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Tratado de Direito Internacional - Direito dos Espaços: Tomo 1 - Conceitos Basilares, Domínio Terrestre, Fluvial e Marítimo
Tratado de Direito Internacional - Direito dos Espaços: Tomo 1 - Conceitos Basilares, Domínio Terrestre, Fluvial e Marítimo
Tratado de Direito Internacional - Direito dos Espaços: Tomo 1 - Conceitos Basilares, Domínio Terrestre, Fluvial e Marítimo
E-book1.248 páginas18 horas

Tratado de Direito Internacional - Direito dos Espaços: Tomo 1 - Conceitos Basilares, Domínio Terrestre, Fluvial e Marítimo

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Sobre este e-book

Esta obra apresenta o tratamento jurídico internacional das várias dimensões do território, nos seus âmbitos terrestre, marítimo, aeronáutico, bem como no tratamento legal do espaço exterior. Reflexões centrais para a compreensão da matéria, tais como a mutação das fronteiras, a relação destas com a soberania, a extensão da extraterritorialidade e da licitude desta, a condição dos espaços comuns, de "terra de ninguém" até a emergência dos conceitos de patrimônio comum da humanidade, a ligação entre território e identidade cultural, foi escrito para ser usado, como base segura para o exame e a compreensão da dimensão espacial do direito internacional pós-moderno, obra didática, para atender parte da responsabilidade no ensino da matéria.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento1 de abr. de 2022
ISBN9786556275086
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    Tratado de Direito Internacional - Direito dos Espaços - Paulo Borba Casella

    TÍTULO PRELIMINAR: CONCEITOS BASILARES

    O território se compõe da extensão de terra e de água, que depende exclusivamente do poder supremo do estado. A soberania política, considerada em relação ao território, tem o nome de soberania territorial. Esta se manifesta pela dominação que exerce sobre território determinado e sobre tudo o que aí se encontre. Quidiquid est in territorio est etiam de territorio.

    Fiodor de MARTENS (1883)⁴⁰

    Historicamente, as bases territoriais do estado são o fundamento da ordem política e jurídica, nascida no século XVI, e que foram definitivamente consagradas, na Europa, pelos tratados de Vestfália. O lugar essencial, que o território ocupa na organização estatal, sua significação, altamente simbólica, explicam a propensão dos autores bem como da prática internacional, se não a identificar o território com o estado, ao menos a considerar sua delimitação espacial como inseparável daquela da soberania.

    C. de VISSCHER (1953)⁴¹

    Parte-se da premissa de que espaços se constroem, ao mesmo tempo, como dados de fato e como dados de direito: por isso a importância de situar, preliminarmente, conceitos basilares, cujo conteúdo se fará presente e necessário para todo o ulterior desenvolvimento do trabalho. Embora tautologicamente a base física, sobre a qual determinado povo constrói o estado (povo-território-governo), a significação do território não é somente dado físico, mas vai muito além deste.

    Dentre os dados para a caracterização do território do estado exsurge a questão da soberania, e esta, simultaneamente, se põe como fenômeno interno da política, mas também é dado inexorável da política, do direito e das relações internacionais⁴². E, perfazendo a interação entre os temas⁴³, da conceituação da soberania se há de voltar para a base física, sobre a qual esta seja exercida: o território. Ambos serão, nesse propósito, considerados.

    Na sentença arbitral de 7 de setembro de 1910, a Corte permanente de arbitragem, ao decidir o caso das pescarias do Atlântico norte, entre a Grã-Bretanha e os Estados Unidos considerou: um dos elementos essenciais da soberania é que esta deve ser exercida nos limites do território e, na falta de prova contrária, o território tem os mesmos limites que a soberania.⁴⁴ Seguindo tal entendimento, se faria coincidir a extensão física e a extensão política da soberania do estado, ‘equiparada’ ao seu território.

    Ainda Fiodor de MARTENS (1883)⁴⁵: não é preciso demonstrar que a existência de território, bem como da soberania exclusiva de nação determinada sobre esse território, são condições indispensáveis para a própria existência do estado. Se tais condições não estiverem preenchidas, e se não existem cidadãos para povoar esse território o estado não é mais do que uma palavra vã, e permanece, por conseguinte, fora do direito internacional.⁴⁶

    Este título preliminar compreende, assim, os capítulos I a IV, que vão da ‘evolução do conceito e do tratamento do território no direito internacional’, a ‘soberania e território do estado’, com estudo de dois casos da relação entre ‘soberania e território’: um clássico, ‘a Santa Sé e o estado do Vaticano’ (2.1.), e outro, recente e controvertido, o ‘Hezbollah no Líbano’ (2.2), antes de examinar a questão da contraposição entre ‘legalidade e efetividades: título jurídico em contencioso territorial’, no capítulo 3 e as ‘competências territoriais do estado’, no capítulo 4.

    A seguir se passa ao exame da evolução do conceito e do tratamento do território no direito internacional (capítulo 1).


    ⁴⁰ Fiodor de MARTENS, Traité de droit international (1882, trad. du russe par Alfred LÉO, Paris: Librairie Marescq, 1883, 3 vols., vol. I, partie générale, chap. III ‘le territoire de l’état’, p. 451-509, cit. p. 451): «Le territoire se compose de l’étendue de terre et d’eau qui dépend exclusivement du pouvoir suprême d’un état. La souveraineté politique, considérée par rapport au territoire, prend le nom de souveraineté territoriale. Celle-ci se manifeste par la domination qu’elle exerce sur un territoire déterminé et sur tout ce qui s’y trouve. Quidiquid est in territorio est etiam de territorio

    ⁴¹ Charles de VISSCHER, Théories et réalités en droit international public (Paris: Pedone, 1953, ‘le territoire dans les rapports internationaux’, p. 239-267, cit. p. 239): «Historiquement les assises territoriales de l’état sont à la base de l’ordre politique et juridique né au XVIe. siècle et qu’ont définitivement consacré en Europe les traités de Westphalie. La place essentielle que le territoire occupe dans l’organisation étatique, sa signification hautement symbolique expliquent la propension des auteurs aussi bien que de la pratique internationale sinon à identifier le territoire avec l’état, du moins à envisager sa délimitation spatiale comme inséparable de celle de la souveraineté.»

    ⁴² E. N. van KLEFFENS, Sovereignty in international law (RCADI, 1953, t. 82, p. 1-132).

    ⁴³ O. J. LISSITZYN, Territorial entities other than independent states in the law of treaties (RCADI, 1968, t. 125, p. 1-92).

    ⁴⁴ C.P.A., affaire des pêcheries de l’Atlantique nord (Grande Bretagne – États Unis, 7 septembre 1910, p. 164).

    ⁴⁵ Fiodor de MARTENS, Traité de droit international (1882, trad. du russe par Alfred LÉO, Paris: Librairie Marescq, 1883, 3 vols., vol. I, partie générale, chap. III ‘le territoire de l’état’, p. 451-509).

    ⁴⁶ F. de MARTENS (op. cit., 1882, trad. fr. 1883, v. I, chap. III, p. 451-452) prossegue: «Il résulte de la définition de territoire qu’il comprend non seulement la terre ferme, mais les mers, les lacs et les fleuves qui dépendent du même pouvoir souverain. La composition d’un territoire peut différer sous certains rapports. (...) Cela ne change rien au principe que toutes les possessions territoriales d’un état, en quelque pays qu’elles se trouvent, sont considérées en droit international comme un tout.» O dado que conferirá, assim, unidade (política) ao conjunto (humano e físico) será a soberania: «C’est à la souveraineté territoriale qu’appartient exclusivement la domination dans toute l’étendue de ses possessions.»

    CAPÍTULO 1

    EVOLUÇÃO DO CONCEITO E DO TRATAMENTO DO TERRITÓRIO NO DIREITO INTERNACIONAL

    Não existe interrogação mais antiga que a relativa ao espaço.

    D. ALLAND (1987)⁴⁷

    Embriaguez dessa história única: quando as terras, os mares, os arquipélagos ainda não tinham sido encerrados em suas fronteiras, que os homens eram livres e cruéis como os pássaros marinhos, e que as lendas ainda pareciam infinitamente abertas.

    J. M. G. le CLÉZIO (1986)⁴⁸

    Elemento constitutivo do estado, ao lado de povo e da ocorrência (de modalidade mais ou menos organizada) de governo, o território representa a base física, ou porção da superfície do globo terrestre, sobre a qual cada estado exerce dominação exclusiva, ou o conjunto de direitos, normalmente enfeixados sob a rubrica da soberania⁴⁹. O estado se define, fisicamente, pela sua territorialidade. E esta se define pelo espaço, sobre o qual o estado exerce o conjunto de poderes, normalmente enfeixados sob a denominação de soberania.

