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E-book312 páginas5 horas

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Sobre este e-book

Depois do fim do seu relacionamento, a personagem tenta se reconhecer por meio de uma lista de coisas que sempre quis fazer, mas nunca teve tempo, coragem ou dinheiro o suficiente para enfrentá-las. A transformação da personagem é vista em cada traço de suas conquistas, em cada risco de meta cumprida. Depois da última, tanto o leitor passa a compreendê-la, como também ela mesma.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento14 de mai. de 2021
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    Sobre Ele - Adri Cardoso

    Para minha mãe a qual eu devo toda a minha vida.

    E me deu coragem para dar este enorme passo.

    Eu te amo!

    Capítulo 1:

    Talvez houvesse alguma força superior que gostasse de rir da minha desgraça. Terceiro relacionamento, terceiro término por mensagem.

    Eu não sabia e bem provável que nunca saiba qual o problema desses caras que não tem coragem de falar as coisas na minha frente. Um encontro face a face. Era medo das minhas lágrimas? Era medo de continuar apenas porque eu estou ali tremendo de dor? Não sei dizer.

    - Tu sabes que eu estou fazendo isso apenas por você, não é? – disse para Carol.

    - Eu sei, e eu te amo muito mais por isso. – Ela sorriu.

    Eu poderia ficar em pé por alguns minutos, depois me dividir em momentos sentada e outros em pé, poderia falar um discurso para todos e dançar... por ela. Eu queria os meus óculos escuros aviador Ray Ban do Paraguai, mas eles tinham sido confiscados no início do dia de hoje. Alguém me disse que a maquiagem é a prova d’água, caso eu fique mais confortável deveria apenas não passar a mão no olho e tirar os cílios postiços do lugar.

    A mulher que aparecia no espelho não era eu, meu reflexo bonito não condizia com o que eu estava sentindo. Eu queria o meu quarto, eu queria o meu travesseiro e ver filmes românticos que me detonassem ainda mais, pelo menos eu sentiria algo, eu não aguentava mais o vazio que entrava quando precisava falar ou ser vista com alguém. Ninguém respeita a minha dor, ninguém me deixa sofrer.

    Carol estava numa fase modinha, então meu vestido azul escuro bordado na parte de cima e frisado na parte de baixo até os meus pés combinava com a camisa do meu acompanhante que tinha o desenho do símbolo do super homem por trás do terno. Ela me disse que este

    era o seu primo mais bonito, mas ele não tinha olhos castanhos quentes, nem era alto o suficiente. E era loiro. LOIRO. Eu não aguentaria olhar para seus cachos modelados por mais de alguns minutos, eu precisava e queria aqueles lisos escuros.

    O primo dela me chamou e nós fomos para a fila, eu sorria, mas eu sabia que era mentira, todo mundo sabia que era mentira. Mesmo assim ninguém se importa. Nem queria que se importassem, é claro, eu não queria desviar o foco para o meu sofrimento neste dia festivo.

    Carol está sendo a primeira do nosso grupo de sete meninas a se casar. Meu par, meu verdadeiro par, não está aqui hoje, e apenas uma carcaça de mim.

    Eu queria dizer ao primo dela que ele me deixasse cair, mas não podia. Seguimos com a música escolhida – que eu não ouvi – até o altar, nós éramos os últimos, porque afinal eu era a melhor amiga.

    Era meu o discurso que diria todas as coisas sujas e imprudentes que fizemos e terminaria no mais sincero desejo de felicidade e amor.

    Eu soube o que é o amor uma vez, algumas vezes na verdade, algumas repetidas e repetidas vezes, só que talvez eu tenha esquecido como é.

    Marcos parecia feliz, eu podia dizer. Ele não olhava para outro lugar, ele estava inquieto, sua nuca parecia brilhar por causa do suor. Eu conseguia ler os seus pensamentos caminhe mais rápido, Carol. E

    ela seguia lentamente pela nave na igreja como se não fosse se casar com o homem por quem era completamente apaixonada desde os dezesseis. Dez anos depois estávamos aqui. Demorou, eu diria.

    A cerimônia foi lenta. Extremamente lenta. Absurdamente lenta.

