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From: Madureira To: Brasília
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E-book162 páginas2 horas

From: Madureira To: Brasília

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Sobre este e-book

Leonice Oliveira Horta Barbosa é natural do Rio de Janeiro, dividiu sua infância e adolescência entre Madureira (RJ) e Brasília (DF), desde a fundação da Nova Capital.
Casada com Hegler José Horta Barbosa, tem 3 filhos – Heglinho, Letícia e Hugo – e seis netos – Henrique, Giovanna, Luíza, Gabriela, Homero e Katarina.
Formada em Economia na Universidade de Brasília, em 1975, nunca exerceu essa profissão, sua vida foi direcionada ao serviço público, desde que ingressou no Senado Federal em 1973, aos 21 anos, como Auxiliar de Taquigrafia.
Foi Taquígrafa Parlamentar do Senado Federal até 1984, quando chefiou o Serviço de Apanhamento Taquigráfico desta Casa, por indicação dos funcionários.
Na época dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte do Brasil, foi nomeada e empossada na Diretoria da Subsecretaria de Taquigrafia do Senado Federal, onde atuou de forma marcante na realização dos trabalhos desta Assembleia.
Sua contribuição na implantação da Informática nesta Subsecretaria, juntamente com o apoio do PRODASEN – Serviço de Processamento de Dados do Senado Federal –, foi importante em sua trajetória profissional.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento22 de jul. de 2022
ISBN9786525240367
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    From - Leonice Oliveira Horta Barbosa

    CAPÍTULO I OS MEUS, OS SEUS, OS NOSSOS

    Meu pai – Manoel Barbosa - nasceu na Fazenda Muribeca, Município de São Sebastião do Alto, Estado do Rio. De família pobre, calçou o primeiro par de sapatos aos dezesseis anos e, logo após, quitou as dívidas do pai dele contraídas para o casamento. Serviu ao Exército como padioleiro no Rio de Janeiro, tornou-se evangélico, se casou, tiveram seis filhos – Parmenas, Lídia, Lígia, Paulo, Lenir e Manoel - ficou viúvo aos 36 anos. Naquela época não havia concurso público e ele conseguiu uma indicação como contínuo no Tribunal Superior Eleitoral, no centro da Cidade do Rio de Janeiro. Ele nos contava que o Ministro Lafayette de Andrada gostava muito dele pelo seu trabalho e humildade e, quando soube da sua viuvez, lhe ofereceu colégio interno para seus filhos, presumindo como seria difícil criar seis crianças sozinho, mas ele agradeceu e respondeu que Deus o ajudaria na criação deles. Antes de sair para trabalhar, lavava roupa, cuidava da casa e dos filhos e deixava o almoço pronto com um despertador próximo; os mais velhos – todos menores de 10 anos – eram encarregados de cuidar dos mais novos e alimentá-los, quando não podiam contar com a ajuda da avó Adelaide todos os dias. E ainda arranjava tempo, devido ao seu temperamento também inquieto, para militância política no Diretório da UDN (União Democrática Nacional) em Madureira, fazendo campanha ao lado de Carlos Lacerda e Jânio Quadros.

    Minha mãe – Azenete – nasceu em Palmares, Pernambuco e era a mais velha dos 5 irmãos; ficou órfã de pai aos 9 anos e, junto com a mãe e irmãos, vieram para o Rio de Janeiro. Casou-se, teve dois filhos – Washington e Jabis - ficou viúva aos 32 anos e foi morar na casa do pastor da igreja, onde ajudava costurando. Como no filme brasileiro Dona Flor e seus dois Maridos, seu primeiro marido – Constâncio – era boêmio e mulherengo (ela o conheceu aos 15 anos) e meu pai, seu segundo marido, não bebia, não fumava, nem prevaricava, pois era membro da Assembleia de Deus. Eram opostos, mas quando ela mergulhava em suas recordações matrimoniais, seus olhos brilhavam quando falava do primeiro marido que, ao que tudo indicava, foi seu grande amor. O pedido de casamento de meu pai foi feito através de um contrato escrito e entregue ao pastor, com várias cláusulas. Ela assinou o acordo que simbolizava seu sonho de ajudá-lo a criar as crianças e construírem uma família de 8 filhos, num lar cristão. Dizem que, na primeira noite deles de matrimônio, algumas crianças estavam doentes com sarampo ou catapora. Deus abençoou-os e, da nova união, eu nasci após 3 anos de casados e, cinco anos depois, nasceu meu irmão Pedro e somamos 10 filhos.

