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O Mal Surge
O Mal Surge
O Mal Surge
E-book396 páginas5 horas

O Mal Surge

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Sobre este e-book

Guerreiro. Monge. Feiticeiro. Ele é Roland dos Penhascos Altos.
Como um monge-guerreiro, ele fez votos de proteger a humanidade de todas as formas do Mal. Para proteger os inocentes e fracos, e para enfrentar inabalavelmente seus inimigos, não importando as chances. Por séculos, isso significou que os monges Bretões enfrentaram hordas de exércitos dragão, que obrigaram os humanos a se esconderem nas montanhas cobertas de neve do Alto Kanris.
Mas um dia, um nobre dragão pediu a Roland que levasse sua única herdeira, uma princesa dragão de sete anos de idade, e a salvasse de todos os que queriam destruí-la. Aceitando o desafio, Roland decide criar a criança na maneira Bretã, e ensiná-la os vastos poderes mágicos do Caminho Bretão.
Mesmo assim, em seu coração ele sabe a verdade; que a criança é a arma derradeira, pensada pelos deuses dragões. Uma arma forjada por mágica Dragão e carregada com o comando de destruir toda a raça humana. Ainda assim, Roland vê um rastro de esperança, um jeito de desafiar a profecia. Um jeito de pegar a arma derradeira e virá-la contra os próprios deuses.
É uma aposta cheia de traição e deslealdade, mas é a chance de acabar com a guerra eterna. Para Roland, não existe outra chance a não ser aceitar esse papel.
E então, a Aventura começa.


 

IdiomaPortuguês
Data de lançamento2 de jan. de 2023
O Mal Surge
Autor

B.R. Stateham

I am jut a kid living in a sixty year old body trying to become a writer/novelist. No, I don't really think about becoming rich and famous. But I do like the idea of writing a series where a core of readers genuinely enjoy what the read.I'm married, father of three; grandfather of five.

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    O Mal Surge - B.R. Stateham

    CAPÍTULO 1

    Os fiéis sabem a terrível verdade. O mal não pode ser destruído.

    Do Livro de St. Albans

    Segurando uma grande tocha em chamas sobre minha cabeça, ligeiramente na minha frente, subi lentamente os degraus de pedra da antiga Torre Leste do mosteiro, desconsiderando o vento frígido do inverno, assobiando através das enormes paredes de pedra da torre, como alguma convocação sombria dos mortos. Lá fora, uma tempestade de inverno gritava, gemia e uivava de raiva. Neve – em vastas nuvens de fúria branca tão espessas, que alguém poderia se enterrar da nuca ao dedo do pé, em questão de segundos – logo mais, quase um metro e meio de neve seriam adicionados à quantidade já admirável, que preenchia o vale estreito abaixo do mosteiro.

    Invernos nestas montanhas são mortais. Nem o homem e nem a besta, ousam deixar seus casebres quentes ou cavernas protegidas, quando uma tempestade dessas desliza sobre o topo da montanha coberta de gelo e invade o vale. Mesmo aqui, neste antigo mosteiro Bretão, construído ao lado de um penhasco imponente – agarrando-se às duras paredes de granito do penhasco como algum monstro antigo se recusando a morrer – os estragos da tempestade do lado de fora podiam ser ouvidos claramente.

    Mas eu não estava subindo os degraus de pedra em espiral na Torre Leste para observar a tempestade. Outro pavor me obrigou a deixar meu cubículo, quente e confortável com um fogareiro cheio de brasas vermelhas brilhantes, para acender o fogo. A massa de cobertores e lençóis de algodão grosseiro, que suavizaram a dureza da laje fria em que eu estava dormindo momentos antes – uma laje fria e de pedra como aquela em que todos os monges Bretões dormiam em seus cubículos aqui no mosteiro – no entanto, parecia quente e luxuriante para mim.

    Para você, Peregrino, a ideia de dormir em pedra dura apenas disfarçada suavemente por cobertores e uma almofada fina, pode parecer abominável enquanto você lê essas palavras, sentado no conforto de sua cadeira favorita ao lado de uma lareira acesa. Mas para um monge guerreiro como eu, dormitórios como o que eu havia ocupado apenas momentos antes, eram um luxo raramente experimentado por mim. Fazia anos desde a última vez que dormi neste mosteiro. A premonição que me tirou do meu sono profundo e me obrigou a me vestir e encontrar o caminho para a Torre Leste, sugeriu que eu poderia nunca mais ter esta oportunidade.

