Camury
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Camury - João Do Carmo
2019, de João do Carmo
Projeto Editorial: UmNorte Design | @umnortedesign Diagramação: UmNorte Design | @umnortedesign Capa: UmNorte Design | @umnortedesign
Revisão: Mário Domingues do Carmo, João - 2019
CAMURY | QUANDO A UNIDADE É O RESULTADO DA SOMA DOS DIFERENTES
Contato do autor: joaocarlosdesignrj@yahoo.com.br
Telefone: (21) 9.9715-1243 | (21) 2222-7710
Todos os direitos reservados (leiº 9.610 de 19/02/1998). É proibida a reprodução total ou parcial deste livro, salvo breves citações com indicação da fonte.
Aqueles que fazem discípulos, jamais vão embora. Permanecem na mente de seus alunos. Brilhantes, eternizados.
A experiencia é uma lanterna dependurada nas costas que ape- nas ilumina o caminho já percorrido. Confúcio, pensador Chinês. Não se acende a lâmpada debaixo de um cesto. Mas a colocamos no velador para que todos a vejam. Jesus, o mestre dos mestres. Passar adiante a sabedoria é uma missão.
Ao homem do lampião, agradeço.
Sua luz ainda brilha.Seu rastro está aceso. O seu nome está nas linhas desse livro.
Obrigado amigo.
ÍNDICE
Prefácio
Apresentação
Capítulo 1 - A Clareira do Submarino
Capitulo 2 - O Enígma
Capítulo 3 - O Começo da Festa
Capítulo 4 - O ago
Capítulo 5 - O Abrigo
Capítulo 6 - O Reencontro
Capítulo 7 - A Torre
Capítulo 8 - Morcegs Sempre
Capítulo 9 - A Porta da Torre
Capítulo 10 - O Pico do Vigilante Negro
Capítulo 11 - Em Busca de uma Nova Pista
Capítulo 12 - A Fazenda Baronesa
Capítulo 13 - A Chama Preecisa Brilhar
Capítulo 14 - Velhos Amigos
Capítulo 15 - Todos por um
Capítulo 16 - Em Busca do Livro
Capítulo 17 - O Livro do Pico
Capítulo 18 - O Retorno à Fazenda
Capítulo 19 - Operação Dissimulação
Capítulo 20 - A Pedra Branca
Capítulo 21 - A Casa Amarela
Capítulo 22 - O Menir
Capítulo 23 - Os dois Amigos
Capítulo 24 - O Despenhadeiro
Capítulo 25 - A Cabana
Capítulo 26 - O Brazão
Capítulo 27 - A Tempestade
Capítulo 28 - Enígma do Brazão
Capítulo 29 - A Caverna
Capítulo 30 - O Homem da Floresta
Capítulo 31 - Gratidão
Capítulo 32 - O Jogo de Pistas
Capítulo 33 - O Alvo
Capítulo 34 - Decifrando os Códigos
Capítulo 35 - O Silêncio do Lago
Capítulo 36 - Corações Acesos
Capítulo 37 - A Mensagem
Capítulo 38 - O Acampamento
Capítulo 39 - A Revelação
Capítulo 40 - O Início de Tudo
Capitulo 41 - O Sábio
Capítulo 42 - Pão Sobre as Águas
Capítulo 43 - Lição para Toda Vida
Capítulo 44 - O Tronco do Ipê
Capítulo 45 - O Último Degrau
Capítulo 46 - O Escoteiro e o Lampeão
Capítulo 47 - O Perdão
Capítulo 48 - O Retorno
Marco Aurélio
PREFÁCIO
edro, o protagonista do livro, agora um médico adulto, lembra de suas aventuras com os amigos da Patrulha do Morcego. Anos se passaram e cada um seguiu o seu caminho na vida. Porém ele nunca perdeu o enorme desejo de aventura.Um dia vem uma lembrança e nesse passeio pela me-
mória, há uma caixa cujo mistério atravessou os anos.
É assim que é apresentado o jovem Pedro, que tem medo que suas histórias se percam e, por isso, resolve contá-las. De descoberta em descoberta e de aventura em aventura, com muita inteligência o caminho vai sendo trilhado. O escritor João do Carmo sabe das práticas escoteiras há muito tempo. Conhece os jovens como poucos, por isso, escreve neste belo livro as aven- turas tão caras aos jovens e também a muitos adultos que ainda não esque-
ceram sua infância.
