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Babel
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E-book126 páginas1 hora

Babel

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Sobre este e-book

O livro é uma reunião de ensaios produzidos ao longo de décadas com críticas de Mídia e aponta efeitos poderosos do uso de recursos de multimídia. Para tanto, os textos procuram definir qual é a mensagem peculiar de cada meio de comunicação, como definiu Marshall McLuhan, que diz que “o meio é a mensagem”.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de mai. de 2020
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    Babel - Leão Serva

    PREFÁCIO À PRIMEIRA EDIÇÃO

    Tranças para fugir da torre

    José Nêumanne Pinto¹

    Uma das tarefas mais espinhosas na vida de um comunicador profissional, como este escriba que dirige a suas retinas as manchas negras caprichosas deste texto, é avaliar outros textos, da lavra de outros tipos de comunicadores, os teóricos. Você, meu querido leitor, vai logo sentir uma pontinha de preconceito na afirmação acima. Vai ver, o homem é frustrado, porque não é bom de didática e fica falando mal do professor, que nunca conseguiu ser, comentará, não sem uma pontinha de razão. Mas, na outra ponta da razão, fica a diferença que existe entre comunicar para vender e não comunicar para lecionar comunicação. Pois é: a grande maioria, para não radicalizar na base da quase totalidade, dos textos teóricos existentes sobre a comunicação leva o leitor à conclusão mais óbvia e fácil de que esta nobre arte, que tem sido guindada (ou rebaixada) à condição de ciência exata, é uma impossibilidade.

    No entanto, a comunicação pode até ser complexa e caprichosa, sobretudo volúvel, mas possível ela é. Não é? Prova-o o fato de a mesma me proporcionar renda mensal, com a qual alimento meus filhos. Mas isso não é de sua conta nem de ninguém. O que é de sua conta, aí, sim, e finalmente, estamos indo diretamente ao ponto, é que o autor deste livro, que, a seguir, será oferecido às mesmas retinas que, com alguma dificuldade, acompanham meu tortuoso (desculpe, leitor) raciocínio, se é que há algum, também consegue se fazer entender.

    Leão Pinto Serva (que não é meu parente, apesar do Pinto no meio do nome, ficando o meu no fim), por incrível que pareça, é um comunicador que comunica. Grande vantagem, você dirá! E rirá. Afinal, é um colega seu, prefaciador de uma figa, pensará. O autor, também, é um profissional do ramo, pois vive de seduzir incautos para o conluio armado pelas frases, atraindo-os com a melodia enganosa da flauta doce das palavras. Mas, à medida que você for progredindo na leitura, se é que não desistiu ainda, por minha culpa, descobrirá que, de fato, ele é meio híbrido. Pois se trata, também, de um comunicador em teoria.

    Teórico e prático, pois, o autor deste livro é uma exceção. E excepcional também, pode crer, é o fato de ser ele um jornalista que sabe escrever. Não pense que estou brincando, não. Nem sempre o ofício leva à perícia, o que, aliás, é bom que se diga logo, não é desdouro. Um de meus mestres, talvez o melhor repórter que conheci, Mané Alexandrino Leite, do Diário da Borborema, de Campina Grande, era semianalfabeto. Ler, até ele lia, mas escrever, nem pensar. O que lhe faltava em intimidade com o vernáculo, porém, lhe sobrava em faro para a notícia, e é esta, não aquela, a principal virtude de um militante da reportagem. De qualquer maneira, meu mestre morto não tem nada a ver com a hora do Brasil e o fato é que Leão Pinto Serva não trata nosso vernáculo de Vossa Excelência, mas tem intimidade com o próprio. Isso já é meio caminho andado para uma boa leitura. Mais de meio, vá!

    Outra coisa: apesar de ter produzido apenas um programa de rádio na vida, reconhece a extraordinária importância desse veículo na vida moderna. Com aquelas melenas desgrenhadas, ele até tem jeito de gente que esnoba o populismo radiofônico, mas não esnoba, nada! Desenterrou até um texto do poeta Bertolt Brecht, transportando-o para nosso cotidiano atual. Além do mais, conseguiu tornar palatáveis as teorias de Félix Guattari sobre a radiofonia comunitária, o que também é tarefa dependente de engenho e arte. Pois conheço pessoalmente o francês em questão e posso lhe garantir que isso não é sopa. Sopa de letrinhas.

    Para completar a receita do livro, o diabo de seu autor ainda exumou Marshall McLuhan em pessoa. Você sabe, o homem esteve na moda aí pelos 60, mas, de repente, não mais que de repente, tomou chá de sumiço. A graça que ele tinha, aquelas frases que, isoladamente, soavam com sentido, mas, em conjunto, eram a própria descrição do vácuo, evaporou. Leão Pinto Serva pegou o quebra-cabeças desconexo do guru do meio é a mensagem/massagem e deu vida a seus trocadilhos inócuos. Mais do que uma exumação, foi uma ressurreição. Levanta-te e anda, Marshall, berrou ele. E McLuhan se pôs de pé, como raras vezes na vida, equilibrando-se no arame frágil das próprias frases.