    Tempestuosamente lenta. Alguém disse para Carol que ficaria mais bonito se as madrinhas e os padrinhos não tivessem cadeiras no altar e ficassem o tempo inteiro em pé. Eu estava sofrendo com os meus saltos extravagantemente altos, me apoiava no meu par loiro para

    não sucumbir ao desejo de tirá-los e jogar para o alto, de arremessar o vestido o mais longe que eu pudesse e deitar em posição fetal até que o mundo ao meu redor sucumbisse num apocalipse zumbi. O

    braço do loiro pareceu mais firme, talvez ele sentisse o que eu realmente queria fazer. Meu eu dramático estava à flor da pele. Eu não conseguia parar.

    Quando o padre perguntou à Carol se ela aceitava se casar com Marcos, eu quis chorar por ela. Pela primeira vez uma lágrima minha não teria um motivo que fosse o meu sentimento, eu quis chorar por ela, por todas as vezes que fizemos uma festa do pijama e ela contava tudo o que sentia. Quis chorar por ela, por lembrar da primeira vez em que beijou o Marcos e saiu correndo dele assustada. Quis chorar por ela, por causa da insistência dele em descobrirem juntos a dimensão do que sentiam. Quis chorar por ela, porque ele ficou, mesmo que ela fosse louca.

    Ele aceitou muito mais rápido do que ela, como se mais um segundo não casado fosse destruir todo o seu mundo. Talvez fosse, tive a impressão de ler um finalmente dos seus lábios antes de beijá-la como se não houvesse ninguém olhando. Finalmente casados. Eu apertei o braço do meu par, ainda que não fosse aquele braço que eu queria aqui, agora, foi o que tive para suprir o meu grito. Finalmente, querida! E talvez, durante muito tempo, eu estivesse mais feliz do que triste.

    Alguém me deu um saco de arroz e fiquei esperando numa fila até os noivos passarem. O carro que os levaria até a recepção já estava na entrada, minha carona já estava a postos, faltavam apenas os noivos, agora marido e mulher. E eles demoraram eras. Alguém comentou num grito sobre não ser hora para uma rapidinha e nem lugar, mas eu sabia mais do que isso. Carol estava grávida de algumas semanas e ela disse que contaria ali, naquele momento.

    Eles apareceram e Marcos estava com os olhos vermelhos, Carol estava com o batom borrado e os olhos brilhavam. Eles seriam felizes, eu sentia.

    Antes de irmos para a festa, as madrinhas e padrinhos junto com os recém casados, tivemos que parar e tirar as fotos tradicionais num parque. Eu fiquei ao lado direito da Carol, os meninos subiram um degrau na estrutura preparada e nós – mulheres – abrimos os seus ternos revelando as camisas com os símbolos dos super-heróis. Carol e Marcos eram o capitão américa.

    Eu não chorei por pouco. Não era o mesmo peitoral que tanto eu tinha aberto camisas, que tanto ensaiamos sozinhos no quarto e rimos da ideia idiota. Que concordamos em não fazer algo tão brega quando fosse o nosso. Quando, não e se. E de um dia para o outro virou nunca.

    - Sorriam. – Eu fingi.

    Estouraram vários confetes quando os noivos chegaram, o cerimonialista apresentou pela primeira vez o Senhor e a Senhora Silveira. Meu discurso estava embaixo do prato, eu batia tantas palmas que minhas mãos estavam vermelhas. Eu queria gritar, mas não sentia forças para isso. Eu desaprendi a falar alto.

    Eu estava sentada ao lado da mãe de Carol, nossa mesa enorme quadrada estava quase ao centro de todo o salão. Alguns olhares passavam dos noivos até mim, eu sentia, mas não deixei de olhar nenhum segundo para os olhos felizes de Carol, de admirar o seu vestido estilo princesa maravilhoso. Eu estava aguentando até agora, conseguiria aguentar mais algumas horas. Por ela, eu disse, tudo por ela.

    Eu já tinha passado pela fase de postar as fotos mais bonitas que tinha, já me arrumei para ficar em casa e fazer com que ele achasse que eu estava curtindo. Já postei cervejas, uísques, vodcas, runs, não

    como se estivesse sofrendo, mas me divertindo. Já postei fotos com tantos rapazes desconhecidos só para ele pensar que eu tinha superado. Eu tentei esquecer quando na verdade qualquer coisa fazia lembrar. Eu não sabia mais lidar com a solidão, com o frio de meia cama vazia.

    Quando eles sentaram, antes de liberarem o buffet e os garçons servirem os convidados, o melhor amigo do Marcos se levantou e bateu com um garfo no seu copo de champanhe.

