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Música e religião na era do pop
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E-book293 páginas5 horas

Música e religião na era do pop

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Sobre este e-book

Este livro trata da música sacra religiosa na nossa época apresentando uma nova visão que conjuga a musicologia, a sociologia e os estudos da mídia. As mudanças ocasionadas pela indústria musical e o consumo de bens musicais não poderiam deixar de afetar a prática musical nas igrejas. O mundo mudou e a música sacra não ficaria ilesa diante dessa avalanche. Entretanto, a rapidez dessa mudança e a expansão dos seus efeitos são surpreendentes. O que podemos fazer, então, é procurar compreendê-la, pois, como escreve Joêzer Mendonça, "o gospel é a coluna mestra do mercado evangélico, fazendo parte dos novos comportamentos cristãos observados na esteira das transformações religiosas e culturais". Prof.ª Dr.ª Dorotéa Kerr (Instituto de Artes-UNESP)
IdiomaPortuguês
Data de lançamento11 de jul. de 2017
ISBN9788581923116
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    Música e religião na era do pop - Joêzer Mendonça

    pós-moderna.

    CAPÍTULO 1

    CULTURA PÓS-MODERNA E RELIGIÃO

    Uma multidão aguarda com ansiedade o início do espetáculo. Grande parte do público é composta de VIPs. Os músicos estão prontos. Os primeiros acordes soam. A música atravessa o enorme espaço aberto e o público imediatamente muda de comportamento.

    Essa não é a descrição de um show contemporâneo realizado em um estádio, mas o começo da cerimônia religiosa idealizada por Nabucodonosor, rei de Babilônia, em que ilustres convidados da política e da magistratura do reino curvaram-se, com exceção de três pessoas, diante de uma gigantesca estátua de ouro durante um ritual de adoração que envolvia monarquia e religião, segundo consta no livro bíblico de Daniel (capítulo 3:1-17).

    Música e religião estão inseparavelmente ligadas desde os rituais das culturas mais antigas, como mostram os registros bíblicos dos cultos babilônicos e dos serviços litúrgicos no templo judaico no período antes de Cristo. A música tem sido uma expressão da comunhão e da comunidade cristãs desde o canto da igreja primitiva, passando pelo coral católico gregoriano e pelo coral luterano da Reforma, seguindo pelos hinos protestantes norte-americanos do século XIX até chegar às variações do gospel contemporâneo.

    Para o etnomusicólogo Bruno Nettl (1983, p. 145-148), uma das funções da música nas sociedades humanas é controlar e mediar o relacionamento do indivíduo com a divindade ou com o sobrenatural. No cristianismo moderno, a música também serve como elo de comunicação entre os cristãos e Deus, além de contribuir para a criação de um ambiente apropriado para a expressão de adoração e emoção coletivas. Os momentos de louvor e adoração das igrejas cristãs revelam diversas formas de expressão musical que atendem aos padrões culturais e religiosos dos fiéis, seja nos templos, nas casas de espetáculos, nos espaços públicos ou na privacidade do lar.

    Essa música é portadora de um conteúdo doutrinário específico ao comunicar por meio de suas letras os aspectos da vida e da teologia cristãs. Se essa música apresenta particularidades teológicas na letra, o estilo musical também pode manifestar características que representam a interpretação teológica de determinado grupo religioso. Lois Al Faruqi (1975, p. 1) escreve que as ideias religiosas têm moldado de maneiras sutis tanto o conteúdo como a forma da herança musical de uma cultura. A autora considera que a influência da religião afeta igualmente a expressão musical de uma instituição religiosa e a música de natureza não religiosa ou secular.

    Isso significa que a música cristã é produzida de acordo com as noções teológicas do compositor. Por outro lado, seria o caso de perguntar se uma determinada visão teológica não influencia também o modo de cantar e o modo de comercializar a música.

    Portanto, se as ideias religiosas afetam a expressão musical, é preciso ver também como a mentalidade religiosa é afetada pelo impacto das novas relações sociais, econômicas e culturais.

