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Os Olhos do Dragão: O Guardião
Os Olhos do Dragão: O Guardião
Os Olhos do Dragão: O Guardião
E-book653 páginas10 horas

Os Olhos do Dragão: O Guardião

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Sobre este e-book

Três anos depois de salvar a Terra e Duran, Dylan enfrenta desafios totalmente novos. Kiro desapareceu, os Iadnahs estão virando-se contra seus Guardiães e, para completar, uma criatura antiga como os deuses está criando o caos na Terra. Outras ocorrências estranhas acontecem em todo o universo e Dylan precisa investigá-las para descobrir a verdade.

Mordon, tendo finalmente se libertado do pai, concorda em ajudar Dylan em suas aventuras. No entanto, quanto mais se afasta de sua terra natal, mais ele descobre segredos aterrorizantes que tinham sido escondidos dele.

Juntos, Dylan e Mordon precisam proteger mais do que apenas a Terra. Eles terão que explorar novos mundos, conseguir a confiança dos deuses e salvar seus amigos, bem como uma criança misteriosa. Durante o tempo todo, terão que batalhar contra um mal antigo como os deuses.

IdiomaPortuguês
EditoraBadPress
Data de lançamento18 de ago. de 2023
ISBN9781667461663
Os Olhos do Dragão: O Guardião

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    Os Olhos do Dragão - Rain Oxford

    Os Olhos do Dragão

    O Guardião - Livro 2

    Rain Oxford

    Traduzido por Christiane Jost

    Os Olhos do Dragão © 2015 Rain Oxford

    Todos os direitos reservados

    Edição de Crystal Potts

    Índice

    Capítulo 1

    Capítulo 2

    Capítulo 3

    Capítulo 4

    Capítulo 5

    Capítulo 6

    Capítulo 7

    Capítulo 8

    Capítulo 9

    Capítulo 10

    Capítulo 11

    Capítulo 12

    Capítulo 13

    Capítulo 14

    Capítulo 15

    Capítulo 16

    Capítulo 17

    Capítulo 18

    Capítulo 19

    Capítulo 20

    Epílogo

    Capítulo 1

    Mordon

    Quando tinha um ano de idade, ateei fogo no berçário e meu pai disse que eu seria um feiticeiro poderoso. Quando tinha cinco anos, gritei de raiva tão alto que quebrei todas as janelas do quarto e meu pai disse que eu seria um homem poderoso. Quando tinha dez anos, um dos meus tutores me bateu e joguei-o no outro lado do aposento. Meu pai disse que eu seria um guerreiro poderoso. Quando tinha quinze anos, disse ao meu pai que o conselheiro em que ele mais confiava era mentiroso e que a prova que tinha era que eu conseguia sentir o cheiro da enganação. Quando contrariei as ordens do meu pai e expus o assassino, ele disse que eu seria um rei poderoso.

    Meu pai, Ishte-mor Nako, queria devolver o poder aos reis, dar à monarquia o direito de criar qualquer lei. Ele achava que Duran deveria ser governado pelos feiticeiros e políticos mais poderosos, não pelos cidadãos. Ele acreditava que apenas os poderosos sabiam o que era melhor para todos. Ele também decidiu que eu governaria em seu lugar quando se aposentasse.

    Eu recusei.

    Mokii era diferente das outras terras grandes e seu reinado sempre fora em batalha. Cada uma das outras terras tinha um rei que governava a região inteira, de oceano a oceano, mas que obedecia aos votos do povo. Apesar de meu pai ser, tecnicamente, rei de toda Mokii, ele ignorava as massas. Em vez disso, Mokii era governada por reinos menores, que tinham que pagar impostos ao reino do meu pai. Ele só se importava com o próprio povo e ninguém fora de seu reino era fonte de preocupação.

    Eu me esforçava para deixar meu pai orgulhoso, mas, quanto mais tentava ser algo que não era, acreditar em algo em que não acreditava e fazer algo que não conseguia, mais catastróficos eram os resultados. Eu poderia culpar minha mãe por isso, mas teria que ser pela morte dela. Ela era uma vidente e sabia que morreria durante o meu parto, mas permitiu que a gravidez continuasse. No momento em que nasci, ela lançou um feitiço proibido em mim para que absorvesse os poderes dela enquanto morria de uma doença incurável.

    Os servos da casa diziam que eu nascera morto. Meu pai exigiu que saíssem e, na manhã seguinte, tirou-me do quarto como uma criança saudável. Uma criança assustadoramente poderosa e sem mãe.

    Desde o momento em que comecei a caminhar, eu explorava, fugia e procurava. Eu não sabia o que estava procurando. Os cuidadores odiavam minha exploração, os tutores odiavam minhas fugas e meu pai me odiava. Ele nunca admitiu isso, obviamente. Quando me batia, achava de verdade que era um meio aceitável de me moldar para ser um futuro rei. Ele sempre ficava decepcionado quando um dos servos ou uma das pessoas da cidade falava sobre minhas travessuras.

    Não era intencional. Eu pisava em um graveto na floresta e causava uma debandada de animais grandes que destruíam a vila, pegava uma poção com o rótulo incorreto ou estava no lugar errado na hora errada e ouvia um segredo terrível.

    Isso levara ao meu dilema do momento. Eu estava parado em frente ao trono do meu pai enquanto ele me passava um sermão sobre a importância de um regente furioso. Porém, a única coisa em que eu conseguia pensar era um navio partindo para a floresta de Aradlin. Eu nunca estivera lá porque meu pai não deixaria que seu único herdeiro visitasse um lugar tão perigoso. Entretanto, eu não pretendia pedir a permissão dele.

    Ainda faltavam alguns meses até que eu fizesse vinte e dois anos e ficasse independente. Essa era outra lei que meu pai queria mudar. Ele insistia que uma criança não era adulta até que fizesse vinte e cinco anos e que as mulheres tinham que estar casadas nessa idade. Ele acreditava que uma mulher tinha que ser cuidada, primeiro pelo pai e depois pelo marido. Falando em mulheres...

    — ... será o dia antes do seu aniversário — dizia meu pai. Senti um frio na barriga. Ele estava fazendo planos que me envolviam.

    — O quê? — perguntei.

    — Sei que não é cedo o suficiente, mas o pai da garota não...

    — Não, quero dizer que eu não estava escutando o que você dizia — interrompi.

    Ele suspirou. — Então escute com atenção. Você se casará com a filha dos Corsicot de Banjii. Com a aliança com a família regente de Banjii, teremos direitos fiscais sobre todas as terras do centro-oeste.

    — Pai, sei como você adora extorquir klash de quem não tem nada, mas não vou me casar. Não agora, nem amanhã, nem no dia antes do meu aniversário nem por decisão sua. Não conheço essa garota nem pretendo conhecer — disse eu, usando minha melhor voz de rei.

