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Dimensões humanas, saberes e processos na educação superior: Ciências Contábeis na complexidade e na integralidade
Dimensões humanas, saberes e processos na educação superior: Ciências Contábeis na complexidade e na integralidade
Dimensões humanas, saberes e processos na educação superior: Ciências Contábeis na complexidade e na integralidade
E-book1.037 páginas12 horas

Dimensões humanas, saberes e processos na educação superior: Ciências Contábeis na complexidade e na integralidade

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Sobre este e-book

O livro aborda o processo educacional superior conjugando as dimensões da natureza do ser humano através de incentivos, pesquisas, exemplos reais e simulações, argumentos comprobatórios e reflexivos, tendo-se como referência o curso de Ciências Contábeis. Os autores provocam e argumentam sobre o que está posto no curso para refletir, aprender e auxiliar no constructo dos discentes e docentes diante da complexidade tão presente em pleno século XXI.

Organizado em nove partes, inicia-se com a identificação, trajetórias, perspectivas e expectativas dos discentes em relação à educação, aprendizagem e futuro. A Parte 2 aponta a trajetória e as práticas didático-pedagógicas utilizadas pelos docentes. A Parte 3 fornece uma proposta curricular modular e por competências. A Parte 4 trata da avaliação externa. A Parte 5 discute a dimensão ética geral e profissional. Segue-se, na Parte 6, retomando o transcendental do ser humano. A Parte 7 expõe a qualidade de vida conectada à saúde, ao esporte e ao lazer. A Parte 8 polemiza a educação ambiental e o comportamento ecológico, e a Parte 9 apresenta um relato de experiência educacional diante da Covid-19.

É nesse vértice que as temáticas emergem de maneira a resgatar o que já se sabe, ao desconstruir o que se imagina e, nesse contexto, vir a reformular o processo educacional norteado pela Teoria da Complexidade, embora ciente das limitações: "o todo não é tudo". Eis a contribuição dessa obra, que é indicada para toda a comunidade acadêmica.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento31 de ago. de 2022
ISBN9786525252889

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    Dimensões humanas, saberes e processos na educação superior - Ana Maria Gonçalves de Sousa

    PARTE I – VOCÊS… NÓS! ALGUÉM!

    Discentes: perfil, representações, perspectivas e expectativas perante a educação, a aprendizagem e o futuro

    Ana Maria Gonçalves de Sousa

    Edgar Morin recorre ao princípio de Pascal para afirmar que o conhecimento das partes depende do conhecimento do todo, assim como o conhecimento do todo depende do conhecimento das partes, qual seja: Como todas as coisas são causadas e causadoras, ajudadas e ajudantes, mediatas e imediatas, e todas são sustentadas por um elo natural e imperceptível, que liga as mais distantes e as mais diferentes, considero impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, tanto quanto conhecer o todo sem conhecer, particularmente, as partes.(MORIN, 2021, p. 88).

    Evidenciar e tracejar um perfil dos discentes do curso de Ciências Contábeis da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás) vai além de se tentar elaborar uma classificação, um agrupamento, um estereótipo. A partir dessa perspectiva, buscou-se mostrar o quão complexas são algumas nuances apresentadas pelos discentes, mesmo que formem neste estudo um pequeno coletivo. É nesse pequeno coletivo que se pode vislumbrar um pouco mais sobre quem são esses sujeitos, seja em sua unicidade ou em suas multiplicidades, ou melhor dizendo, em sua "unitas multiplex" (MORIN, 2011a, p. 49).

    O reconhecimento das diferenças e a busca pela compreensão de cada sujeito discente são relevantes e se fazem necessários, uma vez que se torna indispensável romper com o estereótipo de que em uma sala de aula todos são iguais. Certo é que todos os discentes devem ser atendidos com respeito, educação e sem qualquer tipo de discriminação, e mais, que absolutamente nada impeça que sejam tratados com atenção, consideração, acolhimento, gentileza, compreensão e prontidão para ajudá-los naquilo em que mais apresentam dificuldades. Nada deve tornar impraticável ao docente conhecer a história, a cultura, assim como o seu papel de sujeito ativo na vida acadêmica dos discentes com os quais se relaciona no processo de ensino-aprendizagem. Esse conhecimento favorece não apenas uma relação de confiança entre docentes e discentes, mas também uma aprendizagem exitosa e, conforme ressalta Morin (2011a, 2021), um conhecimento pertinente. A tradicional atitude de tratar os discentes de maneira igualitária, desconhecendo-se as particularidades de cada um, faz com que o docente não esteja a par das dificuldades, das necessidades e dos anseios dos discentes com quem trabalha. Entretanto, o potencial, as dificuldades, a espiritualidade, a ambiência familiar, o contexto social, a identidade étnica e cultural, bem como a trajetória educacional de cada um dos discentes ainda são fatores minimamente considerados no convívio acadêmico e no processo de ensino-aprendizagem e do qual decorrem várias reflexões e questionamentos. Como as instituições de ensino superior e os docentes que nelas trabalham podem instaurar um processo de ensino e de aprendizagem sem atentar-se para a história de vida e as experiências adquiridas de seus discentes? Como se pode obter uma aprendizagem significativa sem dar importância ao contexto, à ambiência que esse discente encerra em si próprio? Como o docente pode ser útil, cuidar e ajudar o discente nos processos de aprender a aprender, aprender a ser, aprender a fazer, aprender a conhecer e aprender a viver, ou seja, aprender a natureza da condição humana e a compreensão humana, quando esses fatores não se encontram inseridos no processo relacional e em que se pauta o ensino e a aprendizagem?

    Nesse sentido, a sociedade e, por consequência, os discentes depositam sonhos, aspirações, expectativas e desejos na educação superior. Ainda que essa mesma sociedade encontre-se desiludida, decepcionada, desacreditada com os rumos, os resultados e o papel desempenhado pela educação superior. Embora essa situação se apresente de maneira complementar e paradoxal, não impede que essa seja questionável, pois, conforme assinala Morin (2011a, 2021), é absolutamente essencial que a educação se torne uma educação que corresponda às aspirações dos seres humanos.

    É nesse cenário de anseios, sonhos, frustrações, decepções e insatisfações que Morin reafirma a necessidade urgente de uma reforma na educação, assim como expõe o relevante papel da educação e dos docentes. Entretanto, para reformar o ensino nos núcleos de conhecimento são necessárias motivação, audácia e coragem. Segundo Morin (2011a, 2021), a reforma do ensino requer um pensamento complexo e deve se originar dos próprios docentes. O docente deve se enveredar em um processo de autoeducação e assimilar o pensamento complexo, ao mesmo tempo em que passa a ensinar de forma diferente, inclusive com o subsídio das novas tecnologias de informação e comunicação. Sob esse aspecto, o docente continua sendo peça primordial do processo de ensino e de aprendizagem, mas a relação entre ele e o discente é alterada quando se estimula, cada vez mais, uma relação de aprendizagem colaborativa e cooperativa. Assim, o docente precisa repensar suas funções, tarefas e atitudes, na medida em que essas mudanças implicam em se adaptar e conhecer o universo de cada um de seus discentes.

    Conhecer o universo sob o qual vivem os discentes com os quais o docente se relaciona implica, minimamente, que os docentes devam se instruir sobre fatores condicionantes em relação, principalmente, aos aspectos da cultura familiar e escolar de seus discentes. É preciso que a docência conheça e reconheça, sobretudo, esses dois universos culturais, que não podem ser ignorados e desdenhados pelo mundo intelectual da docência. Edgar Morin (2021, p. 80) defende que se trata de

    […] instruir-se sobre a autonomia conquistada pelo mundo adolescente em relação à cultura familiar e à cultura escolar […], e sobre as formas comunitárias e regras específicas dos grupos adolescentes, que, onde há desintegração do tecido social ou familiar (periferia), chegam até a formação de clãs, que constituem verdadeiras microssociedades, com seus territórios sacramentados, suas leis de vingança, seus códigos de honra.