    1.1 Tempos pós-modernos

    Uma imagem bastante conhecida é aquela em que Carlitos, personagem de Charles Chaplin, é literalmente engolido pela máquina na cena que configura uma sátira à mecanização do homem pelo capitalismo mais selvagem. Essa é uma cena clássica do filme Tempos Modernos, de 1936. Hoje, talvez Chaplin criasse cenas em que o homem contemporâneo fosse devorado pela máquina do entretenimento mais espetacular dos tempos pós-modernos.

    Tais tempos, que se referem ao universo social, cultural e econômico que se configurou após a II Guerra Mundial, têm sido rotulados como hipermodernidade (para Gilles Lipovetsky), modernidade tardia ou reflexiva (para Anthony Giddens) ou sociedade do espetáculo (segundo Guy Debord).

    Em 1947, Arnold J. Toynbee cunhou o termo pós-modernidade para assinalar uma nova etapa na civilização ocidental. Mais tarde, na década de 70, o termo foi relacionado às transformações promovidas na arquitetura, nas artes visuais e na música.

    Segundo o historiador Perry Anderson (1999, p. 139), o pós-Modernismo surgiu como um dominante cultural nas sociedades capitalistas de riqueza sem precedentes e com índices bastante elevados de consumo.

    A teoria do pós-modernismo chama a atenção para mudanças que vêm ocorrendo na cultura contemporânea. Essas mudanças podem ser compreendidas segundo três perspectivas: modificações nos campos artísticos, intelectuais e acadêmicos; mudança na esfera cultural mais ampla, envolvendo novos modos de produção, consumo e circulação de bens simbólicos; mudanças nas práticas e experiências cotidianas de diferentes grupos que estão desenvolvendo novas estruturas de identidade (FEATHERSTONE, 1995, p. 29-30).

    Falar em pós-modernidade sugere a polêmica noção de uma modernidade anterior cujo ciclo teria se esgotado. Então, quando e de onde partiram os sinais do declínio da modernidade a fim de que um novo ciclo fosse indicado?

    Fredric Jameson (1993, p. 32) aponta um sentimento geral de que, em algum momento do pós-guerra, um novo tipo de sociedade começou a emergir. Essa sociedade revelava alguns traços que marcam uma ruptura radical com a sociedade do pré-guerra, principalmente no que se refere aos novos tipos de consumo: a obsolescência planejada, que interfere no ritmo cada vez mais veloz de mudanças na moda e no estilo; a gigantesca força da propaganda, da TV e dos meios de comunicação.

    Após as grandes guerras mundiais da primeira metade do século XX, houve um crescente desencanto em relação ao desempenho da ciência, quando esta, a partir do Iluminismo, prometia atender tanto às aspirações de igualdade social quanto aos anseios humanistas e espirituais. Mais pessoas passaram a rejeitar os antigos discursos sobre o significado da vida e a organização da sociedade, o que motivou o surgimento de novas explicações para a realidade e intensificou a crise das grandes narrativas explicadoras do mundo, as quais teriam deixado de modelar as formas reais da vida social, política, econômica e cultural (LYOTARD, 2006, p. 43).

    O indivíduo que vive na pós-modernidade relaciona-se, então, com a variedade e a diferença. Esse cenário implicaria na constante informação sobre muitos assuntos e na produção de relações efêmeras. Além disso, a variedade de opções e reivindicações de direito teria gerado um tipo de liberdade em que se desenvolve uma moral sem sanções, sem repressões, em que haveria mais escolhas que obrigações (HOUTARD, 2003, p. 104).

    Essa nova realidade produz uma oferta simultânea de opções filosóficas, estéticas, religiosas, culturais e políticas criando um cenário em que a sincronia toma o lugar da diacronia, a co-presença toma o lugar da sucessão e o presente perpétuo toma o lugar da história (BAUMAN, x998, p.127). É a sociedade do tudo-ao-mesmo-tempo-aqui-agora.