    Ele franziu a testa de forma incerta. — Eles têm um filho que...

    — Pai! — gritei.

    Ele deu de ombros. — Eu queria que você tivesse essa opção. Você terá um filho para continuar a linhagem. Não me importa com quem se case, desde que a pessoa seja da família Corsicot e que seja no seu próximo aniversário.

    Eu era útil para o meu pai como uma forma de moeda de troca. Muitas famílias de Mokii queriam que as filhas se casassem com o filho do rei. Felizmente, a ganância do meu pai fez com que ele esperasse o melhor negócio até que fosse quase tarde demais. Depois do meu aniversário, ele não conseguiria mais me casar com alguém contra a minha vontade. Infelizmente, ele estava ficando desesperado.

    — Não vou. Vou morrer na próxima praga de seis meses.

    — Então você se casará em seu quarto.

    — Ele é uma bagunça, vergonhoso demais para mostrar a uma mulher.

    — Enviarei os servos imediatamente.

    — Sou estéril.

    — Procurarei um doador de esperma. Ninguém saberá.

    — Odeio crianças.

    — Você nem precisará ver a criança. — Ele franziu a testa. — Você adora crianças. A questão está resolvida. Você se casará antes de seu aniversário com a filha dos Corsicot e não aceitarei desculpas. Não autorizo nenhuma doença nem desastres. Agora, volte para o seu quarto. — Meu pai era um homem alto, magro e imponente, com cabelos pretos longos e olhos roxos frios. Ele não tinha uma célula sequer capaz de perdoar ou aceitar.

    — Como quiser. Vai me ensinar alguma coisa hoje à noite?

    — Não. Pratique sua magia elemental. Usaremos a arena amanhã e é bom que consiga controlar seu fogo. Caso contrário, os servos se queimarão — ameaçou ele.

    O problema que eu tinha com o fogo era meu pai. Sozinho, eu dominava o fogo. Porém, com outras pessoas em volta, particularmente meu pai, as coisas davam errado.

    Eu era magro, não importava o quanto me exercitasse. Isso não me ajudava a enfrentar meu pai e os servos não podiam enfrentá-lo no meu lugar. No entanto, de forma chocante para todos, incluindo eu mesmo, cresci bastante depois dos vinte anos. Eu não era mais pequeno para a minha idade e tinha uma compleição decente para alguém que só lutava no campo de treinamento. Ainda assim, anos de condicionamento tornavam difícil desafiar meu pai.

    Saí da sala o mais depressa possível, parando na biblioteca em vez de ir para o meu quarto. — Jedes — sussurrei ao perceber a jovem sentada em uma cadeira grande. Jedes era uma garota dócil e de rosto doce, com cabelos avermelhados e olhos verdes, que pesava menos do que a pilha de livros que ela geralmente carregava. Ela era alguns dias mais jovem que eu e começava a parecer uma mulher.

    Os pais dela trabalhavam para o meu pai antes de se mudarem para Banjii. Ter uma filha em vez de um filho os rebaixava, portanto, deixaram a recém-nascida para trás para ser criada por outros servos. Isso acabou sendo melhor, pois Jedes era tratada como uma princesa pela maioria das pessoas.

    Vendo que ela estava adormecida, tirei o livro de sua mão e deixei-o de lado. Em seguida, peguei um cobertor que estava sobre uma mesa próxima e enrolei-o nela. Depois de beijá-la de leve nos lábios, virei-me para sair.

    — Não vai se despedir? — perguntou ela baixinho.

    Eu parei. — Você precisa descansar. Só ficarei fora alguns dias. — Fazia muito tempo que eu desistira de fugir permanentemente.

    — Você vai para uma floresta cheia de monstros e planeja voltar em breve?

    — Terei cuidado — disse eu, sentando-me ao lado dela na cadeira enorme. Ela se aconchegou sob o meu braço e repousou a cabeça no meu peito.

    — Você encontrará o que está procurando. Este lugar ficará no seu passado. A floresta é um ponto de inflexão. Lembre-se de que, no escuro, quando não conseguir ver o caminho, ainda poderá caminhar. Sua luz está dentro de você. Não volte aqui.

    Jedes era vidente, como minha mãe fora, e suas previsões ficavam mais claras a cada ano. — Eu poderia levar você comigo. Poderíamos viajar juntos.

    — Não. O seu caminho é com outros. Meu destino ainda não surgiu, mas surgirá para mim aqui. Porém, sentirei saudades de você. — Ela ergueu a cabeça e encontrou meus lábios em um beijo gentil... o primeiro que jamais iniciara. — Parta hoje à noite. Não perca esse navio. Amanhã será tarde demais. Não importa o que faça, não volte para este castelo, especialmente não para confrontar seu pai.

    Depois de me despedir de Jedes, fui para o meu quarto para me preparar. Em vez da mochila leve para três noites que preparara, juntei tudo o que era importante para mim em um saco. Era fácil escalar para fora na sacada do meu quarto e mais fácil ainda sair do terreno do castelo. Meu pai devia melhorar a segurança.

    *      *      *

    Fugir de Mokii não era tão fácil. Eu não vestia um traje cerimonial, mas minhas roupas eram de alta qualidade com as cores da realeza. Quando criança, eu frequentemente roubara roupas dos servos para conseguir fugir. Portanto, meu pai garantira que os servos vestissem as cores do castelo e que todos os cidadãos soubessem sobre mim. Eu sabia que, se alguém me visse saindo, contaria ao meu pai. Porém, eu pretendia sair primeiro de Mokii.

    Felizmente, o capitão do navio não era nativo de Mokii e não me reconheceu nem às minhas roupas. Portanto, ele me deixou embarcar. Tive um surto de adrenalina quando velejamos para longe. Desfrutei do momento de liberdade, apesar de saber que, em algum momento, meu pai me encontraria.

    A não ser que Jedes estivesse certa, e normalmente estava.

    Chegamos à costa leste de Mijii ao meio-dia e separei-me do grupo que se encaminhava para o oeste, em direção à cidade. Ao norte, ficava a floresta de Aradlin. Eu lera sobre ela e era exatamente o que esperara: alta e proibitiva. O grupo de pessoas que bloqueava o meu caminho, por outro lado, não era o esperado. Curioso, eu me aproximei.

    — Estão todos prontos? — perguntou um homem com roupas de caminhada.

    — Prontos para o quê? — perguntei.

    — Este é um grupo de passeio — disse ele em tom de orgulho. Pareceu pretensioso, mas apenas porque ele tinha o rosto queimado de sol e obviamente não era a primeira vez.