    - Eu sei que todos estavam esperando por isso, é a melhor parte do casamento. – Ele riu e as pessoas riram junto por serem educadas, não foi engraçado. – Então, vamos começar.

    Claro que ele disse sobre todas as mulheres que ele fez o seu amigo beijar antes de conhecer Carol e as que ele beijou quando passaram algum tempo separados. Talvez o intuito daquelas palavras fosse

    cuide dele, porque muita gente o quer ou então não se preocupe, ele tem bastante experiência, como se dez anos de relacionamento, contando com o tempo quando tinham terminado, não fosse experiência o suficiente.

    A irmã do Marcos falou também, como ela se sentia feliz pelos dois e desejava do fundo do seu coração os votos de mais pura felicidade.

    Eu nunca gostei muito dela, mas talvez ela realmente estivesse tentando ser agora uma boa pessoa. E então foi minha vez.

    - Boa noite. – Eu disse primeiro, algumas pessoas responderam de volta. Eu estava nervosa, eu sabia. Tinha treinado por dias quando fiquei sabendo que teria que falar. O que seria meu verdadeiro par sempre era meu editor, e não eram os ombros dele que eu usava para me apoiar. – Eu conheço a Carol desde a quarta série, quando ela esbarrou em mim na hora do recreio, eu caí e sujei toda a minha calça. Naquele dia eu perdi meu jeans favorito, mas ganhei uma melhor amiga. Minha mãe nem sempre acha que foi uma boa

    escolha. – Eu ri, e as pessoas riram por educação comigo. Eu apontei para minha mãe numa mesa próxima e ela sorriu mandando um beijo para Carol. – Nós passamos por muitas coisas durante todos estes anos de amizade, no nosso primeiro cachorro resgatado nós tínhamos doze anos, ela chorou para o cara da veterinária que não tínhamos dinheiro para as vacinas, mas queríamos salvar o bichinho.

    Ela salvou.

    - Ele se chamava Bob. – Os olhos dela já estavam marejados. Dei uma respirada funda, fechei os olhos e continuei quando os abri.

    - Nós fizemos um pacto de amizade aos quatorze anos e brigamos segundos depois. Eu imaginei que ela sairia da minha vida, porque éramos completamente diferentes. Contudo, ela me abraçou ao invés de se afastar, ela cruzou a ponte que eu tinha montado e as nossas diferenças foram o que nos mantiveram unidas até hoje.

    Parafraseando a série favorita dela, ela é a minha pessoa. Sempre foi.

    Eu estou absurdamente feliz por estar aqui hoje, poder dizer a vocês que eu vi neles o amor mais puro que existe. Eu os vi ficarem juntos, brigarem, se acertarem, brigarem de novo, sofrerem com a falta um do outro e então voltarem porque não há nada além no mundo que os faça tão feliz quando estarem juntos. Eu não teria deixado este casamento acontecer se eu não tivesse a certeza que o Marcos a ama com tudo o que ele tem, como eu não deixaria que ela aceitasse o pedido sabendo que não seria para sempre. A vocês, meus queridos,

    - apontei então a minha taça de champanhe ao casal - eu desejo a reciprocidade do sentimento, calma para resolver os conflitos e o amor mais genuíno que haja no mundo. Felicidades. – Ergui minha taça agora aos convidados e as pessoas se levantaram para aplaudir de pé. Carol veio me abraçar e secamos as nossas lágrimas. Eu estava com medo de que este novo status de relacionamento dela a afastasse de mim, mas participar de toda a organização do casamento nos deixou ainda mais próximas. Ainda teríamos as nossas noites do pijama, nossas saídas para beber juntas e ir ao cinema,

    nossas compras, nossos compromissos sociais em que ela sempre me metia e eu fingia odiar.

    - Para sempre. – Ela sussurrou.

    - Até o fim.

    Marcos me abraçou também, nada mudaria, eu tinha certeza. Ele secou uma lágrima do canto do meu olho com o dedão enquanto segurava o meu rosto. A expressão dele dizia que sentia muito e olhou rapidamente ao meu par. Não era para este ser loiro estar aqui, eu não queria mais ninguém, mas alguém disse que eu não poderia ser madrinha sozinha. Acho que Marcos entendia, mas a diferença é que ele ficou no fim com o amor da sua vida mesmo depois de um tempo separados.

