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A profecia dos pecadores
A profecia dos pecadores
A profecia dos pecadores
E-book566 páginas7 horas

A profecia dos pecadores

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Sobre este e-book

Roma: Um padre é encontrado assassinado em circunstâncias estranhas e parece que o assassino não vai parar por aí. O inspetor Paolo Salvano, dos Carabinieri (força militar italiana), tentará capturar o que parece ser o assassino em série perfeito. Madrid: Uma inesperada passagem de avião levará o inspetor da Polícia Nacional Nicolás Valdés a seguir os passos de uma perigosa e milenar irmandade, além de ter que enfrentar seus próprios fantasmas do passado. Nenhum dos dois suspeitará que seus caminhos estão unidos. O escritor alicantino (de Alicante) Blas Ruiz Grau, após o sucesso de “A verdade vos libertará” retorna com sua continuação, com mais intriga, mais mistério e mais enigmas religiosos, sem perder as grandes doses de emoção que prendem o leitor do início ao fim. 

IdiomaPortuguês
EditoraBadPress
Data de lançamento11 de jan. de 2020
ISBN9781071525579
A profecia dos pecadores

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    A profecia dos pecadores - Blas Ruiz Grau

    Capítulo 1

    Quarta-feira, 20 de março de 2013. 04h04. Roma

    A noite estava bem fresca. Uma brisa suave movia timidamente as folhas das árvores. Isso fazia com que a sensação térmica ficasse vários graus abaixo do que os termômetros marcavam. Essa sensação lembrava que, embora naquele dia tivesse começado a primavera, o inverno ainda se recusava a ir embora.

    Noites como esta enfatizavam o quão frio tinha sido este ano na estação que ficou para trás. Isso ajudava os idosos a reafirmarem suas teorias de que o clima estava mudando. Ninguém duvidava. Muito se falava sobre o aquecimento global e razão, talvez, não lhes faltava. À brisa se acrescentava uma meteorologia caprichada. Ao longo da semana, caía, intermitentemente, uma chuva fina que incomodava mais do que qualquer outra coisa. O conjunto inteiro fazia um coquetel que conseguia deixar as ruas desertas naquele momento. Talvez também ajudasse que fossem quatro horas da manhã. De qualquer forma, era impossível encontrar um único pedestre pelas ruas da capital italiana.

    Nenhum outro além dele.

    A cidade dormia e deveria aproveitar a situação. Sua tarefa exigia solidão e isso era exatamente o que ele tinha. Outro teria agradecido a sua sorte, mas ele não acreditava nisso. Não gostava de deixar nada ao acaso, não era seu estilo, mas era claro que ele não podia controlar o quê ou quem estava vagando como zumbi por aquelas ruas. Então ver que a noite se apresentava daquela forma era algo que não podia ser desperdiçado. Era agora ou nunca.

    Impassível, como sempre se mostrava, puxou a maçaneta para abrir a pesada porta da van. Ele não estava muito satisfeito com o veículo porque era preto e, apesar do que muitas pessoas acreditavam, isso chamava muita atenção. Havia aprendido que passar despercebido era escolher um veículo que qualquer um pudesse possuir. A mudança de planos de última hora, que o fez acelerar seu trabalho, precipitou tudo e não teve escolha. Então ele acabou usando o que tinha na mão.

    Com a porta aberta, ele olhou de novo para a esquerda e para a direita. Ninguém. Apesar da aparente solidão que o mau tempo lhe oferecia, ele não conseguia baixar a guarda. Um erro colocaria tudo a perder. Ele se inclinou um pouco e colocou meio corpo dentro do veículo. A primeira coisa que ele fez foi tirar as madeiras. Ele as pregou com a exatidão que era exigida dele e estavam prontas para serem usadas ​​como a estante que iria conter seu impressionante trabalho. Eram pesadas, mas a própria adrenalina que chegava em grandes quantidades o ajudava a conseguir uma força quase sobre-humana. Ele as deixou no chão. O plano seguia conforme previsto e ele não pôde deixar de sentir alguma excitação subindo por seu corpo. Tentou se acalmar e não se deixar levar pelas emoções. Agir friamente era sua única opção.

    A chuva deixou de ser fina e tímida para dar lugar a gotículas maiores que caíam com alguma violência. Ele sorriu. Antes de continuar, fechou os olhos, jogou a cabeça para trás e deixou a água escorrer pelo rosto. Desfrutava dessa sensação como se fosse um ritual de purificação da alma. Embora, para ele, esse pensamento fosse redundante, já que sua alma não poderia ser mais pura. Nenhuma outra pessoa poderia ter sido encarregada desta missão.

    Ele não havia sido escolhido diretamente por Deus para realizar seu trabalho, não era tão ignorante a ponto de se deixar levar por pensamentos tão estúpidos. Não. Havia sido escolhido por seus servos mais fervorosos e isso o colocava na mesma altura que eles. Confiaram cegamente nele. Seu trabalho estava em suas mãos.

    Ficou claro que era o mais adequado para realizar essa tarefa, mas também sabia que aquilo não seria um caminho de rosas. Pelo contrário, estaria cheio de pedras. Isso impediria que ele alcançasse seu objetivo? Jamais. Fez sua motivação dobrar e sentiu a necessidade de provar seu valor. A causa era bem merecida. Não importava o esforço, não importava o sacrifício. Não importava nada. Apenas ele e sua missão. Nada mais na linha reta que havia traçado. Uma linha que começava no momento exato em que estava agora. A recompensa o merecia. Já podia tocá-la, senti-la. Estava perto. Podia sentir o cheiro. E que cheiro.