    — Para a floresta de Aradlin? Eu não sabia que havia passeios em Aradlin. — Era um dos lugares mais perigosos em Duran e fora de Canjii.

    Ele abriu a boca para falar, mas ficou em silêncio ao perceber meus olhos. Apesar de olhos roxos e azuis serem comuns, o fato de eu ter um olho de cada cor incomodava a maioria das pessoas. Isso também me tornava distinguível. Os olhos dele desceram pelo meu corpo e ele os estreitou ao perceber as minhas roupas. Eu não era um turista comum nem estava vestido para uma caminhada.

    — Somos novos. Meus pais foram exploradores a vida inteira e tenho as anotações detalhadas deles da exploração desta floresta.

    — Bem, então você deve ter dicas de segurança e suprimentos médicos. Eu estava me perguntando o que fazer se encontrasse um draxuni — comentei. Obviamente, eu sabia que deveria recuar e não parecer ameaçador. Eles só atacavam quando os filhotes ou a comida estavam ameaçados.

    — Você sobe.

    — Em uma árvore? — Franzi a testa. Os draxunis subiam em árvores.

    — É claro! — respondeu ele, sorrindo. — Os draxunis não conseguem subir em árvores. Pode se juntar ao passeio, se quiser, mas temos que ficar em silêncio.

    Era verdade, tínhamos que ficar em silêncio, mas a maioria das pessoas que eu encontrava não entendia esse conceito. Entramos na floresta, comigo bem atrás, pois não lideraria. Logo, eu estava procurando um caminho alternativo, pois o grupo fazia tanto barulho que era como se estivesse gritando hora do jantar. Alguma coisa me observava.

    Não demorou muito para que um turista pisasse em um cogumelo sofar, o que lançou um pó tóxico que causava alucinações e parada cardíaca em doses grandes. Um grito de uma mulher foi o que bastou para que o grupo se espalhasse. Suspirei e continuei seguindo o caminho. Infelizmente, o que quer que fosse que me observava não sumiu. Tentei sentir o cheiro, mas o vento estava no sentido contrário. Além do mais, os odores fortes da floresta o mascararam.

    A caminhada foi boa. Andei devagar o suficiente para ser silencioso e evitar as armadilhas perversas da floresta, ao mesmo tempo em que admirava sua beleza. Era um lugar incrível. Subitamente, uma explosão ao longe acabou com a paz. Sabendo que isso atrairia criaturas famintas, andei depressa no sentido oposto. Um passo errado me jogou colina abaixo. Quando parei, permaneci imóvel até avaliar os arredores. Os turistas gritavam à distância. Antes que eu conseguisse me sentar, uma criatura peluda pulou no meu peito e latiu.

    Ah, não. Ergui a cabeça a tempo de ver um filhote de draxuni esticar a língua para o meu nariz. Comecei a empurrá-lo de cima de mim até que ele mordeu meu polegar. Doeu um pouco, mas não chegou a rasgar a pele. Ouvi um rosnado uma fração de segundo antes que outro filhote pulasse no meu ombro e depois sobre o primeiro filhote. Eles viraram uma bola de pelo que rosnava e rolava. Por mais fofos que fossem, eu estava aterrorizado. Um filhote de draxuni era mais assustador que um adulto. Um draxuni caçava e protegia seu território sozinho, mas um filhote nunca estava sozinho. Onde havia filhotes, havia pelo menos seis adultos muito alertas.

    Sentei-me e olhei em volta. Dois outros filhotes decidiram que eu era um brinquedo e um deles pulou no meu colo para enfiar a língua na minha boca. Não consegui evitar uma risada até que os pais lentamente saíram das sombras. Eu estava rodeado por quatro adultos, mas eles não avançavam. Eu sabia, pelos meus estudos, que metade do bando ficava escondida, o que significava que havia oito deles nas imediações. Ouvi um se aproximar por trás, mas os filhotes continuaram a brincar. Ele farejou minha cabeça e meu pescoço. Eu não poderia ter ficado mais chocado quando ele cutucou minha cabeça e os outros relaxaram. Ele se afastou.

    Nenhuma criatura tinha permissão de se aproximar dos filhotes de draxuni. Porém, aquele bando não só me deixou vivo, como também não me espantou dali. Eles se viraram, protegendo os filhotes contra forças externas. Depois que a minha náusea passou, levantei-me para ir embora. Porém, quando comecei a passar pelo círculo de proteção, o draxuni mais próximo me derrubou com a pata enorme.

    — Por que fez isso? — perguntei, levantando-me. Fui jogado longe quando tentei de novo, mas a fera teve o cuidado de não me ferir com as garras. Fui para o lado oposto, mas fui bloqueado por outro draxuni. — Não sou um filhote, deixe-me passar! — exigi. Eles me ignoraram.

    Depois de várias outras tentativas, sentei-me derrotado e fui imediatamente atropelado pelos filhotes. Depois de ter sido advertido a não voltar para casa, ser adotado por um bando de draxunis certamente não era o pior destino que poderia ter, mas não era o que eu queria.

    Por horas, fiquei sentado no meio da pilha de pelos, esperando que os adultos recobrassem o juízo e devorassem-me. Não houvera mais sinais dos turistas. Talvez eles tivessem conseguido sair vivos, mas eu duvidava disso.

    Em vez de me preocupar, aproveitei a oportunidade para aprender. Os draxunis eram uma espécie forte, criada para sobreviver e que formava bandos com uma hierarquia rigorosa. O pelo deles denunciava em que parte do mundo viviam, pois tinha a cor necessária para camuflagem. Aquele bando tinha pelo marrom-escuro e preto para se misturar na floresta escura. O mistério que ninguém conseguia chegar perto de entender eram os filhotes. Não importava a parte do mundo em que estavam, o pelo era uma mistura de vermelho, preto, branco e marrom, e as orelhas eram imensas em comparação à cabeça.

    Descobri o mistério enquanto os filhotes brincavam. As cores se misturavam enquanto eles rolavam juntos até que era impossível ver quantos havia ou para onde estavam movendo-se. No menor sinal de som na floresta, eles congelaram e ergueram as orelhas até que um dos adultos deu um sinal para que relaxassem.

    — Feder como um cachorro é uma coisa, mas duvido que alguém o deixe sair da floresta fedendo como um filhote de draxuni. — A última voz que eu esperava ouvir na Aradlin me sobressaltou.

    — Dylan! — Eu me levantei, mas os draxunis também. Apesar de meu melhor amigo não demonstrar medo, ele não chegou mais perto. Os draxunis formaram uma parede entre mim e Dylan. — Pode me dar uma ajudinha aqui? — perguntei em inglês. Nosso procedimento padrão em particular era que eu falasse o idioma dele, o inglês, e ele falasse o meu, sudo.