    Finalmente me sentei, terminei a minha taça de champanhe e um garçom me serviu rapidamente de novo. Eu não queria ficar bêbada, apenas parar de sentir. Apenas por uma noite eu não queria me sentir estufada, desconfortável, infeliz. Eu queria ficar bem, porque eu sabia que ele estava bem, não queria ser a única sofrendo. Então, eu fingi. Continuei.

    Nada no casamento era mais tradicional do que a valsa dos noivos.

    Carol queria mudar, fazer umas dancinhas bonitinhas assim como ela via em vídeos da internet, mas Marcos foi categórico, se meteu apenas nesta parte: a primeira dança seria dele com ela agarradinhos enquanto se balançavam lentamente. Depois se ela quisesse rebolar até o chão, ter outro vestido, o que fosse, ele não se opunha.

    Depois de comer e tirar as fotos com todos os cem convidados, Marcos levou Carol até o meio da pista de dança. Todo o salão ficou escuro e um foco de luz surgiu iluminando apenas eles dois. O leve som do piano foi subindo e uma música clássica que os dois gostavam estava aparecendo. Marcos deu o primeiro passo e foi imitado por Carol, era como se o movimento de um fosse o reflexo do outro. O

    feixe de luz os seguiu sem perder nem um só passo. A música foi ficando mais firme, mais forte, o agudo parecia em declínio enquanto o grave tomava lugar. Os passos também foram ficando mais fortes, eles rodopiavam muito mais, os sorrisos não saíam dos seus lábios, mas os olhos pareciam em desafio. Para um espectador comum era apenas mais uma dança, para quem os conhecia sabia que era uma preliminar. Marcos segurou Carol pela cintura e ela desceu como se fosse uma pluma, tão leve quanto o ar. Quando subiu eles se beijaram e uma música eletrônica substituiu o piano. Era hora de ser alegre.

    As outras madrinhas se levantaram e eu as segui, as mais animadas gritavam e pulavam, puxavam as pessoas das mesas por onde passávamos. Vamos celebrar, vamos comemorar porque mais um casal se rendeu ao amor eterno e ainda poderíamos acreditar que isto seria possível para todos. Claro, claro... eu queria continuar sentada bebendo, mas seria rude.

    Carol me abraçou e nos balançou quando eu cheguei junto a ela, Marcos pulava com os seus amigos e algumas pessoas gritavam à nossa volta. Eu só escutava um zumbido. Sorria, meus lábios, por favor, sorriam.

    - Amanhã vai ser melhor. – Ela disse no meu ouvido.

    - Amanhã eu estarei de ressaca.

    - Por isso mesmo vai ser melhor. – Ela começou a gritar no meu ouvido e me soltou indo pular discretamente com outras pessoas, eu me mexia tentando entrar no ritmo da música que eu não entendia qual era. Em outros tempos na metade da festa eu já estaria sendo carregada pelos lugares por um cara alto e moreno, tão bêbado quanto eu. Entretanto, isto não aconteceria hoje.

    Quando todos estavam curtindo demais, os garçons passavam com taças de champanhe e se equilibravam como gatos para nada cair, eu

    saí do meio do caos. Fui ao bar e pedi mais uma taça de champanhe, depois uma dose de uísque e então a cerveja mais leve que eles tinham. Meu telefone, onde está o meu telefone?

    Minha bolsa estava devidamente em cima da mesa, caminhei tentando ser o mais elegante possível, sempre bebi pouco e quando tentava extrapolar para me divertir já ficava zonza em minutos. Se concentre, se concentre. É fácil, só chegar até a mesa. Levou uma eternidade, mas me sentei. Minha boca estava seca.

    Eu ia nas redes sociais e ficava atualizando a página, esperando que houvesse uma mudança de relacionamento. Eu estava esperando as fotos dos lugares aos quais planejávamos ir, mas ele com outra pessoa. Estava esperando as juras de amor que ele não me dizia, pois ninguém tinha nada a ver com a nossa vida. Nada, meu coração saltava de alegria e ao mesmo tempo ficava triste por saber como ele jogava, só porque não está no Facebook, não significava que não estava acontecendo. Se eu visse seria pior? Eu já queria morrer agora e nem estava vendo nada.