    Na escuridão da torre, a fortaleza mais antiga construída no mosteiro Bretão chamado O Valete, a sensação de do mal se aproximando me tirou do meu sono e me enviou para cá. Acima da minha cabeça, a grande tocha ardente assobiou e estalou, brasas brilhantes na escuridão, criando uma grande bolha de claridade, que me envolvia como uma armadura protetora. Juntos, a tocha e a bolha de luz subiram lentamente em direção à câmara deserta mais alta de todas.

    No meu peito, senti a agitação. Tão débil que disse a mim mesmo que poderia estar imaginando. Mas não, Peregrino. Eu não estava imaginando. Longe, um grande mal se agitava. Uma força das trevas tão sombria, que um monge-guerreiro e mago Bretão como eu, não poderia descartar. Toda a minha vida em meu treinamento Bretão, os ensinamentos desta antiga ordem me condicionaram a enfrentar o mal sempre que sua cabeça de víbora se revelava da escuridão. Por anos, percorri os penhascos nevados do Alto Kandris e morei entre os clãs das colinas, me colocando na frente dos que eram fracos demais, ou velhos demais, ou jovens demais para enfrentar o Mal sozinhos. Esse é o caminho de um monge-guerreiro. Um monge-guerreiro de qualquer ordem religiosa. Seu chamado, seu juramento sagrado, os obriga a proteger os fracos e os indefesos daqueles que desejam atacá-los.

    Mas esse Mal, Peregrino. Esta agitação de fúria das trevas, despertando em alguma terra distante, não se igualava a nenhum outro Mal que eu já havia encontrado. Meu Olho Interior de mago, sentiu um poder de força imensa. Uma fúria não baseada neste mundo – o mundo dos vivos. Mas, em vez disso, senti os fios do outro mundo, do Submundo, entrelaçados nessa fúria.

    Um espectro do Mal escapando do Submundo e mergulhando na terra dos vivos? Uma criatura vil de imenso poder. Tal força seria catastrófica por natureza, tanto para os humanos, quanto para os dragões. Se meus medos fossem verdadeiros, essa criatura do outro mundo teria que ser encontrada e destruída o mais rápido possível.

    Por fim, pisei no chão de madeira da alcova na torre superior, e parei. O fim da escada era uma alcova longa, mas estreita, usada agora para armazenar caixas pesadas, cheias de qualquer tralha que um monastério sólido, do porte do Valete, precisasse armazenar. Mas mais da metade do pavimento estava isolada da escada por madeiras pesadas. Uma grande porta em arco, feita de carvalho antigo, geralmente isolava o resto do pavimento dos curiosos e tolos. Mas agora, com a tocha na mão, vi que a porta gigante estava parcialmente aberta. De dentro da grande sala do outro lado, vi a luz cintilante de tochas, como a minha, cortando a escuridão.

    E na poeira acumulada por gerações, no chão onde eu estava parado, vi a confusão de pegadas – três conjuntos de rastros no total – me informando que eu não era o único a fazer essa viagem solene na calada da noite. Pelo menos três pessoas estavam na sala do outro lado da porta aberta.

    Senti suas auras invisíveis queimando intensamente no espectro oculto e as reconheci instantaneamente. Clovis, o Mago mais velho e sacerdote do mosteiro. Malinitrix, o Mestre de Armas do mosteiro e Guardião da Fé. E uma aura mais jovem e brilhante, de um monge guerreiro recentemente santificado chamado Golida, das Colinas Douradas. Sem hesitar, mergulhei pela entrada arqueada da grande porta e entrei na sala para me juntar aos meus companheiros monges Bretões.

    Parecia que o sacerdote, o mestre de armas e o jovem monge guerreiro estavam me esperando. Todos os três seguravam tochas como a minha sobre suas cabeças e acenaram com a cabeça silenciosamente para mim, quando entrei na sala. Clovis, com um pesado manto de um amarelo profundo, enfeitado com azul escuro e adornado por uma faixa azul e prateada em torno da sua cintura, sorriu fracamente enquanto assentia em minha direção.