    Os draxunis rosnaram e Shinobu não gostou. A naowen era um marsupial pequeno, peludo, marrom-escuro e peçonhento que conseguia matar uma pessoa com uma única mordida, e ela protegia Dylan ferozmente. Ela cabia na palma da minha mão, com a cauda peluda preênsil tendo o dobro do comprimento do corpo. Sentada no ombro dele, como sempre, ela sibilou e cuspiu nas feras. Comecei a andar em volta dos draxunis na direção de Dylan. Um deles saiu da formação para ficar na minha frente. Porém, quando Shinobu saltou para o chão e avançou, ele cedeu à criatura minúscula.

    Eu me juntei a Dylan. Shinobu voltou para ele, subiu seu corpo correndo para ficar no ombro e enroscou a cauda no pescoço dele. Ela colocou a patinha na bochecha dele e emitiu um som de clique.

    — O que ela está fazendo?

    — Ela não gosta daqui. Há algo por perto. Algo pior do que esses caras. Vamos. — Ele se virou e começou a andar.

    Eu nunca conhecera um homem corajoso o suficiente para dar as costas a um draxuni, muito menos a um bando inteiro deles. Corri atrás dele, mantendo o bando à vista o máximo que consegui. — O que você está fazendo aqui, como me encontrou e por que não está com medo?

    — Não sei por que estou aqui, só sabia que tinha que vir. Foi como se alguma coisa estivesse pedindo ajuda. Encontrei algumas pessoas perdidas e assustadas, e tirei-as daqui, mas talvez tenha encontrado você por acidente. Quanto a ter medo... na próxima semana, fará três anos que estou aqui. Três anos durante os quais treinei sob orientação de Kiro. Juntando a magia que sei e Shinobu, não estou preocupado. O que aprendi com Divina sobre os draxunis é que, primeiro, tenho que mostrar que não sou uma ameaça aos filhotes e, segundo, que eles não são uma ameaça para mim. Não olhei para os filhotes. E eles perceberam que eu não partiria sem você, o que implica a segunda parte. Então, o que traz você aqui?

    — Eu queria ver a floresta. Você já esteve aqui antes, certo?

    — Sim, quando eu ainda era novo em Duran. Muito mudou na minha vida, mas esta floresta está exatamente a mesma.

    Quando eu o conhecera, esgueirando-se em um navio para Anoshii, ele era suscetível a acidentes devido a um excesso de poder desconcentrado, sabia apenas algumas palavras em sudo e lutava para se adaptar à nossa gravidade maior. Não me incomodou o fato de ele ser de outro mundo.

    Porém, ele mudara. Ele andava com facilidade, sua magia estava bem sintonizada e ganhara músculos como alguém que fazia trabalhos físicos como profissão. Havia confiança em sua voz e ele era agora fluente em sudo. Os cabelos castanhos estavam curtos. Seus olhos verdes eram expressivos e sempre tinham um toque de malícia. Dylan era o tipo de homem que faria o possível para ajudar as pessoas, mas também era sarcástico e gostava de brincadeiras.

    — Como você se esgueirou até os draxunis? — perguntei.

    — Eu não queria me tornar um petisco para nada aqui, portanto, estava mascarando meus sons e meu cheiro com magia.

    — Além de aprender magia poderosa, o que tem feito? — perguntei. Fazia meses desde que tínhamos nos visto.

    — O mesmo de sempre, acho. Moro metade do tempo com Divina e a outra metade com Kiro. Kiro saiu em uma missão e deveria ter voltado uma semana atrás. Divina está em uma reunião e deveria ter voltado duas semanas atrás. Estou um pouco preocupado.

    Kiro era o mentor de Dylan e Divina era a namorada dele. A mulher era maravilhosa, mas tinha cheiro de enganação e antiguidade. Apesar de não ter intenções maliciosas em relação a Dylan, eu achava que seria melhor ele procurar companhia em outro lugar. No entanto, ele estava completamente apaixonado por ela. Pouco tempo depois de Dylan e eu nos conhecermos, Divina se envolvera em um acidente que a deixara dependente de Dylan. Ela se recuperara completamente, mas isso os deixara mais próximos.

    — Eles frequentemente o deixam sozinho desse jeito?

    — Não — respondeu ele, franzindo a testa. — Um deles pode nos deixar se tiver que cuidar de alguma coisa. Não é um problema. Porém, se houver uma tempestade, precisamos de dois de nós para cuidar dos dois territórios. Se dois saem para salvar o mundo e há uma grande tempestade, isso deixa só um para cuidar dos dois lugares.

    — Mas agora você está aqui. Isso não deixa os dois lugares desprotegidos?

    — Eu os bloqueei no caso de uma tempestade.

    — Está preocupado com a ausência deles?

    — Sim. Se um deles estivesse encrencado, eu deveria sentir. Em vez disso, alguma coisa nesta floresta está me atraindo para longe.

    — Não fui eu, certo? — perguntei.

    — Não foi só você. Mas você é parte disso. Por exemplo, para onde estamos indo? — perguntou ele.

    Aquilo me espantou. — Você está nos levando para fora da floresta e eu o estou seguindo.

    — Exceto que você não está me seguindo, estamos andando juntos, e indo mais para dentro da floresta.

    Paramos e percebi que ele tinha razão. Eu não estava seguindo Dylan. Um arrepio gelado desceu pela minha espinha. — Como você sabe que estamos entrando cada vez mais na floresta?

    Ele apontou para o chão. — As plantas. Dá para perceber que elas recebem menos luz do sol porque a floresta é mais densa aqui. Além disso, as árvores são mais altas, o que significa que são mais antigas. A floresta cresce para fora, portanto, as árvores mais antigas ficam no centro. E estamos subindo. Pense nisso. Nosso instinto natural seria descermos em direção à luz. Portanto, o que é que estamos procurando?

    Dylan amadurecera desde que eu o conhecera. Eu não. — Seja lá o que for, não quero saber. Vamos embora agora.

    — E se essa coisa estiver ferida? — perguntou ele.

    Segurei o braço dele para levá-lo de volta, mas ele resistiu. — Essa coisa vive na floresta, é durona. Deixe-a.

    Ele ainda hesitou. — Sou um Guardião. Protegemos os que precisam — retrucou ele.

    — O Guardião da Terra, não de Duran — argumentei. Puxei-o por alguns passos quando um grito alto de dor nos deixou imóveis. Eu conhecia aquele som. Já o ouvira antes... mas onde? O som me encheu igualmente de empolgação e terror, e nós dois corremos na direção dele.