Qual seria o mistério a descobrir? No caminho as aventuras se sucedem, assim como as dificuldades a vencer?
No caminho as descobertas não são apenas dos mistérios, mas também de si próprios.
Maurício Moutinho
Chefe Escoteiro
APRESENTAÇÃO
edro Mascarenhas Gomes, este o meu nome. Tenho vinte e sete anos, e por muito tempo fui escoteiro. Aliás, ainda sou. Aprendi com o meu
chefe que ser escoteiro é para toda a vida.
Se existe uma pessoa de quem não consigo esquecer é o meu chefe escoteiro. Algumas pessoas passam pela nossa vida e são logo esquecidas, outras entretanto, estarão presentes na lembrança até o último suspiro, e quem sabe, por toda a eternidade.
De vez em quando me pego pensando nele com aquela sua calma e sim- plicidade, seu coração cheio de bondade, sempre disposto a ajudar a quem precisasse. Muita coisa do que sou hoje eu devo a ele.
A última vez que o vi foi quando me formei em Medicina na Univer- sidade Federal do Rio de Janeiro. Entrou discretamente no salão, vestido com um terno azul sobre uma camisa branca, sem gravata. Sentou-se num dos bancos que ficava ao lado do corredor, como era seu costume, e se pôs a observar tudo o que se passava ao seu redor. Ele já devia estar com uns quarenta anos, com alguns fios de cabelo branco e certas rugas que eu ainda não tinha visto marcando o seu rosto, mas o seu sorriso ainda era de um menino feliz, o mesmo jeito de falar, sempre calmo, sempre atencioso. Cumprimentou-me com um forte aperto de mão, depois me deu um
firme e longo abraço e disse-me algumas palavras afetuosas que exigiram de mim toda a atenção possível para que não se perdessem entre as vozes que ecoavam no salão de festa. Assim, aquelas palavras ficaram gravadas no meu coração, e ele partiu, atravessando a multidão de convidados.
É claro que se dependesse de mim eu esticaria a conversa para saber mais sobre sua vida, o convidaria para ir até a minha casa para ficarmos sentados no sofá até tarde da noite tomando suco de graviola que ele tanto aprecia- va. Relembraríamos os acampamentos que fizemos juntos e eu prolongaria toda a alegria que estava sentindo por vê-lo depois daqueles anos que se passaram. Mas não era possível, pois a fila dos cumprimentos precisava andar, eram mais de cinquenta pessoas. Pude apenas dizer um muito obri- gado enquanto me esforçava para conter duas lágrimas que ameaçavam escorrer no meu rosto.
O meu chefe sempre me dizia que se eu quisesse muito ser médico eu conseguiria, e que ele estaria presente no dia em que eu fosse receber o diploma. Cumpriu a promessa. Até aquele momento eu ainda não havia entendido como ele ficou sabendo que eu iria me formar e como ele fez para estar no Rio de Janeiro no dia e na hora exata da minha formatura. Soube depois que seu primo era professor e dava aulas de matemática na- quela universidade.
Agora ele está trabalhando muito longe, no norte do país, em Roraima, na fronteira com a Venezuela. Casou-se com a mesma moça que namorava desde que tinha quinze anos de idade com ela teve um casal de filhos. De vez em quando trocamos alguns e mails.
Além de ser médico, gosto muito de escrever. Isso é herança de meu pai, que foi professor de português e lecionava em uma escola pública perto de nossa casa. Ele faleceu aos trinta e um anos de idade, de tuberculose quando eu tinha dez anos. Meu Deus, que saudade enorme eu e minha mãe sentimos dele!. Chamava-se Ricardo, era extremamente educado e atencio- so. Quando se foi, deixou uma lacuna enorme no meu coração, um espaço impossível de preencher. Mas como a minha mãe sempre dizia, a dor de uma perda se transforma em uma doce saudade
.
