Cinco Amigos E Um Coração
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Cinco Amigos E Um Coração - Rolnei S. Vianna
1
CINCO AMIGOS E
UM CORAÇÃO
Aventuras Modernas Vol.1
Rolnei S. Vianna
Dedicado a família, amigos, mestres e aos sentimentos de amizade e companheirismo, fundamentais para manter a esperança em dias amargos. Tive um pouco disso tudo e muito mais ao longo da vida e sou muito grato.
PRÓLOGO
O pôr do Sol destacava a silhueta de quatro adultos se encarando em um píer que se estendia em direção ao mar. Eram dois homens e duas mulheres, e mesmo sem poder ver seus detalhes com clareza era possível sentir que havia entre eles uma forte conexão.
A presença de um quinto vulto, portando um revólver, se aproximando sorrateiramente indica que isso poderia ser um fm. Porém o destino nem sempre dá o aspecto apropriado para os inícios, meios e fns. Essa é só uma parte da história.
CAP.1 — OS AMIGOS MAIS
PRÓXIMOS
Um verão como outros da década de 90, mais precisamente no ano de 1991, uma época onde a criatividade era impulsionada pela simplicidade. Era isso que permitia a intensidade na vida das pessoas, fazendo o mundo daquela época se encaminhar para o futuro com passos ritmados.
Fael Oliveira era um garoto que sabia viver intensamente na cidade de Fortaleza do estado do Ceará, e aos onze anos já fazia uma infnidade de coisas, principalmente arranjar aventuras e confusões. Era visado pelos valentões do bairro onde morava, e sabia como se vingar das surras de tal forma que não faltava garotos que lhe considerasse um inimigo. Ele mesmo repudiava essa palavra, pois inimizades eram contra seu modo de levar a vida, preferindo usar no máximo o termo opositor
.
Dois ou três garotos mais velhos persistiram com a estúpida ideia de dar uma lição nele no ano anterior — umas duas surras consecutivas e aplicadas de forma covarde —
mas esse tipo de ação apenas resultou em uma reação, sobre a forma de acontecimentos vexatórios contra os valentões. Um deles comeu um lanche adicionado de laxante, que resultou em um contratempo na sala de aula durante uma prova de matemática. O outro teve seu uniforme infestado de pó de mico durante o campeonato inter estudantil de futebol. Isso apenas para citar algumas das medidas planejadas pelo menino, mas mesmo assim Fael era o garoto mais legal da escola, do bairro, e provavelmente da cidade.
Criava ou recriava a maior parte dos próprios brinquedos e objetos com grande habilidade — arte aprendida com o pai artesão —
pedalava sozinho pelos quatro cantos da cidade, era gentil com os fracos e com os idosos, fazia trabalhos que outros de sua idade jamais teriam disposição de encarar e muitas vezes fazia essas
coisas apenas por instinto. Era prestativo por natureza e mantinha um sorriso natural no rosto.
Em sua vida só lhe faltava amigos, pois um órfão de mãe e esquisito como ele afugentava as crianças acomodadas, algo até justifcável devido à intensidade exagerada de Fael. Era difícil acompanhar a vida solta de um garoto que tão cedo já havia acumulado experiências tão diversas, e Fael era ciente disso e por isso nunca se aborreceu com o isolamento. Para ele a solidão era apenas a prova de que ele ainda não havia conhecido as pessoas certas, já que o mundo era grande o bastante para cada um ter o seu próprio grupo de semelhantes. Mal sabia ele que as coisas estavam se encaminhando para uma grande mudança em sua vida, e de que esse não seria um ano ordinário como os demais.
No início das aulas daquele ano, Fael conheceu seus novos vizinhos, uma família vinda do sul do país composta por um casal de meia idade e seus três flhos. O casal de gêmeos eram os caçulas e não pareciam empolgados com a mudança, principalmente com relação a nova
escola e bairro. Lucas Schwartz era um baixinho invocado que sabia brigar e tinha um tipo de imã para isso, chamado de Diabo Loiro devido a um pouco de perversidade em suas ações. Já a bela Lara Schwartz se revelou mais madura que o irmão, demonstrando ser o tipo de criança prodígio que carregava uma grande quantidade de conhecimento, apesar da pouca idade.
Suas características marcantes faziam com que os novatos fossem motivo de zombaria na escola, inclusive por terem um sotaque que acentuava a letra R
das palavras e parecendo cantar cada frase dita com um insuportável —
porém não proposital — ar de superioridade. Isso de alguma forma atraiu Fael e o fez pela primeira vez ter a vontade de criar uma amizade, o que veio bem a calhar para os dois novos alunos —
mesmo que Lucas não tenha admitido de imediato. Os irmãos sentiam falta do contato com a irmã mais velha, que ajudava nos trabalhos da família, então viram em Fael a fgura de guia experiente apesar de não haver diferença de idade entre eles. Lucas demonstrou mais
relutância com a nova amizade que se formou —
admitir algo sempre foi um problema para ele —
e chegou a trocar socos com Fael por causa de uma pequena confusão com a expressão
rebolar
, que ali dava sentido de arremessar algo, e não sobre o gingado de cintura. Sua irmã, por sua vez aceitou de bom grado a primeira amizade em seu novo território.