    Antes de organizar as madeiras em seu lugar correspondente, ele olhou novamente para o interior da van. Lá estava, deitado no chão, ocupando o lugar onde devia haver algumas poltronas que ele próprio se encarregou de tirar. Estava embrulhado em um cobertor cinza. Não se mexia. Não conseguia se mexer. Achava que esse volume era tão vulgar e, ao mesmo tempo, tão imenso que assustava. Lembrou das palavras que ouviu tantas vezes. O não somos nada ganhava e perdia significado nesta situação. Era algo incrível. Quase estonteante. Tudo e nada ao mesmo tempo.

    Ele meditou por alguns segundos sobre a finalidade do que estava fazendo. Sentiu um calafrio que correu do pescoço até a base das costas. Todos os poros de sua pele reagiram imediatamente. Levou alguns segundos para acordar de seus pensamentos e decidiu que a hora tinha chegado. Ele se abaixou, pegou as madeiras novamente e começou a preparar tudo. Em poucas horas a cidade acordaria e logo seria um formigueiro de gente. De manhã, a chuva não seria um impedimento para que tudo voltasse a esse caos tão característico. A cidade não parava.

    Embora isso fosse exatamente o que ele queria, não fez. Assim, o tapa que estava prestes a desferir iria doer mais. Ele se perguntou se a população estaria preparada para o que estava por vir. Por fim, saberiam a verdade. Finalmente estaria livre.

    Não havia como voltar atrás.

    As cartas estavam sobre a mesa.

    Tudo tinha começado.

    Capítulo 2

    Quarta-feira, 20 de março de 2013. 06h10. Madri

    As mesmas palavras de sempre voltaram a soar. Já havia perdido as contas das vezes em que as tinha escutado. Ainda assim, continuava doendo tanto ou mais como da primeira vez. Não havia como se acostumar com elas.

    — Você sabe tão bem quanto eu que não pode ser, Nicolás. Você sabe disso e não quer aceitar.

    — Não posso aceitar.

    — Você não quer aceitar — disse Carolina. Seus olhos estavam cheios de lágrimas. Estava completamente quebrada e sua cabeça era um vaivém constante de movimentos. Eles se alternavam entre olhar para ele e depois para o chão. Em loop. — Isso nunca funcionará. Se você não fez até agora, por que faria isso? Porra, estamos como dizem na flor da relação, em um momento doce, e tudo que temos são problemas.

    — Mas são problemas que podemos resolver, Carolina. Principalmente, se quisermos fazer isso.

    Ela segurou seu olhar por um momento. Agora ele estava desafiador.

    — Você quer dizer que eu não quero?

    — Eu não disse isso...

    — Sim, você disse. Além disso, e a distância? Você seria capaz de citar um único relacionamento que você conheça e tenha dado certo à distância?

    Deu apenas alguns segundos para Nicolás se esforçar para pensar a respeito.

    — Não, você não pode citar porque eles não funcionam — continuou ela. — Nunca deram certo e nunca darão.

    — Bobagem! — Ele gritou enfurecido. — Isso é algo que só depende de nós. Recuso-me a acreditar que você se apega a essa desculpa para querer que nos separemos. Você não acredita no que você mesma diz. A distância não é um impedimento, especialmente quando duas pessoas se amam. Nós não podemos deixar isso morrer por algo tão tolo. Isto não tem sentido. É estúpido. Não é um motivo.

    Carolina olhou para o chão.

    — É uma razão mais que suficiente. Pelo menos para mim. Eu quero continuar, ou melhor, começar meu trabalho imediatamente. Eu passei minha vida estudando o que mais gosto para nada. Ou você vai me negar isso também?

    — Mas lhe ofereceram uma posição no Museu Arqueológico Nacional!

    — Por puro disfarce, Nicolás. Diga-me: você aceitaria isso? Diga-me honestamente.

    O inspetor sentiu-se tentado a mentir para ela, mas não conseguiu.

    — Não...

    — Claro que não aceitaria. Você não aceitou a posição que eles lhe ofereceram como inspetor-chefe e também não aceitaria isso. Nisso nos parecemos, não queremos que nada seja doado e o que é do museu é assim. Você sabe que eles fizeram isso pela memória do meu pai e eu não quero isso. Eu quero fazer trabalho de campo, como ele começou. Além disso, se eu ficar aqui, para que tipo de vida seria? Você passa vinte e três horas na central todos os dias. Eu não vejo você, Nicolás. E quando vejo, nós apenas discutimos por bobagens. Tem sido muito bom tudo isso, mas estamos nos destruindo por dentro. Eu sei que a solução que eu quero é a mais egoísta, mas você devia ser capaz de respeitar isso. Pelo menos se você realmente quer o melhor para mim.

    — Se for necessário, eu saio...

