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Pentecostalismo, fuzil e voto: as verdadeiras forças que impulsionaram as eleições para os Conselhos Tutelares
Pentecostalismo, fuzil e voto: as verdadeiras forças que impulsionaram as eleições para os Conselhos Tutelares
Pentecostalismo, fuzil e voto: as verdadeiras forças que impulsionaram as eleições para os Conselhos Tutelares
E-book212 páginas2 horas

Pentecostalismo, fuzil e voto: as verdadeiras forças que impulsionaram as eleições para os Conselhos Tutelares

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Sobre este e-book

Este livro é o resultado da minha dissertação de mestrado em Sociologia Política para o Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ-UCAM). Tentei seguir a formatação exigida pela academia, sem, contudo, renunciar a uma linguagem acessível a quem este trabalho é direcionado: aos que estejam ligados aos interesses da criança e do adolescente e em sua proteção, e aos que se interessam por política.
Apesar de provocativo, o título Pentecostalismo, Fuzil e Voto foi a forma que encontrei para homenagear Victor Nunes Leal, que faria 100 anos em 2024.

Contribuo com o resultado de minha pesquisa para indicar se há um uso da família vulnerável como trampolim político. Ligação que, caso exista, pode possuir interesses que nem sempre combinam com aqueles da criança e do adolescente.

Com a ascensão da Direita no mundo, e do Bolsonarismo no Brasil, a religião tem tido destaque nas suas relações com a política. Como isso afetaria a política nacional pelo Parlamento, quando o assunto é as eleições para o Conselho Tutelar?

Teriam a igreja – qualquer igreja – e os donos dos fuzis força suficiente para influenciar a eleição dos conselhos tutelares? O que a milícia teria a ver com isso? Mas essa eleição não é facultativa? Tentando encontrar respostas para hipóteses que alvoroçaram a imprensa em 2019, cruzei dados desses eleitores específicos, do Município do Rio de Janeiro e dos candidatos para analisarmos o perfil de ambos e a qualidade do voto. O Resultado me surpreendeu.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de jul. de 2023
ISBN9786525299204
Pentecostalismo, fuzil e voto: as verdadeiras forças que impulsionaram as eleições para os Conselhos Tutelares

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    Pentecostalismo, fuzil e voto - Washington Carlos Silva

    I. INTRODUÇÃO

    Os meus filhos estão defendendo-me. Vocês são incultas, não pode compreender. Vou escrever um livro referente a favela. Hei de citar tudo que aqui se passa. E tudo que vocês me fazem. Eu quero escrever o livro, e vocês com estas cenas desagradáveis me fornece argumentos (SIC).

    Carolina Maria de Jesus (p. 20).

    Este livro que tenho a honra de apresentar, como já se percebe pelo título, é uma homenagem a duas grandes figuras da literatura brasileira, mineiros como eu: Victor Nunes Leal, com seu clássico Coronelismo, Enxada e Voto, publicado em 1948, que inspirou a forma de se apresentar uma narrativa; e Carolina Maria de Jesus com o agora não menos clássico Quarto de Despejo, publicado em 1960, que apresenta cada um dos subtemas aqui tratados. Tomei fragmentos do diário da Carolina em sua aridez; procurei qual tinha sido sua razão de ser e a quais instituições ou qual a prática social e política que eles poderiam inspirar (FOUCAULT, 2003).

    Ao prefaciar a sétima edição de Coronelismo... , José Murilo de Carvalho, com sua falta de esperança numa democratização de fato plena em terras brasileiras, disse acreditar que neste estágio (de apuro democrático) só chegaremos na medida em que a plenitude da cidadania chegue "a todos os recantos e a toda população do país. Enquanto isso não se verificar, os valores democráticos que informaram Coronelismo continuarão vivos a nos desafiar com novas tarefas." (CARVALHO, 2012).

    Murilo de Carvalho (2012) nos adverte que Nunes Leal, ele próprio, não definiu o que seria o Coronelismo. Deixou nas entrelinhas e no entendimento do contexto de sua narrativa. Carvalho critica a falta de percepção daqueles que tentaram fazê-lo ao pensar Coronelismo como mandonismo local. Não o é. Pelo menos não apenas. Coronelismo teria sim, traços de mandonismo local, mas era mais que isso, fazia parte de um sistema, de uma trama que ligava coronéis (mandões), governadores e presidente da República. Insistiu num ponto... e aqui prestemos atenção na ligação de ambos os conceitos coronelismo e neopentecostalismo – como se vê hoje, e como se apresenta em certas instâncias: era a ideia de sistema que distinguia seu conceito e lhe conferia originalidade. Preocupava Victor Leal mais que a qualquer coisa o sistema, a estrutura e a maneira pela qual as relações de poder se desenvolviam na Primeira República, a partir do município. Tal como hoje. A religião como tomada de poder não se restringe ao mandonismo local, mas parte dele, surge dele, se expande a partir desses núcleos de poder localizados.

