Contos Na Pandemia
De Cid Alberto
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Contos Na Pandemia - Cid Alberto
EM BUSCA DE JUSTIÇA
Ano 2018
– Eu sabia que o desafio era grande!
Revoltada consigo mesma por ter concordado tão facilmente com aquele negócio duvidoso, sem ao menos pensar melhor, avaliar os riscos ou verificar os prós e os contras
. Agia muitas vezes por impulso, procurava se corrigir, mas apenas quando as decisões haviam sido tomadas. Lamentava-se.
*****
Era uma jovem linda, pele clara, cabelos cor de caramelo e olhos esverdeados, ligeiramente amendoados. Adorava a natureza e os exercícios físicos, fazia regularmente trinta minutos de esteira, praticava boxe e treinava Jiu-jitsu. Tinha o corpo sarado, era perfeita!
Com os pés descalços sobre a areia úmida da manhã, usando um minúsculo biquini branco, protegido por uma saída de praia estampada com motivos marinhos, Lívia fazia sua incursão matinal desfrutando da paisagem maravilhosa à beira mar, nos arredores de sua casa.
Gostava de caminhar pela praia acompanhada de sua cadelinha, Baile, cuja presença proporcionava-lhe uma grande satisfação e até uma leve sensação de segurança. Baile era um animal pequeno, sem raça definida, muito esperta!
Admirando aquela água transparente e convidativa, resolveu dar um mergulho. Com um rápido movimento dispensou a saída de praia, expondo um corpo esguio, revelando curvas suaves e firmes, ostentando uma beleza incomum, realçada pelo brilho dos seus cabelos, aos primeiros raios de sol.
Não demorou muito e saiu do mar apressada pelo avançado da hora, chamou Baile, colocou cuidadosamente a guia no animal e as duas seguiram atravessando a calçada em direção a sua casa. Mais tarde, após o banho, sentou-se à mesa, tomou um copo de suco, comeu uma fatia de pão com geleia, levantou-se mordendo uma banda de maçã, beijou carinhosamente os pais e o irmão menor, seguiu para pegar o ônibus.
O centro da cidade já apresentava movimento considerável. Na esquina da praça principal, com passadas largas entrou em um elegante edifício envidraçado, uma torre alta com lojas, magazines no térreo e escritórios comerciais nos andares superiores. Identificou-se na portaria, subiu ao décimo pavimento e na sala 1005, através de uma porta de vidro com logotipo indicativo, acionou a sirene. Uma jovem com cabelos longos platinados a recepcionou com um leve sorriso e falou de forma educada:
– Dr. Amadeu, deixou essa caixa para entregar a senhorita. Disse que os procedimentos a tomar, já são de seu conhecimento. Obrigada.
Lívia recebeu a encomenda e sem comentários saiu rapidamente para pegar o elevador. Era uma caixa pequena embrulhada em papel de presente verde claro, com um lindo laço de fita vermelha e pequenos riscos dourados. Acompanhava um envelope branco com suas iniciais escritas à caneta, LCO (Lívia Clara Oliveira).
Pôs a caixa dentro da mochila passada sobre o peito, e discretamente, colocou o envelope no bolso da frente da calça Jeans, contendo seu pagamento. Desconhecia o conteúdo da caixa, apenas cumpria o acordado: fazer o transporte e entregá-la ao destinatário, o mais rápido possível. Esse trabalho lhe causava certo desconforto, pois acreditava ser um tanto duvidoso; se não fosse pela necessidade de ajudar nos estudos, já o tinha abandonado.
Ligou o celular e avisou aos pais que não viria para o almoço, somente à noite retornaria. Foi até a Rodoviária, comprou uma passagem de ida e volta e seguiu viagem para o município de Sta. Cecília, distante cerca de 150km da capital.
Era a segunda remessa que fazia, por isso, conhecia o trajeto, o endereço e a pessoa a quem contatar. Chegando ao destino, pegou um táxi e dirigiu-se a uma pequena galeria comercial no centro da praça, cercada por lindos jardins floridos, pagou a corrida, foi até uma joalheria, cujo proprietário, Sr. Roland, homem de meia idade, de boa aparência e com um sotaque estrangeiro, atendia.
A recebeu com um largo sorriso nos lábios e, gentilmente, puxou uma cadeira para ela se sentar. Ofereceu suco, café. Apenas água, ela aceitou e logo tirou da mochila a encomenda entregando-a pessoalmente. Ele prontamente a colocou dentro de uma gaveta com chave e trancou. Assinou o recibo e a devolveu.
Mais uma vez fez um comentário à moça, elogiando sua beleza, convidando-a para almoçarem na churrascaria da cidade. Ela declinou do convite, dizendo que estava com a passagem de volta comprada e tinha compromissos ainda aquele dia na capital. Prometeu, em outra oportunidade, aceitar a gentileza. Despediram-se. Sr. Roland deu um beijo na face da garota e disse que aguardava ansioso a próxima visita.
Lívia chegou em casa ao anoitecer, um pouco cansada pelo desconforto da viagem. Baile a recebeu feliz, dando pulos de alegria, o que foi retribuído com muito carinho e milhões de afagos.
Seus pais, sorridentes, a beijaram e perguntaram sobre a reunião. Lívia disse:
- Apenas cansativa, mas tudo bem.
Dia seguinte, acordou cedo, com o sol clareando seu quarto, fechou um pouco as cortinas e foi ao banheiro. Tomou seu café, comeu ovos com presunto (seu desjejum preferido), e foi se trocar para ir à Faculdade. Cursava o último semestre de Arquitetura.
