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Grandes Projetos No Araguaia-tocantins: Conflitos E Falcatruas
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Grandes Projetos No Araguaia-tocantins: Conflitos E Falcatruas
E-book148 páginas1 hora

Grandes Projetos No Araguaia-tocantins: Conflitos E Falcatruas

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Sobre este e-book

Este livro analisa a implantação de um grande empreendimento pelo Governo de Goiás no período da Ditadura Militar, no Vale do Araguaia-Tocantins, denominado de Projeto Rio Formoso. Por meio de empresas-cooperativas, recursos públicos beneficiaram um número reduzido de pessoas em detrimento de uma população local marginalizada. O autor, antes de adentrar nas questões políticas dessa obra, faz um breve apanhando histórico da região, quando esta ainda era um território indígena. No final, expõe os conflitos e falcatruas oriundos de um capitalismo de laços e expropriador, que se beneficiou da criação do estado do Tocantins.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento8 de abr. de 2015
Grandes Projetos No Araguaia-tocantins: Conflitos E Falcatruas

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    Grandes Projetos No Araguaia-tocantins - Ycarim Melgaço Barbosa

    O Brasil entrou no terceiro milênio desfrutando da condição de Estado Democrático de Direito, e assim vive um momento de importantes investigações sobre corrupção. Esta decorre de atividades ilícitas envolvendo homens públicos, grandes empresas e o próprio poder público. Fatos são descobertos a cada dia e, neste contexto, encontra-se uma população completamente atônita em meio a vários escândalos. Todos ficam espantados com as feridas abertas; a realidade está exposta e circula de forma rápida pela rede. Muitos fatos tiveram lugar nesse país, no entanto, em outra época, não muito distante, e em face de uma estrutura de governo militar e autoritária, as instituições responsáveis por investigações não podiam desempenhar o mesmo papel. Desse modo, muitos acontecimentos ilícitos e falcatruas passaram em branco na história do país por um longo tempo.

    Este livro, originalmente publicado em 1996 pela Editora Papirus, com o título Conflitos Sociais na Fronteira Amazônica: o Projeto Rio Formoso, passou por uma reformulação e revisão geral a fim de apresentar ao público uma análise da intervenção do Estado na modernização da agricultura no vale do Araguaia-Tocantins e abrir uma ferida da história do país que ficou de certa forma sem investigação e, consequentemente, sem um desfecho justo.

    No final da década de 1970, o estado de Goiás, aliado a interesses particulares, adotou políticas de investimento de grande vulto na implementação de obras no Vale do Araguaia-Tocantins, nas proximidades da Ilha do Bananal, para produção de arroz e soja nos moldes do agronegócio.

    Ao investir no maior empreendimento agrícola feito pelo estado de Goiás, denominado de Projeto Rio Formoso, nas proximidades de um rio com o mesmo nome, o Governo goiano, em 1979, ainda sob as égides do regime autoritário, transferiu recursos públicos para a iniciativa privada sem garantir retorno aos cofres públicos, o que se configurou em uma política paternalista, seguida de fraudes e calotes no sistema financeiro, incluindo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

    Houve uma modernização na região, mas o poder público encobriu as formas ilícitas em meio a falcatruas, com a criação de empresas travestidas de cooperativas agrícolas, aproveitando-se de todos os benefícios dessa modalidade para burlar a lei. A escolha dos cooperados seguiu o critério de laços com o Governo de Goiás.

    Após a divisão de Goiás e com criação do estado do Tocantins, esse empreendimento passou a integrar o sudoeste de Tocantins, nas proximidades da Ilha do Bananal, no município de Formoso do Araguaia. As dívidas e os investimentos de Goiás foram rapidamente absorvidos pela União. Como num passe de mágica, a divisão desse estado colocou os empresários ou os cooperados do Projeto Rio Formoso livres dos ônus da implantação, capital fixo. Como se diz no jargão popular, a conta foi pra viúva.

    Este livro, antes de adentrar nas questões políticas de implantação do Projeto Rio Formoso, faz um breve apanhado histórico da região do Médio Araguaia, quando ainda era território indígena. Na década de 1940, essa região foi invadida pela atividade de garimpagem de cristal de rocha (matéria-prima utilizada pela indústria eletrônica), ocasionando os primeiros conflitos pela posse da terra – época em que os índios foram massacrados pela violência de garimpeiros. Após a garimpagem entrar em processo de decadência, a pecuária ocupou espaço em uma extensa área de várzea.

    O restante da população dos Avá-canoeiros e Carajás se refugiaram numa reserva na Ilha do Bananal, e a região passou por um processo de demarcação e de legalização das terras. Com a construção da rodovia Belém-Brasília, a fraude dos títulos de terra, conhecida como grilo, ocorreu de maneira generalizada, o que deu origem a novos latifundiários.

    Nota-se que a população local permaneceu excluída da concepção original do empreendimento, o Projeto Rio Formoso. Surgiram posseiros nas áreas das cooperativas e os conflitos sociais pela posse da terra se instalaram na fronteira agrícola.

