Guerras Indígenas na Mundurukânia: Mura x Munduruku (1768–1795)
De Max Baraúna
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Sobre este e-book
No dia 10 de março de 1788, os Munduruku travavam guerras contra índios inimigos e colonos portugueses no baixo rio Tapajós, decapitaram dois índios nos arredores da "Vila de Alter do Chão" (Santarém, PA), e nessa guerra os portugueses conseguiram capturar um chefe Guerreiro Munduruku, com suas armas de guerra e com algumas cabeças-troféus.
As autoridades portuguesas da Vila estavam num misto de euforia e medo ao embarcar e se livrar do guerreiro Munduruku para Belém, para satisfazer a curiosidade de todos e o remeter para Lisboa, a fim de que sua Majestade e seus Ministros pudessem ver com os próprios olhos o guerreiro Munduruku que tanto medo infligiu à população da Amazônia colonial, no seu original.
Os índios pacificados da região acreditavam que o índio aprisionado era um grande matador de homens, além de ser um grande guerreiro e um dos lideres principais dos Munduruku.
Nesse sentido, o Governador do Pará solicita que seu irmão, Christovão de Souza da Silva e Alves, apresente o índio Munduruku ao Ministro dos Negócios Ultramarinos, Martinho de Mello e Castro, e este, a sua Majestade Maria I, Rainha de Portugal. E assim foi, o guerreiro Munduruku no Navio "Nossa Senhora Mây dos Homens", sendo levado pelo capitão Felipe Romano para atravessar o oceano Atlântico e ser apresentado como um grande inimigo da Coroa portuguesa.Nunca mais se ouviu falar desse guerreiro Munduruku, cadê o guerreiro?
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- Nota: 5 de 5 estrelas5/5LIVRO MARAVILHOSO QUE MOSTRA O CAMINHO DA GUERRA DOS MUNDURUKU
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Guerras Indígenas na Mundurukânia - Max Baraúna
Guerras indígenas na Mundurukânia
Mura x Munduruku (1768–1795)
Editora Appris Ltda.
1.ª Edição - Copyright© 2022 do autor
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Catalogação na Fonte
Elaborado por: Josefina A. S. Guedes
Bibliotecária CRB 9/870
Livro de acordo com a normalização técnica da ABNT
Editora e Livraria Appris Ltda.
Av. Manoel Ribas, 2265 – Mercês
Curitiba/PR – CEP: 80810-002
Tel. (41) 3156 - 4731
www.editoraappris.com.br
Printed in Brazil
Impresso no Brasil
Max Baraúna
Guerras indígenas na Mundurukânia
Mura x Munduruku (1768–1795)
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer aos professores do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), representado pelo orientador e amigo, Prof. Dr. Almir Diniz de Carvalho Júnior, pela sua sensibilidade, orientação e paciência nesse percurso da minha vida acadêmica.
Agradeço a Deus, embora a Ele eu agradeça todos os dias da minha vida, por tudo e até pelas derrotas, porque servem como aprendizado; Deus faz parte da minha vida e a minha da d’Ele.
Agradeço à Associação Folclórica Boi-Bumbá Caprichoso, o Boi Negro de Parintins, por proporcionar os melhores momentos da minha vida com suas toadas e apresentações magníficas, grandiosas e maravilhosas. Obrigado, meu Boi Caprichoso, por tudo.
Agradeço à Ufam, universidade que amo de paixão. Tudo o que tenho devo a ela, devo aos professores da universidade pelos seus ensinamentos. A Educação muda vidas, assim como mudou a minha.
Agradeço à cidade de Itacoatiara, a cidade canção, que me acolheu e onde escolhi viver a minha vida, olhando quase todo dia o Rio Amazonas correr para o mar. Agradeço à cidade de Parintins por seu jeito único de recpecionar e conquistar as pessoas que vão visitar aquela ilha mágica.
Agradeço à minha companheira Crisleny Sakamoto, que estava comigo nessa batalha, segurou a minha mão quando esmoreci, ajudou-me a levantar quando caí e esteve ao meu lado nos momentos difíceis da minha vida.
Agradeço à minha família, que sempre torceu pelo meu sucesso. Minha mãe, Jacy Baraúna, neta de índios Mura, do Paraná do Ramos. Ao meu pai, Anselmo Nogueira (O Mapinguary da Amazônia), neto de escravos que se refugiaram na Vila Nogueira
no rio Tefé. Agradeço aos meus tios e tias, em especial, Márcia, Elvira e Carlinha (Iaiu), que me ajudaram diretamente; a eles todo o meu carinho; sem vocês não teria chegado até aqui, sem família não somos nada. Alguns tombaram no campo de batalha, como tio Binha, tio Dilmar, Tia Mundinha e minha avó (mãe Didi), é para vocês esta conquista. Agradeço ao meu irmão, Fabiano Baraúna, que sempre me acompanhou na defesa da cultura, dos povos indígenas e da arte de folclorear sendo um grande expoente dela.
Só há duas Opções na vida:
Se resignar ou se indignar.
