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O Inverso De Pi
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E-book421 páginas6 horas

O Inverso De Pi

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Sobre este e-book

Num futuro não muito distante, a humanidade atravessa uma severa crise, agravada por uma iminente terceira guerra mundial. Em um pequeno país situado na América do Sul, aparentemente distante do centro dos conflitos, uma pacata família tem a sua rotina totalmente modificada quando o patriarca é raptado e submetido a uma inusitada experiência científica, a qual irá mudar a sua vida. A partir de então, o rumo da história da humanidade será reescrito e o planeta poderá vivenciar o pior de todos os males. A história é narrada em primeira pessoa.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento12 de nov. de 2012
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    O Inverso De Pi - Rafeal Ceadric

    ¹ sempre levado consigo, que o enunciado fora parte de um sonho cuja perpetuidade decidiu manter num pedaço de papel.

    ─ Que sonho interessante, Zirfill! Até parece que você vivenciou tudo o que se passou naquele planeta imaginário, levando-se em consideração a descrição pormenorizada que fez.

    Naquele segundo dia de contato com Zirfill ele foi bem receptivo. Descreveu sua infância na Coreia do Norte, da retirada de seus pais adotivos para a Coreia vizinha, escapando da repressão no fechado país oriental, e de sua grande paixão: os estudos avançados em física e química. Contou-me que não desfrutava da companhia de amigos e sabia que os outros o achavam meio anormal, não entendendo o motivo. Os seus comentários foram digitados na versão aprimorada do tablet na cor cinza e entregues a mim para leitura.

    Eu também o achava diferente em virtude de não se aproximar de ninguém e ser excessivamente reservado, nunca abria a boca para dizer uma palavra. A forma de emissão de suas opiniões era restrita ao multimídia portátil. E continuava a não compreender o que uma mente privilegiada fazia numa empresa daquele segmento econômico, trabalhando numa área avessa à sua especialidade. Com os conhecimentos que acumulava, poderia trabalhar na área de biotecnologia ou algo similar de qualquer grande multinacional, fiz questão de dizer isso a ele.  

    Zirfill outra vez sorriu e me convidou a visitar sua casa. Escreveu que zelava por alguns segredos e ansiava partilhá-los com alguém de confiança. Num ato impensado, o qual mudaria o rumo da minha vida para sempre, aceitei o convite.  

    Dias se passaram dentro da minha rotina sem novidades. Numa tarde de sábado resolvi fazer-lhe uma visita de cortesia. Era um pequeno sítio localizado num bairro pouco habitado, isolado do restante da cidade. Gastava-se mais de uma hora para se deslocar da casa ao trabalho, caso o trajeto fosse realizado de carro em um dia de pouco movimento no trânsito, uma raridade. A residência de número cento e vinte e três, pintada exteriormente na cor amarela escuro, era modesta e sem nenhum luxo aparente. O muro alto escondia parcialmente dos raros e curiosos pedestres os aspectos visuais negativos da casa. O portão metálico abriu-se sem que eu solicitasse, provavelmente uma câmara escondida tenha denunciado minha presença. Uma calçada de pedras conduzia o visitante à porta principal. Zirfill me aguardava na entrada, segurando duas xícaras. Ao entrar na sala, tendo circulado antes por um jardim mal cuidado, não pude deixar de notar a pouca quantidade de móveis no recinto: um estofado marfim, uma cadeira de balanço da mesma cor e um enorme, delgado e antiquado televisor fixado em uma das paredes do cômodo, cuja dimensão era pelo menos três vezes maior do que a televisão comprada por mim no ano passado, top de linha na época.

    – Bela TV, Zirfill. Não sabia que ainda fabricavam modelos à base de cristais de íons polarizados

    ² . Posso ligá-la?