    — Não diga isso, por favor. — Ela respondeu, olhando-o nos olhos novamente e desviando o olhar. — Você ama seu trabalho. É sua vida. Eu entendo que você tenha que ficar tanto tempo lá, trabalha na Unidade Central de Homicídios e Desaparecidos e está sobrecarregado. Mas você ama o que faz. E acredito que também posso amar meu trabalho desde que tenha a oportunidade de fazê-lo. Você deve me deixar ir. Além disso, somos muito jovens. Quem sabe se haverá outras pessoas no nosso caminho?

    — Então é isso.

    — Acho que você só ouve o que te interessa, Nicolás — disse com raiva. — Essa conversa é inútil. Você não quer entender. Sabe que é o melhor para nós dois e insiste que não. Bem, você saberá, porque eu estou indo embora.

    — Não é o melhor para nós dois. Não me ponha em seus caprichos. Você não faz ideia do mal que está me causando. Ou faz e não se importa. Isso é o que mais me magoa.

    — Um dia você vai entender.

    — Sinceramente? Duvido muito.

    Carolina não suportava mais a tensão que havia se formado entre eles e se virou. Começou a andar enxugando as lágrimas enquanto derramava mais algumas. Não olhou para trás. Apenas continuou andando. Ela desapareceu da vista do inspetor.

    Ele ficou parado onde estava. Não conseguia mover um único músculo de suas pernas, tudo o que fez foi apertar os punhos com muita força. A raiva o inundou.

    Carolina foi embora.

    Acabou tudo.

    ****

    Nicolás acordou com o corpo encharcado de suor. Estava muito sobressaltado e com uma respiração que beirava o sobre-humano. Mais uma noite. Tentou se acalmar. Seu coração batia em um ritmo frenético e parecia querer escapar de seu peito. A lembrança de Carolina continuava o atingindo todas as noites. Parecia que não podia sonhar com outra coisa. Fazia um ano desde sua dolorosa partida e ele ainda sentia como se tivesse acontecido na noite anterior. Tentava não mostrar nada do que sentia, mas seu subconsciente o traía da pior maneira. Por mais que quisesse, não conseguia se livrar de uma memória que estava matando ele.

    Ele nunca poderia imaginar que uma separação fosse afetá-lo tanto. Que emocionalmente o teria destruído como aconteceu. Em geral, se considerava uma pessoa muito completa e capaz de manter esse tipo de emoção sob controle. Como se ele fosse capaz de administrar uma barreira que o isolasse de tudo. Pelo menos as emoções que tinham a ver com o campo amoroso. Não conseguia controlar as outras e, muitas vezes, se apoderavam dele, como aconteceu em Mors há alguns anos. Agora, desde um ano atrás, estava comprovando que também não controlava as primeiras. Isso o estava afetando muito.

    Passou por sua cabeça voltar a visitar um profissional com o qual pudesse tratar sua dor. Sua experiência com eles não tinha sido totalmente positiva, especialmente com uma médica que o havia tratado anos atrás. Talvez não as sessões em si, mas a maneira como tudo terminou, embora essa fosse outra história. A busca por ajuda externa provocava nele uma sensação de profunda rejeição da qual tentava fugir. Embora, talvez, dado a direção que aquilo havia tomado — que tinha passado um ano e que estava exatamente o mesmo que no início —, não era uma má ideia procurá-la. Alfonso certamente riria de tal rendição. Ele passava o dia todo dizendo que precisava disso.

    Ainda um pouco sonolento, levantou o braço e, com uma falta de jeito, procurou a lâmpada em sua mesa de cabeceira para acender a luz. Seus olhos levaram vários segundos para se acostumar com o flash inicial. Aos trancos, depois procurou por seu celular para olhar a hora. Seis e vinte da manhã. Porém ainda nem um único feixe de luz entrava pela janela. Ele se sentou e olhou em volta. O quarto já não parecia mais com o que era quando Carolina decidiu se instalar ali, com ele e seu companheiro de apartamento, seu amigo Alfonso. Agora havia apenas uma mesa de cabeceira de uma cor que não tinha nada a ver com a da cama, além de uma cômoda, comprada em Ikea sem se importar muito com o estilo, que era usada para guardar sua roupa de baixo. O closet não contava, já que era embutido e vinha com o quarto.

    Já estava acordado e pensou que custaria horrores voltar a dormir. Além disso, em quarenta minutos ele teria que se levantar e começar seu ritual diário antes de ir trabalhar — um trabalho que era apaixonado antes e agora o fazia com resignação, como se fosse uma mera obrigação. — Foi por isso que decidiu sair da cama.

    Assim que o fez, calçou os chinelos e foi ao banheiro.

    Lá, se olhou no espelho. Sua aparência era horrível. Há vários dias não se barbeava e isso o fazia parecer um mendigo. Apesar de toda a dor que se arrastava durante um ano, aquilo não era habitual. Uma coisa que não fazia era descuidar de sua aparência. Podia ser chamado de vaidoso, embora fosse uma palavra que ele constantemente evitava. Mesmo que fosse demais, a verdade era que ele gostava de manter um aspecto por fora que estivesse a quilômetros de distância de como se sentia por dentro. Depois de lavar o rosto um pouco — um ato que serviu para limpar algo mais —, ele passou o barbeador pela parte inferior de seu rosto. Cortou os pelos até deixar como de costume, parecendo uma barba de três/quatro dias de aspecto semidescuidado que suas companheiras de trabalho tanto gostavam. Não era algo que ele supunha, já que haviam dito mais de uma vez.