    Logo encontramos o que procurávamos. No meio de uma clareira, estava uma criatura majestosa. Preto como a noite mais escura, grande e esbelto, ele tinha um formato reptiliano com uma cauda longa. Na ponta da cauda, havia um espinho afiado. Os olhos eram âmbar e o focinho era curto e largo. Ele tinha asas longas, uma delas batendo com agitação e a outra envolvendo o corpo de forma estranha. Ele rugiu de dor.

    Ele era um dragão, coisa que meu pai jurava que não existia. Durante toda a minha vida, eu quisera ver um.

    — Ele está ferido — disse Dylan. — A asa dele não devia estar dobrada daquele jeito. — Ele não hesitou e foi até o dragão, que recuou, protegendo a asa. — Cuidado, amigão, só quero ajudar. Como você me ajudou.

    — O quê? — perguntei.

    — Já encontrei esta criatura antes. Ele ajudou Divina, Kiro e eu na última vez em que estivemos aqui. Venha acariciar a cabeça dele enquanto verifico a asa.

    Aproximei-me do dragão com cuidado. Obviamente, eu ficara com a parte perigosa. Ah, bom. Na pior das hipóteses, descobrirei se sou um petisco gostoso de dragão. Ele deixou que eu me aproximasse e, quando estendi a mão, farejou-a antes de abaixar a cabeça para ser acariciado. O couro duro e cheio de escamas era coberto por um pelo curto, grosso e aveludado. Quando esfreguei as orelhas dele, o dragão ronronou. Foi incrível, até que ele soltou o ar alegremente e jogou-me no chão. Seu hálito fedia. Ele se inclinou para a frente e esfregou a cabeça no meu peito.

    — Ah, merda — disse Dylan.

    O dragão e eu olhamos para ele. A asa estava estendida e ainda em um ângulo estranho, mas consegui ver o motivo: havia marcas de garras enormes nela. A pobre fera fora atacada. Shinobu saiu do ombro de Dylan, sem querer nada com o dragão.

    O dragão puxou a asa, mas Dylan não a soltou. Quando começou a ficar agitado, virei a cabeça dele. — Está tudo bem. Dylan quer ajudar. Concentre-se em mim. Olhe para mim. — Ele parou de rosnar, mas soltou um ar horrível devido à irritação. Acariciei a cabeça e o pescoço dele enquanto Dylan curava as feridas. As mãos dele estavam sobre os cortes e emitiam um brilho verde suave. Logo, ele parou. Porém, apesar de os cortes estarem fechados e a asa estar em um ângulo melhor, ainda estava machucada.

    — Isto é tudo que consigo fazer por enquanto — disse Dylan, cambaleando e sem fôlego. Eu o segurei quando ele caiu e arrastei-o até uma árvore para que se sentasse. Shinobu se aconchegou no colo dele.

    — Então, teremos que levá-lo conosco?

    — Não. Ele não consegue se deslocar. Mas não entendo. Eu o vi ser atacado antes e não ficar ferido. O couro dele é muito duro. O que poderia ter feito isso?

    — Talvez a parte de dentro das asas seja mais macia — sugeri.

    — Não sei. Teremos que ficar aqui para curá-lo.

    Olhei em volta. O sol estava se pondo e não gostei do silêncio. — Sobreviveremos à noite?

    Ele se esforçou para não desmaiar. — Claro que sim. Pode pegar um pouco de madeira para fazer uma fogueira? — pediu ele.

    Assenti e afastei-me para fazer isso. Apesar da escuridão, consegui reunir um pouco de madeira seca. Voltei para a clareira e encontrei Dylan dormindo e o dragão estudando-o. — Como está sua asa? — perguntei.

    O dragão flexionou a asa um pouco e considerou-a, pensativo. Consegui perceber, pelo cheiro, que ele estava contente, apesar de estar ferido. Coloquei a madeira em uma pilha, absorvi energia e fiz como meu pai me ensinara. A madeira se recusou a pegar fogo. Quanto mais eu pensava no meu pai, mais minhas entranhas queimavam, mas o fogo não surgia. Depois de algum tempo, percebi que o dragão me olhava confuso.

    — Pode me ajudar aqui? — perguntei. Ele abaixou a cabeça e soprou um pouco de fumaça na lenha, que pegou fogo. Por que isto é familiar? — Obrigado. — Puxei Dylan para mais perto do fogo.

    Eu sentia que já tinha encontrado o dragão antes. Por que pareceu que ele estava me mostrando como fazer quando ateou fogo na madeira?

    Meu estômago roncou, quebrando o silêncio, e o dragão rosnou de volta. — Shhh. Quando Dylan acordar, vou caçar. O que você come? — perguntei. Em vez de responder, ele olhou para o céu.

    Depois de alguns minutos, ele soprou um jato de fogo concentrado diretamente para cima com precisão. Houve um grito, seguido de um barulho surdo não muito distante da clareira. Uma busca rápida mostrou um pássaro grande chamuscado no chão. Eu o levei para a clareira e ofereci-o para o dragão, mas ele virou a cabeça.

    — Obrigado — disse eu. Peguei a faca que estava no saco, cortei um pedaço para Dylan e outro para mim, e joguei o restante do pássaro para o dragão, que o pegou no ar e engoliu-o inteiro. Encontrei um graveto longo com o qual assar os pedaços do pássaro.

    Dylan acordou no momento em que a carne ficou pronta. Ele me agradeceu e pegou seu pedaço. Comemos em silêncio por algum tempo.

    — Como estão as coisas entre você e Divina? — perguntei.

    Ele deu de ombros. — É complicado, mas nós nos amamos.

    — Não o suficiente para se casarem e terem filhos?

    Ele engasgou com a comida. — Como eu disse, é complicado.

    — Porque ela não é sago? — perguntei. Ele me encarou com os olhos arregalados e eu suspirei. — Dylan, você confia em mim. Você me contou sobre os livros, os deuses, seu mundo, seu pai... tudo, exceto quem é Divina. Eu sei que ela não é quem aparenta ser. Ela tem cheiro de ser mais poderosa do que qualquer outra pessoa que conheci.

    — Não é um segredo meu que eu possa contar.

    — Isso tem a ver com o motivo de ela estar sumida e você não a estar procurando? — perguntei. Ele assentiu. — Bom, se precisar de ajuda quando for procurá-la, pode contar comigo. Quanto tempo demorará para curar o dragão?

    — Curei os ferimentos imediatos. Ele não consegue voar, mas não está mais sangrando. Também consertei os ossos quebrados e as infecções. Ele provavelmente está assim há uma semana. Duvido que tenha comido alguma coisa desde que se feriu. Divina me disse que os dragões não conseguem comer nem beber nada quando estão gravemente feridos porque precisam regular o corpo para combater a infecção e a perda de sangue.

    — Ele matou um pássaro quando você estava inconsciente, mas recusou-se a comer até que cortei uma parte para nós. Por que ele faria isso se passou tanto tempo sem comer?