Aprendi que as palavras também possuem um poder de cura que, para muitos, é inimaginável. As boas palavras, é claro, pois as ruins podem ma- tar, ou fazer adoecer quem as ouvir. Palavras ruins são como sementes más que podem fazer germinar ervas daninhas no coração das pessoas.
A história que aqui vou contar ocorreu 18 anos depois da virada do sécu-lo, quando os supersticiosos diziam que o mundo iria acabar. Era o ano de dois mil e dezoito. Eu tinha quase quatorze anos completos e era monitor de uma patrulha de escoteiros chamada Morcego.
Eu vivi essa aventura com alguns escoteiros que se tornaram meus melho- res amigos. Crescemos juntos. Cada um seguiu o seu caminho, mas sempre damos um jeito de nos encontrar para relembrar nosso tempo de escotismo, quando um desejo enorme de aventura transbordava do meu coração como se fosse um rio que extrapolasse sua margem nos tempos de muita chuva.
Quem pensar que isso mudou, está enganado. Aquele desejo de me aven- turar pelas matas, atravessar os rios e descobrir lugares diferentes se trans- formou em um oceano profundo, sobre o qual decididamente não tenho controle. Ando me sentindo muito preso ao trabalho e é só uma questão de tempo para que eu pegue a minha barraca e suba uma montanha, ou acampe numa praia deserta onde eu esteja absolutamente só, ouvindo o ba- rulho das ondas, sentindo a caricia do vento no rosto. Se não aparecer uma oportunidade para que isso aconteça, darei um jeito de criá-la pedindo um adiantamento de férias no hospital onde trabalho.
Acho que certas histórias não podem ficar dentro de nós, escondidas, desbotando-se com o passar do tempo, nem podemos levá-las trancadas dentro de nós ao partirmos deste mundo, mas que precisam ser contadas para que outros possam conhecê-la e vivê-la. Todos merecem reviver essa história, mesmo que seja só na imaginação.
Mas se você for um escoteiro ou escoteira, ou alguém que nutre um pro- fundo amor pela natureza e, além de imaginar aventuras, gosta de torná-las reais junto com sua patrulha e seus amigos, se ama singrar os rios e os mares, seguir as trilhas sinuosas das florestas, ver o sol nascer e adormecer de tarde no horizonte pintado de vermelho e se cobrir com um manto de estrelas cintilantes para passar a noite dentro de um saco de dormir, você, naturalmente, também deve ser daqueles que não permite que o sono o leve para a barraca antes de
uma boa conversa animada ao redor de uma mesa de bambu, feita com sisal, sob a luz de um lampião de acampamento enquanto a chama de uma fogueira vai se acalmando até que somente res- tem brasas. Então, é para você que escrevi a minha história.
..........
O RASTRO
Eu estava exausto, fazia muito calor.
o ponto onde estávamos, víamos a enorme pedra no centro da clarei- ra. Tinha a forma de um submarino, com uma torre de observação
no alto, cujo acesso se dava por uma escada de ferro pintada de preto. Dali, alguns sacerdotes dirigiam-se aos fiéis, que acampavam na clareira quando de seus retiros espirituais. A pedra se impunha imponente, rodeada por algumas árvores altíssimas, centenárias. Aquele era o lugar onde os desbra- vadores, nossos irmãos de lenço, costumavam construir seus abrigos para passarem a noite. Ao fundo, junto da floresta, uma bica de metal dourado deixava alguns pingos de água pingarem sobre o chão úmido. As cigarras cantavam sem parar. Eram os machos tentando atrair as fêmeas para o aca- salamento e ao contrário do que o meu saudoso pai dizia elas não morriam de tanto cantar. Normalmente a cigarra passa a maior parte do ano sob o solo alimentando-se da seiva das árvores até que o verão chegue e as pri- meiras chuvas comecem a cair, época em que abandona seu esconderijo em busca de uma namorada.
Um raio de sol bateu impiedosamente sobre o meu corpo depois de en-contrar uma brecha entre as nuvens escuras de chuva que começavam a encobrir o céu naquele verão de 2028. A floresta
estava submersa em si- lêncio. Um vento começou a alvoroçar a copa das árvores e algumas folhas iam caindo pelo chão, tecendo um enorme tapete, amarelo e marrom. Tive que retirar uma enorme folha seca que havia caído dentro do buraco que eu estava começando a cavar, depois de bailar um pouco ao sabor do vento.
