Jugo Desigual
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Jugo Desigual - Euclyd's January
Euclyd’S January
Não vos prendais a...
JUGO DESIGUAL
Que comunhão há entre luz e treva? 1
1 Referência bíblica em 2Co 6:14
Revisão:
Supervisão:
Milton Arcoverde
Marcos Maciel Mairins
Simone Barbosa
Francinaldo de Silvana
Capa:
Heliton Filgueira
Editoração e diagramação:
[criador de imagens]
Euclides S. Januario
January, Euclyd’S
JUGO DESIGUAL – dramática incursão de uma médica com formação europeia na plaga do oeste americano sem lei e sem ordem. Citação de Freud em fundamento psicanalítico.
Subtítulo: Que comunhão há entre luz e treva?
Série: Jack & Alyne Tomo II
ISBN - 978-65-00-74875-8
Ficção norte americana, título
22 – 122378
CDD-810
Todos os direitos reservados.
Nenhuma parte desta publicação será reproduzida, arquivada ou transmitida por qualquer meio, sem prévia autorização do autor.
2
O ‘Caçador de Recompensas’ deixa herança vultosa para a filha bastarda e a orientação para se aprimorar nos estudos de nível superior na cidade grande.
Passados dez anos de estudos na Europa, onde viveu em sociedade e conviveu com expoentes do meio científico, a moça retorna à cidadela de sua origem para desempenhar a profissão de medicina; mas tem o desprazer de conviver com a pior classe de indivíduos, envolvidos em crimes.
Ela sofre sequestro de uma quadrilha e é resgatado por outro criminoso, com o qual estabelece o jugo desigual. Surpreendentemente a doutora se adapta a essa convivência e só reencontra a família após um ano de seu retorno à terra natal.
Contém cenas fortes:
- estupro, sexo explícito, abuso de vulnerável.
- lutas corporais, golpes baixos.
- tiroteios seguido de morte, matricídio
- assalto, sequestro, resgate de refém
- genocídio populacional de jovens
- fugas e desacato às autoridades.
Recomendado para maiores de 21 anos
3
Personagens.
Jackaline (Europa) – protagonista/narradora Johnny – protagonista/comentários
Junior – amigo homo afetivo
Jack – pai pistoleiro
Aline – mãe
Olivier – xerife desarmamentista
David – auxiliar do xerife
Rudy – avô
Rose – avó
Joseph – noivo de Jackaline
Lucy – irmã de Johnny
América (Flor de Liz) – esposa indígena África (Florisbela) – esposa negra
Lady – sogra
Enoque – patrão cafetão
Donald – pistoleiro desalmado
Lucky – Gigolô
Joey – assaltante de bancos
August – fazendeiro
May – Esposa de seu August
June – Filha de seu August
July – Filho de seu August
James – Sócio de seu August
Jonas – noivo de June
Águia Ligeira – índio traidor
Capitão – oficial estuprador
Delegado – Cafetão e aliciador
4
O título deste romance faz referência a uma passagem bíblica (2Co 6:14-18) em que o apóstolo adverte sobre os riscos do relacionamento antagônico.
Não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis; porque, que sociedade tem a justiça com a injustiça? E que comunhão tem a luz com as trevas?
E que concórdia há entre Cristo e Belial? Ou que parte tem o fiel com o infiel? E que consenso tem o templo de Deus com os ídolos?
Porque vós sois o templo do Deus vivente, como Deus disse: Neles habitarei, e entre eles andarei; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo.
Por isso saí do meio deles, e apartai-vos, diz o Senhor; E não toqueis nada imundo, E eu vos receberei;
E eu serei para vós Pai, E vós sereis para mim filhos e filhas, diz o Senhor Todo-Poderoso.
Isso foi dito, pelo apóstolo Paulo aos fiéis, mas pode ser aplicado em qualquer vertente das relações humanas. Na vida conjugal e amorosa é premente, pois a convivência constante de uma família exige unidade de pensamento, ações e interesses profissionais...