    Malinitrix estava vestido com o privilégio de um típico mas simples monge guerreiro bretão. Uma camada de cota de malha fina, debaixo de um pesado sobretudo amarelo longo. Calças de couro com botas de pele nos pés. Em torno de sua cintura havia um cinto de couro, largo e grosso, usado para segurar a típica espada forjada reta bretã. Golida, o membro mais jovem deste trio, estava vestido de forma muito parecida ao mestre de armas.

    — Roland, eu sabia que você viria. Posso ver na sua cara as mesmas preocupações que temos. Uma força poderosa viaja em direção ao Alto Kanris. Essa força não é um bom presságio, para aqueles que são infelizes o suficiente para cruzar seu caminho, enquanto se move pela noite.

    A voz do sacerdote era suave, mas repercutia. Era a voz de um homem em pleno domínio de sua mente e corpo. A voz de um guerreiro experiente. Um general experiente. Uma vez, anos atrás, este homem e seu mosteiro, me protegeram e me esconderam daqueles que queriam me destruir. Em outra ocasião. Outro momento sombrio para qualquer um que alegasse ser Bretão.

    Mas o que eu sentia em minha alma era um perigo muito, muito maior do que qualquer um dos que eu já havia sentido dentro de mim antes. Este perigo era tão intenso, tão poderoso. E isso só pode significar uma coisa. Velhos inimigos haviam saído da tumba e agora estavam reunindo suas forças para recair sobre nós. Recair não apenas sobre nós, da fé Bretã, mas sobre toda a humanidade. Enquanto olhava para o rosto de cada homem ao meu redor, pude ver que eles também sentiam o mesmo.

    — Nós não víamos algo assim, tão perto do Alto Kanris, há gerações, — Clovis disse com uma voz forte e cheia de preocupação. — O clã dragão, nosso antigo inimigo, decidiu se reunir novamente sob as bandeiras de um líder forte. Seu desejo, é claro, é cumprir a profecia do dragão.

    — Quem, Abençoado Pai? — Golida perguntou, seu jovem rosto de jovem ingênuo brilhando sob a luz da tocha cintilante.

    — Clã Hartooth, — eu disse, franzindo a testa. — O Primeiro Clã.

    O homem-menino, Golida, na verdade era apenas um jovem guerreiro, que ainda seria enviado para o Mundo Médio, esta terra dos vivos que nós, humanos, ocupávamos atualmente. Ele tinha acabado de completar seu treinamento aqui no Valete e era um monge guerreiro promissor e habilidoso. Mas ele ainda tinha que enfrentar sua primeira batalha de vida ou morte com as criaturas das trevas que habitavam este reino.

    — Eu pensei que Hartooth tinha sido destruído há muito tempo, — Golida sussurrou, ficando pálido quando olhou primeiro para o sacerdote, depois para mim. —— Vocês querem dizer que eles ainda existem?

    — Sim, meu filho, — respondeu o sacerdote. — Em números crescentes. Como uma praga viva, eles decidiram sair de suas terras ancestrais e consumir todos os que estão em seu caminho. Clã Dragão ou reino humano, não importa. Receio que estejam marchando em direção ao Alto Kanris. A última fortaleza da humanidade.

    — Para nos derrotar e nos transformar em servos e escravos?

    — Não, Golida, — Malinitrix rosnou como um urso, enquanto seus olhos escuros se erguiam e olhavam para mim. — Para cumprir a profecia, como Roland disse. para nos destruir.

    Golida arregalou os olhos. A pouca cor que restava em seu rosto, foi drenada. Mais fantasma do que humano, ele olhou para o sacerdote em desespero.

    Clovis continuou falando.

    — Sentimos sua força crescente. Estamos cientes de seus desejos. Temos que nos preparar. Cada um de nós sabe o nosso dever. Mas primeiro, antes de podermos realmente planejar, devemos saber de suas forças. As intenções deles. E, se houver, suas fraquezas potenciais.

    Os olhos dos três monges caíram sobre mim. Meu Olho Interior de mago sentindo cada uma de suas auras. Cada um tinha emoções furiosas dentro de seus peitos, que mal podiam conter. Raiva. Medo. Fúria. Ódio e luto. Luto infinito pelo que estava por vir. Especialmente a dor bruta do luto genuíno, enquanto olhavam para mim.

