernambuco, CAC.
Desenvolvimento Urbano, 2011.
Inclui bibliografia.
1. Planejamento urbano. 2. Embelezamento urbano.
3. Vida urbana. 4. Koolhaas, Rem, 1944- . I. Moreira,
Fernando Diniz (Orientador). II. Titulo.
711.4 CDD (22.ed.) UFPE (CAC 2012-71)
ISBN 978-85-7858-273-9
Ao meu pai, José César Veras (in memorian)
AGRADECIMENTOS
Seguindo a ordem das coisas que compõem o universo, agradeço a Deus, o princípio de tudo. Graças à confiança que tenho nele, em mim mesma e no objetivo que havia de ser alcançado, mantive-me firme até o fim. E é a ele a quem peço forças para continuar a minha marcha na pesquisa e na vida acadêmica.
Agradeço aos meus pais José e Marlucy Veras e minhas irmãs Patrícia e Fabiana, a construção de um lastro familiar onde o amor sempre estava acima de todas as outras coisas. Com o exemplo de obstinação e seriedade de meus avós e pais, aprendi a lutar por meus ideais, inclusive aqueles que pareciam mais distantes.
Agradeço ao meu marido Carlos Augusto e aos meus filhos Luísa e Carlão pela paciência, o amor e a compreensão, nunca hesitando em embarcar comigo em minhas aventuras em busca de conhecimento.
Agradeço à família de Carlos, seus pais Humberto e Joanna, e irmãos (Sílvia, Valéria, André, Hilton e Humberto Júnior) por me acolherem com paciência e carinho, sendo uma segunda família para mim.
Agradeço a tia Fátima, tio Pedro, Christopher e Matthew que também são pais e irmãos para mim.
Sou grata aos amigos brilhantes que acreditaram em mim. São muitos, graças a Deus, mas aqui destaco Renata Vieira Caldas, Barbara Aguiar (Barbie), Carla Cortês, Ana Holanda e Rafaella Cavalcanti. Agradeço especialmente o apoio de Sandrinha (Sandra Ferreira) amiga e colega que tem me ensinado muito com sua alegria e jeito leve de ver a vida.
Agradeço ao meu orientador Fernando Diniz Moreira que sempre confiou em mim, animando-me com os seus comentários lúcidos e de vez em quando até um tradicional ‘tá tudo ótimo!’
Serei eternamente grata a Luiz Manuel Amorim (Luizinho) meu professor na graduação e orientador de mestrado que me ensinou os primeiros passos no caminho da pesquisa. Ele também enriqueceu esta tese com sua participação em bancas de qualificação e na defesa final. Por falar em participação em bancas de qualificação e defesa, agradeço aos professores Gentil Porto, que acompanhou esta pesquisa desde o início, Tomás Lapa e José de Souza Brandão (Zeca) que também contribuíram com seu brilhantismo para o resultado deste trabalho.
Agradeço a todos os professores do MDU pelo respeito e pelas contribuições para a minha conduta moral e profissional. Foram inúmeras contribuições ao longo dos anos, destacando-se a professora Virgínia Pontual que sempre me encorajou, o professor Luiz de La Mora, a professora Vera Mayrink, a professora Circe Monteiro e o professor César Cavalcanti. Desejo que sejam recompensados pelo bem que fizeram não só a mim, mas também a todos os alunos do MDU. Agradeço também à amiga Rebeca Júlio Melo Tavares, secretária do MDU que sempre esteve presente e me incentivou a seguir adiante.
Não posso deixar de agradecer aos amigos da Filadélfia e da Universidade da Pensilvânia: meu orientador professor David Leatherbarrow, Ed Deegan bibliotecário da Fine Arts Library, Matthias Hollwich, professor de projeto arquitetônico da Universidade da Pensilvânia e diretor do projeto e execução do McCormick Tribune Center; e Nycia Petrakis, coordenadora do departamento de arquitetura. Agradeço a atenção do OMA, especialmente Stephan Petermann e James Westcott por me receberem na sede do escritório em Roterdã, pelas imagens e informações fornecidas.
Não me falta a quem agradecer, mas poderia prosseguir com uma lista interminável que, infelizmente cansaria os leitores. Assim finalizo, na esperança de um dia poder retribuir os benefícios recebidos de todos.
PREFÁCIO
Para muitos, a metrópole contemporânea mostra-se confusa, caótica, heterogênea, fragmentada, descontínua e desordenada. Entretanto, isto não é algo novo: alguns privilegiados observadores do século XIX usaram estes mesmos termos para descrever as grandes metrópoles europeias de seu tempo. Talvez esta sensação seja hoje intensificada pela magnitude dos fluxos de informação, pela rápida obsolescência e desativação dos lugares e edifícios, pela simultaneidade de usos e redefinição dos equipamentos coletivos, como observado por Bernardo Secchi, e pela proliferação dos não-lugares, como batizados por Marc Augé. As cidades contemporâneas são cada vez mais complexas. Se por um lado, parecem ser cada vez mais homogêneas quando comparadas entre si, revelam-se, por outro lado, mais heterogêneas, ao incluírem minorias culturais, étnicas e religiosas e diversos estilos de vida e formas de deslocamento.