–É folha de embaúba – disse o meu amigo. O macaco-preguiça se ali- menta dos frutos dessa árvore. Sei
, disse, em um intervalo de ar na minha respiração ofegante.
–Vem chuva por aí, ele completou. Concordei. Que calor!
, reclamou. Res- pondi só com o gesto de cabeça, pois a necessidade de colocar ar para dentro dos pulmões não me permitia falar muito mais do que alguns monossílabos. Um temporal estava se armando. Guapimirim é assim: um lugar em que nos meses mais quentes do ano as nuvens cumulo nimbus, escuras, com o formato de bigorna, que são comuns nas encostas das montanhas, despe-
jam sobre a terra chuvas e raios.
Os trovões ribombavam ao longe como se fossem disparos de canhões. Os pássaros voavam apressados em busca dos seus ninhos. Em breve a chu- va cairia, não tínhamos muito tempo. Precisávamos terminar aquela tarefa e seguir para a sede do sítio para nos abrigar dos raios.
O solo na clareira do Submarino no meio da mata estava duro, resistindo bravamente às investidas da cavadeira. Mas eu estava determinado a abrir um buraco de cinquenta centímetros de profundidade naquele pequeno pedaço de chão, a quase cinco metros de um enorme ipê-amarelo, todo florido. O esforço valeria a pena.
O meu grande amigo que havia limpado o terreno para que eu começasse a cavar –eu usava um enorme ancinho emprestado pelo dono do sítio – es- tava sentado, descansando sobre um tronco de árvore. Sorria, observando os esforços que eu fazia tentando penetrar o chão com a cavadeira de ferro.
–Vamos! Força! dizia, enquanto sorvia um gole e outro da água do seu cantil. Aos poucos o buraco foi tomando forma, o solo havia ficado
mais macio, mas as pequenas raízes das árvores ao redor começaram a aparecer, difi- cultando mais a minha tarefa. Calos palpitando nas mãos, a camisa toda
suada. Eu arfava, o coração batia acelerado no peito.
Meu amigo veio em meu socorro, pegou a cavadeira e começou a cortar as raízes finas das árvores até que chegamos a uma profundidade que consi- deramos ideal. Pegue a caixa, ele me pediu. Colocamos lá a pequena caixa, exatamente no lugar onde havia sido encontrada há mais de dez anos atrás e a cobrimos de terra. Sorrimos um para o outro: a missão estava cumprida.
Caminhamos pela trilha que descia até a piscina natural e mergulhamos na água fria. Refrescamos nossos corpos suados e seguimos rapidamente na direção da sede do sítio. Os raios cortavam o céu em ziguezague.
Agoraéaguardarqueaiscasejamordida,disseele.
Tomara não leve tantotempo...
2018 | OS MORCEGOS
ONZE ANOS
tripulação do trem que seguia para Guapimirim era um misto de passageiros, gaiolas de passarinhos entre caixas de legumes e até mesmo frangos irrequietos nos engradados, alojados no canto do primeiro vagão. A paisagem passava lá fora preguiçosamente por causa da vagarosidade do trem, o sol da manhã ainda morno projetava a sombra da composição ora sobre o pasto verde, ora sobre as bananeiras plantadas junto à linha férrea,
e noutras vezes sobre a parede de alguma estação abandonada.
Os trilhos avançavam sobre os dormentes de madeira que rangiam e ge- miam sob o peso do trem. Vez ou outra cortavam uma mata fechada e som- bria, atravessavam uma ponte de ferro barulhenta ou um campo iluminado pela luz do sol da manhã onde a boiada pastava. Mas era quando chegava numa pequena parada do percurso que o movimento no trem aumentava com a saída das pessoas com suas caixas de bananas e a entrada daquela gente simples que se dirigia a Guapimirim para fazer compras no mercado, visitar algum parente nos sítios da região ou para tomar banho de cachoeira. Num dos bancos junto à porta aberta um homem tirou uma sanfona de uma caixa preta e a aconchegou sobre o peito. Seus dedos sujos, um pouco trêmulos começaram a procurar as teclas do lado direito do instrumento. Justo quando o trem passava sobre um pontilhão de ferro começou a tocar uma música cujo som se misturava com a conversa alta, o barulho das ro- das sobre os trilhos, o ranger da lataria do vagão e com o canto de um dos
pássaros dentro da gaiola.