    Ele considerou o que fazer a seguir, já que ainda tinha algum tempo sobrando. Escolheu ir ao quarto desocupado, o do alvoroço, como ele o chamava, no qual tinha um banco abdominal e vários halteres. O engraçado é que Alfonso comprou tudo e Nicolás não se lembrava dele ter usado uma única vez. Nem mesmo o banco, aquele que todo mundo compra para usar sempre e que poucos repetem depois de estreá-lo. Ele sorriu para isso.

    Realizou três séries de abdominais inferiores e três superiores. Em seguida, um pouco de bíceps e tríceps com os halteres.

    Quando saiu, ouviu uma batida da porta. Alfonso já estava saindo para o trabalho. Agora ambos estavam entrando em horas diferentes. Alfonso, com sua nova posição, quase não tinha horários. Isso não era exatamente uma coisa boa, porque alguns dias entrava às cinco da manhã para trabalhar e preparar as reuniões e outras parafernálias e outros, no entanto, saía às três ou quatro da manhã, dependendo da importância dos casos nos quais trabalhava na Unidade Central de Homicídios e Desaparecidos da Polícia Nacional. Nicolás pensou que fez bem em rejeitar a posição de inspetor-chefe e não sabia quanto tempo mais Alfonso permaneceria naquela cadeira. Sabia que ele era mais ação do que burocracia. Além do mais, ele não parava de repetir isso, e se Alfonso tinha uma qualidade, era ser insistente.

    Tomou um banho. Deixou a água correr por seu corpo por um longo tempo. Era um dos atos que mais o acalmavam. Ele fechou os olhos enquanto sentia o líquido cair neles. Depois de alguns minutos, saiu e voltou para o seu quarto para se vestir.

    Escolheu entre suas roupas um jeans confortável ​​e uma camisa de mangas compridas. Ainda estava frio lá fora. O inverno estava relutante em deixar a capital espanhola e a hora que era não ajudava a esquentar o dia ainda. Apesar disso, sempre que podia, evitava vestir roupas grossas, então, além da camisa, escolheu uma jaqueta fina.

    Ele olhou para o relógio novamente. O tempo não parecia passar. Foi até a loja que ficava a poucos metros de sua casa e comprou um pedaço de pão. Depois, foi ao quiosque ao lado e comprou um jornal. Com as duas coisas, voltou para seu apartamento, foi até a cozinha, preparou um café e fez uma torrada que temperou com azeite e um pedaço de queijo. Depois disso, tomou café da manhã enquanto lia o jornal.

    Quase como de costume, após a quinta notícia sobre corrupção fechou o jornal balançando a cabeça negativamente. Não aprendia.

    Ainda não era a hora habitual que costumava ir para o trabalho, mas como não tinha nada melhor para fazer, decidiu sair. Ele desceu novamente e olhou para o seu Peugeot 407. Havia lavado apenas alguns dias atrás e estava brilhante, assim como ele gostava que estivesse. Embora fosse verdade que este carro trazia de volta muitas memórias com Carolina, ele se recusava a trocá-lo por algum outro. Gostava de seu carro, não mudaria até que não tivesse escolha. Ou ganhasse na loteria.

    Ele entrou em seu Peugeot e o ligou. Com o motor já em funcionamento, partiu rumo ao Complexo Policial de Canillas, onde cada dia realizava seu trabalho.

    Levou apenas dez minutos para chegar lá. Se não fosse geralmente um trecho com muito tráfego, levaria menos tempo ainda. Não precisou mostrar sua identificação no posto de segurança, simplesmente o deixaram passar. Ele estacionou no local designado para inspetores judiciais e entrou no prédio onde ficava a Unidade Central de Homicídios e Desaparecidos. A construção não era nada moderna. Com o passar dos anos, era perceptível demais e, além de um sofá puído que não sabia muito bem com que propósito, não encontrou nada mais no térreo até pegar o elevador. Saiu no segundo andar e, a caminho do escritório onde trabalhava com sua equipe, cumprimentou quem encontrou no caminho. O inspetor Nicolás Valdés já tinha feito nome no complexo e todos o conheciam. A resolução dos casos de Mors e o que esteve envolvido há um ano e meio lhe valeu a reputação de bom policial que muitos desejavam para eles. Ele tentou não pensar sobre isso e limitou-se a fazer o seu trabalho, embora reconhecesse que, desde o que aconteceu com Carolina, estava em um mau momento, não fazia nada além de cuidar de documentos sem importância. Não conseguia se concentrar em nada.

    A resolução do último caso, no qual ela também estava envolvida, foi o que catapultou para o pedido unânime de que ele fosse nomeado inspetor-chefe. Isso e o fato de que o comissário anterior estava envolvido e foi substituído pelo inspetor-chefe anterior. Ele rejeitou sem pensar duas vezes. Sabia que a figura do inspetor-chefe era um rosto para a mídia, para reuniões e, acima de tudo, muitas dores de cabeça. Por isso, falou com o seu amigo Alfonso e encorajou-o a apresentar a sua candidatura ao novo comissário da Polícia Judiciária. Alfonso tinha suas coisas, mas considerando que seu registro de serviço era imaculado, o pedido não podia ser negado. Depois disso, Nicolás seguiu seu caminho do jeito que fazia agora. De qualquer maneira, preferia ficar do lado daqueles que investigam, daqueles que se escondem das câmeras e holofotes. Daqueles que realmente resolvem um caso.