    Existe relação direta entre o território do estado e a soberania deste mesmo estado, que ali se exerça: as competências do estado se exercem como competências territoriais. Nas suas respectivas esferas e domínios.

    O estado territorialmente delimitado não é somente modelo físico, mas cultural. E histórico.

    SÊNECA⁵⁰ enfatizava caber ao interesse público o domínio e ao particular a propriedade.⁵¹

    Esta ideia se projeta, nos primórdios do direito internacional, como a tentativa de distinguir o domínio eminente, que competiria ao estado, como antes ao soberano, em relação ao título do particular, que revestiria a condição de titular de direitos de propriedade. Assinale-se, mas não se conserve esta distinção, em boa medida pode ser considerada obsoleta, mas poderia refluir na configuração de interesse público, que se sobreponha aos do particular, inclusive para possível desapropriação, decorrente de imperativo, determinado pela coletividade, que se sobreponha ao interesse e aos direitos do particular.

    Ainda Henry WHEATON (1836, ed., 1858)⁵² a menciona: o direito exclusivo de cada estado independente sobre seu território e a seus outros bens é fundado sobre o título originariamente estabelecido pela ocupação, a conquista ou a cessão, e posteriormente confirmado pela presunção que resulta do lapso de longo espaço de tempo, ou por meio de tratados e outros acordos com estados estrangeiros e especifica esse direito exclusivo compreende os bens públicos ou domínio do estado, e todos os bens que pertencem aos particulares, e que se encontram incorporados no território do estado.⁵³

    A relação se põe entre espaço e poder. Por isso cabe falar em modelo de estado territorial. Modelo esse corrente, na ordenação espacial e política do mundo, mas não o único, o estado territorial. Durante séculos, não foi a tônica da gestão estatal dos territórios a espacialidade estrita. Outros parâmetros foram, antes, e ainda podem vir a ser experimentados. Como se percebe, ante as mudanças em curso⁵⁴, no tempo presente.

    Tendemos, hoje, a considerar estado somente quando ocorre a formação, sobre território claramente delimitado, da organização soberana de um povo, observava Walter SCHOENBORN (1929)⁵⁵: a condição do estado, no sentido atual, está, assim ligada à condição prévia da residência fixa do povo do estado.⁵⁶

    A condição de povo pode subsistir sem território. Território exprime a dimensão espacial, na qual se encontra instalada e vive aquela parcela da humanidade, que se identifica como habitante da base física de determinado estado, a população instalada, em caráter mais ou menos sedentário⁵⁷, em determinado território. Ao mesmo tempo em que o território é dado físico, este se constrói como conceito jurídico. E os seus desdobramentos se põem tanto nos respectivos planos internos dos estados, como também no plano institucional e normativo internacional.⁵⁸

    A territorialidade do estado não é conceito unívoco. A sua espacialidade se compreende, também, como temporalidade: a noção de espaço, enquanto modelo de ordenação deste, está vinculada ao tempo, ao contexto político, logicamente, mas antes contexto econômico, e também contexto cultural, no qual emerge e se consolida o modelo de estado territorial. E este modelo se vê em processo de mutação, no contexto pós-moderno.

    A concepção do estado territorial pode ser temporal e culturalmente delimitada. Põe-se no fim da idade média e se inscreve em tempo de mudança, que representou considerável ruptura, à época, em relação aos modelos políticos e culturais, até então vigentes.

    Francisco de VITÓRIA rejeita a teoria que tivera curso, antes, como ainda teve, depois dele, segundo a qual o direito de cada estado sobre o seu território seria da mesma natureza que o do proprietário sobre os seus campos; na verdade, mais absoluto, porquanto nenhuma autoridade superior pode limitá-lo. Por isso se referiu, e se descartou, em seguida, a menção à configuração do assim chamado domínio eminente⁵⁹.

    Enquanto a maioria dos autores, do passado, como ainda em séculos futuros, insistirá sobre a independência das nações, VITÓRIA insiste na interdependência. Para ele existe e deve ser levada em conta a societas naturalis das nações: nas bases dessa sociedade, encontram-se, em estado latente, os elementos que serão os fundamentos das teorias das escolas de direito natural e das gentes: o estado de natureza, e o contrato social⁶⁰.

    O direito internacional, para VITÓRIA compreende as normas que a razão natural estabeleceu entre as nações: quod naturalis ratio inter omnes gentes constituit vocatur jus gentium – denomina-se direito das gentes aquilo que a razão natural instaura entre todos os povos. Essa antiga formulação mostra-se muito atual. E merece ser levada em conta.

    J. BARTHÉLEMY (1904)⁶¹ ressaltava quanto foi inovador o fato de VITÓRIA ter substituído da definição de jus gentium, contida nas Institutas,⁶² o termo gentes em lugar de homines⁶³: VITÓRIA se recusa a considerar o mundo habitado como amontoado inorgânico de nações isoladas, sem vínculo entre estas, não tendo, umas em relação às outras, nem direitos nem deveres, se não o direito absoluto para cada uma de se fechar em si mesma, e o dever para todas as demais de respeitar essa vontade. Por isso enfatizava a interdependência.

    Da ênfase na territorialidade estatalmente delimitada e exercitada, se passa, mais e mais à cognição da interdependência do gênero humano, sobre este geograficamente limitado planeta, e da necessidade premente de conservação dos recursos deste, passíveis de esgotamento, em razão de utilização predatória e inconsciente⁶⁴. Mas a regulação da matéria, pela grande maioria dos estados se ressente, todavia, dessa territorialidade que já ficou superada, pela história e pelo caráter funcional do território, em decorrência da crescente interdependência da humanidade no planeta.

    O contexto de transição do sistema internacional, aponta Karl ZEMANEK (1997)⁶⁵, leva à caracterização deste pela interrelação de três fatores: o rápido aumento da interdependência de seus membros produz novos conceitos, ameaças e desafios, que exigem com urgência normas para a sua gestão; a consciência do significado de tais desenvolvimentos para cada estado, enquanto a necessidade de assegurar tratamento comum de tais questões cresce muito mais lentamente; o cenário é completado pela relutância que se conserva, por parte dos governos, em assumir compromisso de ação política, para criar normas vinculantes para assegurar a gestão de tais necessidades".⁶⁶

    Em grande linha evolucional, poder-se-ia apontar que, ao mesmo tempo, o território ganha em extensão conceitual, e perde em determinação estrita. Amplia-se em extensão, mas torna-se mais ‘permeável’, menos coesamente ordenado.

    Dentre as questões centrais das relações interestatais, do direito e das relações internacionais se inscreve o território e seu tratamento jurídico⁶⁷. A regulação jurídica do território é tema tanto complexo quanto multifacetado. Pode ser considerado sib diversos ângulos. Ao mesmo tempo em que mostra a sua heterogeneidade: quantitativa e qualitativamente diversificado, reveste-se de valores e signifcações variadas. Aos dados físicos somam-se dados culturais. Estes podem se manifestar como categorias legais, quer de direito interno, como de direito internacional.

    Consolidado dentro dos limites de fronteiras reconhecidas, o estatuto territorial dos estados se apresenta, na ordem internacional, como situação objetiva, válida em relação a todos os demais estados, e que é particularmente aparente quando repousa, como se dá na maioria dos casos, sob a forma de posse, que constitui exercício contínuo e não contestado das funções estatais. Por isso, segundo ainda assim entendiam DECENCIERE-FERRANDIERE (1937)⁶⁸ e de VISSCHER (1953)⁶⁹, "esse aspecto objetivo não é menos manifesto onde o título da soberania procede da ocupação de terra sem dono, esse título, por sua natureza, estabelecendo aqui erga omnes e não na perspectiva de relações específicas entre certos estados. Ainda de VISSCHER (1967)⁷⁰: em sociedade na qual princípio algum presidiu à repartição das terras entre os homens, é o fato histórico que teria decidido a sua atribuição a determinado grupamento de seres humanos".⁷¹ A respeito da implementação das obrigações erga omnes no direito internacional, compare-se a lição de C. J. TAMS (2005)⁷².

    Passadas algumas décadas, à luz de desenvolvimentos recentes, a ocupação passa a ser conceito histórico.⁷³ Notável a evolução do direito internacional vigente, desde G. F. von MARTENS (1788, ed. 1858)⁷⁴.