    Ele já se encontrava na cozinha preparando o chá e não ouviu minha observação. Aproveitei a ausência do dono da casa para me deslocar a uma sala auxiliar. Vi vários quadros com imagens inexplicáveis. No primeiro, uma paisagem de plantas exóticas, onde se via uma espécie de vulcão ao fundo do plano, ladeado por duas desmedidas árvores cujas raízes contorcidas eram visíveis. A obra seguinte, também uma gravura, expunha um exuberante campo de golfe com a grama na cor azul e uma grande montanha em destaque cortada por um relâmpago incandescente. O terceiro painel divulgava uma ilustração gráfica desoladora: uma vasta superfície de terra escura, com plantações destruídas e um córrego ressequido onde antes parecia ter existido um riacho. A obra de arte fixada ao lado continha o rascunho monocolor de uma casa urbana abandonada, com as iniciais A.D.V. seguidas do número 314 rabiscado numa cerca de madeira. Aproximei-me de mais um quadro e notei que era mais precisamente uma fotografia. Uma casa em formato circular, construída com um material semelhante ao vidro, exibindo uma janela redonda aberta e outra fechada, com duas antenas na parte superior, destoando do design moderno do imóvel.

    Na outra parede dessa sala, cinco telas menores registravam imagens de fisionomias recobertas com fitas escuras que não consentiam reconhecê-las. Quando me aproximei de um dos quadros para tentar decifrar o enigma, o aroma da infusão de folhas em água fervente, vindo da outra sala, convidou-me a desistir dessa ideia.  

    Após tomarmos o chá, por sinal muito ruim, o coreano foi à estante e trouxe o seu inseparável caderno digital recheado de orifícios laterais. Numa das aberturas, inseriu um conector cuja outra extremidade se assemelhava a um fone de ouvido. Olhando mais de perto, vi que se tratava de uma ventosa de plástico com um minúsculo chip embutido numa caixinha transparente. Ele então esticou o fio do aparelho e fixou a ventosa no lado superior direito da cabeça, deslocando um pouco para cima o boné encarnado. Percebi que nesse acessório figurava a inscrição "I Love Ozt", tendo a palavra love sido substituída por um coração na cor amarela. O meu vizinho era proprietário de um boné quase igual, de coloração branca, onde constava "I love NY, cuja palavra amor em inglês era representada por um coração na cor do sangue e, logo após a letra Y", na parte inferior direita, aparecia um pequeno círculo contendo a letra "R". Prosseguindo, meu anfitrião ligou o esmerado tablet e, como num passe de mágica, passados alguns segundos, um som de voz humana saiu de dentro do pequeno brinquedo eletrônico:

    Achou interessante a novidade, Isak?

    Ele explicou que se tratava de um transmissor de ondas de pensamento. Tudo o que ele planejava dizer com a fala era convertido em sinais elétricos e reproduzido como impulsos de voz.  Havia ainda a opção dos pensamentos serem digitalizados e anunciados na tela na forma de textos ou imagens.

    Zirfill acrescentou que a tecnologia foi desenvolvida há pouco tempo e que pretendia aperfeiçoá-la por meio da não utilização de fios. A comunicação entre a mente e a máquina dar-se-ia em modo virtual ou wireless. Ele pretendia inaugurar o transmissor brevemente e patenteá-lo em seguida.

    Era grande a minha curiosidade em saber o motivo dele não possuir a capacidade de falar. Será que era mudo desde que nasceu ou teve algum problema que lhe tirou a voz? Não importava. Meus genitores me ensinaram que era falta de educação perguntar este tipo de coisa a outrem. Sobre a invenção mostrada, eu tentava assimilar as suas possíveis consequências. Será que a ferramenta tecnológica também poderia ler os sonhos? Numa penitenciária seria permitido acoplar as ventosas na cabeça dos prisioneiros para que seus intentos delinquentes fossem ouvidos? O invento apresentava uma vasta gama de utilidades.

    Conversamos durante horas sobre a novidade e assuntos diversos, exclusive trabalho, futebol e mulheres. Zirfill voltou a comentar sobre os assuntos confidenciais reservados em sua casa e que almejava dividi-los com alguém.

    – Além dessa invenção existem outras? E por que eu, Zirfill? Nós mal nos conhecemos. Somos parceiros de trabalho de seções diferentes, nada mais do que isso.