    — Ele é gentil.

    — Os dragões são raros. A maioria das pessoas acredita que eles estão extintos e consigo entender o motivo. Esse cara poderia voar sobre a cidade mais movimentada à noite e permanecer sem ser visto. O couro deve repelir a água, mas o formato das asas tornaria difícil nadar. O formato das pernas é perfeito para mergulhar no ar ou na água, mas ele não plana pelo mesmo motivo pelo qual não nada.

    — Como você sabe tanto sobre dragões?

    — Eu acredito neles. Há muitas informações para qualquer um disposto a procurá-las. Sempre fui fascinado por eles. Meu pai, por outro lado, odeia tudo que tem a ver com eles e insiste que não existem.

    — Você não pode odiar algo em que não acredita. Agora, há mais um deles que não morreu. Pela manhã, teremos que encontrar água para ele.

    — E se o atacante dele voltar?

    — Ele vai voltar.

    — O quê? — perguntei, levantando-me. A cabeça do dragão também levantou depressa.

    — Posso sentir, ele está em perigo. Não consegue sentir o cheiro? — perguntou ele. Ele sabia sobre o meu senso agudo de olfato.

    — Não. Consigo sentir o cheiro da floresta, do dragão e o seu. Você não está com cheiro de assustado.

    — Eu disse que o atacante voltaria, não que ele está aqui agora.

    Eu me sentei. — Quando eu o conheci, você era a pessoa mais paranoica no planeta. Qualquer coisa que pudesse dar errado, daria. E, ainda assim, você fazia o que tinha que fazer.

    — Não sou mais tão paranoico. Passei tempo demais morando com Divina e Kiro.

    — Por que você parou de chamá-lo de Edward? — perguntei.

    Ele deu de ombros. — Não sei. Acho que foi quando ele parou de ficar tanto por perto. Agora, ele é mais como um pai para mim do que um tio ou mentor e tenho certeza de que pensa em mim como um filho. Kiro nunca se sentiu confortável como pai. Receio que um dia ele leve outro aprendiz para casa e diga-me para morar com Divina. Só faz três anos, mas aprendi muito. Talvez demais.

    Bati de leve nas costas dele. — Você conversou com ele sobre isso?

    — Não. Ele sempre sai em missões e deixa-me com Divina.

    — Talvez o problema não seja o que ele sente em relação a você. Talvez ache que você não precisa mais dele ou que ficará melhor sem ele, que só está atrapalhando.

    — Mas isso é uma bobagem. Mesmo sem lições de magia, aprendi lições de vida com Kiro o tempo todo. De Divina, só aprendo história e fatos.

    — Quando você começou a chamá-lo de Kiro? — perguntei novamente. — Por que você o chamava de Edward? Não era seu nome especial para ele? Eu ficaria bem triste se meu futuro filho me chamasse por um apelido durante toda a infância e subitamente parasse.

    Ele pensou por um tempo. Antes que ele achasse algo a dizer, peguei no sono.

    *      *      *

    Acordei com uma vista que nunca teria esperado: o rosto furioso de um dragão a poucos centímetros do meu. O dragão que Dylan começara a curar na noite anterior estava parado sobre mim com as asas abertas no que parecia uma posição de ataque. Quando ele rugiu, mostrando os dentes afiados e deixando-me temporariamente surdo, tentei rastejar para trás. Para minha surpresa, foi Dylan, que estava deitado ao meu lado, que me segurou. Dylan tentou dizer algo, mas o rugido seguinte do dragão abafou suas palavras.

    O dragão virou a cabeça para lançar um jato de fogo sobre o ombro. Subitamente, algo surgiu à frente dele e atacou seu pescoço. Ele foi jogado para longe de nós e vi o que realmente estava acontecendo: estávamos sendo atacados.

    Duas criaturas atacaram o dragão de forma impiedosa. Elas tinham a altura de um draxuni, mas eram muito mais esbeltas. Um pelo preto cobria o corpo. A cabeça era curta, com olhos vermelhos sólidos e focinhos largos, cheios de presas tão grandes e afiadas que mal cabiam em sua boca. As orelhas eram pontudas, no topo da cabeça de forma muito parecida com as de um draxuni e estavam achatadas por causa da raiva. As criaturas tinham asas pretas de couro grandes, similares às do dragão. Por algum motivo, as asas eram mais assustadoras naqueles seres.

    Uma das feras tentava se agarrar no pescoço do dragão com os dentes, enquanto a outra atacava a asa ferida dele. O dragão tentou de forma fiel nos proteger, apesar de Dylan agora estar esforçando-se para participar da luta. As criaturas forçaram o dragão a cair de costas para rasgar a barriga dele. Em um instante, o ar passou de quente e úmido para frio e seco. Primeiro uma, depois a outra criatura caiu, contorcendo-se de dor. Dylan tinha uma expressão de concentração feroz no rosto.

    — O que você está fazendo? — perguntei.

    Ele se encolheu. — Não fale.

    O dragão soltou um grito e Dylan estremeceu. As duas criaturas pararam de se contorcer, levantaram-se e rapidamente desapareceram na floresta. Dylan caiu sobre o dragão, estendendo a mão para o pescoço rasgado da criatura, mas o Guardião só conseguiu emitir um brilho verde muito leve.

    — Venha cá — pediu ele ofegante.

    Quando me aproximei, ele pegou a minha mão. Instantaneamente, senti-me exausto, como se tivesse participado da batalha. Apesar de o encontro ter durado apenas alguns minutos, parecia que durara horas. O brilho verde explodiu em um fogo estranho e o dragão suspirou, relaxando. As feridas do dragão começaram a fechar enquanto eu me sentia cada vez mais tonto. Dylan e o dragão desmaiaram. Eu tive tempo suficiente para me sentar antes de também desmaiar.

    *      *      *

    Acordei muito confortável com o som do fogo e o cheiro de comida.

    — Acorde — disse Dylan insistentemente.

    Eu teria rosnado para ele se meu estômago não tivesse escolhido aquele instante para roncar. Absorvi o calor e abri os olhos. Eu não sabia que dragões gostavam de se aconchegar, mas aquele estava enrolado à minha volta, com a perna sobre mim. Olhos grandes piscaram para mim como se perguntassem quando eu me levantaria. Aconcheguei-me ainda mais sob a perna dele.

    — Ora, levante-se. Você precisa comer e depois precisamos lavar o sangue do dragão de nós para não chamarmos a atenção.

    Tirei a pata do dragão de cima de mim e vi que eu realmente estava coberto de sangue. Foi horrível. — Como isto aconteceu? — perguntei. O dragão colocou a pata novamente sobre mim e deitou a cabeça.