E eu não vou me resignar
Nunca.
(Darcy Ribeiro)
APRESENTAÇÃO
No meio do Rio Amazonas, existe uma ilha que foi o último refúgio da grande nação Tupinambá, a qual habitava o litoral brasileiro na época da invasão da esquadra portuguesa, antes de ser extinta. Os Tupinambá resolveram migrar para a Amazônia em busca da Terra Sem Males
. Essa longa caminhada durou aproximadamente 60 anos; no meio do caminho, encontraram várias nações indígenas, travaram guerras com uns, acolheram outros, perderam, ganharam, mas chegaram à ilha, que anos depois recebeu seu nome. A ilha sobre a qual estamos discorrendo chama-se Ilha dos Tupinambaranas, que abriga a cidade de Parintins.
A cidade de Parintins fica ao leste do estado do Amazonas, cerca de 390 km da capital, Manaus, e faz fronteira com o estado do Pará. Na frente da cidade, percorre o maior rio do mundo, o Rio Amazonas; por trás da ilha, passam os rios Macurany e Yacurapá até chegarem ao Rio Andirá, que se embrenha na mata e se encontra com o antigo Rio das Tupinambaranas, hoje Paraná do Ramos ou Arariá, que faz a ligação entre os rios Madeira e Tapajós; uma verdadeira estrada ancestral indígena que servia de caminho para se fazer guerra contra seus inimigos naturais e contra os portugueses, que dominavam o percusso do rio Amazonas no tempo colonial.
Parintins é a capital da Mundurukânia, extensa faixa de terra que engloba os rios Madeira, Juruena, Amazonas e Tapajós, habitat natural de várias nações indígenas, que, nessa mistura tribal, forjou homens fortes e belas mulheres. É possivel perceber os traços indígenas marcantes na formação do seu povo, um povo bonito, homens de grande porte fisico e estatura acima do normal para os padrões amazônicos, como os Mura, valentes e fortes, os Munduruku, gente de bom coração, como os Sateré-Mawê e a criatividade artística e cultural herdada dos Tupinambá.
A mulher parintinense é a definição perfeita da beleza, desde o seu tom de pele de tez morena, até seus cabelos negros, sedosos, e seu corpo traçado e esculpido pelo pincel de Monãg. Ela foi decerto o motivo pelo qual houve inúmeras guerras tribais na Amazônia colonial — era comum haver guerra para roubar ou recuperar mulheres. As parintinenses são descendentes diretas dessas mulheres guerreiras do passado, que formaram o que, hoje, são as mulheres mais lindas de toda a Amazônia.
O parintinense é a mistura perfeita das maiores qualidades que os guerreiros indigenas amazônicos posuíam para poder viver num ambiente hostil; eles sempre estavam alertas para as guerras iminentes com outras nações indígenas, em suas veias corre o sangue dos guerreiros de grandes nações como: Tupinambá, Munduruku, Mura, Parintintim, Saterê-Mawê, Juma, Apaiká, Tapajó, Arara, Passé, Curiató, Icamiaba, entre outros.
Parintins é conhecida internacionalmente pelo seu prestigiado festival folclórico, que envolve uma disputa de dois bois de pano: Caprichoso x Garantido. O primeiro é representado pelas cores azul e branco, o segundo pelas cores vermelho e branco; ambos disputam o título de campeão do Festival Folclórico de Parintins, em 21 itens de julgamento, nos três dias de festa do último fim de semana de junho.
E foi justamente o Festival Folclórico de Parintins do ano 2000 que deu inspiração para o surgimento deste livro. Naquele ano, o Boi Caprichoso apresentou o seguinte tema: A Terra é azul
. Dentro do tema, os subtemas referiam-se à guerra tribal dos Mura x Munduruku. O projeto de arena foi muito bem executado pelos artistas parintinenses do boi azul e branco, que nos brindaram com um festival mágico, histórico, cultural e social, demonstrando o modo de vida dos povos amazônicos de outrora, uma verdadeira aula sobre história indígena do Amazonas, uma ópera a céu aberto decantada em belas toadas e na concepção primorosa, criativa e alegórica dos vários artistas do boi azul traduzidos em: lendas Mura, lendas Munduruku, rituais, ritos de passagem, teatralização, cênica e coreografia de seus dançarinos. Um dos pontos altos da apresentação foi a guerra Mura x Munduruku, encenada pela torcida. A arquibancada do Boi Caprichoso foi dividida ao meio: de um lado, os guerreiros Mura e, do outro, os guerreiros Munduruku, ambos com toada própria para esse momento. O ato nos transportou, como partícipes da guerra tribal, para aquelas batalhas sangrentas e mortais, vivenciando a glória da guerra e da vingança Mura ao Paikicé Munduruku, que, ao final, decepou com uma faca de bambu a cabeça do inimigo.