5
Sumário
I – ASSALTO AO TREM PAGADOR ............................................................................................... 7
II – O SEQUESTRO........................................................................................................................ 15
III – O RESGATE ............................................................................................................................ 23
IV – MONTANHA, ABRIGO SEGURO ......................................................................................... 33
V – A MONTANHA DO AMOR ...................................................................................................... 41
VI – FUGA DA MONTANHA ......................................................................................................... 49
VII – O RATO DO DESERTO ........................................................................................................ 59
VIII – TRATAMENTO CIENTÍFICO ............................................................................................ 68
IX – TRATAMENTO ALTERNATIVO ........................................................................................... 77
X – A FAMÍLIA CALENDÁRIO .................................................................................................... 86
XI – DESTINO TRÁGICO ............................................................................................................. 94
XII – JULGAMENTO ................................................................................................................... 101
XIII – VIDA SELVAGEM ............................................................................................................. 107
XIV – NOVO JULGAMENTO ..................................................................................................... 114
XV – DE VOLTA AO LAR ............................................................................................................ 123
XVI – INICIAÇÃO SEXUAL ....................................................................................................... 132
XVII – TERRITÓRIO INDÍGENA .............................................................................................. 142
XVIII – LUA DE FEL ................................................................................................................... 150
XIX – ATO DE TRAIÇÃO ............................................................................................................ 158
XX – FUGA DA CIDADE ............................................................................................................. 168
XXI – PRISÃO DE UM INOCENTE ........................................................................................... 176
XXII – CURA SURPREENDENTE .............................................................................................. 184
XXIII – LUA DE MEL .................................................................................................................. 191
XXIV – PRINCESINHA............................................................................................................... 198
XXV – O ESTUPRO ..................................................................................................................... 204
XXVI – A TRAIÇÃO ..................................................................................................................... 212
XXVII – REVELAÇÕES .............................................................................................................. 226
XXVIII – CONFISSÃO ................................................................................................................ 237
XXIX – ARREPENDIMENTO ..................................................................................................... 245
XXX – DIREITO E DEVER......................................................................................................... 254
XXXI – ESPERANÇA PERDIDA ................................................................................................ 266
XXXII – CURA PELO INSIGHT ................................................................................................. 276
APÊNDICE.................................................................................................................................... 285
6
I – ASSALTO AO TREM PAGADOR
Eu narrarei esta história até onde possa compreender, cooperando comigo ‘the wanted2 Johnny’. Sou a doutora Jackaline, PhD em medicina, voltando da Inglaterra para a terra natal, onde pretendo exercer a profissão com esmero.
Especializei-me em neuropsiquiatria, para entender a vida interior de meu irmãozinho, hoje com dez anos, portador de síndrome neurológica congênita.
Portanto, aqui estou eu, a filha de Jack e Aline, na estação de trem, esperando que venha alguém da família para recepcionar a
‘ilustre doutora’.
Os avôs, Rudy e Rose, teriam muita atenção nessa tarefa e não demorariam em chegar. A minha mãe também não é de atrasar; porém o noivo, displicente, focado nos acertos agropecuários e exímio observador das oportunidades de negócio, ter-se-ia distraído no caminho.
Meu pressentimento logo se confirma: eu deduzi que os genitores estariam preparando a recepção em casa e Joseph viria na companhia inseparável de seus guarda-costas para me conduzirem ao lar em segurança.
Embora queira demonstrar indiferença ao que acontece em derredor, não posso deixar de observar o movimento das pessoas: gente a desembarcar e outros que aguardam. Eu sou o centro das atenções, de homens que me espreitam lisonjeiros e das mulheres enciumadas.
Todavia, estou acostumada com isso, desde a Europa, com seus galanteadores, até a entrada no Novo Mundo, com os atrevidos descorteses.
Por fim, esvazia-se a Estação, ficando apenas dois guardas na 2 Expressão em inglês, que pode significar: desejado, querido ou procurado, conforme o contexto.