    Destarte, tendo como viés condutor a Teoria da Complexidade em Edgar Morin, em especial as obras do autor Os sete saberes necessários à educação do futuro e A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento, o objetivo da Parte I – Vocês… Nós! Alguém! foi o de descrever o delineamento socioeconômico e cultural dos discentes do curso de graduação presencial de Ciências Contábeis da PUC Goiás, bem como identificar, avaliar e analisar as expectativas e as estratégias dos discentes relacionados à escolha profissional e inserção no mercado de trabalho, ao curso e à instituição, ao sucesso acadêmico, à formação acadêmica face ao desenvolvimento de competências, às estratégias de aprendizagem e às relações interpessoais.

    Especificamente, objetivou-se: (i) apresentar alguns antecedes dos discentes quando da acessibilidade ao curso, refletindo a sua imagem social, demográfica, econômica e cultural; (ii) determinar alguns dos fatores implícitos à escolha do curso e da instituição, por parte dos discentes; (iii) evidenciar perspectivas e expectativas dos discentes com o processo de ensino-aprendizagem e aquisição de competências, bem como o que gosta de estudar e como aprende; (iv) identificar o nível de participação, o envolvimento acadêmico e as estratégias de aprendizagem empregadas por esses; (v) conhecer as perspectivas e expectativas dos discentes sobre as diversas especialidades contábeis perante o mundo do trabalho.

    Nessa concepção e a par desses objetivos, esse estudo foi norteado, basicamente, por quatro hipóteses de trabalho que se enunciam a seguir.

    Hipótese 1: é esperado que as expectativas acadêmicas tenham a mesma importância, quer para o gênero masculino, quer para o feminino.

    Hipótese 2: é esperado que existam diferenças nas expectativas acadêmicas em razão da faixa etária dos discentes.

    Hipótese 3: é esperado que as estratégias de aprendizagem tenham a mesma importância quer para o gênero masculino, quer para o feminino.

    Hipótese 4: é esperado que existam diferenças na importância das estratégias de aprendizagem em razão da faixa etária.

    Acredita-se que, ao averiguar e obter os resultados dessas informações sobre os discentes do curso, seja possível criar e ampliar as oportunidades de melhor conhecer, assim como de contextualizar esses discentes no processo de ensino-aprendizagem, mediante o fortalecimento nas relações colaborativas e cooperativas entre discentes e docentes. De igual maneira, é provável que tais informações possam contribuir para com os gestores e os docentes em suas reflexões e discussões sobre o processo educacional e de ensino-aprendizagem, na atualidade, no curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás, com vista a um contínuo aperfeiçoamento.

    Pode-se afirmar que um aspecto interessante desta investigação residiu no fato de que a maioria das variáveis que compôs o questionário, para proceder ao levantamento dos traços sociais, econômicos, culturais e educacionais desses discentes, encontravam-se associadas estatisticamente ao curso e à instituição. Logo, tornou-se possível transparecer as características do contexto em que se inseriam esses sujeitos. O universo da pesquisa foi constituído pelos 535 discentes regularmente matriculados no curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás no primeiro semestre de 2019. Destes, 178 se encontravam matriculados no turno matutino, e, 357, no noturno. Dos 535 discentes, 214 acessaram o questionário e, destes, dois se recusaram a participar, o que conduziu a uma amostra de 211 discentes respondentes, compreendendo, pois, 39,4% do total. Assim, obteve-se a seguinte distribuição dos discentes respondentes por período matriculado: no 1º período: 0,5%; no 2º período: 7,1%; 3º período: 12,8%; 4º período: 9%; 5º período: 7,6%; 6º período: 3,3%; 7º período: 32,7% e 8º período: 27%, como segue na Tabela 1. Ao se observar a quantidade de discentes matriculadas e a quantidade de discentes respondentes por período, relativos ao primeiro semestre de 2019, a representatividade real assume outra dimensão.

    É perceptível que os dados expostos na Tabela 1 evidenciaram uma desconformidade matemática. Tal efeito foi em decorrência de que alguns dos discentes cursavam disciplinas em dois, três ou mais períodos, simultaneamente. Nesse caso, o discente era alocado e computado pela Instituição, no período em que cursavam maior número de disciplinas e ou créditos.

    Tabela 1 – Distribuição da amostra e respectiva representatividade por período no curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás, 1º semestre de 2019

    Fonte: PUC Goiás (2019).

    Também se pode perceber uma concentração de respondentes nos dois últimos períodos do curso. Deduziu-se que a maior participação dos discentes nos últimos períodos do curso seja justificável pelo fato de que, especificamente, nos 7º e 8º períodos que os discentes desenvolviam com mais efetividade a pesquisa, quando da realização do Trabalho de Conclusão do Curso (TCC), conforme constava no Projeto Pedagógico do Curso (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2015). Portanto, é bastante provável que houvesse um nível de conscientização mais forte por parte dos discentes em relação à importância de sua contribuição ao responder um questionário de pesquisa.

    Metodologicamente, trata-se de um estudo pautado na abordagem qualitativa e quantitativa, narrativo-descritivo e reflexivo subsidiado pela pesquisa bibliográfica e documental, bem como pelo levantamento de dados através da técnica de questionário (LAKATOS; MARCONI, 2010; LUDWING, 2009). A amostra não probabilística intencional se constituiu com a adesão ao responder o questionário, de 211 discentes respondentes regularmente matriculados na Matriz Curricular de 2013/1 do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás. O locus do estudo foi a Pontifícia Universidade Católica de Goiás, especificamente, o curso de Ciências Contábeis.

    A coleta de dados se deu por meio do levantamento utilizando a técnica de questionário, realizado por meio da plataforma gratuita Google Forms, encaminhado pela Secretaria da Escola de Gestão e Negócios da PUC Goiás ao endereço eletrônico dos discentes matriculados. O critério de inclusão e exclusão foi que, respectivamente, os discentes estivessem regularmente matriculados no curso e que possuíssem idade superior há 18 anos. Nele constavam os esclarecimentos sobre a pesquisa e a solicitação de apoio com o estudo, bem como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido com opção de aceite. Esse ficou disponível para resposta por 60 dias durante os meses de abril, maio e junho de 2019. Os aspectos éticos foram seguidos, conforme determina a Resolução do Conselho Nacional de Saúde n. 510/2016 (BRASIL, 2016a), e com a devida aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da PUC Goiás mediante Parecer Consubstanciado n. 3.205.764/2019.

    Seis eixos nortearam as questões que edificaram este recorte do questionário destinado aos discentes matriculados no curso, composto por questões simples e de múltipla escolha. O primeiro eixo foi composto por questões que possibilitassem uma caracterização social e demográfica, e contou com vinte e quatro questões. O segundo compreendeu duas questões, com o intuito de identificar os fatores que levaram o discente a realizar o curso de Ciências Contábeis, assim como as oportunidades obtidas durante a sua realização. O terceiro objetivou diagnosticar a expectativa profissional do discente e se constituiu de duas questões. O quarto eixo englobou as características culturais dos discentes. O quinto eixo conciliou duas questões relacionadas aos aspectos do sucesso profissional e às relações interpessoais dos discentes. Por fim, o sexto eixo abrangeu sete questões e objetivou obter informações acerca da educação, da aprendizagem e dos métodos didático-pedagógicos.

    A análise dos dados foi através da estatística descritiva, basicamente frequência, média e desvio padrão. Para a diferença entre as variáveis, foram usadas as técnicas do Teste t e Manova, bem como matriz de correlação de Pearson. O teste de Correlação de Pearson foi aplicado para verificar a associação entre as variáveis. O nível de significância adotado foi p<0,05. Todos os cálculos e demais procedimentos estatísticos foram efetuados a partir do software Statistical Package for Social Sciences 26.0 para gerar as estatísticas descritivas, e o software Statistica 12.