Foi de carona com uma colega, a Graziela. Coincidentemente tinham a mesma idade, 23 anos, eram muito amigas, faziam o mesmo curso juntas.
No trajeto, ao parar no sinal, notou um homem moreno, com óculos escuros, no volante de um carro vermelho encarando-a firmemente, fazendo um leve movimento com a cabeça. Lívia ficou intrigada, tendo a sensação de já ter visto aquele indivíduo. Comentou com Grazi, mas ela afirmou não ter notado nada.
Na aula, estava sendo realizado um estudo sobre Urbanismo com um grupo de trabalho formado por quatro alunos. Estavam analisando um mapa, contendo o traçado das principais vias de acesso ao centro da cidade, avaliando-se o sistema de mobilidade atual. Lívia olhava o mapa, mas sua mente estava naquele homem do carro vermelho.
Na manhã seguinte, saiu para caminhar com sua Baile. Caminharam cerca de 40min. Lívia retornou com o corpo suado, logo foi para o chuveiro. O celular chamou, ela atendeu, mas ninguém respondeu, insistiu, continuou mudo.
Os dias seguintes foram de prova na Faculdade. Lívia chegava em casa muito tarde, não tinha tempo para outra coisa a não ser descansar e dormir. Seus exercícios físicos ficaram esquecidos.
Seu celular tocou pela manhã, era do escritório de Dr. Amadeu, pedindo o seu comparecimento na empresa na segunda-feira seguinte. Ela disse
– Tudo bem. – Confirmando sua presença à secretária Fernanda.
Sua amiga Grazi convidou para irem ao barzinho essa noite. Já faz tempo que as duas não saem, tudo por força dos estudos, então hoje, resolveram curtir um pouco.
Naquele horário, o bar já estava cheio, tiveram dificuldades para conseguir um lugar, mas logo um colega da escola, o Max, com um sinal chamou as duas para sua mesa, enquanto aguardava uma amiga. Pediram uma caipirinha cada uma, ele continuou bebendo sua cerveja.
Lívia observou que o Max estava muito ansioso, um pouco nervoso, calado, embora soubesse que era alegre e comunicativo. Logo chegou a Natália, Nat como ele a apresentou.
Ela pediu um suco de abacaxi e sentou-se. O celular chamou, ela atendeu e passou para o Max, este pegou o aparelho e afastou-se um pouco. Depois de alguns minutos retornou à mesa e disse que precisava sair, mas que voltaria. Pagou as bebidas e juntamente com a Nat, despediram-se. As meninas acharam estranha aquela atitude, mas continuaram conversando.
Max não retornou como dissera; mais tarde perto da meia-noite, as duas resolveram voltar para casa. Pagaram a despesa e saíram. A noite foi bem agradável e divertida, beberam um pouco e conversaram bastante. Antes, um rapaz alto, simpático, aproximou-se e puxou conversa, as moças foram receptivas, mas Lívia mostrou-se um pouco tímida. Grazi mais alegre, ria muito e não parava de falar.
O rapaz, conversava e se dirigia à Lívia. Esta, monossilábica respondia, sim, não, certo, obrigada. No carro, a Grazi comentou:
– O Marcelo é um gato, mas você não deu muita atenção, não gostou dele?
– Não é isso, apenas não quero compromissos agora. Primeiramente, quero me formar.
Pela manhã, foi caminhar com Baile, andou na praia, molhou os pés na água do mar e pensou nos acontecimentos da noite passada, o Max muito estranho com sua namorada que nada falava, as risadas da Grazi e as discretas investidas do Marcelo. Realmente serviram para distrair um pouco.
Lembrou-se que amanhã, segunda-feira, tinha que ir ao escritório do Dr. Amadeu, certamente para cumprir o mesmo ritual, que a deixava nervosa e preocupada.
No almoço, D. Mercedes, sua mãe, serviu uma lasanha carregada na muçarela e com bastante molho de tomate, prato que Lívia e seu irmão Tavinho, adoravam. Sr. Renato, seu pai, espanhol de nascimento, bebia seu vinho preferido.
O celular de Lívia tocou, era a Grazi.
– Você soube do Max? Ontem, depois que saímos, se envolveu em um acidente e o carro capotou, ele e a Nat estão no hospital.
– Meu Deus, como foi isso?
– Minha mãe disse que viu no noticiário da TV, agora cedo. Não sabe de detalhes. Qualquer coisa lhe aviso.
Lívia lembrou-se que no Barzinho ele estava muito tenso e inquieto, como se algum problema o afligisse. Até o fato dos dois saírem apressadamente, após uma chamada no celular, soou estranho.
No final da tarde, Grazi ligou novamente e informou que o Max teve algumas costelas fraturadas e o ombro deslocado, sobre Nat, ainda não tinha informações. Os policiais confirmaram excesso de velocidade, o carro deu perda total, completaram.
Lívia ouviu tudo e ficou calada. Lamentou.
Quando saiu do escritório de Dr. Amadeu, pegou o ônibus para Sta. Cecília e assim que chegou ao destino dirigiu-se à loja do Sr. Roland. Ele não estava presente, foi atendida por uma jovem senhora, muito simpática, que se apresentou como sua esposa.
Lívia disse que o aguardaria, pois tinha trazido uma encomenda, e necessitava da assinatura dele no recibo. A senhora sorridente pediu para ela se sentar, disse que ele não