7
porta de entrada do gabinete, acobertando a entrega de valores.
Observo o entrar e sair dalgumas pessoas que transportam sacolas e malas; vejo um velhinho sentado noutra extremidade.
Este me observa por baixo da aba do sombreiro e flagro o olhar capcioso que evita meu rosto e mira a parte baixa. Eu vou ao seu encontro para ofertar uma moeda.
- A cobiça dos marmanjos é compreensiva, mas deste eu não posso aceitar – é o meu pensamento.
A minha intenção é faze-lo levantar a vista e me encarar, desmotivando a concupiscência dos olhos e o colocando no devido lugar... mas, surpreende a sua feição jovial por traz da barba emaranhada. Olhinhos apertado encaram-me com languidez e curiosidade. Ele observa a moeda com estranheza e não demonstra interesse.
"É libra esterlina, dinheiro inglês, que pode trocar por dólar –, eu digo em atenção à sua curiosidade em observar a oferta. –
Você é tão jovem, não devia estar assim.... Você conhece o meu noivo, Joseph? – Ele fica espantado. – Procure-o, que pode lhe arranjar emprego na fazenda....
- Moça, vá embora! pode haver tiroteio, bala perdida, sabe? –
Ele fala e me afasto para observar as imediações.
À distância vejo alguns cavaleiros, escondendo-se atrás de suas montarias. Acho suspeito. Nesse momento, um rapaz me aborda, fala gracejos e procuro ignora-lo; ele pega meu braço e me desvencilho. Inicia-se refrega e um dos soldados vem em meu socorro, repelindo o homem com a coronha do rifle. O
intruso se afasta e o guarda volta ao seu posto, feliz por ter-me protegido, e eu esboço sorriso de gratidão.
Porém, não vendo o companheiro no posto, o soldado corre à sua procura. Entra pela porta e não sai.
Observo que os carregadores também entram e não saem, o garoto da moeda desaparece e os cavaleiros abandonam seus 8
cavalos. De súbito me encontro só na plataforma. Em atenção à advertência recebida para ir embora, eu caminho apressada e desorientada, quando surge a charrete dirigida por meu noivo e acompanhada por dois cavaleiros. Joseph desce eufórico e vem me cumprimentar com afagos.
- Amor, vamos embora – eu peço –, que está acontecendo assalto.... – Joseph, sempre confiante, não se abala.
- Vamos, então, à delegacia na cidade, fazer denúncia... – ele fala sem receios, olhando em derredor. – Rapazes, perigo à vista, fiquem atentos –, ordena aos capangas para me tranquilizar, pois eles são treinados.
- Estou cansada da viagem de trem e quero encontrar minha mãe. Por favor, vamos pra casa. – Joseph obedece e seguimos de mãos dadas, ele olhando para trás a procura de sinais ameaçadores.
- O xerife, seu pai, não vai aceitar a nossa atitude. Ele considera mais importante a segurança do que a pressa.
- Não o chame assim. Meu pai existe em memória. Falar em família, quem está a minha espera em casa?
- Todo mundo. Estamos ansiosos para ouvir suas histórias, da viagem, da vida na capital dos europeus e também dos estudos.
Temos planos para aproveitar seus conhecimentos em medicina.
Ah, seu irmão, o meu cunhado, está à porta, esperando para vê-la. Sabia que ele lê todas as suas cartas? Até mesmo as endereçadas a mim...
O meu noivo chicoteia o cavalo, apressando o galope para me sossegar. Eu, de fato, estou ansiosa para sair da zona de conflito, premeditando o perigo advertido pelo pedinte.
- Eu deixei a bagagem no armazém para você mandar buscar depois. Eu trouxe muita coisa, pois a medicina que irei praticar é instrumentalizada. Há equipamento que não se encontra por aqui.
9
- Isso está de acordo com o que combinamos, pois a sua especialidade médica não tem demanda nesse fim de mundo.