    Depois da caminhada, chegou ao escritório. Ramírez estava digitando em seu computador e Nicolás o cumprimentou sem muita efusão. Ele devolveu a saudação sem levantar os olhos do teclado. Batia nele sem muita facilidade.

    — Mas que merda de teclados, porra — disse de repente. — Será que nós não estávamos bem com os de antes e tinham que colocar esses ultrafinos? Eu não tenho dedos, tenho patas de elefante e aperto três ou quatro teclas ao mesmo tempo.

    — Tudo é questão de se acostumar, Ramírez.

    — É muito fácil dizer quando seus dedos não são como os meus. Como me cansei, mando este teclado tomar no rabo e eles colocam de volta o antigo. Ou eu trago o da minha casa, cassete, vale quatro dólares e é melhor que essa merda.

    Nicolás sorriu. Ramírez era assim.

    O inspetor se sentou. Sua mesa estava limpa, arrumada, como ele gostava que fosse. Carolina apareceu pela enésima vez em sua cabeça. Não sabia o que fazer para evitar que isso acontecesse, mas a memória de ambos sentados na frente do PC quando aconteceu a tragédia com seu pai o atingiu. Tudo o fazia lembrar dela. Como ele poderia ter tantas lembranças em apenas seis meses que estiveram juntos?

    Quando o relacionamento terminou, ambos prometeram manter contato. Na verdade, essa decisão foi tomada por Carolina, já que ele queria interromper toda a comunicação com ela. Queria evitar a dor, embora tenha falhado miseravelmente nesta última. Felizmente, a intenção de Carolina caiu por terra e nenhuma ligação veio dela. Nicolás agradeceu, porque sabia que ter notícias dela só aumentaria uma ferida já enorme. E a ferida não cresceu. Não. Mas era verdade que também não diminuiu.

    Ele olhou para os relatórios dos últimos dez casos. Todos eram crimes passionais ou ajuste de contas. O que estava por cima de todos falava de como haviam cortado o pescoço de um jovem que, supostamente, queria deixar de ser o traficante do bairro para ser outra coisa. Balançou a cabeça negativamente e se perguntou o que diabos estava acontecendo no mundo para haver tanta violência aqui e ali. De qualquer forma, mesmo que a violência nunca cessasse, era verdade que eram casos menores. Nenhum alcançou a ponta do sapato do que aconteceu em Mors ou o que ele viveu há um ano e meio. Não sabia se parte do que acontecia era porque sentia falta de algo tão complicado. Algo que o fizesse realmente se esforçar e que ele não tivesse escolha a não ser colocar todos os seus esforços para resolvê-lo. Talvez fosse cruel pensar desta forma, ambos os casos tinham um grande número de corpos envolvidos, mas o desafio intelectual que se apresentou não havia voltado a experimentar e essa experiência fez, de alguma forma, com que ele se sentisse vazio.

    Junto com esse pensamento, outro radicalmente oposto se entrecruzava. Ele se perguntou se estaria emocionalmente preparado para viver algo assim agora. Talvez não. Reconheceu que estava em um mau momento. Péssimo momento.

    Bocejou.

    Pegou o primeiro relatório e começou a lê-lo. Sua missão com eles era verificar se os procedimentos haviam sido seguidos rigorosamente e que não tinham negligenciado nada. O cidadão comum não sabia, mas seguir esse procedimento ou não estabelecia a validade de um indício que poderia acabar se tornando prova e, portanto, ser capaz de colocar o criminoso atrás das grades com uma pena proporcional ao seu ato. Em noventa e nove por cento dos casos, não havia problema em seguir os passos necessários. O outro um, costumava ser uma bagatela que sempre tinha uma solução de última hora.

    Entre papéis, a primeira hora de trabalho passou.

    Bocejou novamente quando levantou os olhos dos relatórios. Sua visão repousou em um ponto da mesa onde, aparentemente, desde que entrou, não tinha olhado. Deve ter sido porque havia algo nele que não tinha visto. No começo, não sabia o que era. Ele se inclinou para frente e o pegou. Franziu a testa.

    Uma passagem de avião em seu nome.

    Sem saber muito bem o que estava fazendo lá, começou a olhar tudo em volta de novo e de novo. Não sabia se com esse movimento o que queria era encontrar uma explicação com algum sentido, mas não conseguia. O destino da passagem era a Escócia e o dia do embarque era o dia seguinte. Em seu rosto se formou uma expressão confusa.

    — Você sabe quem deixou isso aqui? — perguntou a Ramírez, que estava na dele com o novo teclado.

    Ele apenas levantou os ombros e fez cara de quem não sabia.

    O inspetor continuou olhando a passagem e a abriu. Dentro havia um post it com o que parecia ser um número de telefone. Pela quantidade de números, era internacional. Ainda não conseguia encontrar uma explicação razoável para isso. Não sabia se o que faria a seguir o ajudaria ou não a entender alguma coisa, mas de qualquer forma, se levantou de seu assento e se dirigiu para outro escritório.

    Quando ele chegou na porta, bateu. Talvez ele nem estivesse lá.

    — Entre — disse uma voz dentro.

    Nicolás foi ao escritório de Alfonso.

    — Rapaz, é você — disse ele em tom de saudação.