    Em sua parte final, o livro destaca o maior calote da história da região, levando à insolvência da Cooperformoso, administrada por cooperados gaúchos. Por meio do nome da cooperativa, esses arquitetaram um golpe no sistema financeiro ao abrirem um rombo, em vários bancos, de mais de US$ 11 milhões (dados de 1989). E assim começa a história...

    Ycarim Melgaço Barbosa

    A criação do estado do Tocantins é recente, ocorreu em 1989. Nesse sentido, para estudar a ocupação das terras nessa região, faz-se necessário analisar a ocupação no norte e sul de Goiás, anterior à divisão.

    Goiás, em meados do século XX, tinha como principal fonte de renda a pecuária, concentrada, sobretudo, no sul do estado. O norte era pouco habitado e de difícil acesso. Assim, o domínio de terras nessa região não despertava muito interesse. Com a construção de Goiânia e da Colônia Agrícola de Ceres, houve uma expansão capitalista, o que elevou o valor das terras próximas à nova capital.

    Em seguida, com a abertura da rodovia Belém-Brasília, as terras no norte goiano (atual Tocantins), grande parte devolutas, ocupadas por alguns posseiros e de território indígena, começaram a ser incorporadas pela iniciativa privada de forma fraudulenta, inaugurando os conflitos pela posse da terra, que, a partir daquele momento, passou a ser um equivalente de mercadoria.

    O processo de legalização das terras na parte sul de Goiás seguiu o caminho do Instituto de Registro Paroquial. Permaneceu, dessa forma, a posse da terra por herdeiros e pelos sucessores dos responsáveis pelos registros. De acordo com Albernaz (apud Guimarães 1982):

    (...) A aquisição do domínio dos imóveis mais na região sul se fez, de um modo geral, de maneira tranquila e contínua. ‘Grilo’ aconteceu esporadicamente e não teve o caráter de especulação imobiliária como aconteceu depois no Norte do Estado: a falsificação ou adulteração de documentos visava a ‘legalizar’ posses consolidadas, pois o governo, via de regra, só outorgava título de domínio a poucos privilegiados. Trata-se assim, de terras já integradas no processo produtivo ou de glebas a serem imediatamente ocupadas.

    A ocupação do norte de Goiás ocorreu de maneira especulativa, ao transformar a terra em reserva de valor, favorecendo, com isso, o surgimento de grandes propriedades. A aquisição da maioria das terras ocorreu de forma fraudulenta, por meio do grilo. Como afirma Asselin (1982, p. 34):

    O grileiro é um alquimista. Envelhece papéis, ressuscita selos do Império, inventa guias de impostos, promove genealogias, dá-se como sabendo escrever velhos urumbebas que morreram analfabetos, embaça juízes, suborna escrivães. Aí estão as características do grileiro.

    Em 1957, o Instituto de Desenvolvimento Agrário de Goiás (Idago) decidiu medir as terras do Vale do Javaés. Para tanto, enviou o primeiro agrimensor àquela região. Após o término do garimpo, poucos moradores ficaram na Vila de Formoso, outros, dispersos pela redondeza. Naquela época os camponeses da região não se preocupavam com a delimitação de suas áreas – a decisão dos loteamentos partiu do Idago. Essa divisão dos municípios em lotes favoreceu a ação de grileiros. O Idago funcionava como uma imobiliária: com os lotes demarcados tornava-se fácil dar-lhes uma destinação.

    O primeiro passo para a legalização das terras constituiu-se em ações discriminatórias. Essas ações serviram para conhecer os documentos dos donos ou posseiros. Após a discriminação, as terras sofreram demarcação. Averiguou-se se a cadeia dominial¹

    estava perfeita ou se faltava o memorial descritivo².

    Ressalta-se que o Direito é de uma conduta positivista, portanto considera proprietário quem tem título registrado em cartório. Esse documento torna-se verdadeiro até prova em contrário. Juris Tantum.

    Raimundo Carneiro, morador de Formoso do Araguaia, antigo garimpeiro, viveu o período da medição das terras no Vale do Araguaia e relatou alguns acontecimentos:

    E tem até o agrimensô que fez isso. Tá aí... É o Orival. Todo esse loteamento daqui foi seu Orival que fez. Primeiro agrimensô que mediu aqui. Mediu essa terra toda: Loteamento Gameleira, Loteamento Pato Assado, Loteamento Lagoa Formosa, e tudo foi ele.

    A grilage é o seguinte, foi depois que Orival mediu. O Orival mediu e ficô muita terra, muita terra sem dono mais medida loteada. Aí apresentô diversos grileiro aí, ali. Eles mediram muita terra. Pelo menos esse varjão eles deixaro ele todo medido, todo medido, o loteamento Lagoa Formosa, onde é o Projeto hoje.

    Antes da medição havia muita terra desocupada, devoluta, no Vale do Médio Araguaia, região da Ilha do Bananal, ainda como território goiano. Após os loteamentos, constataram-se, nos registros do Idago de 1957, que os lotes foram quase todos ocupados, apenas no papel, por pessoas desconhecidas, vários não eram sequer agricultores.

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