Naturalmente tudo aquilo era uma novidade para nós, que sentados no primeiro vagão junto à locomotiva observávamos tudo com muito inte- resse. As mochilas próximas dos pés, e os uniformes estavam começando a molhar de suor: era verão. Mas uma alegria intensa dentro da alma, e o espíirito aventureiro pulsando dentro do peito atiçavam o desejo de que tudo aquilo durasse para sempre.
Todos estávamos ali conversando animadamente, cantando canções escoteiras e de vez em quando a algazarra era tal que o chefe
Marcos Augusto levantava o braço com o sinal escoteiro convidando-nos a baixar um pouco a voz. Algumas pessoas próximas não tiravam os olhos de nós, cheias de curiosidade, observando aquele grupo de vinte e sete escoteiros uniformi- zados e alegres. Muitas delas jamais haviam ouvido falar sobre o escotismo. De repente, uma gargalhada geral entre os passageiros tomou conta do ambiente quando um porquinho começou a guinchar numa parada cha- mada Santa Dalila. Uma senhora gorda, com um vestido de chita, tentava arrastá-lo até a porta do trem puxando-o por uma corda amarrada ao pes- coço, mas o animal se soltou e correu pelo vagão causando um enorme al- voroço. Um homem simples, de chapéu de palha, que a aguardava do lado de fora, entrou no vagão para ajudar a mulher, mas o animal saiu para a plataforma fugindo para uma estrada estreita de barro que passava ao lado. Quando o trem apitou para dar partida tudo já estava mais calmo, mas as pessoas comentavam o fato em voz alta, outros ainda não tinham parado de rir. O homem junto à porta aberta do vagão, com aquele seu jeito de ma- tuto, chapéu de palha na cabeça, olhos miúdos e dentes cariados começou a tocar de novo a sanfona. Mas agora ele havia resolvido também cantar, por isso apagou o cigarro de palha e jogou pela janela do trem. Sua voz estridente ecoou no vagão. Antes que a risada começasse a mão do chefe le- vantou com o sinal escoteiro de silêncio. Controlar a vontade de rir não era fácil, a maioria dos escoteiros havia colocado a mão na boca para sufocar a gargalhada. O rosto avermelhado do chefe denunciava que ele também estava prestes a explodir em risos. Felizmente, para o alivio de todos, o homem saltou duas paradas depois com sua velha sanfona e o cigarro de palha soltando fumaça.
Quando o trem prosseguiu viagem alguns escoteiros se ajoelharam sobre os bancos de madeira e se debruçaram nas janelas para olharem a paisa- gem. O vento fresco da manhã se chocava com os seus rostos, movimen- tando seus cabelos. A voz do chefe se fez ouvir: Não ponham a cabeça para fora da janela!
.
O cheiro do campo entrava pelas janelas abertas do vagão, era um ar puro que enchia nossos pulmões e ao mesmo tempo ajudava a afugentar o odor ruim que vinha dos engradados de frangos. Em Citrolândia, que era uma das paradas do trem ainda no município de Magé, o chefe disse que lá ficava o Campo Escola, onde os chefes faziam os cursos para orientarem suas tropas. Para chegar lá bastava pegar uma estrada do lado esquerdo, atravessar a Rio–Teresópolis mais adiante e pegar uma estradinha de barro. Do lado esquerdo do trem vimos os carros passando rumo a Teresópolis, cidade serrana. A rodovia de vez em quando corria paralela à linha do trem e os carros pareciam voar na pista, enquanto a locomotiva se arras-
tava, soltando fumaça com cheiro de óleo e fazendo um barulho enorme. Quando chegamos à Parada Modelo, o chefe avisou que a próxima estação era Guapimirim.
Perto das nove da manhã a locomotiva entrou apitando na estação de Guapimirim que significa cabeceira pequena
. Era uma construção antiga, coberta de telhas francesas, janelas de ferro