    — Roland, — Clovis se dirigiu a mim. — Você é nosso monge-guerreiro mais notável. Você também é o nosso mago mais poderoso. Os poucos como você que restam aos Bretões, estão espalhados por todo o Alto Kanris. Em seus ombros deve repousar esta responsabilidade. Devemos conhecer nosso inimigo. Temos que enfrentar esse mal. Devemos ganhar tempo para reunir nossas forças. Você, meu filho, deve encontrar uma maneira de cumprir todos esses requisitos.

    — Eu entendo, Abençoado Pai. Vou partir assim que a tempestade acabar.

    Uma onda de imensa dor varreu a aura vibrante, mas invisível, do poderoso sacerdote e guerreiro Bretão. Ele sabia o que estava me pedindo para fazer. Ele sabia qual seria o meu destino final. Tinha de ser feito assim.

    Eu sorri. Inesperadamente.

    Isso surpreendeu Malinitrix e Golida. Eles também entenderam qual seria o meu destino. Eles sabiam que minha missão era uma jornada para a morte. Que os desafios que me esperavam, nenhum homem – nem mesmo um mago de renome modesto como eu – poderia suportar. Os Hartooth estavam vindo. O Primeiro Clã. Suas proezas militares e magia negra eram lendários. Eles eram, como a tradição ditava, supostamente invencíveis.

    — "O que virá, virá" — citei um velho ditado Bretão, ainda sorrindo.

    O Abençoado Pai sorriu fracamente. Avançando, ele colocou a mão calejada e seca no meu ombro e a apertou com carinho.

    — Você sempre foi o rebelde tranquilo dentro de nossa ordem, Roland. Você questionou quase todos os princípios que nós Bretões professamos como verdadeiros. Desafiou quase todos os mestres e professores que você encontrou. Outros em nossa ordem olharam para você com desconfiança. Você é um verdadeiro monge bretão? Ou alguém que entoa os mantras, mas não acredita em nenhum?

    Ele continuou.

    — Mas eu nunca duvidei de você, meu filho. Seu serviço à nossa causa nunca foi duvidado por mim. Seu compromisso com a nossa causa é incondicional. Temo por você, meu filho. O que está diante de você, está cheio de terrores e perigos incompreensíveis para qualquer um de nós. Mas também sei que se existe algum monge Bretão que possa enfrentar o impossível e sobreviver, é você. Vá com a minha bênção, meu filho. Enfrentar o inimigo antigo e derrotá-lo. Sobreviva, Roland. Sobreviva e volte para nós. Nossa luta está apenas começando.

    Clovis sorriu tristemente, e então, retirando a mão do meu ombro, deu um passo para trás e silenciosamente saiu da sala. Os dois guerreiros bretões se aproximaram, colocaram as mãos nos meus ombros, sorriram e também partiram silenciosamente. Sozinho na grande sala, a fúria da tempestade claramente audível através das paredes de pedra robusta, o frio da sala me agarrando firme com os dedos frios, fiquei sozinho com nada além de meus próprios pensamentos para me fazer companhia.

    A guerra estava chegando. Guerra de destruição e morte inimagináveis. E o Mal. Um mal antigo e ancestral, que os deuses – tanto humanos quanto dragões – nas memórias obscuras de ambas as espécies, predisseram que surgiria. Um mal antigo com presas ensanguentadas e o fedor da morte envolto em torno de seu corpo hediondo, como um manto de invisibilidade. Uma profecia que nenhum humano ou dragão seria capaz de ignorar ou derrotar.

    O que eu deveria fazer? Como eu, um monge-guerreiro, treinado nas artes da magia Bretã, poderia derrotar essa abominação? Uma profecia que dizia claramente, que nenhuma magia de humano ou dragão, poderia se igualar a dele ou ter qualquer vislumbre de esperança em derrotá-lo. Este Mal era mais velho que o primeiro humano. Mais velho que o primeiro dragão. Todos esses anos, tinha ficado adormecido. Esperando o seu tempo. Esperando o momento certo para se levantar da Escuridão e cumprir sua profecia. A humanidade pereceria. Os Dragões reinariam sobre esta terra de polo a polo. E se você acreditava nas profecias, não havia nada… nada… poderoso o suficiente para derrotá-lo.