    Cabe esclarecer que, além desses eixos sobre a dimensão educação, que integra essa parte, explorou-se também outras dimensões, quais sejam: qualidade de vida, esporte e lazer; prática docente, proposta curricular, avaliação, contexto ambiental; contexto ético; espiritualidade e religiosidade, como consta nesta obra. Aventurou-se em terrenos alheios enquanto tentativa de suscitar uma reflexão acerca dos sujeitos discentes e docentes do curso, com fundamento e contextualização no global, no multidimensional e no complexo defendidos por Edgar Morin. Esse autor (1990, p. 103) esclarece que, no fundo, o pensamento complexo deverá ser o [...] produto de todo um desenvolvimento cultural, histórico e civilizacional. O paradigma da complexidade virá do conjunto de novas concepções, de novas visões, de novas descobertas, de novas reflexões, que vão pôr-se de acordo e reunir-se.

    As demais dimensões selecionadas para a investigação presente nessa – que não deixam se inter-relacionar com o sistema jurídico e legal, o sistema legislativo, o sistema de governo, o sistema econômico e o próprio sistema educacional – encontram-se conectadas ao longo do abordado nessa obra.

    Antecedentes: de onde venho?

    Somos filhos do cosmo, mas, em função da nossa própria humanidade, de nossa cultura, de nosso espírito, de nossa consciência, de nossa alma, tornamo-nos estranhos a esse cosmo, do qual somos oriundos e que, contudo, continua a ser, para nós, secretamente íntimo. (MORIN, 2012, p. 48).

    Ao examinar os dados obtidos sobre os antecedentes escolares dos discentes respondentes, tinha-se que 196 deles cursaram o ensino médio padrão somente em escola pública. Dentre os 211 inquiridos, seis cursaram a Educação para Jovens e Adultos (EJA)/Supletivo, sete fizeram o ensino médio na modalidade Técnico e dois em outras modalidades. Assim, a maioria, 196 discentes, realizaram o ensino médio padrão. Do total, 155 discentes cursaram o ensino médio completo na rede pública e apenas 24 deles o fizeram na rede privada. Os discentes que cursaram a maior parte do ensino médio em escolas públicas totalizaram 17 e os que cursaram a maior parte em escola privada, somaram 15. Infere-se, portanto, que a maioria daqueles que ingressaram no curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás eram oriundos do ensino médio padrão da rede de ensino pública.

    Em relação ao nível de formação escolar dos progenitores dos discentes respondentes do curso, 7,6% possuíam especialização, 0,9% cursaram o mestrado e 0,5% realizaram o doutorado. Cursaram especialização quatro dos pais e 12 das mães dos discentes. Obtiveram formação em ensino superior 33 das mães e 25 dos pais. Havia 73 pais e 80 mães com formação no ensino médio. Os pais com formação no ensino fundamental do 1º ao 5º ano eram 54 e, com formação do 6º ao 9º ano, eram 41. Em relação à formação das mães no ensino fundamental do 1º ao 5º ano, eram 37 e, do 6º ao 9º ano, eram 41. Com nenhuma escolaridade, eram 14 pais e seis mães. Nota-se, pois, que a quantidade de mães que cursaram o ensino superior, assim como a especialização, era superior à quantidade dos pais. Ademais, a maioria dos progenitores dos discentes tinha formação na segunda fase do ensino fundamental ou no ensino médio.

    Ao investigar a forma com que os discentes respondentes ingressaram no ensino superior, no que se refere ao tipo de exame e às políticas afirmativas, revelou-se que as formas pelas quais estes ingressaram no curso de Ciências Contábeis encontrava-se diversificada. Dos 211 discentes inquiridos, 127 ingressaram mediante realização e aprovação em vestibular, 68 por meio da realização e aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), nove via transferência, seis de outras formas e apenas um ocorreu por reopção de curso.

    Tal fato traz à tona características quanto à tipologia de acesso ao ensino superior no Brasil, em que há vários processos que selecionam os candidatos interessados em ingressar em um curso superior. O mais tradicional era o exame vestibular, criado em 1911 e reformulado por vários dispositivos legais ao longo de mais de cem anos. Tratava-se de um processo seletivo realizado pelos candidatos e que vem, desde 2010, sendo substituído, gradualmente, por muitas Instituições de Ensino Superior (IES), pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), instituído em 1998 e implantado em 2009 (BRASIL, 2001b, 2009, 2010). Esse Exame objetivou, inicialmente, constituir-se em um dispositivo de avaliação da qualidade do ensino. Posteriormente, configurou-se como um instrumento para os candidatos ingressarem nas IES e passou, então, a ser visto como um vestibular. Era realizado anualmente e compreendia uma prova com 180 questões de múltipla escolha sobre quatro grandes áreas de conhecimento e acrescida de uma redação. Selecionava os candidatos com maiores notas para ocuparem vagas nas IES, quer fossem da rede de ensino privada ou da rede de ensino pública. Os candidatos com maiores notas tinham maiores probabilidades de conseguirem ingressar em uma IES pública por meio do Sistema de Seleção Unificado (BRASIL, 2011, 2017a). Importa recordar que, por um período de cinco anos, de 2009 a 2016, o Enem podia ser utilizado por estudantes cuja conclusão do ensino médio se deu em cursos de Educação para Jovens e Adultos (EJA) e que, a partir de 2017, passou a ser o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja) (BRASIL, 2004, 2008, 2017a, 2017b, 2020).

    Em relação às políticas afirmativas, o ingresso de 43,6% dos discentes respondentes no curso de Ciências Contábeis se deu por meio de políticas de ação afirmativa, através de sistema de reserva de vagas com recorte social (egresso de escola pública, renda e outros) e 5,2% deles, mediante o sistema de reserva de vagas com identificação étnico-racial (negros, pardos e indígenas). Observa-se que a proporção de discentes que ingressaram no curso por intermédio das políticas afirmativas eram menores quando se compara com a proporção de ingressantes em cursos de graduação no Brasil, em 2019, considerando-se o tipo de reserva de vaga no sistema da educação superior, totalizou, em ordem decrescente, ingressantes por escola pública correspondendo a 87,5%, seguidos dos ingressantes por programa étnico, com 8,5%, por programa social/renda familiar, 2,1%, outros fatores, 1,4%, e ingressantes com deficiência, 0,5% (INSTITUTO  NACIONAL  DE  ESTUDOS  E  PESQUISAS  EDUCACIONAIS  ANÍSIO  TEIXEIRA, 2020).

    O sistema de reserva de vagas no Brasil, a partir da sanção da Lei n. 12.711, de 2012, previa a destinação de vagas para estudantes de escolas públicas e, dessa reserva, algumas vagas eram para autodeclarados pretos, pardos ou indígenas, ocorrendo, assim, dois tipos de reserva, uma social e outra racial. A referida Lei determinou às Instituições de Ensino Superior (IES) federais a obrigatoriedade de, até 2016, cumprirem reserva de 50% das vagas para estudantes que cursaram o ensino médio em escolas públicas. Desse percentual, metade deveria ser destinada a candidatos que possuíssem renda mensal per capita igual ou menor que 1,5 salário-mínimo e, a outra metade, a estudantes com renda maior que 1,5 salário-mínimo ou com autodeclaração racial (BRASIL, 2012). Embora a legislação a este respeito só tenha sido sancionada em 2012, há registro de IES que implementaram políticas de reserva de cotas desde o ano 2000, a exemplo da Universidade de Brasília (UnB). Além do previsto nessa legislação, a IES possuía autonomia para implementar outras ações nesse sentido, a exemplo de IES que apresentavam cotas para população indígena, quilombolas e portadores de necessidade especial.

    No curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás, os discentes que ingressaram independentemente de qualquer ação afirmativa representavam 75 e 33 deles ingressaram por sistemas distintos dos expostos, a exemplo do Enem, transferência e reopção de curso, dentre outros. Sublinha-se que um dos destaques do ProUni é que esse trouxe a materialização da política de ações afirmativas, com a destinação de cotas para afrodescendentes e indígenas enquanto proposta contra a discriminação étnica, de maneira a possibilitar a ampliação da inclusão social no ensino superior (SOUSA, 2008, 2009).