    Em termos históricos, a atual configuração territorial, estatalmente norteada e delimitada, é dado a ser considerado, para a compreensão da regulação legal do espaço, ao longo do tempo: o modelo atualmente vigente não é o único possível. Jared DIAMOND (1997, 1999, 2005)⁷⁵ observa como, até por volta do ano de 1500, menos de 20% da total superfície terrestre do planeta estava marcada por fronteiras, com divisão em estados, regidos por burocratas e governados por leis.⁷⁶

    Atualmente, cabe indagar, se estaria em curso movimento inverso, tendente à deslocalização? Após o impulso rumo a delimitação geográfica estatalmente determinada, talvez se tenda a tornar algo mais flexível e fluida tal configuração? A criação de espaços comuns: de patrimônio comum da humanidade⁷⁷, ou matérias de interesse comum da humanidade buscariam refletir essas novas categorias legais e culturais?

    Do ponto de vista da espacialidade da política dos estados, ou do ponto de vista da análise teórica das normas, revela-se a dissociação entre o espaço sensível e o espaço jurídico. Mais do que essa dissociação, são as modalidades, nas quais esta opera, reveladoras de tensões, que marcam o conjunto do direito internacional pós-moderno.

    A evolução do tratamento do território, no direito internacional, é indispensável para a compreensão desta dimensão. Ao mesmo tempo em que evoluiu o direito internacional, como sistema e conteúdo normativo, desde o ‘direito internacional tal como era ensinado’,⁷⁸ no século transcorrido de 1850 até 1950, à emergência de novo direito internacional pós-colonial e pós-moderno: O direito internacional não poderia se permitir ignorar as mudanças que obravam em transformar o mundo. Ele evoluia, também, em ritmo que tinha, às vezes, dificuldade em seguir o das mudanças políticas. Novos campos se abriram a ele. Um direito das gentes novo, estava, de fato, em vias de nascer, dos fundamentos daquele que tinha sido ensinado, em nossa juventude, apontava, em curso na Haia, o embaixador da antiga Iugoslávia, D. NINCIC (1977)⁷⁹.

    Por isso CAVARÉ (1961, ed. 1973)⁸⁰ contrapunha ao direito internacional clássico a mutação em curso na sociedade internacional, e a necessidade de aparelhar o estudante para a compreensão dessa sociedade internacional em mudança: mais que nunca tenho a convicção que o direito, ao buscar a sua razão de ser nas necessidades sociais tem por fim regular os meios de as satisfazer nas sociedades humanas, como parte das ciências sociais. O ponto de partida do estudo do direito internacional deve ser, em boa lógica, o conhecimento da sociedade internacional.⁸¹ Falava CAVARÉ em quadro que subsiste, ao mesmo tempo em que a trama interna deste muda de espírito, sob pressão das transformações, ocorridas na sociedade internacional, que se refletem no direito internacional.⁸²

    A evolução do território, no direito internacional, pode ser considerada em relação a operações distintas como a delimitação e a demarcação de território, como se vai considerar⁸³. Assim, caberá distinguir o regime aplicável a montanhas, rios, lagos ou mares internos e ilhas, como dados dessa caracterização.

    A evolução do território, no direito internacional, traz, ao mesmo tempo, a multiplicação das facetas deste, e a crescente permeabilidade, ‘porosidade’ ou fluidez deste. A dimensão territorial, antes mais restrita e mais precisamente delimitada, permanece a referência para a caracterização do feixe de competências estatais, ditas soberanas, mas estas se conjugam com os imperativos da convivência institucional entre estados.

    O território do estado, segundo J. BARBERIS (1979 e 2000)⁸⁴, constitui capítulo importante do direito internacional e da teoria geral do estado: os países conferem importância toda especial a tudo o que diz respeito a seu território e os numerosos tratados internacionais que assinam, afim de delimitar de o delimitar de maneira precisa e detalhada é prova eloqüente dessa afirmação. Número considerável de sentenças judiciais e arbitrais determinam limites entre os territórios de estados vizinhos,⁸⁵ de tal modo que para precisar no que consiste o ‘território do estado’, é preciso efetuar análise da prática internacional e buscar saber qual o sentido atribuído a tal expressão⁸⁶.

    O conceito de território do estado está em relação direta com o de ‘soberania territorial’ e o fato de enunciar definição do ‘território do estado’ implica, em certa medida, dar, igualmente, definição desta. A soberania comporta, como referido, múltiplas acepções⁸⁷. E estas se veem tanto espacialmente quanto temporalmente condicionadas.

    O território, no direito internacional, pode ter seu conceito e conteúdo situados a partir da prática jurisprudencial e estatal, e estas, apesar de parecerem muito ricas e de coloração variada, permitem extrair princípios e determinar linhas gerais, para a condução da matéria. A Corte Internacional de Justiça, no julgamento do caso da plataforma continental no mar Egeu (1978)⁸⁸ ressaltou a caracterização da fronteira como a linha exata de encontro dos espaços onde se exercem respectivamente os poderes e os direitos soberanos dos estados.⁸⁹

    A questão da estabilidade das fronteiras é matéria recorrente. Isso se mostra particularmente sensível em nossos tempos, tanto nos acordos relativos à matéria, sejam estes bilaterais, como também ocorreu, por ocasião da Ata final de Helsonki, em 1975,⁹⁰ e tantas vezes ocorre, como valor a ser preservado, na jurisprudência internacional.

    O título jurídico nas controvérsias territoriais na ordem jurídica internacional se constrói no sentido de chegar a concepção unitária do conceito de título jurídico. A matéria comporta contraposição entre título enquanto conceito formal e razões históricas, ao lado da averiguação das assim chamadas efetividades⁹¹.

    A jurisprudência internacional considera não ser a noção de efetividade independente dos critérios geográficos, políticos, sociais e culturais. Para A. MEYER-HEINE (1998)⁹², o grau de efetividade exigido é, assim, relativo, e deve ser avaliado caso a caso.

    Pode-se dizer que o conceito clássico do uti possidetis é revisitado⁹³, para a determinação de sua aplicação, em nossos tempos, aponta R. MEHDI (1998)⁹⁴: fator de confitualidade e elemento de estabilidade, a fronteira moderna se encontra no centro de contradição permanente.⁹⁵ Assim se mostra a sua reiterada aplicação, conduzida pelo juiz internacional.⁹⁶

    A partir do surgimento do uti possidetis como princípio, nas relações entre as duas coroas ibéricas, em relação às ocupações coloniais de ambas no contexto interamericano – por ocasião do tratado de Madri, de 1750 – este foi depois utilizado como critério de delimitação entre as antigas colônias espanholas,⁹⁷ depois de se tornarem independentes, bem como entre estas a antiga colônia portuguesa das Américas.

    Após a segunda guerra mundial,⁹⁸ no processo de descolonização, deu-se a aplicação do princípio em diversas controvérsias territoriais, especialmente entre países africanos. Nos anos 1990, este encontrará aplicação também na Europa, para a solução de questões territoriais.

    Se até o fim do século XIX, o território era composto de elementos horizontais, isto é, o domínio terrestre e o domínio marítimo, e no início do século XX, agrega-se o novo dado da dimensão vertical, e se passa a regular o domínio aéreo, no século XXI agregar-se-á a percepção da crescente interdependência, da necessidade de gestão concertada dos recursos naturais⁹⁹, da importância estratégica da água,¹⁰⁰ da internacionalidade inerente às questões de poluição do solo, do subsolo, e das reservas subterrâneas de água (questão dos aquiferos)¹⁰¹. E da terra para o mar¹⁰².

    Aos domínios terrrestre, marítimo e aéreo é necessário acrescentar as projeções da soberania estatal em relação ao domínio marítimo, que passa a incluir a plataforma continental, projeção submarina à superfície e ao subsolo do mar¹⁰³, bem como o domínio aéreo, que compreende a coluna de ar, acima dos domínios terrestre e marítimo. Cumprirá, ainda, considerar regimes específicos, atribuído pelo direito internacional, aos espaços não sujeitos à soberania estatal, como se dá em relação ao alto mar, aos fundos oceânicos,¹⁰⁴ aos dompinios polares e ao espaço exterior.¹⁰⁵

    A soberania do estado, em relação ao seu território, compreenderia, na formulação clássica, o imperium e o dominium: o primeiro, imperium, é constituído por espécie de soberania abstrata, sobre as pessoas que nele se encontram; o segundo, dominium, é constituído pelo direito, exclusivo, de reger o território, e nele dispor, segundo a sua própria vontade, para as necessidades legítimas, da coletividade nacional.