Os fortes laços de amizade foram formados em pouco tempo, atraindo os olhares de outras pessoas que estavam em situação parecida, como o gordinho simpático Matheus Vasconcelos e a garota da alta classe Elisa Mendes. Ambos alunos de uma sala vizinha.
Cada um viu seus próprios interesses em criar vínculos com um grupo pequeno e coeso como aquele. Para Elisa, por exemplo, era a chance de estar acompanhada de pessoas que não a julgavam pela aparência. Ela era uma menina tão bonita quanto Lara, porém suas roupas mostravam que ela pertencia a outro mundo. Como se a realeza resolvesse dividir espaço com a plebe. Já Matheus viu que o
preconceito não tinha lugar naquele pequeno grupo, uma chance de convívio digno com outras crianças depois de um tempo difícil de desprezo recebido.
Com naturalidade os cinco se tornaram mais próximos, fazendo com que aquela primeira necessidade de se unir a um grupo deixasse de ser importante. Todos os cinco não tinham tempo a perder com julgamentos, apenas desejavam compartilhar experiências com amigos.
Matheus sentiu que a amizade sincera de Lucas e Fael era muito mais importante do que a simples proteção que os punhos dos dois lhe proporcionavam. Eram rapazes que não o julgavam pela aparência ou a timidez excessiva e isso era o máximo. O garoto desejava ser como os dois, assim como Elisa queria ser tão autêntica quanto Lara. Claro que a admiração era recíproca, mas talvez não tão evidente. Então a vida seguiu adiante.
Praia de Iracema — Ponte Metálica, última
semana antes das férias de julho.
O grupo caminhava pela praia em mais um daqueles desvios após a aula de sexta-feira, onde gostavam de caminhar pela Ponte dos Ingleses —
popularmente chamada de Ponte Metálica — e observar o mar de perto.
—Estamos terminando com boas notas nesse semestre — a tranquilidade fez com que Matheus tomasse a dianteira ao quebrar o silêncio.
— Alguns de nós poderiam estudar mais para tirar notas melhores, como o cabeça quente ali — Elisa sempre aproveitava a chance de dar sermões em Lucas, que apenas fcava mais sisudo.
— Meu irmão sempre foi distraído para estudar. Ele pensa em muita besteira e acha que os punhos são tudo na vida.
Lara puxou Elisa pela mão, para fcar mais à frente e manter uma distância do que viria a seguir. Questões envolvendo Lucas sempre
geravam discussão entre os meninos, portanto as mais maduras do grupo evitavam fcar no meio desse tipo de coisa. As meninas começaram uma conversa em particular, na qual havia um tipo de seriedade no ar.
— Aquilo que você me disse outro dia é sério, Elisa?
— Sim Lara. Acha que ainda pode ser minha melhor amiga?
— Claro que sim — o abraço comprovou a sinceridade das palavras de Lana. — Nossa amizade é maior do que qualquer coisa. Eu não sei nada sobre isso, mas para mim você é a mesma pessoa.
— E você acha que os garotos…
— Sshh — um gesto típico pedindo silêncio interrompeu a pergunta que viria dos lábios de Elisa com uma preocupação evidente na formulação. — Todos somos amigos, então não ligue para o futuro dessa forma.
Entre os garotos, o clima era diferente, um pouco tempestuoso como sempre fcava nessas horas.
— Deve ser ruim ter uma irmã tão bonita —
Matheus sempre foi o mais franco ao falar das garotas, apesar de ser tímido com as mesmas. —
Alguém vai namorar ela um dia e não será você.
— E nem você gorducho — o sempre nervoso Lucas não gostava desse tipo de conversa. Suas irmãs eram boas demais para qualquer um que se atrevesse a se aproximar.
— Verdade, a Lara gosta do Fael hehehe.
Lucas olhou para os olhos de Fael e esperou uma negação que nunca veio. Talvez o amigo fosse o único capacitado para namorar sua irmã gêmea, só que mesmo assim aquilo era desagradável de se falar ou ouvir.
— Vocês são péssimos amigos —
respondeu ainda irritado. — Deveriam respeitar os limites de nossa amizade. Minhas irmãs estão fora de suas pretensões.
— Respeitamos — Fael colocou o braço sobre os ombros do amigo ao falar com sua típica tranquilidade. — E um dia seremos todos uma família.
A frase incomodou um pouco a cabeça do rapaz, mas ele preferiu mudar de assunto. Certas coisas eram melhores deixar quieto, esperando que caísse no esquecimento.
Um grito de socorro vindo da irmã de Lucas cortou os risos de Matheus, fazendo os três correrem apreensivos em direção das garotas.
Seis garotos malvestidos e sujos cercaram Lara e Elisa, as ameaçando com palavras baixas e olhares maliciosos como de chacais.
A impulsividade de Lucas o fez atacar um dos marginais pelas costas, atingindo a nuca com um