    No que se refere ao exercício de alguma atividade acadêmica remunerada por parte dos discentes respondentes do curso, apenas um encontrava-se na modalidade e no regime da Consolidação das Leis de Trabalho. Não exerciam nenhuma atividade acadêmica remunerada 165 dos respondentes, e 45 deles exerciam atividade de estágio. A respeito da atividade de estágio, esta ocorria em razão do curso ter o Estágio Curricular não Obrigatório, conforme exigido em seu Projeto Pedagógico. Assim, o estágio não obrigatório possibilitava ao discente incluir a experimentação profissional em seu percurso formativo a partir de seu ingresso no curso. O acesso a esse estágio se dava em razão de a Instituição possuir convênios firmados com, por exemplo, o Instituto Euvaldo Lodi, o Centro de Integração Empresa Escola, o Núcleo Brasileiro de Estágios, o Instituto Promover, o Instituto Blaise Pascal, o Portal de Estágio e Emprego, o Instituto Nova Vida – Formação e Gestão, o Universia Brasil S.A. e várias empresas de diversos segmentos (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2015).

    Quem sou e como estou?

    Somos portadores da cultura na sua universalidade humana e nas suas características singulares. Somos os criadores e as criaturas da esfera do espírito e da consciência. Somos os criadores e as criaturas dos reinos do mito, da razão, da técnica, da magia. (MORIN, 2012, p. 50).

    Buscou-se, neste eixo, apresentar um perfil em relação ao gênero, faixa etária, étnico-racial, estado civil, quantidade de filhos e condição de moradia dos discentes respondentes do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás.

    Em relação ao gênero, apenas um discente se declarou "Outro, manifestaram pertencer ao gênero feminino 106 discentes e, ao gênero masculino, 104 discentes. Mais da metade dos discentes respondentes, 111, encontravam-se na faixa etária de 19 a 22 anos. Entre 23 e 26 anos estavam 44 dos discentes e entre 27 e 30 anos havia 24 deles. Acima de 30 anos encontravam-se 19 e até 18 anos eram 13. No que se refere à identificação étnico-racial, mais da metade, 117, dos discentes se consideravam pardos, 69 se declararam brancos, 19 manifestaram ser negros, e seis se declararam amarelos.

    Quanto ao estado civil, 184 dos discentes eram solteiros e 18 encontravam-se casados. Cinco discentes estavam separados, desquitados ou divorciados e quatro eram viúvos. Por sua vez, em relação à quantidade de filhos, grande parte deles, 192, não tinham filhos. Os discentes que tinham um filho eram 13, e os que tinham dois filhos eram quatro discentes. Apenas dois discentes tinham três filhos e nenhum deles mais do que essa quantidade.

    Alguns desses atributos são similares ao perfil discente nacional. O perfil nacional dos discentes ingressantes em 2019 na graduação, na modalidade presencial, no sistema de ensino superior brasileiro, apontava para esses atributos com a seguinte predominância: quanto ao sexo – feminino; quanto ao grau acadêmico do curso a que se vincula – bacharelado; quanto à categoria administrativa da instituição a que está vinculado – instituição privada; quanto à organização acadêmica da instituição a que está vinculado – universidade; quanto à área de conhecimento do curso a que está vinculado – Negócios, Administração e Direito; quanto à cor/raça – branca; e, por fim, quanto ao tipo de escola em que concluiu o ensino médio – escola pública (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020).

    Quando os discentes do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás foram questionados sobre a situação atual em relação à moradia, mais da metade deles, 154, moravam em casa de familiares, e 27, com o cônjuge. Ademais, 23 moravam sozinhos, cinco em moradias coletivas, um morava em pensão, hotel ou pensionato, e um, em casa de amigos. É provável que o fato de discentes morarem sozinhos fosse em decorrência de serem oriundos de outras cidades goianas ou estados brasileiros, pois, ao serem questionados sobre a unidade federativa em que nasceram, os resultados demonstraram discentes oriundos de diversos Estados, com destaque para Bahia, Maranhão, Tocantins, Pará e São Paulo, dentre outros. Oito discentes eram do Tocantins, 12 da Bahia, 12 do Maranhão, três do Pará e três de São Paulo. Contudo, a maioria dos discentes respondentes, 147, isto é, 70% deles, eram do estado de Goiás.

    No que tange a esses aspectos, nota-se que, em relação ao gênero, há quase um equilíbrio entre o masculino e o feminino. Conclui-se, assim, que os discentes do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás, em sua maioria, eram jovens goianos entre 19 e 22 anos solteiros, pardos e que moravam com seus progenitores, além de frequentarem o curso no turno noturno.

    Mobilidade urbana

    Há, em todo comportamento humano, em toda atividade mental, em toda parcela de práxis, um componente genético, um componente cerebral, um componente mental, um componente subjetivo, um componente cultural, um componente social. (MORIN, 2012, p. 53).

    Outro fator que se tentou elucidar, relacionava-se à mobilidade desses discentes. Assim, procurou-se examinar quais eram as principais cidades goianas em que estes residiam, bem como a distância percorrida e o meio de transporte utilizado pelos discentes para se deslocarem até à Universidade. Quase a metade dos discentes do curso, 105, residia dentro de um raio de até 30 quilômetros da PUC Goiás, e maioria, 83, moravam à um raio de até 10 quilômetros. A residência de 18 discentes distava entre 31 e 50 quilômetros, e cinco deles residiam a mais de 51 quilômetros da Universidade. As cidades que mais apresentaram discentes no curso foram Goiânia, com 143, Aparecida de Goiânia, com 42, Senador Canedo, com 20, Trindade, com cinco, e Bela Vista de Goiás, com três.

    À semelhança do que se verificou em relação à unidade federativa em que os respondentes nasceram, tinha-se uma concentração dos discentes residentes na Região Metropolitana de Goiânia. De acordo com a Lei Complementar n. 139, de 22 de janeiro de 2018, a Região Metropolitana de Goiânia (RMG), popularmente conhecida como Grande Goiânia, tem ao seu redor 20 municípios, sendo Goiânia, Abadia de Goiás, Aparecida de Goiânia, Aragoiânia, Bela Vista de Goiás, Bonfinópolis, Brazabrantes, Caldazinha, Caturaí, Goianápolis, Goianira, Guapó, Hidrolândia, Inhumas, Nerópolis, Nova Veneza, Santo Antônio de Goiás, Santa Bárbara de Goiás, Senador Canedo, Teresópolis de Goiás e Trindade (GOIÁS, 2018; INSTITUTO MAURO BORGES, 2019).

    Para se deslocarem até a Universidade, os meios de transporte que os discentes mais utilizavam eram o transporte coletivo, usado por 97 dos discentes, e o transporte próprio, por 89 discentes. Havia também 15 dos discentes que iam de carona, a pé ou de bicicleta, e sete que utilizavam transportes locados ou escolares. Assim, constatou-se que eram poucos os discentes que residiam em outros municípios e utilizavam o transporte escolar, porém, mais da metade deles dependia do transporte coletivo para se deslocar até a Universidade.

    Condição econômica

    Homo consumans […] carregamos não somente um princípio de economia, mas também um princípio de dilapidação e de dissipação. O princípio da despesa e do dom parecem totalmente irracional ao homo economicus, mas é compreensível se, como veremos, vive-se não apenas para sobreviver, mas também par viver plenamente, o que se realiza a uma temperatura de autodestruição, ao mesmo tempo de regeneração. (MORIN, 2012, p. 129-130).

    Neste eixo, tratou-se do fato dos discentes exercerem ou não atividades remuneradas, bem como sobre a média de renda pessoal e familiar e sobre a possibilidade de serem favorecidos por algum auxílio financeiro. Em relação ao fato de os discentes do curso trabalharem ou não, 33 dos respondentes nunca exerceram atividade remunerada. Entre os que trabalhavam, 16 deles tinham carga horária de trabalho de 20 horas semanais, 53 trabalhavam mais de 20 horas e menos de 40 horas e 100 deles faziam 40 horas de trabalho. Do total dos discentes, nove afirmaram ter trabalhado eventualmente.