    Mike Featherstone (1997, p. 69) conclui que o efeito do pós-modernismo se traduz em um indivíduo que perdeu o senso de continuidade entre o passado, o presente e o futuro e que abandonou as preocupações teleológicas mais amplas, isto é, não mais crê que a vida é um projeto com um significado. Esse pensamento seria consequência do bombardeamento de símbolos e imagens desconectadas da realidade, que oferecem um sentido de imersão e imediatismo, mas também se deve a um senso relativista que se enraizou em nossa sociedade.

    Em meio a essas descrições do novo sujeito que emerge na contemporaneidade, é preciso saber de que indivíduo os teóricos estão falando. Provavelmente, devemos excluir os grupos religiosos desse rol de pessoas despreocupadas com a existência da ideia de Absoluto ou com o sentido da vida, pois os grupos cristãos, por exemplo, entendem a história da humanidade como um processo teleológico, ou seja, como um todo que se dirige a um fim, a um propósito dirigido por uma entidade divina absoluta.

    Outro valor caro ao sujeito contemporâneo é a sua independência pessoal, a maior autonomia de estruturar sua vida de acordo com os parâmetros e princípios que lhe são mais convenientes. Zygmunt Bauman (1998, p. 9-10) considera que a liberdade individual reina soberana: é o valor pelo qual todos os outros valores vieram a ser avaliados e a referência pela qual a sabedoria acerca das normas e resoluções supraindividuais devem ser medidas.

    Em resumo, segundo os teóricos que mencionamos, as características mais visíveis da pós-modernidade são:

    1) A relativização das ideologias universalizantes que dariam sentido ao mundo em contraste com a primazia do conhecimento local e da diversidade;

    2) A diluição de antigas hierarquias de juízos de valor, dissolvendo a dicotomia entre as categorias de cultura (superior/inferior, alta cultura/ baixa cultura, erudita /popular);

    3) A exaltação da cultura do entretenimento e a superexposição de símbolos e imagens provenientes da cultura das mídias;

    4) A convivência simultânea de tradições e a forte valorização da liberdade individual.

    Há críticos que tendem a menosprezar a pós-modernidade, vista em linhas gerais como uma qualidade que deturpou os valores modernos, que esvaziou a vida de sentido, que celebra a fantasia e o entretenimento em prejuízo da realidade e da arte.

    Outros teóricos rejeitam a ideia de que o pós-modernismo é uma ruptura cultural definitiva e preferem designá-lo como um processo cultural em andamento (HUTCHEON, 1991). Seja um processo em andamento ou uma ruptura cultural, estamos de tal forma dentro da cultura do pós-modernismo que é tão impossível um repúdio simplista quanto o é uma celebração igualmente simplista, complacente e corrupta (JAMESON, 1997, p. 87).

    Há outros analistas que criticam o argumento de que as metanarrativas, as grandes narrativas universais (como o Marxismo e o Cristianismo), estão em fase terminal. Peter Osborne (1995, p. 157) afirmou que a narrativa da morte da metanarrativa é em si mais grandiosa que a maioria das narrativas que ela destinaria ao esquecimento.

    Com isso em mente, podemos dizer que, se em algum momento os grandes relatos explicadores do mundo perderam credibilidade, também não é incorreto supor que está em andamento uma continuidade da narrativa universalizante na forma do fundamentalismo islâmico, do neopentecostalismo terceiro-mundista, do triunfo da globalização, do humanismo ecológico e da hegemonia do capitalismo de mercado.

    Nesse controverso cenário em que se discute o esgotamento do paradigma modernista, surgem novas práticas e atitudes nas mais diversas áreas. Na ciência, cujas descobertas da física e da bioquímica têm de ser entendidas à luz da noção de que a verdade e o conhecimento são relativos e dependentes da cosmovisão filosófica da qual a própria ciência emerge; na política, às voltas com a emergência de modelos pragmáticos de gestão pública e com os fundamentalismos religiosos de ordem ética ou geopolítica; na economia, que tem de lidar com o poder do capital especulativo das bolsas de valores e a partilha de gestão com as megaempresas; na religião, que experimenta uma forte crise de credibilidade institucional e uma explosão de variantes religiosas.