    Ele insistiu e disse que era muito importante. Levou-me para a sala auxiliar em que ficavam os quadros extravagantes e retirou da parede a moldura com o desenho da grama azulada. Ela acoplava em seu verso uma espécie de central de comando secreta. Vários botões apareceram, cada qual com um número impresso. Ele apertou o botão cujo número sete figurava. No local onde havia uma mesa com um abajur sobre ela abriu-se um espaço no chão, fazendo surgir uma escadaria que dava acesso a uma saleta no subsolo. Logo, fiquei indeciso entre descê-la ou não. A curiosidade resultou maior que o medo do obscuro.

    Durante a descida da escada, ainda no segundo degrau, meu telefone celular tocou. Era Kaio do outro lado da linha.

    ─ Pai, são dezoito horas. Saí mais cedo do colégio e quero ir para casa. O senhor pode vir me pegar? Mamãe saiu para fazer as compras e ainda não retornou.

    ─ Dezoito horas??? Mas hoje é sábado, Kaio... Ah, me desculpa! Você tem razão, não me lembrei da sua aula de hoje.    

    Uma angústia tomou conta de mim, pois não poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo. Zirfill falara, enquanto tomávamos chá, que dentro de alguns anos poderíamos ser teletransportados de um local para outro instantaneamente.

    Segundo ele, os pioneiros cientistas

    ³ que  demonstraram a possibilidade de criar algum tipo de teletransporte valeram-se de uma partícula chamada fóton, semelhante a um elétron, porque igualmente gira em torno de si mesma, num movimento denominado spin. Os estudiosos conseguiram com êxito teletransportar o spin de um fóton.

    Para se concretizar a proeza eles criaram duas partículas e mantiveram uma delas num determinado ponto do laboratório. A outra foi enviada para um local distante. Ocorre que, segundo uma lei da física quântica, essas partículas não têm nenhuma propriedade até serem medidas, como se só começassem a rodopiar depois que o cientista tenta medir sua rotação. Mas, assim que isso é feito, os fótons passam a girar em direções opostas. Para confirmar esse evento, os físicos realizaram a medida no fóton mais próximo. O outro, mais distante, começou a rodopiar ao contrário do primeiro. Ou seja, eles foram capazes de criar uma rotação instantânea à distância. O feito foi repetido varias vezes e sempre funcionou, não importando a distância que as partículas estivessem entre si.

    Zirfill frisou que experimentos como esse foram aprimorados e vêm sendo realizados com a utilização de objetos inanimados desde o ano 2.020. A grande incerteza, segundo ele, é que a matéria é desconfigurada durante o transporte, não havendo um sistema de reconhecimento que possibilite montá-la da mesma forma enviada anteriormente. Em outras palavras, pode-se transmitir uma mesa para um lugar e receber uma cadeira, exemplificando de forma exagerada, destacou ele. Imagine-se então o que não ocorreria com seres vivos. Lembrei-me de ter visto algo parecido num antigo filme de ficção científica, em que o corpo de um homem foi misturado ao de um inseto após serem desmaterializados de um lugar para outro.

    ─ Kaio, eu estou na casa de um amigo, distante muitas e muitas quadras do seu colégio. O transporte escolar não poderia pegar-lhe antes do horário usual? – perguntei ao telefone.

    ─ Acredito que não, pai. O horário do transporte escolar é rígido. Ele virá ao colégio somente por volta das dezenove horas.

    ─ Tive uma ideia. Vou pedir ao Fred para trazer-lhe. Ele deve estar em casa agora. De lá para a sua escola gasta-se menos de quinze minutos.

    Eu não considerava Fred um amigo, do tipo que temos liberdade para falar de assuntos íntimos. Considerava-o sim um bom emissor e receptor eventual de diálogos informais. Mas faltava muito pouco para promovê-lo à categoria de amigo, ao invés de um simples colega de trabalho.

    – Pode ficar so...so...sossegado, Isak. Eu passo no co...colégio do Kaio e levo-o para casa. Você fica me de...devendo esse favor, amigo! – advertiu Fred, em tom de brincadeira.

