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A Blogosfera Portuguesa: Da coluna infame ao ocaso de uma era
A Blogosfera Portuguesa: Da coluna infame ao ocaso de uma era
A Blogosfera Portuguesa: Da coluna infame ao ocaso de uma era
E-book125 páginas1 hora

A Blogosfera Portuguesa: Da coluna infame ao ocaso de uma era

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Sobre este e-book

Eles, bloggers, ainda andam aí. É fácil encontrar nomes-chave na blogosfera da década de 2000 nos espaços actuais de opinião nos jornais, mas também na política, na cultura e no entretenimento. Quando escrever na internet não dava dinheiro, nem borlas em restaurantes, nem cremes para as rugas, o que levou milhares de portugueses a criarem e a alimentarem um blogue? Como se explica o êxito da blogosfera e o que a fez desvanecer-se? Este é o retrato da blogosfera em Portugal, desde o primeiro caso de sucesso (A Coluna Infame) e o auge, em 2008, até à migração da maioria dos bloggers para o Facebook e para o Twitter. Descontraído e deliberadamente informal, regista um fenómeno marcado, desde o início, por uma considerável dose de som e de fúria. Vídeo de apresentação: https://youtu.be/k1LcOFVG2tY
IdiomaPortuguês
Data de lançamento18 de fev. de 2021
ISBN9789899004931
A Blogosfera Portuguesa: Da coluna infame ao ocaso de uma era
Autor

Sérgio Barreto Costa

Sérgio Barreto Costa nasceu no Porto em Setembro de 1977. Licenciou-se em Gestão pela Universidade do Minho (um acontecimento que se deveu a um ataque precoce de pragmatismo) e, mais de uma década depois, em História pela Universidade do Porto (nunca é tarde para cair nos braços de uma vocação). Devido a uma tendência natural para a procrastinação, só chegou à blogosfera em 2017, quando já quase toda a gente tinha ido embora. Este livro serve para provar que, apesar disso, esteve mais ou menos atento ao que por lá se foi passando.

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    A Blogosfera Portuguesa - Sérgio Barreto Costa

    Nota Prévia

    No premiado romance O Sentido do Fim, Julian Barnes, o autor, coloca na boca de uma das personagens, o inteligentíssimo estudante Adrian Finn, uma magnífica frase sobre um dos problemas centrais das ciências históricas: «Precisamos de conhecer a história do historiador para podermos compreender a versão que nos é posta à frente.»

    Não sendo eu historiador nem sendo este um livro de História, julgo, no entanto, ser aconselhável uma apresentação mínima em jeito de nota prévia. Assim, e servindo­-me das sempre úteis escalas, declaro que:

    — numa linha que vá da esquerda à direita, me inclino para a direita;

    — numa linha que tenha início no socialismo e fim no liberalismo, tendo para o liberalismo;

    — numa linha que comece com os progressistas e termine nos conservadores, é provável que me encontre mais ou menos a meio do caminho, aceitando pacificamente a mudança, mas sem desejar que ela seja imposta à pressa com recurso a golpes de optimismo legislativo.

    Importa também dizer que escrevo desde Fevereiro de 2017 no Blasfémias, um blogue que será referido nestas páginas, além de ter publicado alguns textos no Malomil, um blogue que, apesar da singular qualidade, não terá direito a qualquer menção. Tal ausência deve­-se ao pedido expresso de António Araújo, seu autor e editor, que é tão brilhante como modesto. A ele, que na qualidade de director de publicações da FFMS me confiou este pequeno volume, deixo o meu profundo agradecimento.

    Para finalizar, um esclarecimento: não há qualquer pretensão hierarquizante subjacente a este exercício, que é fruto singelo da minha experiência como leitor e não de uma investigação mais ou menos científica. Existirão certamente dezenas de blogues de qualidade que eu não conheço e, como não podia deixar de ser, mesmo em relação ao universo dos que visito ou visitei regularmente, muitos foram deixados de fora por falta de espaço. Apenas a título de curiosidade sublinho que se estimava existirem, em 2008, cerca de 200 mil blogues em Portugal, pelo que, caso passe pela cabeça de alguém o tal estudo rigoroso e exaustivo, só lhe posso desejar boa sorte.

    Maia, Dezembro de 2019

    «Vaidade das vaidades, tudo é vaidade», reza o Eclesiastes logo nas primeiras linhas. Ou rezava, no passado, antes do multifacetado Frederico Lourenço, entre Homero, a música clássica, o cinema, a poesia e a dança, se ter dedicado a traduzir a Bíblia grega, alterando a familiar «vaidade» pela certamente mais adequada — mas muito desconcertante — «vacuidade». Não vou, no entanto, fazer caso das precisões do grande helenista e Prémio Pessoa 2016; as traduções antigas dão jeito à teoria que quero desenvolver, e opto, assim, por sacrificar a exactidão e o rigor. Deixar que os factos prejudiquem uma boa história é normalmente uma opção mais trabalhosa, logo, invocando o «Cântico Negro», sei sempre que não vou por aí. Foquemo­-nos, pois, na «vaidade».