    Nada, Peregrino.

    Se você realmente acreditasse nas profecias.

    O que, reconhecendo silenciosamente para mim mesmo, eu não acreditava.

    Mas veríamos. Finalmente, o teste viria. As profecias eram verdadeiras? Ou um vislumbre de esperança, ainda batia nos corações daqueles que foram treinados para desafiar o Mal em todas as suas formas?

    CAPÍTULO 2

    A guerra é um espetáculo terrível de se ver.

    Do Livro de St. Albans

    Um Ano Depois.

    A morte de uma cidade é um espetáculo sombrio e terrível de se ver. Terrível saber que todos os seus esforços para salvá-la foram em vão. O estrondo da alvenaria. O calor abrasador de incêndios devastadores, consumindo a cidade com fome. A fumaça sufocante cheia de cheiros terríveis.

    Mas o pior de tudo, são os gritos dos moribundos. Vítimas inocentes que foram apanhadas impiedosamente, em uma busca por conquista, que só poderia significar para elas a morte ou as amarras de ferro frias da escravidão. E através da fumaça, a beleza medonha de uma legião de dragões marchando.

    Morte fervilhante.

    Infantarias de defesa na formação ouriço, com guerreiros carregando lanças. O Clã Hartooth era o mestre de um campo de batalha. Em uma mão, eles carregavam lanças cruéis, alabardas, com pontas de aço e três metros de comprimento, abaixadas e reluzindo como milhares de diamantes, através da fumaça. Em sua outra mão, estavam seus escudos com distintivos do Clã Dragão. Cada Clã tinha seus próprios escudos únicos. As cores do Clã, com seus motivos próprios, tudo podia ser claramente visto em seus escudos em forma de losango, feitos de madeira e couro. O couro vinha das carcaças de suas Bestas Aladas que cospem fogo, tornando-o extremamente difíceis de cortar. Os pedaços de madeira que compunham as alabardas eram feitos de toras de madeira. Uma madeira almiscarada e aromática, quase impossível de quebrar e incapaz de queimar. Podia-se sentir o cheiro de uma legião de alabardas resplandecentes se aproximando, muito antes de poder sentir se o vento estava certo.

    Sim.

    Havia uma precisão e unidade na maneira como a legião dragão se organizava em suas tradicionais formações de tabuleiro de xadrez. Eles pareciam fluir como as águas de uma inundação imparável, através de um campo quebrado e confuso. Vê-los se aproximar através das chamas e da fumaça da cidade moribunda, era um encanto surreal. Especialmente quando dezoito mil lanças estavam marchando em sua direção.

    Mas lanças geralmente nunca entravam numa batalha sozinhas. Elas eram apenas metade da ameaça dupla que o inimigo trouxe para suportar, contra aqueles que desejam destruir. Imagine as Bestas Aladas, os dragões voadores de pescoço comprido, asas de morcego e cuspidores de fogo de tradições antigas, com seus arqueiros Grandes Dragões montando em suas selas, enchendo os céus acima do campo de batalha. Das selas de suas montarias terríveis, os Cavaleiros Dragão atacam o inimigo em gente à infantaria, que avança com nuvens de flechas saindo das bestas mortais. A morte assobiando acima, imobiliza o inimigo sem sorte para uma formação defensiva que os protege dos céus. Mas não do ataque da infantaria avançada.

    Com a ameaça da legião armada com alabardas comandando o chão, junto com o terror das Bestas Aladas e seus cavaleiros controlando os céus, pode-se entender como o dragão dominou a humanidade no campo de batalha. Por mil anos, os exércitos dos reinos humanos – reinos que outrora enchiam a floresta e planícies abaixo do Alto Kanris, como grãos de areia em uma praia tropical, tentaram derrotar o inimigo dragão. Mas todos falharam. Todos os reinos dos homens foram dizimados no processo.

    Mas neste dia, de pé com o arco na mão e olhando sobre as muralhas de pedra do último castelo do Clã dragão Anktooth, tive que parar e admirar abertamente a precisão e a grandeza malévola em que o inimigo ancestral da humanidade fazia sua guerra.