    Nicolás fechou a porta atrás dele e sentou-se. Quando outras pessoas estavam olhando, tratava Alfonso com o respeito que merecia sua nova posição, mas sozinhos no escritório eram Nicolás e Alfonso, os dois melhores amigos que tinham pisado nesse complexo, com certeza.

    — O que quer, cara?

    — Isso estava na minha mesa, no escritório. — Nicolás decidiu não ficar de rodeios e jogou a passagem na mesa do amigo.

    Alfonso pegou e olhou para ele com um rosto parecido com o de Nicolás quando a encontrou.

    — Que diabos é isso? Você está indo para a Escócia e não me contou nada?

    — Sabe que não. Além disso, não me ouviu. Eu te disse que encontrei na minha mesa. Foi você?

    Alfonso olhou para ele com uma sobrancelha levantada.

    — Vejamos, Nicolasinho, deixa eu te falar... Você realmente acha que eu deixaria isso lá vivendo juntos como vivemos? Além disso, para que porra eu ia te pagar uma viagem à Escócia? Será que somos namorados ou algo assim e você não me contou? Tenho outras coisas melhores para gastar meu dinheiro. Um Playstation, por exemplo.

    Nicolás suspirou, a astúcia habitual de Alfonso apareceu e ele não precisou de mais provas do que isso para saber que não tinha sido ele.

    — Tem certeza que é para você? — insistiu.

    — Está no meu nome.

    Alfonso verificou e seu rosto refletiu surpresa.

    — Cara, eu não sei... Suponho que você tenha perguntado por aí. Se quiser, peço o registro de entradas durante a noite para os credenciamentos e vemos quem acessou o prédio. Aqui ninguém pode passar como Pedro pela sua casa.

    — Alfonso, aqui trabalhamos cerca de seis mil pessoas. Digamos que apenas mil trabalham à noite.

    — Então, espertinho, eu disse em credenciamentos, onde aqueles que não trabalham no complexo passam obrigatoriamente. Quem pensa que sou? Se a pessoa que te deixou isso trabalha aqui, eu já não posso fazer nada. Você sabe que este edifício parece um bordel e aqui todo mundo quer entrar.

    — Não importa, Alfonso. De qualquer forma, acho que é um número de telefone — disse ele, apontando para o post it que foi anexado. Vou ligar e ver o que diabos é isso. Mas como você tem algo para fazer...

    — Não ligou? Sério. Mas olhe, isso é um sinal.

    — Não comece — comentou Nicolás, levantando da cadeira.

    — Não, é sério. Sente-se porque temos que conversar.

    — Como amigos ou como chefe?

    — Como ambos. Como chefe, vou lhe dizer que Brotons tem insistido para que você faça uma parada no caminho.

    — Foda-se Brotons... — disse enquanto olhava para o teto.

    — Eu sei, Nicolás, eu sei. Eu te digo o que você está me dizendo. Você tem que parar. Eu não sei, tire uma semana de folga ou duas, o que quiser. Deixe as outras duas para o verão se quiser, eu não me importo. Mas você tem que parar e voltar sendo outro. Você está uma merda. Você já se viu? Ok, sim, você queria muito Carolina e essas coisas, muito bem. Mas você vai permitir que uma mulher faça você viver em um estado quase como um zumbi? Porra, cara, você é mais que isso.

    — O patrão ou o amigo fala comigo agora? — perguntou irônico.

    — Não fode, cara. Você já sabe. Deixou de ser o policial mais brilhante de todo o complexo para ser uma alma penada que vagueia por aqui, sem mais. Se eu lhe der um caso em que uma criança rouba um pirulito de outra, você não saberá como resolvê-lo. Está obcecado e isso não pode ser. De certa forma, eu não me importo se você precisa do seu tempo, além disso, eu te apoio, mas os chefes precisam muito de você e estão me colocando contra a parede. A propósito, essa é outra coisa, assim que puder mando essa posição à merda, estava muito bom como um simples inspetor.

    Nicolás pensou no que Alfonso estava dizendo. Sabia que, por um lado, ele estava certo, mas, por outro, não tinha outra coisa senão aquele emprego para não ficar pensando em Carolina. Embora tenha tido sucesso neste último, talvez fosse necessário uma pequena pausa para recuperar as forças. Pode ser que retornasse, pelo menos, com uma nova perspectiva sobre seu presente e seu próprio futuro. Estava em uma confusão e não tinha ideia do que fazer.

    — Deixa que eu vou me consultar com o travesseiro.

    Alfonso ficou tentado a fazer um de seus comentários, aos quais Nicolás respondia chamando-o de babaca, mas preferiu assentir e depois falar.

    — Está bem. Pense nisso. Então, se você quiser, continuamos falando no apartamento, com uma cerveja na frente. Bem, eu com uma cerveja — disse ele, sabendo que Nicolás não gostava de cerveja. Não havia ninguém para fazê-lo tomar outra coisa a não ser Nestea ou água.

    O inspetor assentiu e se levantou. Estava indo embora quando Alfonso lhe fez uma nova pergunta.

    — Você vai ligar para esse número agora?

    — Não. Eu vou fazer isso em casa, em silêncio. Eu não quero mais nada interferindo aqui hoje, para que os chefes não pirem...