    O coronelismo diz José Murilo de Carvalho tem a ver com conexão entre município Estado e União [vereadores, prefeitos convertidos, oxalá conselheiros, governadores e candidatos a presidente que se ‘convertem’ à nova religião agregadora], entre coronéis [juízes, promotores de justiça, padres, pastores], num jogo de coerção e cooptação exercido nacionalmente [como veremos ao final desta obra].

    Nunes Leal, no entanto, via no fenômeno algo restrito a um momento específico de nossa vida política (a República Velha: 1889-1930), num país agrário que o inspirou.

    No entanto, o pensamento é o mesmo já antes trazido por Joaquim Nabuco em Minha Formação: A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil, vaticinara. Ladeando com as cicatrizes eternas da escravidão, as ideias, análises e críticas que inspiraram o trabalho de Carolina Maria de Jesus, Nunes Leal e Joaquim Nabuco estão sendo acentuadas fortemente no Brasil destes anos 2020, com uma nova roupagem, mas uma idêntica essência.

    Cidadania e escravidão. Duas palavras carregadas de conceitos que sobrevivem para além do momento que as criou e que se adaptam de acordo com as circunstâncias e as necessidades sociais de sobrevivência humana. São conceitos que não estão, dessa forma, aprisionados linguisticamente ou presos a um determinado momento histórico. Também podem ser considerados como, Conforme Laclau e Mouffee, significantes vazios ou ponto nodal, tais como democracia, liberdade, família "que passam a atuar como força centrípeta fazendo grupos com interesses específicos gravitarem em torno de um antagonismo do tipo nós x eles que constitui sua identidade política (GRACINDO JR e SILVA, 2023).

    Para Reinhart Koselleck, um dos pais fundadores da história dos conceitos. Por estar dirigido a uma circunstância singular e única, um conceito social e político não possui vida para além de tal circunstância. Tal afirmação só será válida, contudo, segundo o historiador alemão, Se o estado de coisas a que ele se refere deixa de existir ou se transforma. Caso contrário, por consequência, o conceito envelhece, pois os sentidos que abriga já não têm mais um sentido imediato. (ASSIS; FERREIRA. 2020).

    Se faz necessário, contudo, um momento para o silêncio. A partir desse momento de busca dos sentidos, tem-se duas alternativas: permanecer em silêncio ou expressar-se. Portanto, antes de a palavra ser escrita ou falada, precede-se um momento de contemplação, abstração, que não explorados racionalmente em atuações práticas, podem ser interpretados como covardia, cumplicidade política ou desinteresse jurídico e social. A situação, diz Novaes (2006), se radicaliza à medida que valores universais – liberdade, justiça, razão, verdade –, (...) perdem legitimidade e valor.

    Uma palavra pode ter, pois, conceitos que se transformam com o tempo, mas que mantêm os princípios que a criaram e sustentam o seu núcleo de significados. Se partirmos da premissa que tais princípios antecedem à criação da palavra; eles, pois, não serão dependentes dela para a sua sobrevivência, podendo substitui-la por outra que se adeque às mudanças do estado de coisas ou às circunstâncias em que estão inseridos. Os sentidos que foram objeto de uma formação conceitual do passado não esgotam seu potencial semântico naquele passado (ASSIS; FERREIRA. 2020). Pelo contrário, os significados específicos pensados num momento anterior podem recuperar aquele sentido em um outro momento histórico.

    1.1 DOS CONCEITOS

    (a) O Pentecostalismo do título não se pretende exprimir uma compreensão estrita do termo, delimitado em sua pureza conceitual, como bem define o Bispo Robert McAliste nesta nota de rodapé.¹

    Adentrar nas particularidades e divisões do Pentecostalismo até a definição mais precisa de uma de suas derivações, o Neopentecostalismo, exigiria a princípio mais do que o presente trabalho pretende oferecer.

    Também não vamos fugir da apreciação do conceito, pois necessário para compreensão de qualquer teoria. O Bispo Walter McAlister identifica o pentecostalismo como um movimento com mais de 110 anos de existência, ou seja, surgindo no início do século XX do movimento pietista metodista. Segundo o religioso, os pentecostais foram agraciados por Deus com diversos dons espirituais como a profecia, o poder de falar línguas estranhas e curar através do Espírito Santo. A ênfase do pentecostalismo seria a santificação, ou uma evolução no sentido de vivermos a vida em comunhão com Deus e com o Espírito Santo. A vida deve ser vivida em santidade. A vida pessoal e as práticas do dia a dia devem ser separadas das coisas do mundo e regradas pela palavra de Deus. Ainda assim, a forte caracterização dos pentecostais é que eles sempre estão abertos para os movimentos de Deus, e essa pretensão divina em movimento quer fazer coisas novas.