    O dominium do estado, sobre o território não se confunde, absolutamente, com o direito de propriedade privada, que o estado, da mesma forma que os indivíduos, ou qualquer outra pessoa jurídica, também pode possuir. É, antes, a espécie referida de domínio eminente, e seria este perfeitamente compatível com a propriedade particular das terras, à qual como que se superpõe, ao mesmo tempo que lhe assegura a proteção do estado, já apontava no século XVIII, E. de VATTEL¹⁰⁶. Em outra passagem, E. de VATTEL enfatiza a necessidade de delimitar cuidadosamente os territórios.¹⁰⁷

    Em princípio, toda a pessoa ou coisa, que se encontre no território, está sujeita à suprema autoridade do estado, o que configura a estrita territorialidade da jurisdição do estado. Para K. STRUPP (1934)¹⁰⁸ caberia definir o território do estado como parte delimitada da superfície do globo, sobre, acima e abaixo da qual este exerce sua soberania territorial: "pode neste exercer sua potência estatal no duplo sentido de aí submeter ao seu império, exceto algumas exceções decorrentes do direito internacional, todas as pessoas e coisas nele presentes, e aí exercer domínio público (dominium publicum).¹⁰⁹ Este deve ser entendido como feixe de competências locais concedidas pelo direito das gentes a sujeitos internacionais".

    Decorre do direito, que sobre o mesmo território somente um estado possa exercer as suas competências. Com as consequentes obrigações e responsabilidades daí decorrentes. Ao mesmo tempo em que a história apresenta situações do que STRUPP denomina co-império e observa: mas somente se pode construir essa noção na medida em que se restrinja a soberania de cada estado, em favor de outro.¹¹⁰

    Da estrita territorialidade da jurisdição do estado decorre que nenhuma autoridade estrangeira teria direito de aí exercer qualquer jurisdição, salvo, excepcionalmente, em casos admitidos e regulados pelo direito internacional (tais como as imunidades diplomáticas e consulares, resultantes de convenções internacionais), em razão de necessidades operacionais compartilhadas. Mesmo ante a inocorrência de limite legalmente delimitado¹¹¹, o exercício extraterritorial da jurisdição¹¹², por qualquer estado, no território de outro, deve subordinar-se aos imperativos da comitas gentium, da boa convivência entre os estados.

    No tocante à sua configuração, ou maneira como se acha disposta a superfície, o território do estado pode ser: íntegro ou também dito compacto, quando constituído por porção ininterrupta da superfície da terra; pode o território ser desmembrado ou dividido, quando composto de partes, entre as quais a superfície apresenta soluções de continuidade; encravado, quando inteiramente cercado pelo território de outro estado.

    Pode também apresentar-se sob vários aspectos físicos; e, neste sentido, podemos considerar o território terrestre, o marítimo e o aéreo.¹¹³ Em tal acepção, parece preferível o uso do termo domínio, em vez de território.

    Raul PEDERNEIRAS (1953)¹¹⁴ entendia: domínio não corresponde à propriedade plena, e sim à parte da terra, em que o estado exerce a sua ação independente, a sua atividade política, jurídica, moral e econômica com exclusão dos demais.¹¹⁵

    Em suma, o estado exerce as suas competências, em primeiro lugar, sobre a base física, que se denomina o território. Em segundo lugar, em algumas hipóteses, podem estas competências ser, também, exercitadas extraterritorialmente, mas configuram antes exceções à norma geral. A base das competências do estado será, sobretudo, territorial.¹¹⁶

    O estado territorial é modelo que se constrói a partir de dados econômicos, políticos e culturais, no contexto da Itália, do ‘outono da idade média’ e passagem para o renascimento e a era moderna. Não se pode nem se deve sofrer de ucronia, a doença que consiste em reconstruir o passado pela imaginação, e que é familiar a certos economistas, convertidos à história adverte Fernand BRAUDEL.¹¹⁷ Este caracteriza o estado territorial n’O modelo italiano (1989, ed. bras. 2007).

    No conjunto da Itália, "seus estados territoriais – o Piemonte-Sabóia, o Estado pontifical¹¹⁸, o reino de Napóles, do qual se apoderou ALFONSO, o Magnânimo, em 1442, juntando-o à Sicília – seus estados territoriais se consolidaram, sem se mover de modo espetacular: eles correspondem, de fato, à Itália arcaica, feudal e senhorial, ‘subdesenvolvida’. Ao contrário uma grande transformação atinge as cidades mais ativas, mais ricas".¹¹⁹

    A concepção do ‘estado territorial’ se situa em contraposição à concepção mais fluida das cidades-estado, centradas em núcleo de atividades, que se projetavam sobre determinada extensão circunstante, sem delimitação tão precisa, como se virá a fazer, nos estados territoriais. Dois modelos econômicos e dois modelos políticos: Assim se constrói um novo mapa, um novo tecido político.¹²⁰

    Contrapõem-se, assim, as cidades-estado, mais fluidas, e os estados territoriais compactos: portanto, cidades e já estados, elas retiram desse caráter híbrido sua força (seu dinamismo econômico) e sua fraqueza, agora que se anuncia o reino ameaçador dos estados compactos, de exércitos numerosos, ao menos relativamente numerosos.¹²¹

    Curiosamente, o que hoje se aponta como dado recente, decorrente do assim chamado contexto de globalização¹²², que acarreta a deslocalização e a fluidez das atividades econômicas, já estaria talvez, em muitos de seus elementos, presente nas cidades-estado comerciantes, da Itália e da Alemanha, do final da idade média? Poderiam, talvez, ser encontrados germes do modelo globalizado, nesse contexto, de atividade econômica, sem fronteiras políticas determinadas, já no final da idade média? Ou mesmo antes desta?

    A importância do território decorre do fato deste representar um, dentre os elementos essenciais, para a existência do estado – enquanto base física, será determinante das competências territoriais deste – seu conteúdo e seu exercício. Mas a existência e a operação do estado se põem, como dados de modelo, ao mesmo tempo econômico, político, cultural. Modelo esse, temporalmente condicionado.

    Daí resulta serem os dados territoriais especialmente relevantes para a vida do estado e para a construção do sistema de relações internacionais. Ocupa, assim, a regulação do território e as medidas, a este relacionadas, parte relevante da vida de cada estado, como do sistema normativo internacional. E da configuração da noção, e do conteúdo da soberania.

    Para BRAUDEL¹²³ toda grandeza supõe um espaço dominado (o fora) mais vasto que o espaço privilegiado que lhe pertence propriamente (o dentro). Enfim, toda grandeza implica um excedente de espaço. E prossegue: é certamente falso que o jogo de um espaço contra o outro seja um simples efeito da física. O espaço que age é aquele dos homens.¹²⁴

    O espaço, assim, é dado físico, mas, também, dado humano e atributo cultural: humanamente se constrói, como se desfaz. A posição eficaz para uma ação dessa ordem, é geralmente ambígua, na confluência de um espaço longínquo e de um espaço próximo.¹²⁵

    Os deslocamentos entre espaço e tempo marcam modelos culturais e tendências históricas. Dentre outros possíveis, alguns momentos marcantes podem ser, aqui, assinalados: a conjugação entre a ruptura da unidade do mundo mediterrânico, com a tomada de Constantinopla e a queda do Império bizantino, 1453, e, a seguir, os grandes ‘descobrimentos’ (entre o final do século XV e início do XVI), projetam os europeus para os lados do Atlântico. Em seguida, segundo momento, dar-se-á o encontro entre a Europa e o novo continente americano.¹²⁶

    Após a independência das colônias europeias nas Américas (entre o final do século XVIII e início do XIX) recrudescerá o impulso ‘colonizador’ europeu na África e na Ásia¹²⁷, e, terceiro momento, depois do fim da segunda guerra mundial e do colapso dos impérios coloniais africanos e asiáticos, na metade do século XX, as antigas ‘potências coloniais’ europeias se voltam para a reconstrução física, econômica e de infraestrutura, mas também para a concentração de esforços na construção europeia integrada, desde então, não obstante algumas marchas e contramarchas. São estas movimentações não somente de interesse daquele continente, mas com reflexos sobre o conjunto do mundo.

    Não por mera coincidência, à ruptura da unidade do mundo mediterrânico, decorrente da queda de Bizâncio, em 1453, se tenha seguido a projeção dos europeus rumo ao Atlântico e à ‘descoberta’ do ‘novo mundo’: cortados os canais de comunicação e comércio de um lado, instaurar-se-ão outros, apesar do caráter aparentemente aleatório destes. Encerrar-se-á a chamada idade média e começará nova fase da civilização¹²⁸: ao ocaso de um tempo seguir-se-á nova fase, com a formação de novas estruturas na Europa, com destaque para o nascimento do estado moderno, de base territorial mais estritamente delimitada, mudanças na conjuntura, as aspirações do homem, e a difusão europeia no mundo, com a imprensa e as descobertas geográficas.