    Alfonso não viu seu rosto, mas supôs que, embora fosse de uma maneira fugaz, ele saiu sorrindo de lá.

    Capítulo 3

    Quarta-feira, 20 de março de 2013. 08h10. ?

    Tudo era escuridão. Ela preenchia tudo e cobria a sala com um manto sinistro. Um feixe de luz era visto somente por intermédio das quatro grandes velas que ocupavam cada um dos cantos da sala, mas, na verdade, isso apenas dava ao lugar um aspecto muito mais aterrorizante. A atmosfera era fria e úmida. O lugar parecia estar fechado há muito tempo. Na verdade, estava. As paredes, revestidas com pedra antiga, não faziam outra coisa a não ser proporcionar um ar sinistro ao lugar, como se fosse uma antiga masmorra tirada de um filme de terror ruim dos anos noventa. A sala tinha pouca decoração. Suas paredes estavam completamente sem pintar e o mobiliário era composto por uma grande mesa, também de pedra, que parecia ter sido colocada com muita precisão para ocupar exatamente o centro da sala. Era de forma circular e, entalhado nela, havia um símbolo, facilmente reconhecido pela maioria dos mortais, que se estendia por todo seu comprimento e largura, fazendo com que cada uma de suas pontas tocasse as bordas da circunferência.

    Quatro cadeiras a rodeavam. Curiosamente, estavam localizadas justamente em cada extremidade do símbolo entalhado na mesa. Três delas apresentavam um aspecto normal, sem nada para enfatizar. Fabricadas, aparentemente, com uma madeira nobre. A quarta era outra história. Embora parecesse ser do mesmo material que as outras, possuía em suas costas figuras pagãs entalhadas que se misturavam com símbolos religiosos conhecidos. Em seu topo, ficando sem dúvidas por cima da cabeça de quem a ocupasse — por mais alto que fosse, já que o encosto da cadeira era enorme —, estava entalhada, com uma incrível precisão, o rosto de Cristo com feições piedosas. Esse rosto parecia observar sem piscar as outras cadeiras. Como se fosse ele quem os observasse. Seu olhar causava arrepios àqueles que costumavam se reunir ali. Não o escondiam.

    Finalmente, como se estivesse escondida, uma cortina preta e grossa podia ser vista em uma das paredes. Era por onde a sala era acessada e era o final de uma escada descendente que estava mal iluminada por duas tochas.

    A cortina preta foi aberta de repente. Quatro sombras subitamente surgiram atrás do limiar. Cada uma delas carregava uma vela na mão, fazendo com que parecessem fantasmas de verdade. Os quatro usavam um manto marrom escuro que atingia seus tornozelos. Em suas cabeças tinham um capuz grande o suficiente para que caísse sobre a testa e só mostrasse a boca de cada um deles. Isso ajudava a manter seu anonimato. Embora este último, na verdade, não fosse necessário. Eles não estavam certos se as gerações anteriores desconheciam as identidades dos outros membros, mas os quatro que estavam ali já se conheciam há muitos anos. Apesar disso, o protocolo rígido ao qual estavam presos mandava e tinham que ir vestidos dessa maneira. Suas mãos também estavam cobertas por luvas pretas. Por cima delas, três deles usavam um anel de ouro com o mesmo símbolo que havia sido entalhado na mesa. Aquele que parecia ser o mais importante dos quatro, que apareceu por último, tinha um anel diferente. Tinha entalhado o mesmo rosto de Cristo que estava na majestosa cadeira, mas, por sua vez, estava misturado com o próprio símbolo que os outros três carregavam. Podia parecer um emaranhado, mas a joia era tão grande que até permitia carregar mais símbolos sem interceder nos dois que já possuía. Algo muito ostensivo, por sinal.

    Os três de menor nível ocuparam seus lugares devagar e cerimoniosamente. O quarto esperou que os outros fizessem isso. Quando o último sentou, os outros já olhavam para ele com impaciência.

    — Irmãos — sua voz denotava a solenidade do cargo que ocupava —, todos e cada um de nós sabemos o motivo desta reunião extraordinária. Prometi a vocês que tudo estava bem amarrado, que nenhuma ponta ficaria solta. Mais uma vez, eu cumpri. Tudo começou. O maquinário começou a rodar satisfatoriamente.

    Nenhum deles disse nada, mas sua excitação era evidente, pois todos começaram a se mover inquietos em seus assentos. Estavam esperando por este momento por muito tempo. Não era para menos.

    Um deles falou.

    — Acho que falo em nome de todos quando digo que confiávamos cegamente em você, mestre. Não nos desapontou, como esperávamos. Estamos felizes em saber que seu plano já está em funcionamento. Não vemos a hora em que nossa missão esteja cumprida, mas devo dizer que já quase a tocamos com os dedos e isso nos dá uma nova esperança. Parecia difícil, mas aqui estamos nós. O mundo inteiro cairá aos nossos pés. Eles nos agradecerão várias vezes quando mostrarmos o que queremos mostrar.

    Um sorriso apareceu desenhado no rosto do homem com o cargo mais alto.