    E se eu tivesse tentado só mais um pouco? E se eu tivesse dito mais que o amava, teria feito diferença? Ele estaria aqui agora? E se eu tivesse controlado o impulso, tivesse cumprido as minhas promessas? E se eu fosse quem ele precisava que eu tivesse sido? Eu ainda estaria com aquela felicidade momentânea? Nós fomos caindo pouco a pouco até que não sobrou mais nada de mim. Mas estar com ele, agora, aqui, em qualquer lugar, era a única coisa que eu realmente queria. Talvez o ele do início, entretanto. Quando eu recebia sua mensagem e as borboletas no meu estômago entravam em frenesi, quando ele se esforçava e eu sentia que era por nós, que era para me conhecer. Ele se tornou a minha paz no meio da tempestade em que estava, meus pais se separando, a conclusão do TCC, o final do estágio e a procura por um trabalho efetivo, todas as neuras do que eu queria para o meu futuro, quem eu queria ser, o

    que eu queria ter. Ele esperou segurando a minha mão, mandando uma piadinha quando eu estava estressada e roubando beijos quando eu queria explodir. Quando que a gente se perdeu e eu fiquei insegura sobre a gente? Quando ele começou a ter dúvidas sobre o que sentia? E se eu tivesse tentado só mais um pouquinho?

    Com todas as coisas que passamos, ele ainda era o único que eu queria do meu lado agora. Literalmente. Empurrei a cadeira que o primo loiro da Carol estava sentado. Era falso, não era para ser esta mancha baixa, era para ser ele, no seu terno perfeito e que não sobrava nem faltava nada, seu peito que deixava o símbolo da esperança perfeito, quem me fazia babar quando sorria, piscava, mandava um beijinho e fingia se concentrar no que ouvia mesmo que o assunto fosse chato. Eu me acostumei a nós, a não estar sozinha, a sermos uma dupla que combateria as injustiças no mundo e que seria inspiração para clássicos da literatura.

    Amanhã não seria melhor, mentiram para mim desde o início.

    - Por que você veio se sentar? – uma das madrinhas disse quando se aproximou o suficiente para que eu pudesse ouvi-la.

    Por que eu tive uma crise existencial no meio de uma festa de casamento enquanto fingia me divertir para que ninguém me olhasse com pena? Porque eu não queria estar aqui, eu queria estar no prédio Torres, apartamento 305 com uma camisa muito maior do que eu assistindo documentários sobre animais silvestres que fingia gostar enquanto comia pipoca? Por que quando me tiraram ele eu também me perdi e eu não sei voltar sozinha?

    - Meus pés estavam me matando, então aproveitei para parar, me sentar e beber. – Eu sorri, ela acreditou. Eu senti quando ela vinha para tentar me puxar e ir novamente a pista de dança, eu poderia ter evitado, mas eu fui com o fluxo. Em algum momento, eu espero, que

    eu possa rir da noite de hoje e me arrependa de não ter aproveitado o suficiente.

    Eu poderia esquecer só por hoje? O quanto de esforço emocional isto me custaria?

    Começou a tocar a música preferida minha e de Carol, eu ouvi o grito dela e seus olhos me procurando. As pessoas deram espaço e nos permitiram dançar, sim, tínhamos uma coreografia e tudo. Por ela, só pense nisso, por favor, Cérebro, por ela. Pelo dia de hoje que não acontecerá novamente, sofra amanhã, pense em tudo amanhã, chore o triplo amanhã.

    Então, nós dançamos. E dançamos, e dançamos, e dançamos, e dançamos.

    Ignorei as coisas à minha volta, as pessoas, e me foquei na música.

    Meu corpo ia conforme as batidas, eu balançava meus braços, balançava a minha bunda, bebia um pouco do copo na minha mão que eu nem sabia mais o que era, minha língua já não diferenciava mais nada. Eu só ia, fechei meus olhos e ia. Eu queria fugir, mas ficava.

    Eu queria gritar, mas selava os meus lábios. Eu queria chorar, mas sorria. Vamos, só mais um pouco.

    Alguém colocou as mãos na minha cintura e eu deixei, fomos até o chão e subimos, ele acariciava as minhas coxas, ele cheirava a minha nuca, ele apertava os lugares certos, ele me conhecia, sabia do que eu gostava. Ele deu uma risadinha na minha orelha e fiquei eriçada, quando tentei me virar ele me segurou, não, ele estava me conquistando, estava pegando o que conseguia tocar. Suas mãos eram fogo, eram brasa, eu ia explodir, eu queria mais, eu queria que ele parasse porque tinha medo de não aguentar, eu ia morrer. E

    então o nada.

