Culatra, uma ilha com gente dentro
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Sobre este e-book
Ana Cristina Leonardo
Ana Cristina Leonardo estudou Filosofia. Há muita ligada à edição e jornalismo, trabalhou na Assírio & Alvim e em diversos jornais e revistas. Mantém actualmente uma crónica no Expresso. Publicou em 2008 o livro infantil, ilustrado por Álvaro Rosendo, «Joaninha, a Menina que não Queria Ser Gente» e, em 2018, o romance «O Centro do Mundo». Tem três filhas e dois netos e vive no Algarve com dois cães.
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Culatra, uma ilha com gente dentro - Ana Cristina Leonardo
Culatra. Uma ilha com gente dentro
O mundo está cada vez mais indiferenciado, mas na ilha da Culatra, ponto habitado mais a sul de Portugal continental, há uma comunidade piscatória que resiste. Humor. Irreverência. Jogo de cintura. Desafio à autoridade. Instinto de sobrevivência. Solidariedade à prova de canhão. Não é sem consequências que se reúnem estas características numa mesma comunidade.
De território quase desconhecido à pressão turística, de ilha votada ao abandono a berço de projecto ecológico selecionado pela União Europeia, a Culatra, uma das ilhas-barreira algarvias da Reserva da Ria Formosa, tem vivido transformações significativas e profundas nos últimos anos.
Este livro pretende ser um retrato desta ilha, da sua história, das pessoas que a habitam hoje e da sua relação com a Natureza de que, aliás, dependem. Este é um retrato raro do espírito de um lugar, entre a autenticidade e o progresso.
Ana Cristina Leonardo
(Olhão: 1959). Estudou Filosofia. Há muita ligada à edição e jornalismo, trabalhou na Assírio & Alvim e em diversos jornais e revistas. Mantém actualmente uma crónica no Expresso. Publicou em 2008 o livro infantil, ilustrado por Álvaro Rosendo, «Joaninha, a Menina que não Queria Ser Gente» e, em 2018, o romance «O Centro do Mundo». Tem três filhas e dois netos e vive no Algarve com dois cães.
Retratos*
* A colecção Retratos da Fundação traz aos leitores um olhar próximo sobre a realidade do país. Portugal contado e vivido, narrado por quem o viu — e vê — de perto.
Culatra
Uma ilha com gente dentro
Ana Cristina Leonardo
logo.jpglogo.jpgLargo Monterroio Mascarenhas, n.º 1, 7.º piso
1099-081 Lisboa,
Portugal
Correio electrónico: ffms@ffms.pt
Telefone: 210 015 800
Título: Culatra, Uma Ilha com Gente dentro
Autora: Ana Cristina Leonardo
Director de publicações: António Araújo
Revisão de texto: Inês Hugon
Validação de conteúdos e suportes digitais: Regateles Consultoria Lda
Design: Inês Sena
Paginação: Guidesign
Fotografia da capa: Adriano Miranda/Público
Fotografias: Luís Torres
© Fundação Francisco Manuel dos Santos e Ana Cristina Leonardo, Agosto de 2020
Livro redigido com o Acordo Ortográfico de 1945.
As opiniões expressas nesta edição são da exclusiva responsabilidade da autora e não vinculam a Fundação Francisco Manuel dos Santos.
A autorização para reprodução total ou parcial dos conteúdos desta obra deve ser solicitada à autora e ao editor.
Edição eBook: Guidesign
ISBN 978-989-9004-64-1
Conheça todos os projectos da Fundação em www.ffms.pt
Preâmbulo
De Arzila à Ilha dos Cães segundo Rodrigues
No princípio era a geografia
Terão os pobres direito ao paraíso na Terra?
O espírito do lugar
Falemos de casas, do sagaz exercício de um poder
Ah, a ecologia!
Agradecimentos
«Há cerca de 2500 anos, os cidadãos de Cartago, descendentes dos Fenícios, construíram um porto ao longo do litoral do Golfo de Tunes, no Norte de África. Esse porto, de onde Aníbal largou para atacar Roma, ainda hoje é utilizado por pequenos barcos de pesca árabes.
Algumas centenas de anos depois, e a cerca de 20 milhas de distância, os Romanos, um povo mais poderoso, construíram o porto de Útica. O Norte de África era então o celeiro do Império Romano e, nas docas de Útica, circulavam enormes quantidades de alimentos e riquezas com destino a Roma. Hoje, um turista de pé no topo da mais alta coluna das ruínas de Útica já não consegue ver o mar. A linha de costa deslocou-se 17 quilómetros para o largo, longe do que foi o porto.
Os Cartagineses desenhavam as suas estruturas de modo a serem compatíveis com a Natureza. Os Romanos, primeiros adeptos da tecnologia bruta, optaram pelo confronto, alteração e destruição da Natureza. O que os Romanos não compreenderam é que, a longo prazo, no litoral, a Natureza acaba sempre por vencer.»
— Orrin H. Pilkey et al., The North Carolina Shore and Its Barrier Islands: Restless ribbons of sand, Durham, Duke University Press Books, 1998
Preâmbulo
Latitude: 36° 59’ 9.22" N. Longitude: 7° 50’ 36.94" W. Aqui vive gente.
Era então 1522 e na ilha tomaram degredo as mais de 500 mulheres e crianças embarcadas em Arzila, tendo-lhes a peste que grassava na praça-forte decidido a fuga de Marrocos para o porto de Tavira.
A tal soma de foragidos se havia de subtrair Dona Isabel Henriques, mulher de Dom João Coutinho, 2.º conde do Redondo, por duas vezes capitão de Arzila e homem a quem muito se viu gabada a humanidade e sensatez. O degredo da condessa e dos filhos seria passado em recolhimento na povoação piscatória de Santo António de Arenilha, situada a sul da actual cidade de Vila Real de Santo António, desaparecida aquela outra, entre os finais do século XVI e início do século XVII, por acção das águas que a foram paulatinamente engolindo, e da pirataria, que afugentava os locais, espanhóis vindos de Aiamonte, do outro lado do Guadiana, em grande e significativo número — o mais provável, presume-se, visto até o prelado de Arenilha ser espanhol.
A condessa — mulher de espírito, de quem se conta haver trocado cortesias com Mulei Abrahem,