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Por um Triz
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E-book195 páginas2 horas

Por um Triz

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Sobre este e-book

A primeira leitura desta anotação foi um choque para mim. Como é que ela foi escolher justamente esse nome? Parece bruxaria. É absurdo, vão achar que enlouqueci, mas ela está falando comigo. Diretamente. Posso sentir. Talvez por isso eu tenha ficado tão impressionado desde o início. É como se o diário de Anusha fosse de fato dirigido a mim. Será que ela sabia que, tantos anos depois, o seu tesouro chegaria até minhas mãos?
A VIDA DE TADEU MAX KOVALSKY ERA UMA rotina entediante: de casa para a faculdade de medicina, da faculdade para casa. Ao encontrar um caderno antigo, com uma capa de couro marrom e o nome "Ana Rendel" grafado em letras douradas, tudo mudou. Tratava-se de um diário, que diziam ser dedicado a um tal de Max. Seria ele próprio? Aquelas páginas tinham sido escritas 71 anos antes, mas guardavam uma estranha conexão entre ele e Ana - ou Anusha -, uma menina que passara uma temporada hospitalizada após cair de um muro. Dona de uma criatividade extravagante, Anusha reinventava o cotidiano do local, escrevendo o que acontecia nos seus dias de convalescença.
No entanto, não era apenas isso: as páginas amareladas do caderno revelavam uma série de episódios misteriosos. Ana estaria imaginando, delirando ou dizendo a verdade quando descrevia detalhadamente as visitas dos gnomos Gus e Greb, seres encantados que guardavam segredos sobre os tipos de olhares dos humanos? De onde teria saído uma ideia tão inusitada como a existência de uma espécie chamada Gnomus nosocomium? E, por fim, se esses fantásticos seres realmente existiram, onde eles estariam hoje?
Tadeu, então, resolve investigar essas informações e começa a escrever as suas descobertas em um caderno. Qual seria a verdade sobre o enigma dos gnomos? O que aconteceu na vida de Tadeu? Para responder a essas perguntas, é preciso abrir outro diário. Este que você, leitor, tem em mãos.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento1 de fev. de 2012
ISBN9788581221717
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    Pré-visualização do livro

    Por um Triz - Sílvia Zatz

    A todos aqueles que já cuidaram de alguém, sejam profissionais, voluntários ou simplesmente pessoas levadas a isso pelas circunstâncias da vida.

    "Os gnomos são mais antigos que seu nome, que é grego (…) Os etimologistas o atribuem ao alquimista suíço Paracelso, em cujos livros aparece pela primeira vez (…) Têm a missão de custodiar tesouros ocultos.

    Gnosis, em grego, é conhecimento; conjeturou-se que Paracelso inventou a palavra gnomo porque estes conheciam e podiam revelar aos homens o lugar exato em que os metais estavam escondidos."

    Jorge Luis Borges,

    em O livro dos seres imaginários

    Entro por um longo corredor que leva até uma porta grande em forma de arco. À direita, atrás de uma pequena escrivaninha, um funcionário confere um enorme livro de visitas cheio de datas e assinaturas. Atrás dele, uma placa com os dizeres: Museu da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Logo adiante um quadro retrata uma menina convalescente deitada em uma cama, com lápis coloridos espalhados sobre o lençol.

    – O senhor está procurando alguém? – pergunta o funcionário rispidamente.

    – Sim, marquei com a dona Otília, ela deve estar me aguardando.

    Enquanto ele pega o telefone para se certificar, fico apreciando o ambiente levemente sombrio. Sem mais nenhuma palavra, o rapaz me aponta a entrada do museu. Ouço meus próprios passos cadenciados quebrando o silêncio. A porta bate atrás de mim. Uma senhora simpática e sorridente se apresenta como Maria Otília e me pede para aguardar um momento. Diz que um grupo de estudantes de enfermagem está para chegar e fica mais fácil fazer a apresentação uma única vez.