    Madureira é o subúrbio mais conhecido e badalado da Zona Norte do Rio de Janeiro. É um bairro popular onde sua população tem orgulho e características bem próprias e marcantes. O Mercado de Madureira tem de tudo e é conhecido pelo seu comércio e o famoso pastel com caldo de cana. O parque de Madureira é um convite ao lazer e enche de orgulho todas as famílias que ali residem pela sua beleza e originalidade, além de ser palco de shows musicais. As crianças do bairro ainda brincam de bola de gude e soltam pipa nos telhados e muros. Os adolescentes namoram no portão e as donas de casa batem papos longuíssimos sentadas nas portas de casa. Há poucos anos, estava lanchando com minhas irmãs em Madureira, quando ouvi uma buzina tipo corneta, achei estranho aquele som e perguntei à minha irmã o que era. Sabem o que era? Era o padeiro, numa bicicleta adaptada, vendendo pães, pães-doces, broas e bolos; todos os dias pela manhã e à tarde, na hora do café, como um ritual. Típico de Madureira. Ali todos se conhecem, como no caso de uma família da rua que o pai era militar e foi internado por acharem que ele estava desconfiando da fidelidade da esposa sem motivos. E, para surpresa de todos, no dia do casamento da filha, na hora da partida dos noivos para a lua-de-mel, descobriram que o noivo havia fugido com a mãe da noiva. Parece novela, mas em Madureira acontece!

    As escolas de samba Portela e Império Serrano estão localizadas no bairro e são as pérolas do carnaval na Sapucaí. Mas bom mesmo são os irreverentes blocos carnavalescos de rua que alegram toda a gente daquela área. As gírias são comuns, se você não estiver prestando bastante atenção quando estiver conversando com um madureirense, pode até pensar que está desantenado com as notícias ou que é outro idioma. O madureirense é alegre, trabalhador e gosta de sambinha e pagode de fundo de quintal. Hoje o bairro está popularizado pela insegurança e pelo crime que não se alastrou só por ali, mas por toda a cidade.

    Madureira era nosso lar e ali estava toda família reunida. Morávamos na Rua Maria José 232 e tínhamos uma vida simples, mas nada nos faltava. Nossa casa era confortável para o nosso padrão na época, tinha três quartos – o do casal, o das meninas e o dos meninos – uma cozinha bem ampla, a sala e uma varanda de vidro; no quintal um pé de pitanga, um abieiro e um pé de cajá manga. Era normal uma casa deste tamanho com um só banheiro que atendia perfeitamente ao casal e dez filhos. O sistema era o seguinte: se alguém estivesse muito necessitado, batia na porta e quem estivesse dentro do banheiro se apressava.

    Tínhamos uma alimentação sadia onde sempre havia uma carne presente, verduras e legumes. As frutas eram nossas sobremesas: banana, laranja e melancia e, quando alguém adoecia, tinha direito a uma maçã e uma canja de rã, caçada no brejo próximo à nossa casa. Éramos uma só família, todos iguais e com os mesmos direitos e deveres. Meus irmãos mais velhos eram incumbidos de trazer comida de bares e restaurantes para alimentar nossos porcos e galinhas do quintal e, quando em ocasiões especiais, matávamos um porco, eles tinham direito a escolher os seus pedaços preferidos, pois eram eles que os alimentavam.

    As regras eram simples: o dono da casa, que nos sustentava, se sentava sempre na cabeceira da mesa, sempre orávamos o Pai-nosso, agradecendo a refeição, e o melhor pedaço da galinha, o primeiro pedaço do bolo, da melancia ou queijo, era sempre do nosso pai, por questão de reverência e respeito. Nunca comemorávamos Páscoa, Dia das Crianças, Natal ou datas semelhantes, somente no aniversário de cada um cantávamos os parabéns com um bolinho comum e um palito de fósforo. Ganhei meu primeiro presente de Natal, quando meu irmão Paulo foi trabalhar de aprendiz aos 16 anos numa marcenaria e comprou um fogãozinho rosa e preto, com panelinhas. Como fiquei feliz com o inédito presente! A família toda ganhava sapatos novos no Natal e mamãe fazia roupas para os homens - camisas simples ou sociais - e para as minhas irmãs, já mocinhas, vestidos da mesma peça de tecido comprada no armarinho do Sr. Rainer.

    Não consigo deixar de recordar da doença que minha irmã Lenir sofreu na passagem da infância para a adolescência. Tinha crises de esquizofrenia, foi internada num hospital psiquiátrico e lembro, quando fui visitá-la, aos 10 anos, e presenciei os médicos aplicando choques elétricos nela. Era o tratamento da época. Nunca esqueci aquela cena, que marcou profundamente a minha vida. Sempre nutri um carinho todo especial por ela que brincava comigo de casinha de boneca e escolinha – inclusive, foi quem me ensinou a ler e escrever: nossa diferença de idade era de 6 anos – e, também, era ela quem brigava com as meninas maiores que implicassem

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