    Ocorre projeção do dado cultural sobre o espaço físico. E se caracterizam movimentos de fluxo e de refluxo, ao longo dos séculos, entre modelos e a abrangência espacial de aplicação destes.

    A busca de espaço – e não somente de território, propriamente dito – poderia, talvez, explicar a obssessão colonial como modo de projetar espacialmente os sonhos – ou desvarios – de grandeza dos colonizadores europeus, em relação à conquista e à manutenção das colônias na África e na Ásia, depois que a maior parte das Américas se havia libertado do jugo colonial europeu.

    Ao mesmo tempo em que se inscrevem no mundo ocidental, e representam parte deste, as Américas têm as suas componentes específicas. A relação entre Europa e as Américas tem múltiplas variáveis e desdobramentos. Desde a etnologia¹²⁹ ao direito internacional pós-moderno.

    Este ‘jugo colonial’ não deve ser somente tomado literalmente, enquanto dado histórico, mas como intersecção entre elementos alienígenas e outros locais, cuja mescla produziu traços originais, tanto humanos, quanto culturais, que, todavia, nem sempre se mostram totalmente configurados e conhecidos. Mas, pode-se e deve-se atentar para especificidades da presença e do legado do passado colonial europeu, nas Américas, de modo distinto do que ocorreria mais tarde em terras de África¹³⁰ e Ásia¹³¹.

    Importa guardar esses dados, em razão das repercussões sobre os modelos institucionais e a relação com o direito internacional no tempo do colonialismo, até se chegar ao direito internacional no presente contexto pós-moderno. Não será o passado colonial o foco do presente estudo – sobre o direito internacional dos espaços, mas será oportunamente considerado –¹³² e deve-se ter em mente quanto as considerações não estritamente espaciais podem estar diretamente relacionadas à luta pela conquista e pela manutenção de espaço. Seja este espaço territorial ou abstrato – expresso como grandeza.¹³³

    Não foi menor o impacto da descolonização sobre a própria Europa, desde o final da segunda guerra mundial.¹³⁴ Observa T. JUDT (2008)¹³⁵: podados dos territórios ultramarinos, os antigos impérios marítimos europeus (da Grã-Bretanha, da Holanda, da Bélgica, de Portugal), no decorrer dos anos em questão, encolheram, voltando aos seus núcleos europeus e redirecionando a atenção para a própria Europa.¹³⁶

    Esse processo de ‘colonização’ teve componentes mercantis e econômicas, tanto quanto militares e políticas¹³⁷. J. M. G. le CLÉZIO (1986)¹³⁸ falava dessas formidáveis companhias mercantes¹³⁹, que foram os primeiros verdadeiros agentes da colonização européia, e que abriram a rota do Oriente, primeiro por meio de trocas pacíficas, depois por meio da violência armada, dividindo imensos territórios, oceanos, repartindo entre elas essa parte do mundo.¹⁴⁰

    As transformações, na Europa ocorridas, desde 1945, foram antes sobre as vidas e contingentes humanos, que em relação a grandes reordenações territoriais e de fronteiras, como se dera ao cabo do conflito precedente¹⁴¹. A proteção das minorias no direito internacional pós-moderno¹⁴² se exprime como dado da relação entre ser humano e espaço, regulado por instituições e normas interna- cionais¹⁴³.

    A construção do modelo de proteção teve diferença essencial entre o momento posterior à primeira guerra mundial¹⁴⁴ e o momento subsequente à segunda guerra mundial. Ainda T. JUDT (2008)¹⁴⁵: quando acabou a primeira guerra mundial as fronteiras é que foram inventadas e ajustadas, enquanto, de modo geral, as pessoas ficaram onde estavam. Depois de 1945, ocorreu exatamente o oposto: com uma grande exceção, as fronteiras permaneceram basicamente intactas e as pessoas foram deslocadas. Essa exceção foi a Polônia, como parte de todo o novo traçado das fronteiras ocidentais da então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.¹⁴⁶

    Para assinalar dado central da evolução do conceito e do tratamento do território no direito internacional: o espaço, assim, é físico, mas também cultural. Este se constrói com a política, com a cultura, a partir da cultura. A fratura ideológica, mesmo que se possa fazer essa linha cultural entre uma Europa ‘ocidental’ e outra ‘oriental’ remontar até os enciclopedistas franceses do século XVIII, mostrara L. WOLFF (1994)¹⁴⁷, se acirra como a linha divisória, que marcou a Europa, de 1945 até 1989, mais que geográfica, foi cultural e desapareceu, com a mudança do padrão, também este cultural, que faz passar a compreensão da guerra fria, para a História, analisam L. J. HALLE (1967, nova ed., 1991)¹⁴⁸ e T. TODOROV (2008)¹⁴⁹.

    A mutação cultural em curso no mundo, desde 1989, mas sobretudo na Europa, não foi, todavia, absorvida. A Europa ainda reluta em se conceber e operar como todo integrado, do Atlântico à fronteira da Rússia, do extremo norte escandinavo até Malta e Chipre, no meio e no extremo oriental do Mediterrâneo¹⁵⁰: a construção do modelo todavia claudica¹⁵¹. A fase atual de construção de modelo complexo supraestatal em curso na União Europeia pode representar a superação dos modelos estatais, que tantos conflitos causaram no passado¹⁵². Mas as recorrências da estatalidade são fortes e tem consequências nefastas: depois de aflorarem os efeitos desastrosos do Brexit – a saída do Reino Unido da UE, agora parecem estar Polônia e Hungria em rota de colisão com os propósitos integracionistas.

    Assim se apresenta uma dimensão crucial, ao longo deste direito internacional dos espaços: a relação entre o território, em seus vários domínios, com a configuração da soberania,¹⁵³ sempre interrelacionados. Mas a soberania, contudo, não se a limita ao dado físico: esta se constrói, também, como anseio, soberania como a expressão territorial desse anseio político, histórico, jurídico interno e internacional. Não são somente dados geográficos em questão. Há conjunto mais amplo, que toma o espaço por base, e com este interage, para moldar a política, a história, como o direito e as relações internacionais. Por isso cabe estudar o direito internacional dos espaços, como a dimensão concreta deste, nas várias áreas e dimensões, nas quais pode se estender e se desdobrar.

    A relação com o espaço é forma de expressão da identidade do estado no tempo. E a construção da ‘grandeza’ como dado relativo, que se perfaz no estabelecimento de comparações. Não existe ou somente pouco existe em si mesmo; se perfaz em relação aos outros¹⁵⁴.

    Por isso tanto se lutou – se luta, todavia – por espaço. A regulação do espaço pelo direito é a busca do modo ‘civilizado’ de construção do entorno que permita a gestão dos conflitos, sem desencadear, permanentemente, a necessidade de recurso à guerra armada¹⁵⁵. Esta sempre exige a construção de dados não somente físicos, mas sobremodo abstratos – ou, melhor digamos, ‘culturais’ – para perfazer essa dimensão espacial, tutelada pelo estado¹⁵⁶.

    Emanuel MORESCO (1936) apresentava, na Haia, as relações de direito público entre a metrópole, as colônias, os domínios e outros territórios de além-mar.¹⁵⁷ Terminava o exame com ponderação quanto à possibilidade de extrair linhas gerais¹⁵⁸ de análise do tema: o resultado final, ou o termo ideal dessa relação, não será outro se não a realização do direito, que se chama liberdade.¹⁵⁹

    Ao mencionar a evolução do conceito e do tratamento do território no direito internacional se enfatiza, sem cultivar o paradoxo aparente, a mobilidade deste, obviamente não física, por definição, mas a mobilidade temporal e cultural do conceito de território do estado, e do tratamento deste no direito internacional, clássico, como no presente contexto pós-moderno. A mutação, em decorrência das regulações aplicáveis aos espaços comuns, trazida ao direito internacional pós-moderno constitui conjunto a ser considerado, ao lado das projeções territoriais da soberania do estado.

    Nesse sentido, ressalta E. R. LEWANDOWSKI (2004)¹⁶⁰, mantém-se ainda intacto o padrão vestfaliano de relacionamento horizontal entre os estados, enquanto modelo fundado na soberania, na supremacia da ordem jurídica interna, na aplicação do direito internacional em conformidade com ditames da legislação local e na consideração de um povo territorialmente localizado, como fonte de legitimidade, ainda que, em outras áreas, sobretudo na econômica, a heteronomia decisória tenda a avançar cada vez mais.¹⁶¹

    A concepção de modelo fundado na soberania se reporta não somente a base física, como cultural na consideração de povo territorialmente localizado, como fonte de legitimidade. Isso se põe não somente para o âmbito interno, como se exprime também na supremacia da ordem jurídica interna, na aplicação do direito internacional em conformidade com ditames da legislação local.