    Nessa perspectiva, os indivíduos vivem numa sociedade pós-tudo: pós-industrial, visto que os países mais desenvolvidos enveredam por uma sociedade de prestação de serviços e de mídias; pós-patriarcal, nas relações mais igualitárias entre os sexos; pós-ideológica, devido ao desgaste das grandes ideologias e a predominância de uma cosmovisão relativista; pós-euroamericana, com a ascensão econômica da China, da Índia, do Brasil e demais países emergentes que passam a ter voz na arena das decisões mundiais; pós-confessional e inter-religiosa, o que significa, para o teólogo Hans Küng (2003, p. 46), que está em andamento a formação de uma comunidade mundial multiconfessional e ecumênica.

    1.2 Crise da religião ou da igreja?

    A religião, particularmente o cristianismo, deixou de exercer um papel comunicador de sentido à existência do sujeito moderno?

    O sociólogo Renato Ortiz (2006, p. 128) avalia que o advento da sociedade industrial não implica o desaparecimento da religião, mas sim o declínio de sua centralidade enquanto forma e instrumento hegemônico de organização social.

    É certo que, ao despontar o século XXI, o monopólio religioso, centralizador e regulador, apresenta-se, de forma global, enfraquecido e quase desprovido de autoridade oficial sobre a pauta de discussões contemporâneas. O peso das decisões eclesiásticas não sobrecarrega mais o cotidiano dos fiéis, como nas épocas do catolicismo medieval ou do puritanismo anglo-saxão, e aparenta ter menor relevância para os líderes nacionais ocidentais, ainda que o atual tratamento concedido ao Vaticano possa variar entre o diplomático e o reverente.

    Livros recentes, como Deus, um delírio, de Richard Dawkins, e Deus não é grande, de Christopher Hitchens, demonstram as tentativas de pensadores e cientistas de isolar a religião da sociedade atual, vislumbrando a chegada das classes operária, científica e filosófica a um paraíso pós-cristão sem Deus e sem religiosos. Em outro polo, Terry Eagleton (2011) considera que muitos críticos são apressados demais em rejeitar a religião e costumam fazer uma caricatura barata da realidade.

    A religião institucionalizada vem marcando maior presença no cenário de discussões globais como a ética e a ecologia. A declaração do Parlamento das Religiões Universais, realizado em Chicago, no ano de 1993, concluiu que, diante do estado de crise generalizado que assola o mundo atual e face à complexidade de resolução dos problemas, as religiões universais teriam um papel fundamental na elaboração de um consenso quanto a uma ordem global relacionada a uma ética global.

    Embora sem a imensa representação política de séculos passados, e dentro de uma Europa bastante laica e secularizada, o catolicismo e o protestantismo participam de reuniões formais no parlamento da União Europeia com a finalidade de elaborar projetos ecumênicos que visam salvaguardar a cultura cristã europeia e também influir nas questões dos direitos civis e religiosos.

    A ecologia surge também como um importante referencial adotado por religiosos.¹ A integração homem-natureza e a ação planetária para salvaguardar a Terra tornou-se um paradigma em torno do qual seria possível reorganizar atitudes e condutas em escala global. O ecumenismo religioso abre espaço para uma espécie de ECOmenismo e vice-versa.

    Hans Küng (2003, p. 115-119) enxerga a necessidade de um engajamento social e político das religiões na construção de uma ética mundial e na constituição de um consenso básico sobre convicções humanas integradoras. A busca pela solidariedade ecológica e pela superação das divisões entre as religiões comparece no discurso da necessidade de uma ordem mundial amiga da natureza e também ecumênica.

    Nos últimos anos do século XX, a ala evangélica norte-americana mais conservadora voltou a ter força na agenda política de Washington. Seja na legislação de conteúdos disciplinares nas escolas, seja nos debates sobre temas controversos - leis de imigração, direitos dos homossexuais, aborto, pesquisas com células-tronco -, seja nas discussões sobre a interferência federal no mercado, a chamada Nova Direita Cristã vê seu tamanho crescer na arena política. Para a teóloga Karen Armstrong (2009, p. 422), esse recrudescimento do fundamentalismo evangélico envolve, em certo aspecto, uma ressacralização da política.