Apesar de ainda não entendermos o impacto dessas transformações ao longo prazo, não podemos deixar de reconhecer que elas trazem enormes desafios ao arquiteto, um profissional que muitas vezes pensou que poderia, por meio de suas habilidades, prover sentido, clareza e ordem à cidade. Essa condição urbana contemporânea parece enfraquecer uma tradição arquitetônica baseada em valores muito antigos, como a busca da beleza, da funcionalidade, da honestidade construtiva em obras únicas e individuais.
Por outro lado, a instabilidade da condição metropolitana pode também estimular novas formas de pensar e fazer arquitetura. Pode um edifício ser tão complexo como uma cidade? Podem os valores e as demandas de um contaminar o outro? Faz ainda sentido estabelecermos uma clara distinção entre edifício e cidade, diante do que nos apontam alguns edifícios contemporâneos como grandes aeroportos, shoppings, hotéis e centros de convenções? Nesse contexto, Rem Koolhaas é um dos arquitetos que mais tem explorado a metrópole como estratégia de projeto.
Koolhaas admite uma espécie de submissão da ordem arquitetônica ao caos da metrópole. A congestão de atividades, espaços e programas podem ser articulados por meio do que ele chama de grandeza (bigness), um mecanismo arquitetônico capaz de sustentar uma proliferação de eventos em um único edifício ou ambiente urbano. Em suas palavras, bigness não precisa da cidade, ela compete com a cidade, ela representa a cidade, ela domina a cidade, ou melhor ainda, ela é a própria cidade
.
Adriana corajosamente se lançou nesta missão de entender o pensamento e a obra de um dos arquitetos mais controversos de nossa época. Ela traça uma arqueologia das ideias e dos projetos de Rem Koolhaas, mostrando que eles têm origem em conceitos anteriores como as megaestruturas dos anos 1960, que procuravam encaixar a complexidade de uma cidade em um único edifício, e na sua particular visão de metrópole moderna, particularmente inspirada pela Nova York das décadas de 1930 e 1940. Depois de explorar as principais ideias de Koolhaas, ela ainda analisa algumas de suas obras construídas em Seattle, Chicago, Rotterdam e Lille.
Orientar Adriana nesta empreitada foi uma experiência maravilhosa, com certeza a mais rica de minha vida acadêmica. Escrevo isto não só pela sua inteligência, criatividade e seu rigor como pesquisadora, mas sobretudo por testemunhar sua perseverança e lucidez ao conduzir e terminar este trabalho enfrentando a doença que lhe arrebatou a vida tão cedo.
Fernando Diniz Moreira
INTRODUÇÃO
Our amalgamated wisdom can be easily caricatured: according to Derrida’ we can not be Whole, according to Baudrillard we can not be Real, according to Virilio we can not be There. (KOOLHAAS, 1995, p.967)
É cada vez mais difícil definir princípios capazes de orientar as transformações da metrópole contemporânea, espaço dominado pela tecnologia da informação e pela justaposição de fluxos e realidades. Sabe-se que um novo cenário está se delineando, mas não há uma ideia clara sobre a sua natureza. Afinal, qual é o tipo de espaço urbano que a metrópole atual produz? Seria a disciplina da arquitetura capaz de atender às necessidades desse espaço? Quais são as consequências desses espaços para o futuro das cidades? Quais são os limites e possibilidades do urbanismo contemporâneo? Estas características parecem enfraquecer uma tradição arquitetônica consolidada. No entanto, podem estimular o surgimento de uma nova forma de pensar e projetar a arquitetura.
Neste cenário de transformações e questionamentos é possível detectar algumas respostas no campo da arquitetura e do urbanismo. Entre elas, a obra do holandês Rem Koolhaas destaca-se como uma das vertentes mais representativas da arquitetura contemporânea, principalmente por adotar a metrópole como inspiração e estratégia projetual. Em Roterdã, seguiu a carreira de jornalista e de cineasta, mas posteriormente resolveu estudar arquitetura na Architectural Association School of Architecture em Londres. Após conquistar uma bolsa de estudos, foi para Nova York estudar. Lá fundou o OMA (Office for Metropolitan Architecture) em 1975, com Madelon Vriesendorp , Elia e Zoe Zenghelis.
O leque de atuação do escritório inclui projetos arquitetônicos e urbanísticos. Na década de 1980, participações em concursos alavancaram a sua trajetória, entre eles: Parc de La Villette, Paris (1982); ZKM Karlsruhe, Alemanha (1989); Très Grande Bibliothèque em Paris (1989) e duas bibliotecas para a Universidade de Jussieu, também em Paris (1993). Posteriormente, projetos como a Biblioteca Pública de Seattle (2004), CCTV (China Central Television Headquarters), Maison à Bordeaux (1996) e a Casa da Música em Porto (2005), consolidaram a fama do escritório. O AMO, fundado em 1998, é a contrapartida do OMA, um escritório de pesquisa que opera em áreas além dos limites da arquitetura e do urbanismo: sociologia, tecnologia, mídia e política. Tem realizado publicações, projetos nas áreas de sustentabilidade, teoria da arquitetura, além de publicações e exposições.