    Os discentes do curso de Ciências Contábeis que possuíam bolsas de estudos ou financiamentos para auxiliar a sua formação universitária e/ou custear as despesas do curso representavam 190 (90%) dos respondentes. Portanto, 23 dos discentes não tinham bolsa ou financiamento. Dos discentes bolsistas, 127 possuíam a Bolsa Social, obtida por meio de seu ingresso em Vestibular Social da PUC Goiás, e 16, a Bolsa Universitária, concedida pelo Governo de Goiás, por meio da Organização das Voluntárias de Goiás (OVG). Discentes do Programa Universidade para Todos (ProUni) integral eram 30, do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) eram três e cinco tinham Bolsa do Fundo Educacional para graduação, sendo eles funcionários da PUC Goiás e/ou seus dependentes. Chama a atenção o fato de que não houve, dentre os discentes questionados, algum com bolsa empresarial, bolsa municipal, bolsa monitoria, bolsa de incentivo à cultura e bolsa de iniciação científica. Assim sendo, constata-se que mais da metade dos discentes respondentes exercia atividade remunerada e tinha bolsa de estudo, computando, pois, em seu orçamento pessoal, esse subsídio financeiro para conseguir realizar o seu curso.

    Dentre os discentes indagados, 30 tinham ProUni Integral e três tinham o Fies, os quais, cumpre esclarecer, são programas do governo federal. Em decorrência da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, e com a meta do Plano Nacional de Educação, Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014, estabeleceu-se que a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% e a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos atingisse no mínimo 30% da faixa etária entre 18 e 24 anos. Assim, ter-se-ia, além da expansão de oferta de vagas, democratização, mobilidade social, ampliação de orçamento público, dentre outras. Foram criados mecanismos de subsídios no intuito de promover a democratização do acesso ao ensino superior por meio de ensino não gratuito, com ênfase ao financiamento público estudantil (BRASIL, 1996; BRASIL, 2014).

    Essa intensificação do financiamento estudantil se deu, primeiramente, com o Crédito Educativo (Creduc), criado em 1975, redefinido em 1992, suspenso em 1997 e extinto em 1999. O Creduc objetivava atender estudantes com vulnerabilidade socioeconômica no financiamento do primeiro curso de graduação em IES privadas. O segundo, o Fies, foi instituído pela Lei n. 10.260, de 12 de julho de 2001, o qual se destinava a propiciar, a estudantes economicamente desfavorecidos, condições de permanência e conclusão do ensino superior em IES privadas. O terceiro, o ProUni, instituído pela Lei n. 11.096, de 13 de janeiro de 2005, tinha como alvo os estudantes com renda familiar per capita inferior a três salários-mínimos e meio, bem como os professores do ensino básico da rede pública (BRASIL, 2001a, 2005). Salienta-se que essa estratégia por parte do governo federal também veio para garantir, dentre outros fatores, em momento de crise, a sustentabilidade financeira das IES da rede privada que, em troca da adesão ao ProUni, obtiveram isenção tributária.

    Nesse cenário, essa estratégia se configurava em uma via de mão dupla tanto para o governo quanto para as IES da rede privada, pois, com isso o governo resolveu, em parte, a questão de oferta de vagas no ensino público e ampliou o acesso ao ensino superior; a seu turno, as IES tiveram a oportunidade de ampliar a quantidade de alunos, garantir o recebimento de recursos financeiros dos programas de bolsa dos entes públicos e, ainda, obtiveram subsídios fiscais. Como a rede pública de ensino superior não suportaria o aumento da demanda, o governo necessitava, na ocasião, da expansão da oferta de vagas. Entretanto, diante de uma escassez de recursos para investir no sistema educacional superior público, então, optou-se por promover reformas que permitiram ao setor privado se expandir, atendendo parte da demanda por educação superior (BRZEZINSKI, 2008; SOUSA, 2008).

    As políticas federais de financiamento público para discentes de IES privadas passaram por fases de implementação, descontinuidades, avanços e retrocessos nas duas últimas décadas, com destaque para o ano de 2015, quando foi alterada e restringida a concessão do Fies a estudante que obtivesse, no mínimo, 450 pontos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou obtivesse nota zero na prova de redação. Em 2018, foi criado o Novo Fies, Lei n. 13.530, de 07 de dezembro de 2017, com novas alterações, apresentando-se dividido em duas submodalidades de financiamento. Assim, uma se dirigia à estudantes com renda familiar de até três salários-mínimos per capita, e, a outra, destinava-se à estudantes com renda familiar per capita de até cinco salários-mínimos (BRASIL, 2017d). Tais alterações e restrições provocaram uma redução substancial no número de matrículas nas IES no primeiro trimestre de 2015 e, por contingência, comprometeram o volume de receitas previsto pelas IES, que já experimentavam um impacto negativo no capital de giro devido ao contingenciamento, pelo Governo, dos recursos do Fies referentes às mensalidades do segundo semestre de 2014, que não foram repassados no prazo estabelecido.

    A respeito das consequências dessa restrição para as IES privadas, cita-se o estudo desenvolvido por Silva, Piscopo e Serra (2015), em que se analisaram as ações gerenciais tomadas por uma IES com cerca de 37% do total de alunos de graduação financiados pelo Fies em resposta a essa pressão institucional. Os autores constataram que as respostas da IES perante as novas regras em relação ao Fies foram para preservar a legitimidade da Instituição perante seu público externo, manter a proposição de valor a seus alunos e acionistas e defender sua posição competitiva no mercado.

    Como não poderia ser diferente, essa medida restritiva também impactou nos discentes, e houve uma redução no número de estudantes com o Fies de cerca de 1.400.000 para 571.852, entre os anos de 2015 e 2019. Nesse mesmo lapso temporal, cresceu vertiginosamente o quantitativo de estudantes com outras formas de financiamento/bolsa, na proporção de cerca de 900.000 para 1.831.591 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020).

    Outra investigação que tratou deste assunto foi a desenvolvida por Gerhardt (2021), que procedeu a uma análise do Fies e do ProUni, entre 1999 e 2018, em IES comunitárias. Os resultados evidenciaram que as universidades comunitárias computaram resultados negativos por conta dessas políticas públicas, em especial a partir de 2015, mas permaneceram nos Programas, embora cientes dos riscos de sustentabilidade financeira por conta de seu compromisso social.

    Assim, intui-se que houve ações, por parte das IES privadas, para ofertar ou ampliar programas de financiamentos institucionais para os discentes, como uma forma de garantir a permanência destes em seus cursos e, também, evitar evasão. Os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira referentes ao Censo da Educação Superior de 2019 mostravam 3.019.066 estudantes matriculados com algum tipo de financiamento/bolsa, assim distribuídos: 571.851, isto é, 18,9% com o financiamento Fies; 615.623, 20,4%, com o ProUni; e 1.831.591, 60,6%, com outras fontes de recursos. Nesse contexto, percebe-se que o governo federal era o maior financiador de estudos de estudantes na graduação (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020, 2021). Dessa forma, realça-se a importância de políticas mais efetivas de acesso à educação superior quando se analisa a estatística educacional do ensino superior e se constata que 21,4% da população, entre 18 e 24 anos, frequentam uma IES. Recordando que a meta do Plano Nacional de Educação de 2014 é atingir, no mínimo 30%, da faixa etária entre 18 e 24 anos, matriculados no ensino superior (BRASIL, 2014).