    Acima de mim, ouvi o rugido das Bestas Aladas soprando fogo no ataque. Olhando para cima, reconheci a Besta Alada escura, amarela mostarda e verde, chamada Uaala, "Guerreiro das Trevas" na língua do Grande Dragão, junto com seu mestre, girando acima das paredes do castelo. O mestre das Bestas era um Guerreiro Dragão que se chamava Uccmoth, vindo do Clã Hartooth. Ele era o capitão da Guarda do Barão Hartooth, seu soberano ancestral. Mas também havia o cardeal-vermelho Upahil, Daemon Kind, e seu mestre Ussal, também do Clã Hartooth. Dois guerreiros renomados, parentes de sangue do antigo Primeiro Clã da raça dragão, liderando trezentas Bestas Aladas no ataque final às paredes rompidas da última cidade da Casa de Anktooth.

    A cidade estava em sua agonia de morte.

    As chamas saltaram para o céu de todas as partes da cidade. Fumaça negra e espessa girava em correntes de ar raivosas no céu da manhã. Diante de mim, nas planícies abertas que se estendiam além da cidade, seis meses de carnificina deixaram só ruínas. Os corpos dos Grandes Asas mortas, os gigantes pássaros parecidos com falcões que os guerreiros humanos do Alto Kanris cavalgavam em batalha, espalhados pelo campo. Junto com os corpos de centenas de guerreiros, tanto dragões quanto humanos. Mecanismos de cerco esmagados, trincheiras cheias de água e todo resto do longo cerco se espalhava estendido pelo campo de batalha com brinquedos descartados.

    Mas foram os gritos dos moribundos que mais me afetaram. Os Hartooth estavam mergulhando através das lacunas nas grossas muralhas da cidade, queimando e pilhando com a fúria do dragão. Era evidente que o barão planejava arrasar toda a cidade e não levar cativos. Assim, os inocentes, os velhos e jovens, tanto humanos quanto dragões, foram levados à espada com uma intensidade implacável.

    Eu estava em uma parte das paredes externas do castelo – um pequeno castelo no coração da cidade em chamas – sabendo que a batalha estava perdida. Por quase um ano, os poucos Grandes Asas e os guerreiros que se uniram ao chamado da casa Dragão Anktooth, lutaram corajosamente para manter os céus acima da cidade de Ank livres das Bestas Aladas. Mas para cada Grande Asa, havia seis dos magníficos Dragões Alados lança-chamas. Para cada humano ou dragão guerreiro que lutava sob as bandeiras azuis e douradas da Casa de Anktooth, o Barão Hartooth tinha dez dragões leais às suas bandeiras marrom e cinza. Era uma causa perdida desde o início, e todos os que atendiam aos apelos da Casa de Anktooth sabiam disso.

    Raramente humanos e dragões lutavam sob a mesma bandeira contra um inimigo comum. Raramente os humanos e seus Grandes Asas desciam para as colinas ondulantes e florestas espessas abaixo dos altos penhascos de suas montanhas. Na maior parte, humanos e dragões eram inimigos ancestrais, cujo ódio um pelo outro ia tão longe quanto qualquer uma das espécies se lembrava. Mas a Casa de Anktooth, os Senhores Dragão que mantinham o reino no sopé ondulado, logo abaixo de uma das poucas passagens de montanha que levavam ao Alto Kanris, havia ao longo dos séculos, forjado uma postura um tanto neutra com a humanidade. Esta casa nobre teve mais contato com os reinos dos homens no País Alto. Durante séculos, os Anktooth lutaram contra os humanos e seus Grandes Asas sempre que um senhor do reino da montanha, decidia montar uma incursão militar nas colinas e planícies. Foi esta casa, como era costume, que fornecia dragões senhores da guerra com tropas e conhecimento, sempre que um Barão Dragão desejava testar suas habilidades contra os Grandes Asas e humanos. Mas entre os conflitos, foi a Casa de Anktooth que silenciosamente tentou estabelecer algum tipo de comunicação entre os inimigos ancestrais.

    Eu estava familiarizado com Anktooth. O Barão Ahnkar Anktooth era um líder velho e cauteloso que apreciava as habilidades de luta dos humanos e dos Grandes Asas. Mais importante, o Barão admirava os artefatos e bens criados pelos humanos. Ele era um dos raros Senhor Dragão que achava que as riquezas poderiam vir expandindo o comércio e construindo acordos comerciais entre reinos humanos e dragões.