    — As criaturas o atacaram por cima de nós e ele perdeu muito sangue. Ele precisa beber um pouco de água, portanto, apresse-se e coma. — Dylan me entregou um graveto com carne assada. Dei uma mordida e fiquei imóvel, sem saber se mastigava ou cuspia. — Eu sei que é estranha. Não faço ideia de que mamífero pequeno era aquele, apenas coma — exigiu ele.

    Comi a carne com textura estranha de réptil, gosto de crustáceo e cheiro de molusco.

    — Faz alguma ideia do que eram aquelas criaturas? — perguntei.

    Dylan balançou a cabeça negativamente. — Nunca vi nem ouvi falar de nada parecido. Sei que há muitas criaturas nesta floresta que ainda não foram descobertas, mas aquelas pareciam um pouco míticas.

    O dragão roncou.

    *      *      *

    Depois de engolir a comida, fomos em direção ao som de água corrente. O dragão parecia curado e andou conosco de forma graciosa. As asas estavam seguramente dobradas contra as costas, mas estremeciam nervosamente sempre que ouvíamos um ruído particularmente alto. Chegamos à água sem perder nenhum pedaço do corpo, apenas um pouco de sangue quando Dylan confundiu uma árvore thesper com uma árvore inocente.

    — Se tem cor de sangue, é melhor evitar — aconselhei.

    — Está com um pouco mais de cor de sangue agora — gemeu ele. — Desculpe se perder meu sangue é inconveniente para você, mas as árvores não atacam ninguém com espinhos na Terra.

    O rio estava calmo e não parecia muito fundo. Dylan e eu tiramos a roupa enquanto o dragão pulava na água. Como era meio-dia e a clareira recebia muito sol, estava quente o suficiente. Eu odiava banhos frios.

    — Ei, quando foi que você fez uma tatuagem? — perguntou Dylan.

    — Uma o quê?

    — Uma pintura na pele.

    — Eu sei o que é uma tatuagem. Só que não tenho nenhuma — insisti.

    — Bem, então... é uma marca de nascença muito legal que você nunca teve antes. — Ele olhava intensamente para a parte de trás do meu ombro esquerdo.

    Tentei ver do que ele estava falando, mas só consegui ver uma mancha verde-esmeralda. — Ah, não. Provavelmente é um tipo de infecção de alguma coisa nesta floresta.

    — Sim, claro, uma infecção no formato perfeito de um dragão.

    — Sério? — Tentei olhar de novo, mas, desta vez, não consegui nem mesmo ver o verde. Fui interrompido por um rugido irritado, parecido com um latido, e olhei para o dragão que nos aguardava impacientemente. Dylan e eu entramos na água, que fluía calmamente e chegava à altura da cintura. — Limpe-se, lagarto. Você está fedendo — menti.

    Um bufar estranho foi o único aviso antes de cair uma chuva de gotas de água. Virei-me para o dragão e limpei os olhos a tempo de vê-lo encher a boca de água novamente e jogá-la em mim. Dylan caiu de tanto que gargalhava.

    Não demorou muito para que o cheiro do sangue do dragão desaparecesse e houvesse um novo cheiro.

    Este era um cheiro malicioso, um cheiro faminto. Alguma coisa nos observava e consegui sentir o cheiro de sua ansiedade. Consegui determinar a direção de onde vinha o cheiro. O dragão e eu nos viramos para olhar ao mesmo tempo. Dylan percebeu nossa hesitação. A criatura lentamente rastejou para fora da cobertura das árvores.

    Era um hinerpeton, uma das menores espécies de anfíbios. Como todos os anfíbios esse era carnívoro, rápido e tinha mandíbulas fortes cheia de dentes afiados. Faixas verdes e pretas largas cobriam a pele gosmenta. As cerdas venenosas em volta do pescoço estavam erguidas em advertência.

    — Se um humano visse um axolote com dois metros de comprimento, surtaria. Mas este é menor que qualquer anfíbio que já vi em Duran. É melhor irmos embora.

    Shinobu, que estivera enrolada sobre as roupas de Dylan, sibilou, mas a fera obviamente não tinha ideia de com o que estava lidando. Infelizmente, quando a fera não fugiu de Shinobu, ela recuou até a beira da água e olhou para Dylan como se estivesse perguntando o que fazer. Dois outros hinerpetons surgiram ao lado do primeiro. Eles eram mais rápidos que nós e estavam com muita fome.

    — Vão embora! — gritei. Ergui os braços e acenei. — Sou maior e mais barulhento que vocês! Vão embora!

    Dylan se juntou a mim. — Para trás! A última coisa que tentou me comer teve uma intoxicação alimentar! — gritou ele. Os hinerpetons hesitaram, confusos.

    Olhei para o meu amigo humano. — Divina ficou...

    — Cale a boca — interrompeu Dylan, sem cair na armadilha.

    O dragão recuou sobre as pernas traseiras e soltou um rugido ensurdecedor. Ele bateu as asas e agitou as pernas da frente na água, criando ondas grandes. Ele exibiu o espinho da cauda sobre a cabeça em uma posição de ataque. Infelizmente, o hinerpeton mais à esquerda, concentrado em Shinobu, avançou lentamente sobre a criaturinha. Mesmo que o veneno dela afetasse o anfíbio, ele conseguiria causar danos. E, com a água atrás dela, Shinobu estava presa.

    O dragão correu até o predador, lançando-se para fora da água, até ficar protetoramente sobre o animalzinho de estimação de Dylan. Felizmente, os anfíbios deviam ter decidido que eram uma refeição mais fácil que nós e foram embora.

    — Ótimo. Lá vão eles, fugindo dos monstros maiores que acabamos de atrair com o barulho — comentou Dylan. O dragão pensou o mesmo e rapidamente desapareceu na floresta. Depressa, nós nos vestimos para segui-lo.

    — O dragão está forte o suficiente para voar? — perguntei.

    Tivemos que correr para acompanhar a fera preta. As asas dele estavam contra as costas, o que o deixava extremamente ágil. Apesar do corpo em formato de réptil, ele se movia como um mamífero, saltando sobre os objetos no chão.

    — Sim, mas aquelas coisas que o atacaram ainda estão por aí. E isso é estranho. Nunca ouvi falar de criaturas como aquelas. Não gosto disso. Por que elas atacaram o dragão?

    — Precisamos dar um nome para ele — interrompi.

    — Pergunte a ele qual é o seu nome —disse Dylan.

    — O quê? Não falo a linguagem dos dragões.

    — Então vamos chamá-lo de Sangue. Eu sempre quis um cachorro chamado Sangue — disse Dylan. Apesar de falar fluentemente sudo, ele disse o nome do dragão em seu idioma natal.

    — Estou errado nas minhas aulas de linguagem ou isso significa...