    Não sendo explicação única, é talvez uma boa abordagem inicial à estranha febre que levou, numa época pré­-Pipoca Mais Doce (ou seja, numa época em que escrever na internet não dava dinheiro, nem borlas em restaurantes, nem cremes para as rugas), centenas de Portugueses a criarem um blogue. Saliento desde já que não quero, com esta afirmação, desvalorizar o trabalho metódico e perseverante de Ana Garcia Martins, uma jornalista que, com manifesta inteligência, conquistou uma legião de seguidores, outra de imitadores, e ainda uma terceira, talvez a maior de todas, de dedicados críticos movidos a inveja. A ideia é tão­-só mostrar que, antes de existirem blogues sobre vaidades, já existiam outros alimentados pela vaidade, uma realidade que só os muito vaidosos, escondidos atrás da missão de contribuir para o bem comum, se atreverão a negar.

    Convencionou­-se estipular, numa daquelas construções mitológicas de origem desconhecida, que a blogosfera portuguesa nasceu no dia 15 de Outubro de 2002, quando faltavam vinte minutos para a uma da tarde. Num sopro pré­-prandial, Pedro Mexia, na altura com bastante cabelo, revelava ao mundo a boa nova, provando que nem só os profetas do optimismo progressista podem anunciar «amanhãs que cantam». O primeiro post, satisfatoriamente informativo, retirava o véu dos temas (artes, literatura, política e ideias), dos autores (João Pereira Coutinho [JPC] e Pedro Lomba [PL], além do próprio Pedro Mexia [PM]), dos destinatários (qualquer pessoa que soubesse ler, mas com um sublinhado especial em conservadores, liberais e independentes), das influências (Andrew Sullivan e o seu pioneiro blogue), da forma de abordagem aos assuntos (independente e livre) e das ocupações do trio (JPC estava a civilizar­-se em Oxford, PL a dar início a uma carreira na advocacia, e PM a gastar os assentos dos cafés de Lisboa, com um olho na literatura e outro nas miúdas giras — e talvez também nas apenas relativamente feias, ou nas balzaquianas, ou em outras possíveis combinações dos géneros anteriores).

    A referência a Andrew Sullivan, logo na abertura do projecto, é esclarecedora quanto à mundividência dos seus autores. O influente britânico radicado nos Estados Unidos, mais do que um exemplo da arte de bem escrever, é um símbolo da heterodoxia e do pensamento crítico e livre. Católico e homossexual, de direita e desconfiado dos republicanos americanos, conservador Oakeshottiano e consumidor regular de canábis, Sullivan representa tudo aquilo que a direita portuguesa não era antes da «revolução cultural» (expressão muito provocatória, eu sei, mas já lá vamos) dos anos 80.

    Invocando a obra de Alessandro Manzoni (não confundir com o escatológico artista Piero Manzoni, mais ligado à indústria das conservas), foi o recém­-nascido baptizado com o nome A Coluna Infame e alojado no domínio americano blogspot.com, um grande armazém virtual lançado em 1999 e responsável, por causa da relativa simplicidade de funcionamento, pela popularização dos weblogs. Antes reservados a comandantes da marinha, barba branca e cachimbo incluídos, sob a designação de logbooks (diários de bordo, em versão portuguesa), ou a adolescentes ensimesmados e borbulhentos que, inevitavelmente, os fechavam a sete chaves nos intervalos da escrita, os diários em tempos de rede assumiam a vertigem da abertura e da partilha, escancarando ao mundo muito do que era, até aí, do domínio da vida privada.

    Importa perceber, desde já, a dimensão que este fenómeno atingiu em poucos anos. Não vou atirar números para aqui, embora vários (e esmagadores) existissem para corroborar a epidemia; opto por relembrar que a revista Time, em 2006, elegeu como figura do ano um incrivelmente abrangente «You» («Você», em português), querendo com isso homenagear os muitos milhões de pessoas que, em todo o mundo, alimentavam diariamente a Era da Informação com conteúdos digitais variados. Não eram só os blogues que estavam em causa, claro, todas as plataformas que constituíam a chamada Web 2.0 (ou Web participativa) estavam abrigadas pelo reconhecimento da publicação americana, da Wikipedia ao YouTube, sem esquecer o — na altura ainda pequeno e pouco polémico — Facebook, mas o texto que justificava a escolha deixava clara a relevância dos bloggers neste novo tipo de entendimento universal, capaz de abalar, vigorosamente, a teoria historiográfica dos «grandes homens» popularizada no século XIX pelo filósofo escocês Thomas Carlyle (e que nunca deixou de ter adeptos, como se comprova pelo sucesso permanente das biografias de Churchill e restantes figuras históricas consideradas providenciais). Para a Time, com a Web 2.0 e ao contrário da proposição preconizada por Carlyle, os anónimos cidadãos, como um infinito exército de formigas, também tinham o poder de moldar decisivamente o destino colectivo da humanidade, libertando­-se do papel passivo e secundário de joguetes de umas poucas dúzias de

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