    Se, por um lado, essa abertura que possibilita a busca de novidades é boa para a adequação do espírito às mudanças sociais, o resultado, por outro lado, é que tal caminho tem feito com que o pentecostal adentre em situações, segundo McAlister, bem complicadas. O Neopentecostalismo surge, então, de uma abertura que tem levado o servo de Deus à busca por bens materiais, para um bem-estar pessoal, a uma comunhão com o neoliberalismo, pois visando à prosperidade pessoal.

    Sim. As igrejas neopentecostais foram formadas na década de 70 e se distanciavam dos estereótipos que estigmatizavam os tradicionais crentes até então. Com origem grega, Neo quer dizer novo. Um novo pentecostalismo. Neste ambiente, os novos crentes passaram a adotar novos ritos, novas crenças, novas práticas e uma nova forma de se relacionar com a sociedade. Procuram no fim da vida estar ao lado de Deus. Mas neste intervalo, querem gozar, ao máximo, com tudo a que têm direito e sem a menor culpa moral, esta vida e o que julgam haver de bom neste mundo. Almejam, em suma, a felicidade. Boa fortuna (...) em termos de bem-estar pessoal, progresso material e até consumo de bens de alto valor monetário. (MARIANO, 2014, p. 8).

    Neste contexto, o título deste livro poderia ser Neopentecostalismo, Fuzil e Voto. Não o é, pois. Ainda conforme McAlister, esse fenômeno não tem se restringido apenas às igrejas neopentecostais, mas parece que infectou toda a igreja. Isso faz parte dessa ideia da Teologia da Prosperidade.

    (b) O fuzil: entre a milícia e o tráfico de drogas. O vocábulo fuzil significa arma de fogo. Não se tem muito a discorrer sobre o conceito. É uma arma de fogo destinada a ceifar vidas. E o fuzil especificamente, matar mais num tempo menor. Matar, simplesmente. Pode ser usado também para ameaçar, amedrontar, afastar, constranger, intimidar, mostrar força ou poder, estabelecer uma nova ordem. Em A República das Milícias: dos esquadrões da morte à era Bolsonaro, Manso (2020, p. 9) entrevista um miliciano codinome Lobo e informa que "A disposição de praticar homicídios, segundo ele, colaborou na construção do poder e da ordem no bairro onde sua milícia agia. A nova ordem que ele ajudou a criar, na sua concepção, era melhor do que a vigente no passado, estabelecida pelos bandidos e pelo tráfico. A violência fardada dos paramilitares se justificava por ser um meio de defender os interesses dos cidadãos de bem contra a ameaça dos criminosos. Neste trabalho, o fuzil personifica tanto o miliciano quanto os traficantes de drogas, com mais ênfase no primeiro caso. O capítulo III será dedicado ao assunto mais detidamente.

    Com o simbolismo da enxada, Victor Nunes Leal quis transmitir a ideia de que o coronelismo era atividade própria do interior, do poder local típico das áreas rurais, da ausência do Estado, consequentemente, o isolamento é fator importante na formação e manutenção do fenômeno [coronelismo] (LEAL, 2012, p. 230).

    O Fuzil, de forma contrária, traz o fenômeno analisado para a cidade grande – tal e qual uma ferramenta de trabalho – e, da mesma forma como a enxada, em regiões em que o Estado ou é marcadamente ausente ou é fraco diante de forças que ameaçam e amedrontam. Mas tão lá (na região rural de Victor Leal) como cá, cidade olímpica, o voto ainda é marcado pela expressão desse abandono estatal (no sentido da segurança)² ou incursão na política dos que agridem ou agravam a vulnerabilidade para vender proteção.

    1.2 MANO BROWN INSPIRANDO A SOCIOLOGIA E A POLÍTICA

    As discussões sobre representatividade, democratização plena e cidadania também estiveram em alta nos últimos anos no Brasil. Uma delas, porém, aplaudida por uns e vaiada por outros, nos apontou sérias obviedades, mas que tem sofrido da negligência intelectual e artística, tem marcado e transformado o perfil da atual esquerda brasileira.

    Adaptando o que disse Mano Brown à metodologia para a escrita desse livro, sua frase que ao mesmo tempo foi aplaudida e vaiada poderia ter sido a seguinte: O que mata a gente é a cegueira e o fanatismo, se somos a ciência que estuda a sociedade, os sociólogos têm que entender o que a sociologia espera de nós. Se não sabem, voltem para a base e vão procurar saber. Esta é uma paráfrase do que disse o cantor às vésperas das eleições presidenciais de 2018, quando o clima já anunciava uma derrota do Partido dos Trabalhadores nas urnas para uma direita ultraconservadora. Literalmente, disse o rapper: Se nós somos o Partido dos Trabalhadores, o partido do povo tem que entender o que o povo quer. Se não sabe, volta para a base e vai procurar saber (BROWN, 2018).

    Para um estudante de

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