    Eu imaginei as mãos dele em mim? Eu imaginei a sua risada? Eu preciso de um tempo, eu estava chorando, as lágrimas caíam e eu

    não conseguia controlá-las, apenas caíam. Eu queria ficar sozinha, eu queria um abraço, eu queria que alguém dissesse que ficaria tudo bem, eu queria um beijo, eu queria esquecer, eu queria sumir. Era muito, ao mesmo tempo, para suportar.

    A música parou, alguém pegou o microfone. Eu não entendia nada, o banheiro tinha uma acústica muito boa. Me olhei no espelho, onde que eu me transformei neste frangalho? Neste rascunho do que um dia eu fui? Cadê a mulher forte e poderosa que tinha um emprego bom, amigos verdadeiros, família próxima e uma lista de esquemas infinita? Pense, Cérebro, pense que eu não estava feliz com ele, pense nos momentos ruins, pense na tristeza que ele deixava toda vez, pense na dor, foque na dor, foque na raiva. Quando olhei para o espelho novamente, mais determinada, a maquiagem perfeita e prova d’água segurou o meu pranto. Lavei as mãos, precisava encontrar um propósito.

    Quando saí alguém gritou que eu precisava ir para aquele amontoado de mulheres. Carol estava no palco, ela segurava o buquê e todas estavam polvorosas. Vi a minha mãe ali também, alguma de nós não tinha desistido, afinal de contas. Acho que sou a amargurada da família. Eu não queria ir, mas eu fui. Apoio moral em todos os momentos. Mas não consegui gritar, nem levantei os braços. Quando senti as flores vindo na minha direção eu desviei. Não, isso não.

    Marcos chamou então os homens e pude me sentar, Carol sentou na cadeira e teve a liga retirada. Ele jogou para o grupo de homens e eles se debateram para conseguir, os namorados das meninas, é claro, o resto saiu correndo com medo da tradição de ser o próximo a casar.

    Casamento é só um trâmite legal, afinal. Já vi muitos casais não casados serem mais felizes do que quem troca alianças. Já vi casal não casado se amar muito mais do que aqueles que juraram até que a morte nos separe. Carol e Marcos eram exceção. Olhava para eles tentando continuar acreditando, mas as palavras ficavam presas na

    minha garganta. Faltou ali um certo moreno alto naquele aglomerado. Ele teria tentado pegar? Ele teria se afastado? Ele então chegaria aqui perto de mim e me beijaria dizendo que teríamos sorte na próxima vez?

    - Pessoal, eu tenho um aviso para dar, foi repentino, nós não estávamos esperando, mas foi a melhor notícia que eu poderia ter recebido dos lábios da minha esposa. Minha esposa. – Marcos olhou para Carol parecendo emocionado, ele levantou a mão e ela pegou rapidamente. – A segunda melhor coisa na verdade, afinal você disse sim. Então, nós teremos um bebê. Carol está grávida de seis semanas.

    E então se iniciou o pandemônio. Todos se levantaram para cumprimentar os recém casados, os meninos pegaram Marcos e o jogaram para cima. As mulheres gritavam em volta de Carol e acariciavam a sua barriga. O pai de Carol foi até Marcos quando os colocaram no chão, se olharam profundamente enquanto conversavam aos sussurros e então se abraçaram. Os tapas nas costas como forma de afeto diziam mais, ele fez um compromisso com Carol hoje e agora deveria ser estendido para a criança também.

    Quando abracei Marcos revelei que já sabia antes dele, ele riu. Era claro que já imaginava que isso fosse acontecer, é claro que seria eu que iria compraria o teste de gravidez, que estaria junto no médico e teria a confirmação pelo exame de sangue, que ajudaria a montar a estratégia perfeita para dizer a ele de forma ideal. Porque também foi eu quem o ajudou a montar o pedido de casamento perfeito, dizer o que a agradaria e o que não agradaria, ainda que ela fosse dizer sim de qualquer forma, eu que chamei o pessoal, eu que a enganei para ir até o restaurante, eu que aprovei a música e o discurso, porque minha amiga merecia tudo, ela merece o mundo, ela merece o amor de Marcos incondicional. Eu o aprovei antes dela.

    - Obrigado. – E eu sabia que ele queria dizer por tudo o que

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