    Esse modelo cultural continua presente, e, todavia, constitui a unidade básica de operação do sistema interestatal. Mas não é o único modelo possível, conceitualmente, nem há de ser o único aplicável historicamente. Como demonstra o desenvolvimento da regulação dos espaços internacionais, adiante examinados.

    O fim dos blocos ideológicos, com o ressurgimento pós-colonial dos nacionalismos, tem causas imediatas, como a perspectiva de descobertas de recursos minerais, em zonas fronteiriças sujeitas a contestação, que podem conduzir à ocorrência de incidentes de fronteira, suscetíveis de degenerar em graves crises,¹⁶² faz que seja revalorizado o papel das fronteiras, tanto quanto a noção de territorialidade, em relação à caracterização do estado: as fronteiras põem em questão o território do estado, e sendo este a própria substância e o suporte físico da soberania estatal, aparece, sem dúvida, como o conceito fundamental do direito internacional.¹⁶³ Apesar das mudanças em curso no mundo, e das mutações da estrutura institucional e normativa de regulação deste, no quadro do direito internacional pós-moderno, as fronteiras continuam a ser dado pelo qual se batem os estados.

    A evolução do conceito e do tratamento do território, no direito internacional, assim, congrega todas essas dimensões: dado físico, dado humano, dado cultural, dado político. E estas várias dimensões interagem entre si.

    O espaço, assim, será além de físico, também espaço humano, espaço cultural, e espaço político. Como o espaço no qual se exercem as escolhas para a regulação da convivência humana. Dentro dos estados, como entre os estados. Em ambas as dimensões, quer interna ou internacional, terá papel a desempenhar a soberania, como a expressão da dimensão política, para a compreensão do território.

    A evolução do conceito e do tratamento do território no direito internacional mostra a confluência dos vários dados e das diversas dimensões ao espaço e ao tratamento jurídico deste relacionadas. Ao espaço, enquanto dado físico, se somam dimensões abstratas, que impõem modelos regulatórios e de gestão jurídica deste. E somente por meio do exame desses modelos pode-se compreender porque os homens e o direito internacional estabelecem regimes de tutela legal do espaço e conferem distintos tratamentos a diferentes parcelas do espaço físico do planeta.

    A seguir se passa a considerar a soberania, em relação ao território do estado (cap. 2). O tema será considerado de perspectiva instrumental, no sentido de situar os conceitos do fenômeno, muito mais amplo, da soberania, em suas repercussões, no sistema institucional e normativo internacional, em relação ao tema do território.


    ⁴⁷ Denis ALLAND, Les représentations de l’espace en droit international public (in Le droit international, Paris: Archives de philosophie du droit, 1987, v. 32, p. 163-178, cit. p. 163): «Il n’est pas d’interrogation plus ancienne que celle à propos de l’espace.»

    ⁴⁸ «L’ivresse de cette histoire unique: quand les terres, les mers, les archipels n’avaient pas encore été enfermés dans leurs frontières, que les hommes étaient libres et cruels comme les oiseaux de la mer, et que les légendes semblaient encore ouvertes sur l’infini.» J. M. G. Le CLÉZIO, Voyage à Rodrigues: journal (Paris: Gallimard – NRF, 1986, p. 41, e mais adiante, p. 44): «Ainsi faisaient les premiers hommes, lorsqu’ils donnaient leur nom aux endroits de la terre, montagnes rivières, marécages, forêts, plaines d’herbes ou de cailloux, pour les créer en même temps qu’ils les nommaient. Alors chaque parcelle de ce paysage devient un symbole.»

    ⁴⁹ A questão da soberania pode ser considerada sob múltiplos ângulos. Para os constitucionalistas e na maioria dos enfoques, na parte relativa ao direito interno, soberania se exprime como concentração de poderes. Ao se considerar o ‘estado no direito internacional’, e especificamente dentre os ‘elementos constitutivos’ deste, a soberania se exprime como divisão de poderes, entre os diferentes estados. V., a seguir, cap. 2, ‘soberania e território do estado’. V. tb. E. N. van KLEFFENS, Sovereignty in international law (RCADI, 1953, t. 82, p. 1-132).

    ⁵⁰ SÊNECA, De beneficiis (SÉNÈQUE, Les bienfaits, texte établi et traduit du latin par François PRÉCHAC, trad. revue, intr. et notes par Paul VEYNE, © Les belles lettres pour les traductions, Paris: Robert Laffont, 1993, p. 389-584, livro VII, cap. 4): «Ad regem enim potestas omnium pertinent, ad singulos proprietas.»

    ⁵¹ SÊNECA (op. cit., cap. 5): «Sub optimo rege omnia rex imperio possidet, singuli dominio.»

    ⁵² Henry WHEATON, Elements de droit international (1836; Leipzig: Brockhaus, 1858, 2 vols.).

    ⁵³ H. WHEATON (op. cit., 1836, ed. 1858, vol. I, cap. 4 ‘des droits de propriété’, p. 158).

    ⁵⁴ Tais como as entidades territoriais, diversas dos estados independentes, às quais se confere a possibilidade de celebrar tratados, cf. analisava O. J. LISSITZYN, Territorial entities other than independent states in the law of treaties (RCADI, 1968, t. 125, p. 1-92).

    ⁵⁵ Walter SCHOENBORN, La nature juridique du territoire (RCADI, 1929, t. 30, p. 81-189).

    ⁵⁶ W. SCHOENBORN (op. cit., 1929, p. 92): «la fixité de la résidence du peuple resserre naturellement encore, et d’une façon beaucoup plus intime, les relations de ce peuple avec le territoire, surtout le sol qui sert de base à la construction d’habitations fixes et le terrain utilisé comme champ arable.»; também cita Georg JELLINEK, Allgemeine Staatslehre (3e. éd. par W. JELLINEK, 5e. impr. nouvelle, 1929, surtout p. 267 et suiv.).

    ⁵⁷ S. SÉFÉRIADÈS, L’échange des populations (RCADI, 1928, t. 24, p. 307-440).

    ⁵⁸ Giuseppe SPERDUTI, Le principe de souveraineté et les rapports entre le droit international et le droit interne (RCADI, 1976, t. 153, p. 319-410, cit. p. 399-400): «les principes du droit international sur l’observance des pactes et des autres règles de ce même droit se répercutent dans la conscience de chaque peuple. Il semble raisonnable d’affirmer que parmi les préceptes émanant de la conscience du peuple trouve place celui qui impose le respect dans l’état des engagements internationaux de l’état même./Se dessine ainsi une forme d’unité du monde juridique, sans pourtant que cela ait à préjuger de l’individualité de la différenciation et de la séparation des différents ordres juridiques.»; Walter SCHOENBORN, La nature juridique du territoire (op. cit., 1929, esp. chap. III ‘développement des idées à l’égard des frontières du territoire’, p. 126-161, cit. p. 132): «On ne peut dénommer ‘naturelles’ ces frontières, qu’en tant qu’elles se rattachent à certaines formations dans la nature, mais elles ne deviennent des lignes de séparation que par la volonté humaine et elles sont artificielles, parce qu’elles pourraient être tracées tout aussi bien autrement.»

    ⁵⁹ Ainda Henry WHEATON, Elements de droit international (1836; Leipzig: Brockhaus, 1858, 2 vols., vol. I, cap. 4 ‘des droits de propriété’, p. 158): "Os direitos do estado aos bens públicos ou a seu domínio são absolutos, e excluem os de seus próprios súditos, bem como os das nações estrangeiras. Os direitos de propriedade nacional, em relação aos bens que pertencem aos particulares ou a corporações, e que se encontram em seu território é absoluto, no que diz respeito às nações estrangeiras, porquanto exclui todos os direitos destas, enquanto em relação aos súditos do estado, esse direito se reduz ao que se denomina domínio eminente, ou seja o direito, em caso de necessidade, ou por questão de interesse público, de dispor de qualquer bem situado nos limites do estado."

    ⁶⁰ Sobre Francisco de VITÓRIA, v. Tratado de direito internacional (tomo V – Direito internacional no tempo de Francisco de Vitória); ACCIOLY – NASCIMENTO E SILVA – CASELLA, Manual (2021, especificamente item 1.1.1.1), b/c Fundamentos (2008, esp. item II ‘precisões terminológicas e valorativas’, p. 181-296).

    ⁶¹ J. BARTHÉLEMY, François de Vitoria (in Les fondateurs du droit international: leurs oeuvres, leurs doctrines, «avec une introduction de» A. PILLET, Paris: V. Giard & E. Brière, 1904, p. 1-36).