    A PUC Goiás apresentava política institucional de atendimento estudantil que visava promover o acolhimento, a permanência e o acompanhamento dos seus discentes ao considerar suas necessidades e singularidades no decorrer do processo de ensino-aprendizagem. Para aqueles que necessitavam de apoio financeiro, a Universidade contava com a adesão aos Programas Fies, ProUni e Bolsa Universitária. Desse modo, a PUC Goiás disponibilizava outros tipos de financiamento e bolsas aos seus discentes, bem como descontos em mensalidades, ao oferecer as seguintes possibilidades:

    Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior – Fies – programa do Ministério da Educação que financia 100% do valor das mensalidades na graduação – Parceria PUC Goiás/Pravaler – crédito universitário por meio do qual o aluno paga 50% da mensalidade depois de formado; Benefício Família – desconto concedido pela PUC Goiás a famílias que têm mais de um estudante de graduação matriculado na Instituição; Crédito Educativo da PUC Goiás – CEI/Fundaplub – crédito educativo concedido a acadêmicos que necessitam de apoio financeiro para realizar seus estudos; PODE PUC – Programa de Desenvolvimento Estudantil próprio da PUC Goiás que permite o parcelamento estendido das mensalidades em até 50% (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2018b, p. 80).

    Em relação às bolsas disponibilizadas pela Instituição aos discentes, apresentavam-se:

    Bolsa Social – criada em 2010, por meio do Vestibular Social, oferece 50% de descontos para graduandos com perfil socioeconômico pré-definido; Bolsa do Fundo Educacional – destinada aos acadêmicos da graduação, que são funcionários da PUC Goiás ou seus dependentes; Bolsa de Incentivo à Cultura – oferecida a acadêmicos que participam de atividades artísticas e culturais como: dança, teatro, música e arte visuais; Bolsa Monitoria – concedida aos acadêmicos monitores que, sob a orientação de professores, realizam trabalhos voltados para o ensino, integrados com a pesquisa e a extensão; Bolsa de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq – destinada a acadêmicos que participam de projetos de pesquisa, sob a orientação de professores; Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/Capes – concedida a acadêmicos no desenvolvimento de iniciação à docência no contexto escolar, sob a supervisão de um professor; Bolsa de Iniciação Científica Institucional – BIC/PUC Goiás – oferecida a acadêmicos que participam de projetos de pesquisa, sob a orientação de docentes; Bolsa de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovações – PIBIT/CNPq – oferecidas a acadêmicos que desenvolvem projetos nessa área, sob a orientação de professores; Bolsa Prouni – concedida a acadêmicos não portadores de diploma de curso superior, oriundos de escola pública, ou que estudaram em escola particular com bolsa integral; Bolsa Universitária – concedida pelo Governo de Goiás, por meio da Organização das Voluntárias de Goiás (OVG), levando em conta critérios socioeconômicos e desempenho acadêmico; Bolsa Empresarial – concedida por empresas mediante doações, que serão deduzidas no Imposto de Renda; Bolsa Prefeitura Municipal – concedida por prefeituras que disponham de legislação específica, para destinação de recursos para bolsas de estudo a alunos do município que estudam na PUC Goiás (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2017, p. 102-103).

    Mereceu destaque a Bolsa Social, que foi criada em 2010, que […] por meio do Vestibular Social, oferece 50% de descontos para graduandos com perfil socioeconômico pré-definido (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2017, p. 102). Inicialmente, o Programa Vestibular Social se destinou à revitalização dos cursos de Licenciatura ofertados pela Instituição. Face à grande demanda, o Programa incorporou cursos de Bacharelado, dentre os quais incluía-se o curso de Ciências Contábeis. Assim, gradativamente, a Universidade, ao […] responder a uma demanda pela revitalização dos cursos de Licenciatura, reafirmou e consolidou o compromisso social com ações que respondiam aos desafios do desenvolvimento social regional e local (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2017, p. 29). Conforme já mencionado, dos 211 discentes questionados, 60,2% possuíam Bolsa Social e cinco deles tinham bolsa do Fundo Educacional destinado à graduação de funcionários da PUC Goiás ou de seus dependentes diretos.

    No que se refere ao Programa Bolsa Universitária, dentre o total dos discentes questionados, 16 eram comtemplados com esse subsídio. A política educacional do Estado de Goiás promovia a democratização do acesso ao ensino superior gratuito e não gratuito. Nessa ótica, ganhou relevância o Programa Bolsa Universitária (PBU), instituído pelo Decreto n. 5.028, de 25 de março de 1999, modificado pela Lei n. 13.918, de 3 de outubro de 2001. O PBU propunha-se a dirimir questões presentes na realidade educacional do Estado, quais sejam: número reduzido de vagas nas IES públicas; vagas ociosas nas IES privadas e significativa demanda de estudantes que desejavam cursar o ensino superior e não dispunham de condições financeiras para arcar com os custos de um curso em IES privadas. Inserido na política educacional e social, o PBU buscava beneficiar estudantes universitários que apresentavam vulnerabilidades socioeconômicas, custeando total ou parcialmente a mensalidade destes em dezenas de IES credenciadas na Organização Voluntárias de Goiás (GOIÁS, 2001; SOUSA, 2007).

    É provável que os Programas ProUni, Fies e Bolsa Universitária, assim como os programas Institucionais implantados ao longo dos anos, tenham provocado alterações diversas no contexto institucional e social, uma vez que o quantitativo total de estudantes que usufruíam desses Programas representava uma parcela expressiva do total de alunos da Instituição, […] dos quais 26.814 na PUC Goiás, em 2015 (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2017, p. 28).

    É possível elucidar esse quantitativo com os dados do Relatório elaborado pela Comissão Própria de Avaliação da PUC Goiás, referente ao ano de 2018, a respeito da modalidade e da respectiva proporcionalidade de discentes por programas de bolsas e financiamentos (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2019, p. 161), conforme apresentado na Tabela 2.

    Tabela 2 – Quantidade de discentes por programas de financiamento e de bolsas na PUC Goiás, 2018

    Fonte: PUC Goiás (2019).

    Com a instabilidade econômica e financeira brasileira e do aumento da competitividade no ensino superior, em 2019, o quantitativo de discentes matriculados reduziu para cerca de 17.000 e, no final de 2020, a PUC Goiás contava com um total de 14.910 discentes, atendendo a 8.813 bolsistas, assim distribuídos: 1.914 discentes com ProUni; 1.292 com Fies; 4.643 com Bolsa Vestibular Social; dois, com bolsa de Incentivo à Cultura; 134, com CEI/Fundaplub Graduação; dois, com CEI/Fundaplub mestrado e doutorado; 1.308 bolsistas do Programa Bolsa Universitária (OVG); 2.012, Pode PUC; e 176 discentes com outras bolsas (monitoria, Sicatel, empresa, Pravaler) (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS, 2020a, 2021a, 2021b). Chama a atenção o quantitativo de estudantes na Instituição com bolsa ProUni integral, bolsa Programa Bolsa Universitária-OVG, bolsa com o Programa Bolsa Vestibular Social e financiamento Fies. Nesse caso, as fontes de financiamento e de bolsas estudantis presentes na PUC Goiás se congregavam aos programas das esferas federal, estadual e institucional.

    Em continuidade, buscou-se assinalar a situação da renda pessoal e da renda do grupo familiar dos discentes do curso. Nesse sentido, dos 211 discentes respondentes, 49,7% se encontravam na faixa de renda pessoal mensal de até um salário-mínimo e, 47% na faixa de um a três salários-mínimos. Somente seis dos discentes estavam na faixa salarial mensal entre quatro e seis salários-mínimos.

    Em relação à renda mensal de seu grupo familiar, 119 dos discentes declararam estar na faixa de até três salários-mínimos, 60 declaram ter renda familiar na faixa de três a cinco salários-mínimos e 21 deles afirmaram ter renda familiar de seis a 10 salários-mínimos. Apenas 11 dos discentes apresentavam renda familiar mensal acima de 10 salários-mínimos. Com essas rendas familiares mensais, há famílias com seis ou mais pessoas, como foi o caso de 11 dos discentes respondentes. Com cinco pessoas, foram 24 dos discentes; com quatro, 63 deles; com três, 52; com dois, 46 estudantes; e, com uma pessoa, 15 dos discentes. Portanto, mais de 46% dos discentes pertencia ao grupo familiar cuja renda não ultrapassa três salários-mínimos, o que, de acordo com o critério do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2021) – que traz uma classificação econômica da população, separando as famílias em grupos de acordo com a renda familiar –, os enquadra na classe D, cuja variação compreende de dois a quatro salários-mínimos.