Psicanálise, que tolice é essa?
- É a tendência médica, pois muitas pacientes que não tiveram bons prognósticos no tratamento convencional, encontraram solução com a abordagem analítica.
- O médico não deve perder tempo com o paciente; apenas faz a consulta e manda ele se tratar em casa. No caso de cirurgia, o tratamento é ‘in loco’, mas a recuperação não precisa do médico. Para isso existem os assistentes.
- Eu sei da sua opinião, sempre com vistas ao ganho de dinheiro. Mas, saiba que me beneficiei desse tratamento, em minhas crises de histeria.
- As mulheres aqui não têm tempo de apresentar sintoma da histeria. Elas são ocupadas em cuidar da casa, marido e filhos. E
não tente me convencer com a história da sociedade vitoriana. –
Eu apenas sorrio. – Sabe o que você vai fazer aqui? Eu não quis falar sobre isso em carta, mas é previsível que fará muitos partos. Acho que diminuirá a mortandade das mães e não perderemos tantas crianças.
- Ah, eu previ e trouxe até cama apropriada. O doutor Freud lamentou que profissional de minha competência esteja restrita a isso.
- Freud, sempre Freud. Qual é mesmo a idade dele? Quarenta e quatro anos? Se ele aparecer por essas bandas, eu boto os cachorros em cima dele. – Joseph aponta seus capangas e eu rio de sua ciumeira.
- Você não esteja a fazer insinuações com meu mestre. Uma atitude terapêutica preconizada por ele é não retribuir os sentimentos do paciente. Este pode até se apaixonar pelo médico, mas esse não pode corresponder. Ao contar ao médico sentimentos mal resolvidos, estou fazendo transferência, o que é 10
desejável. Se, por outro lado, ele fizer contratransferência vai piorar a minha doença. – E coloco lenha na fogueira: – eu posso até me apaixonar pelo médico, mas ele jamais deve corresponder.
- Espero que ele não venha nos visitar. – Joseph fala afobado e muda de assunto. – Olhe essa é a entrada da fazenda que eu comprei. Fica perto da cidade grande, para o caso de você querer trabalhar ali. Acho que a clientela é mais promissora. A casa é boa e a área de cultivo é fértil.
- Esta não é a fazenda onde nos conhecemos, numa festa da juventude? – Ele confirma com um sorriso. – Você não me falou dessa aquisição. Eu estou disposta para trabalhar em minha cidadezinha. Acho que o povo fará peregrinação para me consultar, onde eu estiver.
- Neste caso, nem a fazenda dos meus pais lhe servirá. Você terá de residir no sítio de seus avós, que está mais perto.... – Ele faz careta de desagrado. – Ocasionalmente talvez possa visitar seu marido, murmura entre dentes.
- Não vejo a hora de chegar lá, abraçar todo mundo, ouvir os versos de meu irmãozinho e me jogar na minha cama. Este é o meu maior desejo, pois minha mãe disse em carta que my bedroom is really nice3.
- Na cama eu posso lhe fazer uma massagem confortante?
- Ah, você sabe fazer, esteve treinando?
- Tem coisas que não precisa treinamento... – Joseph coloca a mão em meu joelho e a retiro cortesmente, olhando sua aliança.
- Vejo que você leva a sério o nosso noivado. Aquilo não foi brincadeira de jovens? – Ele também observa a minha mão com aliança.
3 O meu quarto é muito agradável
11
- Seguramente foi brincadeira feita por jovens entusiastas, mas podemos renovar os votos. Veja aqui a entrada da fazenda dos meus pais, equidistante da cidade grande e da sua cidade. Será também um bom lugar de pouso para nós.
- Depois teremos tempo de passear por todos esses lugares, mas agora tem gente me esperando em minha casa. Seu irmão caçula veio da capital para nos visitar?
- Sim, ele pretende fazer os mesmos estudos que você....
- Até imagino quantas perguntas me fará o cunhado. Seus pais podem preparar os bolsos, pois têm um filho inglês.