    ⁶² Institutionum sive elementorum (recognovit Paulus KRUEGER, in Corpus iuris civilis, volumem primum, Dublin/Zürich: Weidmann, impr. 1973, liber primum, II, ‘de iure naturali et gentium et civili’: «Ius naturale est quod natura omnia animalia docuit, nam ius istud non humani generis proprium est, sed omnium animalium, quae in caelo, quae in terra, quae in mari nascuntur (...) Ius autem civile vel gentium ita dividitur: omnes populi, qui legibus et moribus reguntur, partin suo proprio, partin communi omnium hominum iure utuntur; nam quod quisque populus ipse sibi ius constituit, id ipsius proprium civitatis est vocaturque ius civile, quasi ius proprium ipsius civitatis; quod vero naturalis ratio inter omnes hominis constituit, id apud omnes populos peraeque custoditur vocaturque ius gentium, quasi quo iure omnes gentes utuntur, et populos itaque Romanus partin suo proprio, partin communi omnium hominem iure utitur, quae singula qualia sunt, suis locis proponemus.»

    ⁶³ J. BARTHÉLEMY (op. cit., 1904, p. 7): "On peut dire, par conséquent que c’est chez VITORIA que l’on trouve pour la première fois le terme de jus inter gentes. Le terme est remarquable: ce qui l’est encore plus, c’est l’idée à laquelle il correspond, c’est la notion que présente VITORIA de ce jus inter gentes, du lien juridique qu’il établit entre nations, ou plutôt de la société juridique internationale dont il est l’expression."

    ⁶⁴ Mesmo a utilização não predatória pode conduzir e tem conduzido ao esgotamento dos recursos naturais e de outras formas de vida, no planeta. Esse conjunto de matérias normalmente será abrangido pela ‘proteção internacional do meio ambiente’. A percepção da interdependência crescente e da dimensão dos problemas compartilhados deveria conduzir à consentânea mutação das modalidades de regulação e de tratamento do tema território, no e pelo direito internacional pós-moderno. Isso somente se tem visto de modo, todavia, incipiente. Cfr. cap. 20 ‘espaços internacionais: de res nullius a patrimônio comum da humanidade’ e cap. 25 ‘direito internacional dos espaços e a emergência da proteção internacional do meio ambiente’.

    ⁶⁵ Karl ZEMANEK, The legal foundations of the international system: general course on public international law (RCADI, 1997, t. 266, p. 9-336).

    ⁶⁶ K. ZEMANEK (op. cit., 1997, chap. v, ‘the changing focus of international law’, p. 112-130, cit. p. 113): "To be fair, it has to be added that, even if political action is finally taken, the process of decentralized law-making is slow and rarely produces universally accepted rules to transform or replace former ones. Old and new law may co-exist for a long time which creates special problems of application if the underlying concepts are incompatible."

    ⁶⁷ D. ALLAND, Les représentations de l’espace en droit international public (in Le droit international, Paris: Archives de philosophie du droit, 1987, v. 32, p. 163-178); J. ANCEL, Les frontières, étude de géographie politique (RCADI, 1936, v. 55, p. 203-298); Julio A. BARBERIS, Los recursos naturales compartidos entre estados y el derecho internacional (Madri: Tecnos, 1979); Julio A. BARBERIS, "La concepción brasileña del uti possidetis" (in Dimensão internacional do direito: estudos em homenagem a G. E. do Nascimento e Silva, São Paulo: LTr, 2000, p. 33-48); D. BARDONNET, Les frontières terrestres et la relativité de leur tracé: problèmes juridiques choisis (RCADI, 1976, v. 153, p. 9-166); Suzanne BASTID, Les problèmes territoriaux dans la jurisprudence de la Cour Internationale de Justice (RCADI, 1962, v. 107, p. 361-496, esp. p. 391); G. DISTEFANO, L’ordre international entre légalité et effectivité: le titre juridique dans le contentieux territorial (préface de Georges ABI-SAAB, Paris: Pedone/Genève: Institut universitaire des hautes études internationales, 2002); Paul de GEOUFFRE de LA PRADELLE, Notions de territoire et d’espace dans l’aménagement des rapports internationaux contemporains (RCADI, 1977, v. 157, p. 415-484); P. de G. de LA PRADELLE, Progrès ou déclin du droit international? (in La communauté internationale: mélanges offerts à Charles Rousseau, Paris: Pédone, 1974, p. 139-152); Anatoly MOVCHAM, Problems of boundaries in the Helsinki Declaration (RCADI, 1977, t. 154, p. 1-43); Diuma NINCIC, Les implications générales juridiques et historiques de la Déclaration d’Helsinki (RCADI, 1977, t. 154, p. 45-102); Jean-Paul PANCRACIO, Droit international des espaces: air/mer/fleuves/terre/cosmos (Paris: Armand Colin/Masson, 1997); L. I. SANCHEZ RODRIGUEZ, L’uti possidetis et les effectivités dans les contentieux territoriaux et frontaliers (RCADI, 1997, t. 263, p. 149-382); W. SCHOENBORN, La nature juridique du territoire (RCADI, 1929, t. 30, p. 81-190, esp. p. 126).

    ⁶⁸ A. DECENCIERE-FERRANDIERE, Essai historique et critique sur l’occupation comme mode d’acquérir les territoires en droit international (RDILC, 1937, p. 72).

    ⁶⁹ Charles de VISSCHER, Théories et réalités en droit international public (Paris: Pedone, 1953, ‘le territoire dans les rapports internationaux’, p. 239-267, cit. p. 239-240): «Des considérations fondamentales, liées à la stabilité et la sécurité des rapports internationaux, contribuant à fortifier en droit la position de la souveraineté territoriale. Elles justifient son caractère le plus marquant, l’exclusivité: droit de l’état de l’exercer dans toute l’étendue de son domaine, devoir correspondant de s’abstenir de tout acte de coerction en territoire étranger.»

    ⁷⁰ Charles de VISSCHER, Les effectivités du droit international public (Paris: Pedone, 1967).

    ⁷¹ Ch. de VISSCHER (op. cit., 1967, p. 101): «Dans une société où aucun principe n’a présidé à la répartition des terres entre les hommes c’est le fait historique qui [aurait] décidé de leur attribution à un groupement d’êtres humains.»

    ⁷² C. J. TAMS, Enforcing obligations erga omnes in international law (Cambridge: University Press, 2005).

    ⁷³ Antônio Amaral de SAMPAIO, A evolução histórica da ocupação em direito internacional (Boletim SBDI, 1958, p. 70).

    ⁷⁴ G. F. de MARTENS, Précis du droit des gens moderne de l’Europe (1788, ed, 1858, vol. I, livre II, ch. premier ‘de l’acquisition de propriété par ocuupation’, esp. §§ 35 a 38, p. 125-135).

    ⁷⁵ Jared DIAMOND, Guns, germs and steel: the fates of Human societies (with a new afterword about the modern world, © 1997, New York: Norton, 1999); Jared DIAMOND, Colapso: como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso (do original Collapse, © 2005, trad. Alexandre RAPOSO, rev. técnica Waldeck D. MAIA, Rio de Janeiro: Record, 2ª ed., 2005).

    ⁷⁶ J. DIAMOND (op. cit., 1997, impr. 1999, p. 266): as recently as AD 1500, less than twenty percent of the world’s land area was marked off by boundaries into states, run by bureaucrats and governed by laws.

    ⁷⁷ V. cap. 20 ‘espaços internacionais: de res nullius a patrimônio comum da humanidade’; v. tb. Juan Antonio CARRILLO SALCEDO, Le concept de patrimoine commun de l’humanité (in Ouvertures en droit international: hommage à René-Jean Dupuy, Paris: Pedone, 1998, p. 55-66); Charles Alexander KISS, La notion de patrimoine commun de l’humanité (RCADI, 1982, t. 175, p. 99-256).

    ⁷⁸ Robert CHARVIN, Le droit international tel qu’il a été enseigné: notes critiques de lecture des traités et manuels (1850-1950) (in Le droit des peuples à disposer d’eux-mêmes: méthodes d’analyse du droit international – mélanges offerts à Charles CHAUMONT (Paris: Pedone, 1984, p. 135-159); Charles CHAUMONT, Cours général de droit international public (RCADI, 1970, t. 129, p. 333-528, cit. p. 345): «Si le droit classique est en voie de disparition comme phase historique, il n’est pas aboli comme méthode et vision.»