Londres e Nova York têm papéis especiais na obra teórica de Koolhaas, sendo que sua experiência em Nova York teve papel ainda mais marcante. Para ele, Nova York sintetiza as complexidades da metrópole e foi o leitmotiv do seu livro Delirious New York (1978), um dos mais importantes manifestos arquitetônicos da atualidade. Em 1995, Koolhaas publicou S,M,L,XL, outra obra importante que apresenta seus projetos organizados de acordo com as suas dimensões e reúne seus principais escritos após Delirious. Alguns textos são inseridos entre projetos sem a intenção de relacioná-los, mas apenas expor as ideias que norteiam a sua produção. Content (2003) dá continuidade à série, consistindo em um inventário de sete anos da produção do OMA.
Esta tese consiste em uma arqueologia da obra de Rem Koolhaas, ou seja, uma tentativa de entender como sua obra teórica adquire forma no panorama atual, e eventualmente, contribuir para a compreensão de ideias que guiam parte da produção arquitetônica contemporânea, principalmente no que diz respeito ao relacionamento entre arquitetura e a cidade. Acredita-se que as ideias que regem sua prática e que estão presentes em diversas publicações suas têm raízes mais antigas. A metrópole contemporânea da megaestrutura dos anos 60, constituem aspectos estruturadores de sua obra. São dimensões ligadas ao ambiente de sua formação entre os anos 1960 e 1970, quando vivenciou uma grande metrópole como Nova York e quando correntes arquitetônicas e urbanísticas de vanguarda propunham grandes estruturas como soluções para a cidade do futuro.
Os espaços criados por Koolhaas parecem submeter o homem a experiências equivalentes às vivenciadas e descritas por Walter Benjamin em Paris, ou às idealizadas por Cedric Price ou pelo Archigram nos anos 1960. Sua obra pode ainda ser a matriz de uma nova vertente arquitetônica, havendo influenciado outros holandeses como MVRDV, Mecanoo, Big, Foreign Office Architects, Neutelings Riedijk, Ben Van Berkel e Lars Spuybroek.
Tendo em vista o enfoque da metrópole e da megaestrutura como requisitos essenciais para entender a obra de Koolhaas, a pesquisa se desenvolveu em duas etapas principais. A primeira foi a revisão teórica que se subdividiu em três eixos: metrópole, megaestrutura e obra teórica de Koolhaas. Após esta etapa, foram realizadas as visitas de campo, quando os casos foram analisados in loco e confrontados com princípios e conceitos obtidos na revisão de literatura. Cada edifício foi visitado por um período médio de uma semana, envolvendo entrevistas com diferentes usuários e observação simples. Antes da realização das visitas, foram realizadas entrevistas com membros e ex-membros do OMA, enfocando os projetos escolhidos. Visitas ao OMA em Roterdã possibilitaram observar projetos em desenvolvimento e acesso a documentos do AMO, entre outras coisas.
Refletindo os procedimentos metodológicos adotados na pesquisa, esta tese foi estruturada em quatro capítulos, sendo os dois primeiros voltados para o estudo da metrópole e da megaestrutura. O terceiro capítulo expõe as ideias de Koolhaas e o quarto trata da análise de seus projetos construídos.
O Capítulo 1 estabelece uma visão de metrópole afinada com os ideais de Koolhaas, pressupondo que, para ele, a metrópole contemporânea é um fenômeno semelhante à do século XIX, quando transformações radicais contribuíram para a sensação de estranhamento (VIDLER, 2000, pp. 65-71) naqueles que percorriam bulevares, magazines, galerias, cinemas, estações de trem e saguões de hotéis. Então, a metrópole, neste trabalho, representa uma relação entre homem e espaço, observada subjetivamente, com suas instabilidades e contradições. Não há interesse em defini-la exatamente, nem sugerir como será a cidade do futuro. Apenas, observar a metrópole a partir de um ponto de vista específico, que provavelmente instigou um dos possíveis caminhos para a arquitetura e o urbanismo contemporâneos. Sendo assim, a discussão sobre a metrópole atual foi guiada por escritos de Hans Ibelings (1998), Marc Augé (2007), Anthony Vidler (1992, 2001), Lars Lerup (1994) e do próprio Koolhaas (1978), entre outros autores. A sociologia e psicopatologia de Georg Simmel (1903), a estrutura mítica da metrópole de Walter Benjamin (1935), e a forma como estes temas foram explorados por Anthony Vidler completam a visão que se pretende definir de metrópole.
O Capítulo 2 explora o conceito de megaestrutura, uma tentativa de congregar diferentes unidades e usos dentro de uma única estrutura, procurando incluir variáveis pertinentes à obra de Koolhaas. Apesar de ideias relacionadas à megaestrutura sempre terem existido na história da arquitetura, foi entre as décadas de 1950 e 1960 que ela surgiu como uma solução para os problemas urbanos. O avanço tecnológico permitiu experiências com enormes edifícios capazes de acomodar cidades inteiras e redefinir a experiência urbana. Estas macroestruturas permitem a inserção e a remoção de partes menores