    Faça como ele. E como eu, oportuno leitor. Surfe com tranquilidade sobre as ondas herzianas, como lhe propõe o autor deste livro, nas próximas páginas. Você não se perderá na verdadeira torre de Babel (a das emissoras de rádio e televisão), nas quais o massacre da comunicação do mundo globalizado nos tem encerrado, hoje, em dia. Aqui você encontrará alguns modos de confeccionar as tranças de Rapunzel para facilitar sua fuga para longe da algaravia reinante.

    1 José Nêumanne Pinto, jornalista e escritor, é editorialista de O Estado de S.Paulo e comentarista na Rádio Jovem Pan.

    O RÁDIO QUE NOÉ PÔDE OUVIR

    Esta pequena ilha não é como a baía do Rio de Janeiro, uma visão mágica. Alguns picos de montanha submersa restaram após o Dilúvio; uma família subiu para lá, deitou raízes, os corais também subiram, fecharam-se em anel em torno da ilha

    NOA NOA, Paul Gauguin

    (Sobre o rádio):

    Tive a terrível impressão de que era um aparelho incalculavelmente velho, que caiu relegado ao esquecimento pelo Dilúvio Universal.

    TEORIA DO RÁDIO, Bertolt Brecht

    A primeira emissão de rádio da história² se deu quando o nome do aparelho ainda era sem fio, numa confusão com a tecnologia mais antiga (era considerado como um avanço do telégrafo). O sem fio era muito usado por navios para transmissões telegráficas, em código. Porém, na noite em que estourou a rebelião pela independência da Irlanda em 1916, católicos nacionalistas buscaram apelar à solidariedade norte-americana e usaram o aparelho para transmitir ao léu informações e palavras de ordem sobre seu movimento para algum navio que captasse a manifestação e levasse a notícia para o outro continente. Surgia o uso moderno do rádio. Alguns anos depois o meio vivia sua implantação como mass media, como então só a imprensa alcançara ser. O dramaturgo Bertolt Brecht acompanhou exatamente essa fase da vida do meio, a qual aborda em um texto interessante e perspicaz (O Rádio – Um Descobrimento Antediluviano? – BRECHT. 1970). Apaixonante mesmo, se bem que consista apenas de notas esparsas organizadas.

    O rádio havia acabado de surgir na Europa e já provocava ansiedade entre os teóricos e profissionais de outras áreas da comunicação, assolados por um meio antropófago, que surgido graças a um desenvolvimento técnico que a tecnologia da virada do século permitiu, não detinha ainda público nem atratividade, e nem mesmo algo que fosse característico seu em termos de programação. Então a fera invade outros meios, vai buscar nos meios que o antecedem, a inspiração, o know-how, e principalmente o público. Frente a esse objeto de atenção, Brecht se mostra de um incrível poder de previsão, fazendo colocações que antecipam o fenômeno das rádios livres, que vai despontar na Europa só na década de 1970. Uma frase sua retrata bem essa sua concepção:

    A concentração de meios mecânicos, assim como a especialização crescente na educação – processos que é preciso ativar – requerem uma espécie de rebelião do ouvinte, sua ativação e reabilitação como produtor. (BRECHT. 1970:133-134)

    Essa preocupação com a estrutura comunicativa do rádio, em que o ouvinte tinha (como tem até hoje) um papel cristalizado de puro receptor enquanto a rádio reserva a si o monopólio do papel reverso, de voz, produtor ou Emissor, é ressaltada ainda quando diz que o rádio tem uma cara onde deveria ter duas, que ele é um simples aparato distribuidor. A semelhança não pode ser casual: a rebelião de que fala Brecht, ele tentou equipar (em termos de consciência, não de armas) com seus exercícios chamados Voo Transoceânico, para atuação teatral em rádio, que não são descritos no seu texto, apenas comentados. É essa mesma revolta que deu arcabouço ao surgimento das rádios livres³, além das costas largas para sua sobrevivência frente à perseguição oficial (para tanto estavam a tal ponto encarnadas no movimento social envolvente, que foram chamadas por Felix Guattari como sendo rádios no movimento⁴). Essa revolta fez possível a experiência das rádios livres, tendo nelas um porta voz impossível de ser encontrado nos meios oficiais. Essas rádios se forjaram de forma a ganhar a segunda cara de que fala Brecht.

    O monopólio estabelecido pelos governos europeus desde os anos 20, persistindo até os anos 1980⁵, fez perdurar também os papéis dos elementos da comunicação dispostos da mesma forma, estanques, podendo ser representados, um por uma boca enorme, e outro por um enorme ouvido. Nesse sentido, a empresa emissora se coloca como uma metralhadora de palavras, mais ou menos à imagem do locutor de futebol, que preenche os espaços sonoros

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