    Quando chegou a notícia de que o Clã Hartooth havia invadido as terras dos Anktooth, montei meu Grande Asa favorita e corri em seu auxílio. Por quase um ano, lutei ao lado de dragões e humanos para repelir as forças dos guerreiros castanhos e cinzentos do Primeiro Clã. Meu Grande Asa, que se chamava Cedric, e eu lideramos o pequeno número de Grandes Asas contra as Bestas Aladas. Despertamos das muralhas das torres superiores, das paredes e pedras da fortaleza a cada amanhecer, para enfrentar as Bestas Aladas e seus Cavaleiros Dragões. Às vezes, íamos para o céu e lutávamos quatro ou cinco vezes por dia. Mas em cada ida, mais guerreiros e Grandes Asas estariam desaparecidos ao anoitecer. E agora, o último dos redutos Anktooth estava caindo. Aqueles de nós que lutaram por um ano, para atrapalhar os planos do barão atacaram severamente seu poderoso exército. Falhamos em nossos esforços. Apenas horas restaram para a outrora poderosa Casa de Anktooth. No entanto, eu estava determinado a lutar até o fim.

    Outros, no entanto, tinham planos próprios para mim. Assim que a legião de lanças começou a atacar as muralhas do castelo, e assim que eu mandei os poucos arqueiros que pude encontrar para uma formação de defesa, a áspera, seca mão do guerreiro dragão leal ao Barão Anktooth, me agarrou firmemente e me jogou para o lado.

    — Você é o humano que eles chamam de Roland dos Penhascos Altos? Aquele que monta o Grande Asa chamado Cedric, certo? Você virá comigo.

    O barulho da batalha e o espirro de flechas de besta zunindo pelo ar ao redor de nossas cabeças criavam uma cacofonia quase insuportável. No entanto, ouvi cada palavra que o velho guerreiro disse, e não pude protestar. O guarda, a quem reconheci como Capitão da Guarda na comitiva privada do barão, já estava abrindo caminho através do turbilhão espesso da batalha e voltando para a própria fortaleza.

    Fiz uma pausa por um momento, enviando duas flechas rapidamente para as gargantas de dois homens de lança, e depois corri atrás do Capitão Dragão. Curiosamente, enquanto eu estava me esquivando da chuva de flechas de besta voando pelo ar com meu escudo, notei vários dos guardas do barão puxando guerreiros humanos e dragões selecionados da briga final e enviando-os de volta ao próprio castelo. Seria uma última posição sombria, pensei enquanto deslizava pela fenda estreita de uma passagem de pedra parcialmente aberta, que o Capitão Dragão manteve aberta para mim.

    O velho guarda do Clã Mauk – Clã Mauk, por causa da pele rugosa verde e amarela e três fileiras de chifres no topo de sua cabeça – empurrou uma tocha fumegante em minha direção, segurando uma igual sobre a cabeça no processo e, sem pronunciar uma palavra, virou-se e começou a me levar para cima de um conjunto sinuoso de escadas de pedra cobertas de poeira. Os dragões do clã Mauk, por séculos, eram seguidores leais dos Anktooth, servindo fielmente ao Clã mais antigo e sem hesitação. Eles, como os Anktooth, logo deixariam de existir quando o ataque Hartooth ao castelo fosse concluído.

    A escada, que dificilmente poderia suportar o tamanho de um dragão deslizando, estava cheia de teias de aranha e tapetes de poeira. Obviamente, essa passagem escondida não era usada há séculos, quanto e aonde ela levava, eu não conseguia começar a imaginar. Mas depois de alguns momentos de subida rápida, de repente entramos em um viveiro frio e estéril, usado para abrigar Bestas Aladas, mas há muito abandonado.

    Quando entrei na grande extensão de chão de pedra vazio, meus olhos caíram sobre um pequeno grupo de figuras que estavam no meio da sala. Guardas leais ao velho Barão estavam perto dele, segurando tochas ardentes e sibilantes. Ao lado do Barão havia um capitão mercenário dragão que eu reconhecia, e um mercenário humano também conhecido por mim.