    Foi o suficiente para o arquivamento da minha preocupação momentânea. Continuei a descer a escadaria e apreendi que o local era uma espécie de abrigo antinuclear, tal a espessura da porta de acesso ao recinto subterrâneo. Ao adentrá-lo, Zirfill voltou a chamar a minha atenção para a necessidade de preservar o sigilo sobre tudo o que eu conheceria naquele local. Sob hipótese alguma, advertiu, eu deveria compartilhar as informações sigilosas a serem reveladas. A minha segurança estaria em jogo caso comentasse com alguém sobre os materiais ali ocultados. Tomei um susto quando ouvi essa séria advertência, afinal comparecia à casa na qualidade de convidado e não reunia elementos para conjeturar sobre o que me esperava.

    Ele passou a expor diversos equipamentos sofisticados, inimagináveis de se acreditar. Disse-me que fazia pesquisas ousadas no campo da nanobiotecnologia aplicada à cibernética há mais de trinta anos. No processo de fabricação dos modelos, Zirfill trazia os principais componentes das suas invenções por meio de encomendas efetuadas junto aos grandes fabricantes de produtos eletrônicos situados em países do leste asiático. Ele vinha se esforçando a todo custo visando dividir com alguém confiável os produtos do seu trabalho, antes de divulgá-los ao público em geral. Zirfill, porém, omitia esse pretenso suplício em sua cara oriental, deixando-me desconfiado sobre suas reais intenções.  

    Eram três invenções, um trio de inovações revolucionárias. Somente duas delas poderiam ser mostradas, por enquanto, tendo em vista que o terceiro projeto fora desenvolvido em conjunto com outros dois cientistas. Ele apenas dispunha da maquete e de parte das anotações feitas à época em que participou da equipe.

    O RELÓGIO CONTRA O TEMPO

    Ele me apresentou inicialmente um relógio digital, dizendo que era um mecanismo especial de abordagem do tempo. Com o advento dos supercondutores e o desenvolvimento dos raios gama aplicados à decomposição e recomposição da matéria, inventou uma máquina denominada de Relógio Contra o Tempo, ou RCT

    ⁴ – explicava Zirfill. com seus olhos puxados fixados no protótipo. Após incontáveis anos de cansativos estudos, descobriu que um corpo pode ser desintegrado quando submetido a uma fortíssima onda de radiação gama e, logo em seguida, a matéria é metamorfoseada numa espécie de energia intramolecular, a qual pode ser capturada utilizando-se de um complexo sistema de retenção subatômica.  Este seria o estágio preliminar do processo de viagem no tempo. A fase secundária corresponderia à liberação da mesma energia confiscada e o retorno desta à sua forma precursora de matéria, por meio de um recurso inverso ao primeiro, onde seria utilizada uma quantidade maior de radiação, desta vez com polarização contrária.

    Eu já estava quase dormindo em pé quando Zirfill percebeu que carecia traduzir suas explicações científicas para uma linguagem inteligível às pessoas comuns. Para simplificar seus dizeres, ensinou-me que o Relógio Contra o Tempo teria a função de desintegrar um corpo, convertê-lo em energia e retê-la no interior do objeto para depois ser liberada no futuro. Então o corpo seria reintegrado. Daí o seu sugestivo nome.

    Dessa vez ouvi atentamente as explicações e permaneci pensativo por pouco menos de um minuto, tentando deglutir mentalmente o funcionamento da descoberta. Ele solicitou que eu tocasse no relógio. Então explicou que, antes de ser acionado, o usuário deveria programar a data exata pretendida para a energia ser rematerializada, informando o ano, mês, dia, horas, minutos e até os segundos, caso preferisse uma maior precisão em seu retorno.

    – Eu programo o RCT para me despertar no dia doze do mês de outubro do ano de 1.492, às treze horas, quinze minutos e quarenta segundos, ligo o dispositivo e, como num passe de mágica, acordo e assisto Colombo desembarcar na América com suas três caravelas?! – indaguei a Zirfill de forma irônica, ainda sem alcançar claramente o funcionamento

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