- Ah, eles são entusiastas. Você tem dado bons exemplos.
- Quem mais me espera, que não seja de minha casa? Há alguém da cidade? – Eu tenho receio de encontrar o ajudante de xerife, com quem namorei na juventude e que me assediou por ocasião do noivado.
- Há algumas senhoras que costumam visitar dona Aline, com seus maridos. Quando eu saí, o xerife esperava a visita do prefeito e seus pares. Ninguém mais, mas na cidade há grande expectativa.
- Eu pensei que o ajudante do xerife fizesse parte da tua guarda.
– A lembrança dele é temerosa.
- Ah, David está no lugar do xerife; seu padrasto não abre mão da proteção dele, e a mim serve em outro posto.
- Se não é mais seu ‘anjo da guarda’, o que seria?
- Digamos que seja um homem de confiança... desses que me defendem em qualquer situação. Mas, por que estamos falando dele? – Eu bem que gostaria que ele estivesse longe de minha casa, casado e feliz... o doutor Freud diz que o temor do encontro reflete o desejo de encontrar.
- Eu me interesso pelas tuas amizades e não acho que essa seja apropriada. Parece que o rapaz se dedica inteiramente, nem tem 12
tempo para a família. – Joseph se cala e me deixa bisonha, pois nem minha mãe sabe da vida afetiva dele.
Avistamos o acesso ao sítio de meus avós, quando se ouve tropel de cavalos. Joseph pede que os rapazes fiquem precavidos. Diversos cavaleiros cercam a charrete. Quatro deles avançam e bloqueiam a passagem, outros ficam na retaguarda.
Joseph ordena seus capangas que afastem os meliantes e os vê alvejados por balas de todas as direções.
Ele tenta reagir, mas é agredido por coronhada de rifle. Eu lhe seguro no colo para não cair da carruagem e o vejo desacordado; verifico sangramento na altura da orelha. Tento averiguar seu pulso e outros sinais de vida, mas sou arrancada do veículo e lançada sobre um cavalo. Eu me debato e o cavaleiro agarra minhas coxas para evitar que caia; então ouço um berro:
- Não o mate, imbecil! Ele trará dinheiro para resgatar a doutora. – Isso alimenta minha esperança, pois entendo que Joseph está vivo. O outro argumenta:
- Eu queria tirar o anel, cortando o dedo. – O cavalo em que eu estou escanchada parte e fica a incógnita do que possa ter acontecido com a integridade do meu noivo.
Estamos em disparada e eu passo maus bocados: sufocada pela pressão da mão do homem em meus quadris, eu sinto vertigens tendo as costelas premidas sobre o lombo do cavalo. Tudo o que vejo é a bota do cavaleiro e as patas do cavalo a galope. Vêm as náuseas e me ponho a vomitar. O homem breca o cavalo e fica bravo, jogando-me no chão. Eu não consigo me equilibrar e corro trôpega. Outros me cercam, enquanto o sujeito despeja água na bota. Cabelos em desalinho, eu não consigo ver nada.
- Deixem a vadia e vamos embora. – Alguém grita. Nunca um acinte me soou tão bem. Mas outro retruca:
- Eu já disse que precisamos dela para a nossa proteção.
13
- Ela é de valor, pois é doutora e tem um noivo rico. Allan, monte-a no cavalo de Boy. Vamos, rápido! não temos tempo a perder.
Alguém me joga em um cavalo e seguimos em disparada.
Sentada no colo do cavaleiro, eu seguro a crina do animal. Isso é desconfortável, mas bem melhor que escanchada no seu lombo. Apesar de ser eximia amazona, somente entro no ritmo de cavalgadura quando o homem segura minha cintura com uma mão.
Nosso cavalo fica retardatário, mas o cavaleiro se mantém no encalço. Transcorrido muito tempo de cavalgada, todos apeiam num bosque encorpado, menos o meu brioso, que prime meus quadris contra si.