    A sala é escura, chove lá fora. Estou cercado de objetos antigos: cadeiras, mesas, aparadores, poltronas, armários de vários tipos, tamanhos e épocas diferentes. Uma corrente de um vento gelado me faz arrepiar. Sinto cheiro de madeira velha misturado com umidade e poeira. Há um relógio de pêndulo e dezenas de objetos como castiçais, canetas-tinteiro e crucifixos de diversos tamanhos. Dão a impressão de se ter viajado pelo tempo. Parece que os objetos ali têm vida e me chamam, como se cada um deles tivesse uma história para contar. O chão é feito de cerâmica desenhada, bem desgastada, mas é possível imaginar como aquilo foi um dia. Otília me conta que o museu está em reforma já há alguns anos. Está sendo reorganizado aos poucos. Por isso não poderei ter acesso a todas as salas. Mas a essa altura o grupo de estudantes já chegou e começamos a visita.

    Boa tarde a todos, sejam bem-vindos ao Museu da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Para aqueles que não sabem, ela foi fundada em 1560 e é hoje a maior do mundo. São mais de 400 anos de história que estamos tentando preservar aqui…, Otília fala numa toada monocórdica. A peça mais célebre que temos é a Roda dos Expostos, e também o registro de todas as crianças que foram ‘abandonadas’ na Santa Casa. Como vocês podem ver, ela consiste basicamente de um cilindro de madeira que gira sobre o próprio eixo, com uma única abertura, encaixado dentro de um outro cilindro fixo, ligeiramente maior, que possui uma abertura de cada lado. A Roda dos Expostos ficava junto à porta de uma entrada lateral da instituição e era feita para que pessoas sem condições, impossibilitadas por qualquer motivo de criar um filho, colocassem ali dentro seus bebês, sem precisarem se identificar, tentando assim garantir um futuro melhor para suas crianças. Muitas das crianças ‘expostas’ foram adotadas e tornaram-se até personalidades importantes e conhecidas. Até hoje recebemos a visita de algumas delas, que vêm nos procurar em busca de suas origens, muitas vezes desejando fazer doações como retribuição… As cartas das crianças que foram abandonadas aqui e posteriormente se comunicaram conosco também são muito requisitadas no museu… Muitos roteiristas de telenovelas nos visitam à procura de inspiração para criar seus personagens e enredos dramáticos… O museu acolhe também raridades como instrumentos e utensílios médicos, aparelhos de época, a maioria deles oftálmicos, pois essa sempre foi uma área bastante desenvolvida no hospital da Santa Casa… Uma das maiores curiosidades é este grande eletroímã do século XIX, que era utilizado para extrair fragmentos metálicos dos olhos, tinha uma potência tão forte que chegou a extrair a retina de um paciente, e depois disso nunca mais foi utilizado… Há também livros de documentação de cirurgias que trazem desenhos primorosos… Esta sala é destinada aos objetos de arte, móveis, vasos, esculturas, vejam só que belo quadro sacro… Nesta parede, à nossa esquerda, encontram-se retratos dos grandes doadores e benfeitores da história da Santa Casa… Aqui vocês podem ver o magnífico armário executado pelo Liceu de Artes e Ofícios em 1883 para nossa farmácia. Ele hoje está repleto de antigos instrumentos, balanças e medicamentos usados no passado… Aqui, na sala da Mordomia, há mais retratos dos colaboradores de nossa instituição e políticos que nos auxiliaram… dentro das vitrines estão os livros de atas mais antigos… os registros de expostos… No arquivo, estão as cartas recebidas dos expostos e outras mais, sempre organizadas por data… Nesta outra estante, vocês encontrarão registros de internações e óbitos… diários escritos por pacientes que tiveram longos períodos de internação… diários escritos por médicos, funcionários e estudantes… Para aqueles que não sabem, o registro diário é um procedimento médico antigo e sugere-se que ele seja adotado nas diversas atividades da instituição… É muito interessante observar as diferentes caligrafias, as datas, os desenhos… Vejam só este aqui, de um médico, que durante 35 anos fez anotações diárias de sete linhas cada uma…

    Enquanto expõe outras curiosidades sobre os diários, Otília apanha um livro preto, já separado na prateleira. Hesita, olhando as pessoas em volta, como se estivesse escolhendo alguém. Finalmente o estende para mim. Reparo detalhadamente na parte externa e o abro com cuidado. É um caderno pautado, de capa dura, mais ou menos do tamanho ofício, desses que mesmo novos parecem antigos, bem robusto.