    — Calma, querido amigo. Tudo no seu devido tempo. — Sua voz era forte. — Não vamos cometer o erro de querer correr mais do que devemos. Isso falhou no passado e não pode acontecer novamente. Agora vamos deixar os eventos se desenrolarem conforme lhes mostrei na reunião anterior. Vamos esquecer a impaciência e começar a provar os méis do triunfo. Tantos anos de esforço e luta dos nossos ancestrais serão finalmente recompensados. Tudo sairá como o esperado, você verá. Não permaneceremos mais na escuridão, viremos à luz.

    Uma nova amostra de excitação se fez presente na sala. Quando todos se acalmaram, novamente aquele com menor posição falou.

    — Como você nos ordenar, mestre. Você elaborou este plano e nos guiará para a luz. Terá todo o nosso apoio, seja qual for o resultado final. Somos irmãos e continuaremos sendo. Juramos lealdade a você e à irmandade. Por nossos antepassados ​​e as futuras gerações. Nós daremos a nossa vida pela causa se for necessário. Não duvide que faremos isso.

    O restante assentiu.

    — Assim seja. Não esqueçam o juramento também de sigilo sobre nossas identidades. Ninguém deve saber que pertencem a essa irmandade ou tudo será em vão. Temos sobrevivido graças ao sigilo e assim deve permanecer. De agora em diante, nos encontraremos com mais frequência. Irei avisá-los conforme os acontecimentos forem se desenrolando. Mantenham seus telefones celulares funcionando.

    Todos sabiam que seu líder estava se referindo ao telefone celular que só tinham para este uso. Aquele que ninguém ao seu redor sabia da existência.

    O mestre assentiu e terminou a reunião. Os quatro assistentes levantaram-se e, sem saírem de seus lugares, estenderam os braços e deram as mãos. Abaixaram a cabeça e rezaram algo em latim. Depois de alguns segundos, a levantaram e os três de menor posição ficaram em fila indiana para beijar o anel do mestre.

    — Eu te entrego minha vida — repetiu cada um deles depois de beijar a mão do mestre. Então, beijaram suas próprias mãos e colocaram-se, novamente, em fila indiana, para começarem a subir a escada, com a mesma vela que cada um tinha trazido em sua mão.

    A reunião terminou ao mesmo tempo em que o mestre colocava um pé no primeiro degrau.

    Agora, cada um tinha que retornar à sua posição importante no mundo real.

    Capítulo 4

    Quarta-feira, 20 de março de 2013. 09h13. Direção Central da Polícia Criminal. Roma

    ––––––––

    O assistente — cargo equivalente a inspetor da Polícia Nacional Espanhola — Paolo Salvano adorava Roma. Não era nenhum segredo para aqueles que o conheciam bem. Amava a cidade onde viveu a vida toda, exceto por períodos de visitas a seus avós na Espanha. Amava sem medida e sem hesitação. Suas ruas, seus edifícios, sua fascinante história... o que não adorava tanto eram as pessoas que viviam nela. Talvez seja por isso que decidiu ajudar para que ninguém a estragasse.

    Pelo menos criminalmente.

    Foi há muito tempo que começou neste trabalho. Sua cabeça não concebia que houvesse pessoas que residissem em Roma e que não a tivessem no mesmo altar que ele, que pretendessem atrapalhar sua tranquilidade. Como estes pensamentos eram bastante idílicos, talvez utópicos, decidiu fazer parte da Polizia di Stato (Polícia do Estado), mais especificamente da Direzione Centrale della Polizia Criminale (Direção Central da Polícia Criminal), responsável por resolver os crimes mais improváveis. Sentia imenso orgulho pela corporação e por quase todos os seus membros, não escondia isso. Quase tanto quanto sentia quando alguém na cidade o observava enquanto estava fazendo seu trabalho. Esses olhares lhe davam vida e, ao mesmo tempo, um novo sopro de ar que colocavam em suas costas umas asas que o faziam voar alto. Para ele, não havia maior satisfação que esta.

    Como de costume — salvo raras exceções —, seu humor era excelente. Tanto que chegava a incomodar muitos de seus companheiros. O próprio Paolo se referia a eles como os amargurados. Desempenhava seu trabalho na própria Direção Central da Polícia Criminal, localizada na Vía Torre di Mezzavia, 9. O edifício que abrigava os maiores departamentos de polícia do país impressionava a olho nu. Era complicado definir a forma do enorme complexo, já que visto pelo lado esquerdo parecia uma pirâmide escalonada que em seu centro alargava-se alguns metros, voltava a descer em seu lado direito para subir novamente na metade do caminho formando algo que era complicado de explicar. Muitos turistas que não notavam o número de carros de patrulha — inclusive, ônibus da polícia — que ficavam estacionados em seu entorno, confundiam o imponente prédio com um hospital. Não era algo estranho, uma vez que poderia parecer um à primeira vista. Dentro dessas paredes estavam, talvez, os maiores assistentes com os quais a Polícia do Estado contava em todo o país. Por suas mãos haviam passado os casos mais complexos e, embora houvesse unidades especializadas espalhadas por todo o país para resolver homicídios, quase sempre o caso acabava sendo delegado a estes, pois sua intervenção era sinônimo de sucesso. Entre eles estava Paolo Salvano, que naquela manhã estava revisando papéis sentado em sua confortável poltrona de couro em seu escritório pessoal. Cada um dos assistentes tinha o seu próprio, ao contrário de outras corporações em outros países. Paolo, apesar da relutância que seus próprios companheiros demonstravam com seu habitual bom humor, era considerado o melhor

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