- Vamos logo fazer a partilha. Cada um pegue a sua bolsa.
- Vejam, Boy já tem a sua parte. O dinheiro dele pode ser dividido entre nós. – O rapaz me larga e se junta aos demais.
Todos riem às gargalhadas, deixando-o acanhado.
- Nada sobe mais rápido que pau de adolescente –, alguns apontam a as calças meladas e o aborrecem.
- ...e persistente: como se mantém duro depois de gozar?
- Eu nem consigo me imaginar gozando enquanto cavalgo.
Eu tento me fastar no cavalo, mas sou detida e lançada ao chão.
Aturdida, rolo pelo chão. Levanto e corro sem rumo, tropeço e caio. Os homens gargalham e um deles vem me levantar e abraça por trás, querendo imitar o boy.
- Solte-a. Ela garantirá a nossa fuga. Não tenha medo, doutora, que não vamos machucá-la. Você ficará livre amanhã, quando vierem lhe resgatar ou, se desistirem da perseguição e nos deixarem prosseguir na fuga.
- Chefe, quanto vamos cobrar pelo resgate? Ela vale uma nota.
– Alguém faz a sugestão.
14
- A negociação de resgate é complicada e não devemos arriscar nossas posses. Não podemos perder tempo. Afinal, já temos muito dinheiro.
- Jonas, você será o primeiro a montar guarda no sopé do monte. E o boy fará vigilância à refém – O chefe sorrir.
II – O SEQUESTRO
Eu estou em polvorosa, mas procuro não demonstrar. Penso no meu noivo, ferido na cabeça e talvez sem um dedo e temo que não tenha condição de vir me resgatar. Observo em derredor, buscando rota de fuga e sinto medo ao ver a mata fechada. A minha roupa não favorece.
Escurece e me sinto angustiada ante a possibilidade de passar a noite com esses homens rudes, mormente agora que viram um garoto tirar proveito. Entrego-me à oração e procuro afastar da mente todo pensamento negativo. A minha mãe tem costume de orar e não vejo resultado, mas no momento eu não tenho outro recurso.
Depois da partilha do assalto, eles preparam fogo para assar carne. Mantenho-me agachada, recostada numa rocha, tentando apresentar péssima aparência. O rapaz que me conduziu vem oferecer comida e rejeito.
- A noite será longa e ninguém virá em seu socorro antes do amanhecer. – Ele me olha com meiguice, talvez lembrando a cavalgada.
- Eu não quero nada de vocês –, para não dar ousadia. Vejo seus olhos escuros, pele sardenta, rosto de adolescente e ele me olha com ardor.
O homem designado para fazer sentinela no sopé parte a cavalo mastigando a carne. O rapaz que ofereceu comida puxa meu braço, eu resisto em acompanha-lo e tenho o braço torcido, grito 15
e sou lançada ao chão.
- Ei, garoto, saiba conversar com mulher. Parece que ela não gostou de você ter-se aproveitado....
- Talvez ela prefira um homem - Outro se aproxima e o empurra, ao que do chão o rapaz saca o revólver.
- Epa, nada de tiros aqui. Se vocês quiserem deitar com a moça, disputem no muque.
- Eu também quero, chefe. Na estação ela me rejeitou e agora posso tirar à forra – os dois homens se defrontam.
- Então eu mesmo escolho. Você será o terceiro e vai dormir com ela. Joe, você tem dez minutos e depois Alfred terá vinte.
Boy já fez a parte dele.
"Não se afobem. Como se diz, ‘lavou tá novo’. Depois, vocês dois vão se alternar na guarda no sopé do monte. – Outros se voluntariam e o chefe se mostra zangado:
"A moça precisa dormir, para estar descansada quando for resgatada, e vocês também necessitam para poder fugirem.
Ademais, todos têm dinheiro e podem ter mulheres no bordel. –
Eu corro para ele, suplicante, mas o homem refuta: – Não, eu não! – O sujeito se esquiva, talvez pensando que eu lhe escolha.