    As primeiras palavras que leio me deixam absolutamente perplexo. Como é possível? Trata-se de um diário, cujo texto é entremeado por pedaços de folhas xerocadas, provenientes de um manuscrito antigo, aparentemente datado de 1931. Abalado pela estranha coincidência que acabo de testemunhar e movido pelo meu interesse profissional, ao fim da visita, sento-me num canto para ler o material. Devo fazê-lo obrigatoriamente ali mesmo, já que dona Otília me informa que nenhum daqueles exemplares pode sair do museu. Tenho certeza de que o conteúdo daquele caderno misterioso constitui uma peça-chave na minha investigação. Ele representa, sem dúvida alguma, uma porta para compreender o que aconteceu ao jovem Kovalsky. As anotações dele, numa letra bem firme, começam assim:

    DIÁRIO DO TADEU KOVALSKY

    Em certos momentos da vida você acredita que é possível fazer escolhas. Mas talvez o seu futuro esteja determinado desde quando você nasceu. Você acha que pode decidir sobre o que vai acontecer, mas não tem controle algum sobre as coisas que o levam de um lado para outro…

    11/3/02

    Anotei essas palavras porque desde que as li não saem da minha cabeça. Estou confuso. Não sei o que pensar. Mas de uma coisa eu sei muito bem: tenho em mãos um tesouro imenso. Apenas não sei o que fazer com ele. Comprei este caderno para registrar meus pensamentos fugidios com relação a esse mistério com o qual acabo de me deparar, mas que estou muito longe de decifrar. De repente minhas certezas foram colocadas em xeque. Será que eu sei o que estou fazendo, para onde estou indo? Será que a realidade se restringe a aquilo que eu vejo? Estarei enlouquecendo? Estarei sendo ingenuamente influenciado pelas ideias fantasiosas de uma mente infantil e cheia de imaginação? Talvez sim, talvez não. De qualquer modo, tenho comigo um sentimento de verdade. Algo que nunca senti antes em toda a minha vida. Uma voz interior que me diz que é aí que eu devo buscar. Que nesse emaranhado de histórias confusas e indecifráveis pode estar o verdadeiro sentido da minha vida.

    As coisas estão dando certo para mim. Meu sonho de estudar medicina está se realizando. Enfrentei um bocado de coisas, venci tantos desafios para estar aqui… E agora essa dúvida que me acomete. É por isso que resolvi escrever, apesar de nunca ter sido muito bom nisso. Quem sabe essa tentativa me ajuda a organizar as ideias e as impressões das últimas semanas. Faz menos de um mês que cheguei a São Paulo, vindo do Paraná, muito ansioso e apreensivo com todas as novidades. Desde o primeiro momento me senti acuado na rodoviária lotada com centenas, milhares de pessoas circulando em todas as direções, sempre com pressa. Impossível comparar com a cidade de 17 mil habitantes onde nasci e me criei. Demorei quase uma hora para conseguir me localizar e encontrar o metrô que me levaria até o bairro de Santa Cecília, onde estou alojado. Moro numa pensão que as freiras daqui indicaram para minha mãe. Fica a menos de duas quadras da Santa Casa de Misericórdia, que é onde frequento as aulas da FCMSCSP (Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo). Compartilho o quarto com três outros rapazes. A comida da pensão é boa, caseira, me faz lembrar de Cerro Azul.