    No Brasil, apesar de congregar diferentes igrejas e partidos políticos no Congresso Nacional, a Frente Parlamentar Evangélica (FPE) demonstra unidade quando se trata de defender a moral cristã tradicional ou os interesses institucionais das igrejas. Católicos e evangélicos mostram a força do lobby religioso contrário a projetos de lei que criminalizam a homofobia ou que visam legalizar a eutanásia e o aborto, o que tem levado candidatos que disputam uma eleição a reformular sua agenda liberal de olho nos votos dos grupos cristãos.

    A descentralização da religião não afeta sua própria razão de existir na esfera global, mas favorece um processo de desmoronamento da religiosidade institucionalizada. Há uma demanda pelas identidades religiosas locais ou particulares, coletivas ou individuais, que concedem às instituições oficiais uma autoridade não mais total, mas parcial. É o cenário adequado para a manifestação de práticas religiosas reprimidas pela tradição dominante e para o surgimento de modelos renovados de comunhão com o sagrado. Esse processo de diluição da hierarquia religiosa, notadamente por meio da autonomia do adorador e do fortalecimento da pluralidade de crenças, está presente nas mudanças que afetam as religiões cristãs.

    1.3 O grito de independência individual

    Na pós-modernidade, o sujeito busca um espaço de afirmação individual, abandonando as zonas de segurança que outrora lhe davam pequena mobilidade social e menor independência pessoal. Gilles Lipovetsky (2009, p. 205) chama de explosão hiperindividualista o processo de liberdade ou emancipação privada dos indivíduos. Seja nas relações sexuais, no comportamento feminino, no próprio visual ou nas relações de trabalho, as pessoas desejam maior autonomia e liberdade.

    No âmbito religioso, a tônica pós-moderna reforça a crise dos tradicionalismos, cada vez mais destituídos de poder de legitimação, e cria condições para que se conceda ao adorador mais autonomia de pensamento em relação ao sagrado. Entretanto, não se pode falar em autonomia total do leigo na esfera institucional: não há qualquer tipo puro na prática: o indivíduo nunca é totalmente autônomo, nem a instituição (DOLGHIE, 2007, p. 40).

    De fato, para que determinada organização religiosa garanta sua sobrevivência, é necessário que ela atenda às novas demandas de satisfação pessoal dos leigos, pois estes encontram maior possibilidade de reação à ideologia da igreja graças à independência individual encontrada. Por isso, é preferível falar em relativização da autoridade institucional e intensificação da autonomia do indivíduo.

    As mudanças efetuadas na cultura religiosa pós-moderna têm flexibilizado o sentido das histórias da Bíblia para as populações urbanas contemporâneas. Essas antigas narrativas não são mais tomadas literalmente, mas figurativa e alegoricamente, e assim são destituídas de seu conteúdo exótico ou arcaico, cuja linguagem e figuração essencialmente abstratas (ansiedade, culpa, redenção) são recodificadas pelo público urbano de acordo com suas próprias situações particulares (JAMESON, 1997, p. 387).

    A modificação da apresentação do conteúdo moral ou religioso dos textos antigos não é exclusividade do sujeito ocidental. Wang Gungwu (citado por ORTIZ, 2006, p. 148) também identifica que as qualidades cultivadas pelo confucionismo são consideradas demasiadamente exigentes pelos jovens e, a menos que sejam reinterpretadas em termos modernos, reembaladas numa retórica moderna, dificilmente serão atrativas para as futuras gerações de pessoas educadas.

    O indivíduo pós-moderno está também em busca de sua dimensão mais profunda, o que o levaria a fazer experiências de transcendência que ultrapassem este mundo, que superem os limites impostos pela ciência, até chegar a captar o absoluto em si mesmo, o próprio Deus em nós (TERRIN, 1996, p. 19). Essa localização do transcendente dentro dos próprios indivíduos, junto com a noção de que a divindade ou o sagrado não são alcançados exclusivamente através das mediações religiosas institucionalizadas, faz parte das transformações culturais e religiosas atuais (CAMPOS, 1997, p.

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