- Por favor, não permita que eles abusem de mim. Eu sou médica e vocês podem precisar algum dia de meus cuidados. O
meu noivo ficará grato....
- Doutora, eu não posso negar o que meus rapazes precisam. Se divirta também, que seu noivo perdoará, se ele tiver amor... – eu seguro seu braço, ao que ele o recolhe, com trejeitos.
- Por favor, eu suplico. Eu posso engravidar.
- Ora, você tem outros recursos, como todo mundo. – Eu cuspo no rosto dele, esperando que revide para mudar o foco. Mas ele ri e com o braço ordena a um homem para me levar. – Não a maltratem, saibam negociar.
16
- Isso vai lhes custar caro. O meu noivo não perdoará.
- Espero que ele cuide bem do filho de meus rapazes. Será que um filho pode ter mais de um pai? O que a sua ciência diz sobre isso, doutora? – Esse é o chefe da gangue, o último dos sequestradores a morrer.
O tal Joe pega meu braço, conduz-me para trás de um rochedo.
Eu resisto, peço socorro aos berros e apenas ouço gargalhadas.
Lembro-me que meu pai me salvara em situação semelhante e murmuro:
- Paizinho, socorra-me. – O sujeito me conduz a uma clareira, suspende e joga ao chão. – Não faça isso, não maltrate. – Eu sempre temi hematomas. Ele sentencia:
- Tire a roupa, que não lhe machuco. – Abaixo a calcinha, ele arrebata de minha mão e a põe na cabeça. – Vire se não quer engravidar. – Ele solta a cartucheira, baixa as calças e manipula o membro, alarmando-me.
- Ai ai ai, não me aperte –, eu me viro de bruços e espero com angústia ser violentada, mas nada acontece.
Ouço barulhos de luta às costas e penso que outro veio reclamar pelo tempo gasto. Ao me voltar, vejo o homem debatendo para se livrar de outro que o agride pelas costas. Vejo o reflexo de uma lâmina e os dois caem ao chão.
Forma-se uma poça de sangue sob a cabeça do meu agressor e olhando o outro, vejo sua cabeleira refletida à luz do luar: dourada, parecendo juba de leão. Assusto-me quando percebo o corpo dele com formato de um felino. Ao se levantar, diviso um pequeno homem e pergunto:
- Quem é você? – Eu não lembro de tê-lo visto entre os outros bandidos. Ele me entrega uma moeda, a mesma que eu havia feito doação. – Ah, é o garoto da estação.
- Tome sua calcinha. Não a tire para ninguém. – Ele retira da cabeça do estuprador e ma entrega.
17
- Você chegou em boa hora. Eu sou grata e asseguro a oferta que lhe fiz. O meu noivo lhe recompensará e aquele emprego será garantido por mim. – Eu falo sussurrando e de costas me visto. Quando me viro, estou só. Ninguém há comigo, além do morto. – Garoto, rapaz, moço! – Eu chamo em voz baixa e não obtenho resposta. Inquieto-me, pois, a morte do bandido poderá me complicar.
Lembro-me do clamor que fiz ao meu pai e penso que fui atendida. Olho em volta, ando de um lado para outro sem propósito; desejo me embrenhar na mata, mas me falta coragem. Ouço passos e me animo, mas logo vem à decepção, quando percebo a aproximação de outro bandoleiro. Ele murmura o nome do comparsa e vendo apenas a mim, adianta-se e tropeça no corpo do morto. Agacha-se e vê seu pescoço cortado.
- O que você fez com ele? – Avança em minha direção. – Você o matou? – Eu nego, meneando a cabeça.
Ele corre para avisar os parceiros e em pouco estou rodeada de homens, furiosos, inquirindo sobre o que aconteceu. O chefe chega por último e vem rangendo os dentes em minha direção.
- Você o matou? – O chefe pergunta, sacudindo-me. Eu nada falo, traumatizada, e ele se enfurece