Kuki: Raça Alvirribra
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Kuki - Marcelo Cavalcante
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2018 © Marcelo Cavalcante
Companhia Editora de Pernambuco
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CEP 50100–140 – Recife – PE
Fone: 81 3183.2700
K96c Cavalcante, Marcelo
Kuki : raça alvirrubra / Marcelo Cavalcante. – Recife :
Cepe, 2017.
126p. : il.
1. Kuki, 1971 – Biografia. 2. Jogadores de futebol –
Pernambuco – Biografia. 3. Clube Náutico Capibaribe –
Recife (pe). 4. Futebol – Pernambuco. I. Título.
CDU Kuki
CDD 920
PeR – BPE 17-83
abola na marca do pênalti. Ele estava na risca da grande área. Ansioso, mas muito confiante. Dividia o olhar entre a pelota e o goleiro João Carlos à sua frente. Nada no mundo abalaria sua atenção. Nem mesmo aquelas mais de 70 mil pessoas no Estádio do Arruda, que prenderam a respiração para ver a cobrança. Atrás da trave estava um mar vermelho e branco. Era a torcida do Náutico louca para gritar gol e iniciar a festa do título de Campeão Pernambucano de 2011. Já se passavam 21 minutos do segundo tempo, quando o árbitro Antônio André assinalou a penalidade. Momento crucial da partida. E Silvio Luiz Borba, o Kuki, carregou nas costas e na ponta da chuteira a responsabilidade de fazer a torcida feliz. Um filme que contava a história da sua superação, da vida humilde em Roca Sales, interior do Rio Grande do Sul, até aquele momento, rodava sem parar na sua cabeça. Até que o árbitro apitou. Ele partiu em velocidade e desferiu um chute seco e rasteiro no canto esquerdo do goleiro João Carlos. Correu para a bandeira de escanteio à sua direita para comemorar com a torcida. Os demais jogadores pularam em suas costas, formando uma montanha da mais pura alegria. Estava aberto o placar. O Náutico ainda faria
2x0 sobre o Santa Cruz, gol de Tiago Gentil, garantindo a vitória e o título estadual no ano do centenário do Timbu. Kuki entrava para a história como um dos mais importantes ídolos do clube da Avenida Conselheiro Rosa e Silva. Peça importante nas conquistas do Náutico no século XXI. Em quase 10 anos de carreira vestindo a camisa do Timbu, marcou 184 gols, sendo o terceiro maior artilheiro da história do clube, atrás apenas de Bita e Fernando Carvalheira. Foram 395 partidas com a camisa alvirrubra, garantindo vaga na galeria dos atletas que mais defenderam o Náutico. Uma história de superação e muita dedicação de um atleta que jamais imaginaria morar no Recife. Muito menos construir uma forte relação de amor à cidade e ao clube.
Silvio Luiz Borba da Silva nasceu no dia 30 de abril de 1971, na cidade de Crateús, no Ceará, distante quase 300 quilômetros da capital Fortaleza. Filho do pai militar, Luís Dalto Cândido da Silva e da dona de casa Othenia Borba da Silva, tem dois irmãos: a mais velha, Janaína, e o caçula Luciano. Não foram criados juntos. Quando Kuki tinha sete meses de vida, Luís Dalto deixou o interior cearense e seguiu viagem para Roca Sales, pequeno município do interior do Rio Grande do Sul, distante cerca de 150 km de Porto Alegre, onde deixou o pequeno Silvio sob os cuidados da avó Irene, mãe de dona Othenia. Ao receber o garoto, dona Irene de imediato lhe colocou o apelido carinhoso de Kuki, ele passou a morar ao lado, também, do avô Silvio e dos tios Adão, Eva e Raquel. Tinham uma vida humilde. Dona Irene era lavadeira do curtume, enquanto seu Silvio, era gari da prefeitura de Roca Sales. Kuki foi criado com muito carinho e com a liberdade que toda criança precisa para se desenvolver.
— Kuki foi um presente que ganhamos. Ele foi um filho muito lindo e amado. Somos todos apaixonados por ele. Sempre muito querido e carismático. A forte lembrança que tenho dele, quando criança, era ele andando naqueles triciclos, com dois ou três anos. Usava sempre um poncho vermelho. Kuki está longe, mas estamos sempre torcendo por ele — relembra a tia, dona Eva.
Aos sete anos, fazia de tudo um pouco: empinava pipa, caçava passarinho com bodoque durante o dia e, à noite, saia para pescar. Gostava também de jogar bola de gude. No entanto, sua verdadeira paixão era o futebol. Se deixassem, passava o dia inteiro jogando na rua.
— A nossa família só tem coisas boas para falar de Kuki, porque sempre foi carinhoso, amigo e carismático. Mas, quando ele já estava rapazinho, mais esperto, só queria saber de jogar futebol. A gente não gostava, pois o futebol não era bem visto pela sociedade na época. Então, ele jogava escondido — conta dona Eva.
Kuki cumpria suas obrigações educacionais. Tinha que dar uma pausa no período da tarde para os estudos. Estudava na Escola Evangélica. Gostava das aulas de português e matemática, mas no intervalo para o recreio não perdia tempo e ia bater uma bolinha com os garotos mais velhos. Já naqueles bate-bolas, mostrava o seu perfil de jogador: não gostava de perder nem disputa de pênalti, mesmo que fosse apenas para passar o tempo. Queria ganhar de todo mundo.
A infância repleta de brincadeiras resultou em seu primeiro emprego aos 14 anos. Foi obrigado por sua avó a se inscrever na fábrica de sapatos Flamar, onde fazia de tudo: encaixotava os sapatos, passava cola nos solados, fazia a faxina da fábrica. Kuki lembra perfeitamente como tudo começou:
— Eu era mesmo virado
quando criança. Não parava mesmo. Certa vez, brincando com os amigos com um carrinho de ferro, a gente estava numa ladeira e o carrinho desgovernou. Acabamos machucando um carro de verdade que estava estacionado. Corri para casa, jurando que ninguém descobriria que tinha sido eu. No outro dia, fui acordado por minha avó. Quando abri o olho, ela disse: Vamos levantar. Vou inscrever você na fábrica de sapato. Está na hora de ganhar dinheiro
. E assim comecei a trabalhar. Tenho que agradecer a minha avó por ela ter feito isso. Porque eu estava virado
mesmo —