    Minha vida aqui se resume a ir de casa para a faculdade e da faculdade para casa. Não conheço quase ninguém, exceto alguns colegas de classe e a dona Henedina, que cuida do museu da Santa Casa. Ela é muito boa gente, sempre atenciosa comigo. Só tem um pequeno defeito: falar demais. E isso nos traz de volta ao ponto principal: o diário.

    Eu não sabia por quê, mas ele me intrigou desde o momento em que botei os olhos nele. Ainda não sei o que pensar a respeito. Estava nos arquivos do museu. Mas creio que preciso contar como o encontrei. Ou talvez seja mais justo dizer: como ele me encontrou.

    Cheguei ao museu pela primeira vez com um grupo de colegas da faculdade. A professora de história da medicina nos mandou procurar dona Henedina, que é a pessoa responsável. Ela nos recebeu com muita simpatia e se ofereceu para fazer um tour de apresentação do museu.

    Boa tarde a todos, sejam bem-vindos ao Museu da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Ela foi fundada em 1560 e é hoje a maior do mundo. São mais de 400 anos de história… A peça mais célebre que temos é a Roda dos Expostos, e também o registro de todas as crianças que foram ‘abandonadas’ na Santa Casa. Muitas dessas crianças foram adotadas e tornaram-se até personalidades importantes e conhecidas… Sua correspondência conosco também é muito requisitada aqui no museu… Muitos roteiristas de telenovelas nos visitam à procura de inspiração para criar seus personagens e enredos dramáticos… O museu acolhe também raridades como instrumentos e utensílios médicos… Há também livros de documentação de cirurgias… Esta sala é destinada aos objetos de arte, móveis, vasos, esculturas, quadros… Nesta parede, à nossa esquerda, encontram-se retratos dos grandes doadores e benfeitores da história da Santa Casa… Aqui vocês podem ver um armário executado em 1883 para nossa farmácia. Ele hoje está repleto de antigos instrumentos, balanças e medicamentos usados no passado… Aqui, na sala da Mordomia, vocês podem ver retratos dos colaboradores de nossa instituição… dentro das vitrines estão os livros de atas mais antigos… os registros de expostos… No arquivo, estão as cartas recebidas dos expostos e outras mais, sempre organizadas por data… Nesta outra estante, vocês encontrarão registros de internações e óbitos… diários escritos por pacientes que tiveram longos períodos de internação… diários escritos por médicos, funcionários e estudantes… É muito interessante observar as diferentes caligrafias, as datas, os desenhos…

    Ao dizer isso ela parou bem na minha frente e, olhando meu crachá, perguntou: Kovalsky é alemão? Polonês, eu disse. E ela: Rapaz, a que nome corresponde essa letra M aí no meio do seu crachá? Nome a gente não esconde, tem significado. Alguém o colocou aí para acompanhá-lo pela vida afora! A dona Henedina sempre tem um comentário para tudo. Chega a ser irritante. De qualquer forma eu respondi, só para ser educado, dizendo que o nome oculto era Max. Ela pareceu surpresa e falou que havia um diário que parecia ser dedicado a um tal de Max. Apanhou um caderno na prateleira e o mostrou a mim.

    Era um caderno antigo com uma capa de couro marrom que tinha um nome gravado em letras douradas: Ana Rendel. Era todo escrito em letra cursiva. A letra me pareceu de cara meio infantil, como se pertencesse a uma criança. Não sei por quê, mas já naquela hora eu senti que não era um objeto qualquer. Dona Henedina estava com a mão estendida esperando que eu lhe devolvesse o diário. Não sei o que deu em mim, só sei que me vi segurando firme o caderno e dizendo: Se a senhora não se importar, eu gostaria de dar uma olhada nele. Depois de hesitar um pouco, ela falou: Está certo, mas ele não pode sair daqui. Nenhum objeto pode sair das dependências do museu. Por mim, tudo bem, eu pensei. Sentei-me num canto e comecei a ler. Dona Henedina passou por mim mais uma

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