    Desse modo, não é de se estranhar que mais de um terço dos discentes indagados no curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás apresentar uma participação expressiva na vida econômica do seu grupo familiar, ao se observar que 75 deles trabalhavam e contribuíam para o sustento da família. Em adição, deparou-se com a situação em que mais da metade das famílias dos discentes eram compostas por três ou quatro pessoas.

    Além disso, 13 dos discentes trabalhavam e eram o principal responsável pelo sustento da família. Discentes que trabalhavam e se sustentavam eram 38, enquanto 50 deles trabalhavam e recebiam ajuda da família. Havia, ainda, aqueles que não trabalhavam e cujos gastos eram financiados pela família, que correspondiam a 35 dos questionados. Percebe-se, assim, que a quantidade de discentes que contribuíam economicamente para com a família era superior à de discentes que recebiam ajuda do grupo familiar.

    Propriedades culturais

    A cultura é, no seu princípio, a fonte geradora/regeneradora da complexidade das sociedades humanas. Integra os indivíduos na complexidade social e condiciona o desenvolvimento da complexidade individual. (MORIN, 2012, p. 166)

    Edgar Morin defende que a educação do futuro deverá ser no ensino centrado na natureza humana e, assim, estabeleceu os três primeiros reinos a serem estudados que residem, primeiramente, no entendimento de que a […] importância da hominização é primordial à educação voltada para a condição humana, porque nos mostra como a animalidade e humanidade constituem, juntas, nossa condição humana (MORIN, 2011a, p. 46). Com a hominização, veio o desenvolvimento do cérebro humano que apresentou competências para agir, perceber, saber, aprender. Daí emergiu a mente com capacidade de consciência e de pensamento e, a partir disso, a cultura que completa a relação triádica cérebro/mente/cultura (MORIN, 2011a, p. 46-48).

    Desse modo, a cultura passa a ser o segundo reino ao qual a educação deve se dedicar ao direcionar-se para a natureza do ser humano. Morin (2012, p. 35) considera a cultura a segunda natureza da humanidade, e a define da seguinte maneira: […] é constituída pelo conjunto de hábitos, costumes, práticas, ideias, valores, mitos, que se perpetua de geração em geração, reproduz-se em cada indivíduo, gera e regenera a complexidade social.

    Os estudos sobre a cultura e as culturas se diversificam de autor para autor e encontram-se em contínua transformação. O conceito de cultura se alterou nas últimas décadas, seguindo o curso do progresso social. Conforme assinala Waquil (2017), foi no século XV que surgiu o primeiro conceito de cultura na literatura, o qual se referia a assuntos agrícolas, ao cultivo de uma determinada cultura, de forma que nos dias atuais é comum notar o radical na composição de algumas palavras, a exemplo de floricultura, avicultura, agricultura entre outras (BARROSO; BONETE; QUEIROZ, 2017; WAQUIL, 2017). De acordo com Ferreira (2010, p. 508), além desse significado, o vocábulo cultura também compreende […] o complexo dos padrões de comportamento, das crenças, das instituições e doutros valores espirituais e materiais transmitidos coletivamente e característicos de uma sociedade.

    Contudo, para Morin (2011, p. 38-47), a cultura emergiu do processo da hominização um vez que não foi dado ao conceito de homem apenas sob o princípio biofísico, mas também sob o princípio psicossociocultural. À medida que o homem se humanizou e o cérebro se desenvolveu, a cultura veio a existir. Desse modo, o homem, embora plenamente biológico, é também plenamente cultural, resultado do convívio social e que possibilita que as pessoas aprendam a se relacionar e a comunicar em sociedade. Morin (2011a, p. 49) assinala que as […] interações entre indivíduos produzem a sociedade, que testemunha o surgimento da cultura e que retroage sobre os indivíduos pela cultura. Nesse aspecto, […] a cultura acumula em si o que é conservado, transmitido, aprendido e comporta normas e princípios de aquisição (MORIN, 2011a, p. 47).

    Morin (2011a; 2012), assim como Baum (2019) e Barroso, Bonete e Queiroz (2017), esclarece que a cultura diferencia a espécie humana das outras, haja vista que, a começar dela, pode-se pautar a discriminação entre animal e homem, não com relação à educação, mas no sentido comum, transmitido e compartilhado por um grupo de pessoas. O ser humano é o único ser com competência para o acúmulo cultural, tanto pelos aspectos intricados da sua natureza, como pela quantidade dessa produção. Nessas circunstâncias, a cultura, em seu sentido antropológico, […] fornece conhecimentos, valores, símbolos que orientam e guiam as vidas humanas (MORIN, 2021, p. 48). Sob esses aspectos, a cultura é a conduta memorizada que é repartida pelos integrantes de um grupo, baseia-se de modo operante, vez verbal, vez não verbal, passada de geração para geração. Faz parte da cultura de um grupo social a música, a dança, a atividades de teatro, a língua falada, a escrita, os pensamentos, os rituais religiosos, entre outros (BAUM, 2019; BARROSO; BONETE; QUEIROZ, 2017; SCOPEL; CARVALHO; OLIVO, 2019).

    Na ocasião em que duas sociedades com culturas distintas se encontram, é incomum que uma desapareça por completo. Normalmente, origina-se uma nova, envolvendo elementos de ambas mediante o processo de mesclagem e hibridez. Isso ocorre porque os hábitos de cada cultura disputam, reciprocamente, por consentimento (BAUM, 2019). Sob esse aspecto, Morin (2011a, p. 51), ao discorrer sobre a diversidade cultural e a pluralidade de indivíduos, assinala que a cultura […] mantém a identidade humana naquilo que tem de específico; as culturas mantém as identidades sociais naquilo que têm de específico. Morin (2012, p. 64) enfatiza que a cultura constitui a herança social do ser humano, enquanto as culturas alimentam identidades individuais e sociais.

    Segundo Morin, por mais plurais e diversificadas que sejam as culturas, essas comportam em si os mesmos fundamentos, quando se apresenta a definição de cultura como o "[…] conjunto de hábitos, costumes, práticas, savoir-faire, saberes, regras, normas, interdições, estratégias, crenças, ideias, valores, mitos e ritos, que se perpetuam de geração em geração, reproduz-se em cada indivíduo, gera e regenera a complexidade social" (MORIN, 2012, p. 61). Assim, o vínculo entre a cultura e as culturas se estabelece na medida em que a cultura só existe nas culturas e, dessa forma, também se constitui o vínculo existente entre a unidade e a diversidade cultural.

    Entretanto, ao mesmo tempo em que a cultura favorece o conhecimento, também o desfavorece. A cultura é protegida, mas também é dilapidada; é mantida, mas também é extinta ou destruída. É em meio a esse antagonismo que a cultura […] é o que permite aprender e conhecer, mas também é o que impede de aprender e de conhecer fora dos seus imperativos e das suas normas (MORIN, 2012, p. 36).

    De acordo com Morin (2011a, p. 49), […] é a cultura e a sociedade que garantem a realização dos individuais, e são as interações entre indivíduos que permitem a perpetuação da cultura e a auto-organização da sociedade. E é em meio as essas considerações e conceitos que Morin advoga sobre a necessidade da educação se voltar para os conhecimentos da condição humana, pois, o humano com sua dupla natureza, biológica e cultural, carrega em si o paradoxo da unidade múltipla. Logo, a educação deve trabalhar a identidade singular e múltipla do humano na medida em que […] temos todos uma identidade genética, cerebral, afetiva comum em nossas diversidades individuais, culturais e sociais (MORIN, 2011a, p. 66).