    ⁷⁹ Diuma NINCIC, Les implications générales juridiques et historiques de la Déclaration d’Helsinki (RCADI, 1977, t. 154, p. 45-102, cit. p. 51-52): «L’Assemblée générale des Nations Unies a fourni, on le sait, un gros effort dans ce sens. Au moyen de ‘résolutions déclaratoires’, elle a commencé a assumer ce qu’on a appelé un ‘rôle normatif’, dirigé surtout vers la formulation et l’élaboration de certains principes fondamentaux du droit international, dérivés de la Charte et destinés à constituer la base, le contenu, en même temps que l’objectif de cette nouvelle sécurité qu’on voulait bâtir; cela faisait paraître sous un jour assez nouveau l’ancienne question du rapport entre le fait politique et la règle juridique. En Europe, également, les contours d’un nouveau jus publicum europaeum commençait à se dessiner à la place de l’ancien et il importait d’assurer qu’il se développerait en conformité avec les grands principes qu’établissaient les Nations Unies et s’inserrât dans le système universel dont ils devaient constituer le fondement.»

    ⁸⁰ Louis CAVARÉ, Le droit international public positif (troisième éd. mise à jour par Jean-Pierre QUENEUDEC, Paris: Pedone, 1973, p. VII-IX), advertia no prefácio da segunda edição (1961) quanto HOMERO, no relato da atividade de Penélope, que desfazia de noite, o trabalho feito durante o dia, teve a intuição da quase impossibilidade, para os juristas, e, sobretudo, para os internacionalistas de hoje, em colocar um ponto final em suas obras: «réduits par l’Odysée bouleversante des faits et du droit, qui remet à chaque heure en question les notions acquises, à defaire inlassablement la trame de leurs travaux, n’est-ce pas de leur part poursuivre une insaisissable chimère que d’essayer de fixer, d’immobiliser ne fut-ce qu’un instant, celui de l’éclair atomique, le droit positif pour tenter une analyse et une synthèse. Et pourtant, la connaissance de ses données s’impose.»

    ⁸¹ L. CAVARÉ (op. cit., ed. cit., 1973, loc. cit.).

    ⁸² Já CAVARÉ enfatizava (ed. 1973, loc. cit.) como dados dessa transformação da sociedade internacional, a multiplicação do número de estados, o número e a importância crescente das organizações internacionais e outros grupamentos mais complexos, como exprimem os processos de integração regional, sobretudo a emergência da condição do ser humano, como sujeito de direito internacional: Mieux encore, les personnes privées, les simples individus physiques, s’efforcent de se hisser au rang de sujets de droit e nesse sentido apontava a questão da condição internacional do indivíduo e o papel das declarações de direitos, tanto no âmbito da Organização das Nações Unidas, como nos contextos regionais.

    ⁸³ Cfr. cap. 5, ‘demarcação e delimitação do território no direito internacional’.

    ⁸⁴ J. BARBERIS, Los recursos naturales compartidos entre estados y el derecho internacional (Madri: Tecnos, 1979); J. BARBERIS, "La concepción brasileña del uti possidetis" (in Dimensão internacional do direito: estudos em homenagem a G. E. do Nascimento e Silva, São Paulo: LTr, 2000, p. 33-48).

    ⁸⁵ J. ANDRASSY, Les relations internationales de voisinage (RCADI, 1951, t. 79, p. 73-182).

    ⁸⁶ V. cap. 3 ‘legalidade e efetividades: título jurídico em contencioso territorial’.

    ⁸⁷ Por isso se remete ao capítulo 2, seguinte, ‘soberania e território do estado’. V. tb. Enrique Ricardo LEWANDOWSKI, Globalização, regionalização e soberania (São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004); E. N. van KLEFFENS, Sovereignty in international law (RCADI, 1953, t. 82, p. 1-132).

    ⁸⁸ C.I.J., affaire de la plataforme continentale en mer Egée (arrêt du 19 décembre 1978).

    ⁸⁹ C.I.J., affaire de la plataforme continentale en mer Egée (arrêt du 19 décembre 1978) Recueil (1978, par. 85, p. 35): «la ligne exacte (...) de rencontre des espaces où s’exercent respectivement les pouvoirs et droits souverains». A respeito da plataforma continental, anteriormente ao caso da plataforma continental do mar Egeu (1978), v. M. W. MOUTON, The continental shelf (RCADI, 1954, t. 85, p. 343-466).

    ⁹⁰ Anatoly MOVCHAN, Problems of boundaries in the Helsinki Declaration (RCADI, 1977, t. 154, p. 1-43); Diuma NINCIC, Les implications générales juridiques et historiques de la Déclaration d’Helsinki (RCADI, 1977, t. 154, p. 45-102) mostram a tentativa de caracterizar a inamovibilidade das fronteiras, tal como fixadas, ao término da segunda guerra mundial, como dado crucial para a paz e a segurança na Europa. Sem prejuízo do papel que tenha desempenhado a Ata Final de Helsinki, em 1975, no contexto da détente, em meio à guerra fria, o fim desse período, em 1989, assinalaria nova vaga de reformulações territoriais no continente europeu, como mostraram a dissolução da Tchecoslováquia, da Iugoslávia e da União Soviética, e a unificação da Alemanha.

    ⁹¹ Como analisa Giovanni DISTEFANO, no seu já referido L’ordre international entre légalité et effectivité: le titre juridique dans le contentieux territorial (2002).

    ⁹² Anne MEYER-HEINE, L’application par le juge du principe de l’effectivité (in Le juge international et l’aménagement de l’espace: la spécificité du contentieux territorial, Paris: Pedone, 1998, p. 35-56, cit. p. 43).

    ⁹³ Afonso ARINOS discursa por ocasião do Bicentenário da morte de Alexandre de Gusmão, e aponta a importância da contribuição de Alexandre de GUSMÃO e o papel do tratado de Madri (1750), esp. em seus arts. 21 e 26 como precursor da doutrina MONROE, porquanto, mesmo em caso de eventual futura guerra, ocorrida entre as coroas de Portugal e da Espanha, não se estenderia esta nem as suas consequências às respectivas colônias nas Américas, dessa forma se distinguindo as Américas do que ocorresse na Europa, em síntese o que viria a ser proclamado, sete décadas mais tarde, do ponto de vista dos Estados Unidos. Cfr. AFONSO ARINOS [de Melo Franco] Filho, Diplomacia independente, um legado de Afonso Arinos (São Paulo: Paz e Terra, 2001, p. 77-81); v. tb. C. BARCIA-TRELLES, La doctrine de Monroe dans son développement historique, particulièrement en ce qui concerne les relations interaméricaines (RCADI, 1930, t. 32, p. 391-606).

    ⁹⁴ Rostane MEHDI, L’application par le juge du principe de l’uti possidetis (in Le juge international et l’aménagement de l’espace: la spécificité du contentieux territorial, Paris: Pedone, 1998, p. 57-89).

    ⁹⁵ R. MEHDI (op. cit., 1998, p. 57).

    ⁹⁶ Foi contribuição da justiça internacional a universalização do princípio do uti possidetis. A propósito R.MEHDI (op. cit., 1998, p. 62 ss., cit. p. 66) descreve o processo como «une évolution éntérinée par le juge international.»

    ⁹⁷ CONSEIL FÉDÉRAL SUISSE, Affaire des frontières colombo-Vénézueliennes (Colombie c. Vénézuela) sentence: Berne, 24 mars 1922 (in United Nations, Reports of International Arbitral Awards/Recueil des sentences arbitrales 24 mars 1922, vol. I, p. 223-298; cit. p. 228): "Lorsque les colonies espagnoles de l’Amérique centrale et méridionale se proclamèrent indépendantes, dans la seconde décade du dix-neuvième siècke, elles adoptèrent un principe de droit constitutionnel et international auquel elles donnèrent le nom d’uti possidetis juris de 1810, à l’effet de constater que les limites des Républiques nouvellement constituées seraient les frontières des provinces espagnoles auxquelles elles se substituaient."

    ⁹⁸ R.SANDIFORD, Évolution du droit de la guerre maritime et aérienne (RCADI, 1939, t. 68, p. 555-686).

    ⁹⁹ Ian BROWNLIE, Legal status of natural resources in international law: some aspects (RCADI, 1979, t. 162, p. 245-318); G. ELIAN, Le principe de la souveraineté sur les resources nationales et ses incidences juridiques sur le commerce international (RCADI, 1976, t. 149, p. 1-85).

    ¹⁰⁰ Laurence Boisson de CHAZOURNES, Le droit international de l’eau: tendances récentes (Anuário Bras. de Direito Internacional, III, 2008, vol. 2, p. 137-150).

    ¹⁰¹ Em 28 de julho de 2008 o Parlamento do MERCOSUL formulou "Recomendação ao Conselho do Mercado

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