    — Ah, sim, é sangue em inglês. Contei a você sobre cachorros, certo?

    — Sim, os pequenos caninos que são animais de estimação muito fiéis. Eles parecem os draxunis. Por que diabos você quer chamar um deles de Sangue?

    — É um nome adequado para um cachorro psicótico que comeria com prazer a última mulher na Terra.

    Parei e segurei o braço dele. — Por favor, diga que está falando de um de seus filmes da Terra. Não consigo acompanhar quando você começa a falar assim.

    — Não vejo um filme há três anos. Sinto falta deles. Além do mais, ser muito confuso é um mecanismo de defesa muito bom.

    O dragão nos lançou um latido muito irritado e cutucou as minhas costas, quase jogando-me no chão. Nós o seguimos rapidamente até outra clareira com um laguinho. Além dele, havia uma bela montanha de rochas vermelhas.

    — Ahm, bom, isto não é bem o que se esperaria ver no meio de uma floresta de monstros — disse Dylan. Tive que concordar com ele.

    O dragão bateu as asas uma vez antes de levantar voo por cima do lago. Demos a volta no lago, mas ele voou novamente em direção à montanha. Ele nos esperou na boca de uma caverna e, quando entrou, nós o seguimos com cuidado. Apesar de a entrada da caverna ser seca e simples, quanto mais fundo íamos, mais fascinante ela ficava.

    O ar e as paredes ficaram mais úmidos. Depois de escorregar pela terceira vez, Dylan fez uma tocha com um graveto e um pedaço da camisa dele. A água escorria pelas paredes e havia algumas plantas. Porém, o que se projetava das paredes eram pedras preciosas. As paredes brilhantes vermelhas, verdes e roxas tornavam a caverna bem apropriada para que um dragão se escondesse. Finalmente, chegamos a uma câmara formada naturalmente. No centro, estava um leito de rochas chamuscadas.

    O dragão rapidamente lançou fogo nas rochas e enrolou-se sobre elas para tirar um cochilo antes que o fogo apagasse.

    — Sério? — perguntou Dylan ao dragão. — Foi para isso que viemos aqui? Para um cochilo?

    O dragão bufou para ele e deitou de novo.

    — Cachorro idiota — comentou Dylan.

    Ignorei a imprecisão. — Pelo menos, estamos seguros aqui. Acho que devíamos chamá-lo de Miyo.

    O dragão e Dylan me olharam com revolta. — Claro que não — disse Dylan. — O nome dele é Sangue.

    O dragão deitou a cabeça novamente.

    Derrotado, deitei ao lado do dragão. A pedra estava quente e agradável. Eu estava olhando quando Dylan abriu a boca para falar antes de desmoronar, mas não consegui segurá-lo antes que batesse no chão. Temendo o pior, tentei freneticamente acordá-lo enquanto o dragão observava sobre o meu ombro, mas Dylan não se mexeu. Depois de verificar que ele estava respirando, sentei-me para esperar.

    Capítulo 2

    Dylan

    Eu não estava acordado, mas também não estava dormindo. A comparação mais próxima que eu podia fazer era com o que achava que seria a morte. Eu me vi na casa de Divina, mas tudo estava errado. Não havia ar entrando pela janela aberta, o aroma do incenso que queimava sempre nem mesmo os sons da floresta. Era uma sensação muito inquietante que eu nunca mais queria sentir de novo.

    — Olá, Dylan. Desculpe por ter que falar desta forma, mas preciso de você como o meu Guardião agora.

    A voz estava errada. Era a dela, mas não era, como uma lembrança de sua voz. As palavras, por outro lado, eram muito reais na minha mente.

    — Divina? — perguntei. — Onde você está?

    Longe. Eu me vi em uma previsão muito confusa. Preciso entender uma coisa. Enquanto isso, há problemas na Terra. Você precisa ir até lá e resolvê-los.

    — E Kiro?

    Ele está resolvendo outras obrigações de Guardião.

    — Ele está seguro? — perguntei.

    Um Guardião nunca está seguro de verdade.

    — O que vou fazer na Terra?

    Houve uma onda quando Vretial foi destruído. Os deuses não devem morrer. Alguma coisa mais antiga que os mundos encontrou um jeito de entrar. Alguma coisa que não deveria existir conseguiu passar por uma fissura. E eu sinto muito. Sinto muito mesmo. Mas não podemos derrotá-la.

    — Os deuses não conseguem matar essa coisa?! — exclamei.

    Ela é tão antiga quanto nós. Você tem uma vantagem a seu favor.

    — E qual é?

    Você tem uma forma física e magia. Essa criatura não é viva, mas consegue controlar qualquer ser vivo, exceto um viajante dimensional.

    — Então, como viajei para Duran, estou seguro?

    Seguro não, mas ela não consegue controlar o seu corpo. Ainda consegue matá-lo, só não consegue controlá-lo.

    — Como devo matá-la? — perguntei.

    Você não consegue matá-la.

    — Então o que devo fazer, convidá-la para um chá?

    Traga de volta o que foi perdido.

    — Uma arma?

    — Uma criança.

    — Ai, deuses. Então há uma criatura antiga na Terra matando pessoas e, em vez de detê-la, tenho que encontrar uma criança?

    Essa criatura precisa encontrar um corpo adequado. Porém, por ser tão poderosa, precisa assimilar o corpo de uma criança. Não é uma criança humana, mas uma muito especial. Somente ela é poderosa o suficiente para conter a criatura, que só consegue assimilar quando a alma é jovem o suficiente para ser morta. Você precisa tirar essa criança da Terra. Quando fizer isso, a criatura não terá opção além de retornar pela fissura.

    — E se eu fracassar?

    Aí você não será mais necessário, pois não haverá mais a Terra para defender. Nem Duran.

    — Então, sem pressão nenhuma. Até mesmo o Doutor tinha companheiros. Posso ter alguém para me ajudar? Há algum outro Guardião por aí disposto a entrar nessa?

    Eles irão quando puderem. Mas você tem Mordon.

    — Mordon? Ele mal chegou à idade adulta! Poderia ser morto!

    Todos nós morreremos se você fracassar. Ele não é o que parece. Ele recebeu uma segunda vida.

    — Da mãe dele? Ele me contou que a mãe lhe deu a magia dela.

    Não é dessa vida que estou falando. Ele pode ajudar você.

    — Não concordo, mas aceitarei sua palavra sobre o assunto. Como encontro a criança?

    Lembra-se da mulher que você deixou na Terra?

    — Vivian?

    Ela é a mãe.

    — O quê?! Que merda... — Obviamente, eu tinha que me preocupar.

    Você não é o pai, seu tolo. Não é poderoso o suficiente para ignorar as leis da física.

    O

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