    Sob esse contexto, realizou-se o levantamento de dados de algumas questões voltadas aos aspectos culturais dos discentes do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás. Foram indagados sobre quais fontes de informações utilizavam para se atualizar, sobre os tipos de informação que mais lhes interessavam, sobre qual estilo de literatura tinham preferência, sobre o hábito de leitura, sobre sua participação em atividades extraclasse e sobre o domínio de línguas estrangeiras e computação.

    Ao investigar sobre qual a principal fonte de informação a qual os discentes recorriam para se manterem informados sobre a atualidade, disponibilizou-se oito opções, dentre as quais os discentes puderam assinalar até cinco. De acordo com os resultados, 208 declararam que utilizavam como fontes de informação de acontecimentos atuais, principalmente, a internet; 141 deles, as mídias sociais; 85, o telejornal, e 61 dos discentes utilizavam outros programas televisivos. Sublinha-se que as fontes de informações menos utilizadas pelos discentes compreendiam o jornal impresso, as revistas e o rádio, na proporção de 24, 29 e 42, respectivamente.

    Em conformidade com o exposto na Tabela 3, ao serem questionados sobre quais assuntos mais lhes interessava assistir, ouvir ou ler a respeito, 118 discentes declararam que, somados muita frequência e frequentemente, informavam-se sobre notícias locais e/ou nacionais, e 116, sobre economia e negócios. Na opção ocasionalmente, 83 deles opinaram que se informavam sobre informática, e 81 deles, sobre notícias internacionais. Somando-se raramente e nunca, 87 se informavam sobre assuntos relacionados a esportes, e 84 se interessavam por assuntos relacionados a veículos. As médias não apresentaram grandes variações entre os tipos de informações, com ressalva para veículos e esportes, embora no caso desses dois tipos tenha havido uma pequena dispersão quanto às respostas dos discentes.

    Tabela 3 – Frequência de interesse por tipos de informações dos discentes do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás, 2019

    Fonte: elaboração da autora com dados da pesquisa, adaptado de Andifes (2019).

    Em relação ao hábito de leitura, questionou-se aos discentes qual a média de livros que liam no decorrer do período de um ano. Interessante observar que mais de um quarto, 55 dos discentes declarou não ler nenhum livro. Em contrapartida, 84 responderam ler até dois livros ao ano, e 61 deles leram entre três e cinco nesse mesmo período. Dentre os 156 discentes que apresentavam hábitos de leituras, 88 liam obras literárias de ficção, 58 livros técnicos e 26 livros de autoajuda.

    Ao serem indagados sobre utilizar a biblioteca da Universidade, 100 dos discentes respondentes declararam utilizá-la frequentemente para estudos relacionados ao curso, e 7 deles, para atividades de lazer e cultura. Destaca-se que, somando-se nunca e raramente, 104 deles não se valiam dos serviços ofertados pela biblioteca de sua Instituição.

    Foi questionado também aos discentes sobre o domínio que apresentavam de línguas estrangeiras e do uso do microcomputador. Apenas 24 declararam possuir domínio muito bom/excelente da língua inglesa. Com domínio bom, 34 deles destacavam-se em espanhol e 30 destacavam-se em inglês. Com domínio razoável/ruim, eram 207 dos discentes em relação ao francês e 205 em relação ao alemão. Já no que se refere ao uso do microcomputador, 63 dos discente afirmaram possuir muita experiência, 88 possuíam experiência, 52 tinham alguma noção e oito não apresentavam domínio em microcomputador.

    Além desses aspectos culturais de concepção mais individual, buscou-se também o levantamento de alguns aspectos culturais coletivos aos quais os discentes do curso poderiam estar experienciando, como apresentado na Tabela 4, que se segue. As atividades extraclasse apresentaram médias abaixo de 2,0, com exceção de movimentos religiosos, que foi a atividade social mais praticada pelos discentes, e as ocorrências de desvio padrão foram baixas.

    Tabela 4 – Frequência com que os discentes do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás participam de atividades extraclasse, 2019

    Fonte: elaboração da autora com dados da pesquisa, adaptado de Andifes (2019).

    Os dados expostos na Tabela 4 apontam que as atividades extraclasse não se configuravam enquanto atividades prioritárias para os discentes respondentes. Eram poucos os discentes que praticavam, somados muita frequência e frequentemente, atividades extraclasse, com destaque para movimentos religiosos, com 32 discentes, e movimentos sociais, com 27. Ocasionalmente, destacaram-se as atividades relacionadas a movimentos religiosos, com participação de 45 dos discentes; movimentos sociais, com 38 participantes; 37 participaram de movimentos artísticos/culturais; 37, de movimentos ecológicos; e os movimentos sociais tiveram participação de 38 discentes. Somados nunca e raramente, 177 deles não participavam de programas institucionais de bolsas de iniciação científica, assim como 172 não participavam de empresa júnior, 79 não participavam de políticas partidárias e 168 deles também não participavam de movimento estudantil.

    Diante disso, os aspectos culturais de natureza mais individual com os quais os discentes do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás se conectavam, de acordo com a frequências das respostas, poderiam ser considerados de nível cultural intermediário ou baixo. A situação se apresentava mais frágil quando esses aspectos culturais geralmente se consolidavam em experiências em que o fator relacional entre indivíduos é mais comum. Os discentes opinaram que raramente participavam de ações interventoras na localidade em que viviam. Tais resultados sinalizam para uma tendência de enfraquecimento da natureza sociocultural nos discentes. A título de ilustração, tem-se uma reportagem, baseada em dados do relatório do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em que se mostrou as desigualdades de acesso à cultura no país e cita como exemplo: 44% dos pretos e pardos vivem em cidades sem cinemas, contra 34% da população branca; 37% em cidades sem museus contra 25% dos brancos (JORNAL NACIONAL, 2019).

    É necessário investigar se tal resultado é decorrente da falta de acesso à cultura, em que pese a segregação social em virtude do distanciamento cultural, sobretudo, por fatores econômicos. Ou se é consequência da carência de políticas públicas que buscam preservar a cultura geral, tanto individual como coletiva, quer seja local, nacional ou internacional. Ou se é resultado de instituições educacionais que exercem o ensino em condições precárias, por falta de investimento público na área educacional. Ou se é o enfraquecimento do determinismo cultural, o surgimento de brechas ou rupturas para que possa haver a regeneração a qual Morin se remete. Enfim, inúmeros são os obstáculos em relação à cultura que precisam ser investigados e dirimidos tal a sua relevância na natureza do ser humano, pois, como afirma Morin (2011a, 2021, 2012) a cultura aprisiona, mas somente através dela é que o indivíduo pode se libertar e se autonomizar.

    Condicionantes da decisão dos discentes

    Trazemos, dentro de nós, o mundo físico, o mundo químico, o mundo vivo, e, ao mesmo tempo, deles estamos separados por nosso pensamento, nossa consciência, nossa cultura. Assim, Cosmologia, ciências da Terra, Biologia, Ecologia, permitem situar a dupla condição humana: natural e metanatural. Conhecer o humano não é separá-lo do Universo, mas situá-lo nele (MORIN, 2021, p. 37).

    Em continuidade, nesta seção, apresentou-se algumas elucidações sobre a opinião dos discentes acerca de suas aspirações educacionais, suas motivações e suas perspectivas profissionais. Os resultados assinalaram indícios da percepção dos discentes sobre a educação, sobre a escolha profissional, sobre estratégias e expectativas de aprendizagem e seus aspectos cognitivos, assim como sua motivação ou expectativa profissional. Desse modo, o questionário foi consolidado para responder às questões que orientavam o eixo de investigação sobre os discentes do curso de Ciências Contábeis da PUC Goiás, quais sejam: que relação esses discentes estabelecem com a educação e sua aprendizagem? Quais são seus projetos escolares e profissionais para o futuro?

    A primeira parte, portanto, foi composta por duas questões, com o intuito de identificar a opinião dos discentes sobre a educação e sobre os fatores que os motivaram a realizar o curso de Ciências Contábeis. A segunda parte objetivou diagnosticar a expectativa profissional desses discentes através de duas questões, enquanto a terceira parte foi composta por três

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