    O mercenário dragão do Clã Horak era um renomado renegado que não chamava nenhum Barão de algum Clã de seu soberano ancestral. Ele era o líder de cinquenta guerreiros e suas Bestas Aladas, e sua reputação era a de um guerreiro que vendia seus serviços para o maior lance. Apenas a cor do ouro o dominava. Não podia confiar nessa criatura que se chamava Dagan Horak. Mas parecia que o velho Barão Anktooth confiava.

    O mercenário humano era um capitão de trinta Grandes Asas. Sua reputação, como a do capitão Horak, era tudo menos honrosa. Atrás de um rosto que muitos consideravam o mais bonito de toda a terra, havia um coração tão impiedoso e calculista quanto o de uma víbora. Ele era um cortesão habilidoso, um diplomata talentoso, um líder soberbo de homens e um espadachim mortal. Ele se chamava Helgar Longhair por causa de seu cabelo dourado. A mesma cor de ouro encontrada no trigo pronto para ser colhido. Suas madeixas caíam em seus ombros, criando um efeito deslumbrante para qualquer alma infeliz que ele olhasse em seu rosto. Confiei menos no humano do que no dragão. Mas nada me interessava tanto, quanto a pequena forma perto do barão.

    Ela era uma criança dragão do sexo feminino, vestida com a melhor seda no verde e ouro da Casa de Anktooth. Talvez com cinco anos de idade, ela era uma criatura pequena e delicada entre os três guerreiros. Seus olhos reptilianos, com suas pupilas azuis em forma vertical em olhos cinza opacos, olhavam para mim com admiração maravilhosa. Confesso, olhei com admiração para ela também. Havia rumores é claro, durante o cerco de um ano, de tal criatura existir. No entanto, ninguém a havia visto. Apenas sussurros de sua presença circulavam entre nós, quando descansávamos nossos ossos cansados durante a noite. Mas acreditar que uma Princesa Pérola realmente vivia dentro das paredes de Ank, era demais para aceitar. Até agora.

    Ela era uma Princesa Pérola. Sua pele pedregosa era de uma cor esbranquiçada e o círculo de pequenos chifres, não maior do que a ponta de um pequeno dedo, circundando sua cabeça, como pérolas brancas surpreendentes. Ao contrário dos chifres castanhos ou amarelos que decoravam os crânios do Rei Dragão em várias configurações, os chifres de uma lendária Princesa Pérola eram tão brancos quanto a melhor porcelana e da mesma textura que as pérolas. As fabulosas princesas pérolas eram lendárias em sua beleza exótica, entre a espécie dragão. Elas tinham um poder quase místico para o dragão. Elas tinham a reputação de ser capazes de ver e prever o futuro. Tinha sido, como as lendas diziam, uma Princesa Pérola que primeiro expulsou os ancestrais dos Reis Dragões dos pântanos fumegantes dos Mares do Sul e os fez competir contra os humanos. Centenas de gerações depois, tinha sido uma criatura diferente que pregava a guerra contra toda a humanidade para dominá-los.

    Dizia-se que os Hartooth estavam destinados a serem os governantes de todas as baronias de dragões, porque apenas das fileiras dos Hartooth as Princesas Pérolas eram procriadas. As tropas do Barão Hartooth começaram a saquear o castelo em que estávamos. Vagamente, ouvi o choque de aço contra aço e os gritos de homens em batalha de algum lugar abaixo de mim. O barulho também foi ouvido por aqueles que estavam ao redor da pequena princesa.

    — Meu senhor, devemos nos apressar! — o mercenário capitão de Bestas Aladas sibilou, virando-se para olhar para o velho Barão. — Em instantes, o inimigo estará sobre nós. Deixe-me levar a criança. Com minhas tropas, prometo entregá-la em segurança.

    — Dê-a para mim, meu senhor, — Helgar Longhair rosnou, um sorriso oleoso vincado em seu rosto bonito, enquanto ele dava um tapinha na cabeça da criança. — Vou levá-la para o Alto Kanris. Nenhuma Besta Alada será capaz de seguir. Ninguém a encontrará até que seja a hora.

    O velho e grisalho Barão ouviu cada um falar antes de balançar lentamente a cabeça com um não. As fendas escuras que abrigavam seus olhos se ergueram e fixaram no meu rosto, e ele deu um leve

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