Por fim, essa lembrança maravilhosa, que nem lavagem cerebral fará apagar ou esquecer, da exuberante, magnífica e linda apresentação do Boi Caprichoso no ano 2000, conduziu-nos a pesquisar a existência da guerra entre os Guerreiros Mura e os Guerreiros Munduruku na Amazônia colonial. Este livro é inspirado nesse espetáculo, fruto de pesquisas.
PREFÁCIO
Um passado que não silenciou
O espetáculo que inspirou este livro e que foi registrado pelo autor em sua apresentação da obra foi fruto do encantamento de um antigo leigo (ele próprio). Mas, esse olhar foi lentamente sendo apurado e se tornou, com os anos de estudo e dedicação, o olhar do pesquisador cuidadoso, que passou a enxergar para além das máscaras dos participantes da festa, para além da beleza das cunhãs Poranga. O que ele encontrou foi a história de um drama e de uma luta pela sobrevivência em meio à exploração, à violência, às traições e ao jogo do poder que essas duas etnias tiveram de enfrentar. Diante da realidade que se lhes impôs, esses dois grupos (Mura e Munduruku) foram se reinventando e criaram para si próprios a possibilidade de se manterem vivos.
Falar sobre esses grupos é falar sobre a história indígena. Mais especificamente, é falar sobre uma nova abordagem que hoje coloca os índios como protagonistas dessa mesma história. Esse foi o esforço empreendido por Max Deulen Baraúna Nogueira, nesta importante obra – Guerras indígenas na Mundurukânia: Mura x Munduruku (1768-1795). Caminhando pelas trilhas abertas por outros historiadores, na mata densa dos registros do passado, que enfrentaram o discurso do enaltecimento da colonização portuguesa na América, o discurso da passividade e inferioridade bélica e cultural das populações que foram submetidas pelo Estado português, ou o discurso da incapacidade política diante de uma estrutura de Estado complexa que tiveram de enfrentar, Max nos descortina um ambiente ainda nebuloso e vai palmilhando, por meio de um conjunto de fontes variadas, mas que já revela toda a complexidade, o poder de adaptação e uma capacidade de manipulação do jogo político produzido por essas populações diante das condições adversas e violenta da colonização europeia.
O autor nos revela, no seu objeto de pesquisa (fruto de uma dissertação de mestrado defendida na Universidade Federal do Amazonas), um aspecto fundamental que outros historiadores, hoje no Brasil, têm também buscado entender ao escreverem a nova história indígena. Uma forma inovadora que se caracterizou por definir as populações indígenas como protagonista de sua história e da história do Brasil. Esforço ao qual essa nova historiografia já tem se dedicado faz alguns anos. No caso das guerras indígenas entre Mura e Munduruku, durante o século XVIII, esse protagonismo se revela nas mudanças produzidas na guerra que a sua tradição já havia sedimentado. Portanto, o protagonismo não é somente caracterizado pelo poder de produzirem uma guerra à revelia da ordem imposta pelo governo português em sua colônia amazônica na América. Mais do que isso, o protagonismo também se configurou por terem reinventado o sentido da guerra diante das condições geopolíticas com as quais foram obrigados a conviver.
Max pautou-se em trabalhos clássicos e em obras inovadoras que construíram um novo olhar, lançado por um novo conjunto de historiadores, que, nos últimos tempos, pesquisaram a história dos índios, considerando-os como personagens principais do discurso histórico. Antes, esses personagens figuravam apenas como secundários, senão terciários e, mesmo assim, passivos, enfraquecidos, debilitados, mais do que isso, cultural e fisicamente inferiores. Quando não, vítimas indefesas diante de um opressor muito mais poderoso. Todos esses discursos partem de uma mesma lógica: eles retiravam desses indígenas o seu poder de serem sujeitos, de serem atores sociais, de construírem também a história.
Voltando à questão central deste livro: a guerra nessas sociedades indígenas, antes disso, definia-se como constituinte de suas próprias identidades e de suas culturas. O autor traz para o leitor e coloca em debate vários discursos etnográficos que demarcaram essas matrizes constituintes. Mas, o sentido da guerra mudou ao ganhar outros matizes e mudou para que as sociedades indígenas continuassem existindo. Portanto, não mudou porque foram aculturados
, termo que nasce de uma ideia equivocada de cultura, que a vê como um monolito, um conjunto de padrões constituintes de identidades quase imóveis no tempo, que marcariam as especificidades fundamentais do ser social. Não! A capacidade dos sujeitos de se apropriarem do que se lhes é imposto, de se reinventarem, faz da cultura uma dimensão dinâmica e interativa da existência humana, capaz de incorporar novas experiências sem abandonar alguns dos seus elementos fundantes e de conferir sentido à sua realidade social e às suas identidades.
Os Mura e Munduruku, os personagens centrais dessa história, são o exemplo mais contundente desse modo criativo e dinâmico dos padrões culturais, que, embora impactados pelo poder das armas, da nova religião e dos novos valores, não desapareceram, ao contrário disso, se reinventaram.
Voltemos ao espetáculo que inspirou esta obra. Muito embora essa festa tenha impactado nosso autor e tenha funcionado como uma força motriz que o fez navegar, subindo