Confidências
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Confidências - Rosa Rosileia
Rosa Rosileia
Confidências
São Luís
2ª Edição - 2023
Confidências
Obrigada...
Aos amigos celestiais.
Aos amigos terrenos.
À família.
A Mesa do Editor.
"A Antônio Meneses, pela paciência em fazer a revisão ortográfico-gramatical deste livro.
2
Rosa Rosileia
Confidências da autora
O maior medo que senti quando terminei de escrever o meu primeiro livro — Amor Puro —, foi que, jamais conseguiria escrever outro. Descobri que somos seres inesgotáveis de saber.
A fonte nunca seca, se dela flui amor.
* * *
3
Confidências
"Eu... Eu... Eu não consigo me mexer... Não!... Eu não consigo... Eu vou... Eu tentarei... Eu não consigo... Ah! Eu não consigo me levantar... Nossa! Estou... Fernanda, levante-se! É
uma ordem!... Santo Deus! Só pode ser um pesadelo".
Fernanda encontrava-se em seu quarto numa luta interior para se soerguer. Sabia que estava viva e era por esse sopro divino que ainda tentava sair da cama. Percebia o corpo todo dormente.
Ela pensava em erguer-se e correr para os braços do marido, mas se sentia paralisada.
Desistiu de lutar.
Gotas de lágrimas escorriam pelos cantos de seus olhos.
O seu ser esvaia-se.
Sabe que fora muito feliz e continuará caminhando pela estrada da felicidade enquanto viver.
— Mamãe, deixa! Está tão gostoso — articulou Fernanda, cansada de correr.
— Fernanda, saia já dessa chuva! — ordenou a mãe de Fernanda, de uma janela. — Menina, eu estou mandando!
— Eu quero encher a minha latinha, mamãe... Por que eu não posso tomar banho de chuva? — perguntou Fernanda, aparando água. — Veja mamãe, a patinha e seus filhotes estão adorando!
— Menina teimosa, você vai acabar ficando gripada. À noite se tossir... A pata é um ser que pode viver na água o tempo todo e você não — falou a mãe de Fernanda, brava.
A pequena estava encantada com os pingos d'água, escorrendo do telhado, com os quais ela tentava encher uma latinha.
Quando enchia a lata d'água, corria despida pelo quintal 4
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atrás das galinhas que se tentavam proteger e proteger seus filhotes da insistente menina que não deixava que eles se agasalhassem. Saiam dos seus esconderijos e venham brincar comigo!
, ordenava Fernanda, jogando água nos animais.
A mãe, cansada de chamar a menina, abre um guarda-chuva e vai buscá-la.
— Mamãe! Quando eu crescer, quero ser médica das vaquinhas — declarou Fernanda.
— Veterinária filha! Médica Veterinária. Os veterinários cuidam dos animais — explicou a mãe de Fernanda, enquanto enxugava a filha.
— Eu vou ser veterinária e jardineira — falou Fernanda, muito animada.
— Jardineira?! — exprimiu a mãe de Fernanda, sorrindo.
— Eu quero cuidar das plantas do nosso jardim — anunciou Fernanda.
— Botânica. Botânicos são profissionais que lidam com as plantas. A minha filha será uma linda botânica — expôs a mãe de Fernanda, secando o cabelo da filha.
— Eu também quero ir à lua — revelou Fernanda, toda animada.
— Nossa, meu amor, quantas profissões! — pronunciou a mãe de Fernanda, sorrindo. — Agora vista esta roupa e vamos tomar uma sopinha bem quentinha e cheia de letrinhas. Eu não quero que a minha filhota caia doente.
A menina crescia sob os olhares doces da mãe. Cercada de amor parecia uma flor desabrochando.
— Socorro! — gritou Fernanda.
— O quê foi? — interrogou a mãe de Fernanda, que veio correndo ao encontro da filha.
— Eu estou morrendo — respondeu Fernanda, mostrando a roupa à mãe.
— Desculpe-me! — pediu a mãe, abraçando a filha. — A mamãe ainda não falou com você sobre esse assunto. Foi uma 5
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falha minha... Quando as meninas ficam mocinhas, sangram. A este acontecimento damos o nome de menstruação... Ah! Não chore! Acontece com todas as meninas que estão ficando mocinhas. Eu vou ensinar tudo a minha filha.
— Eu não gostei mamãe! — bradou Fernanda. — Por que isso só ocorre com as meninas?
— Porque nós, mulheres, temos o dom da fertilidade —
disse a mãe de Fernanda, enxugando as lágrimas da filha.
— Por isso que eu queria ser menino — afirmou Fernanda, entristecida.
— Eu amo tanto a minha menininha — mostrou a mãe de Fernanda, beijando a filha nas bochechas.
— Eu também lhe amo, mamãe! — declarou Fernanda, abraçando a mãe.
A cumplicidade e o amor que existiam entre mãe e filha enchiam de alegria o lugar, onde moravam.
Elas viviam num sítio que se encontrava sem a matriarca da família, porque morrera há alguns meses; D. Júlia, avó de Fernanda, mulher firme, cuja autoridade deixava Fábia, sua filha, sem ânimo para desobedecer.
Haviam se mudado para um interior. Uma pequena cidade, pacata, onde podiam viver sem serem questionadas sobre o passado delas. Fábia aceitava a imposição da mãe e suas lamentações e acusações, sem reclamar. Crucificava-se por ter cedido às tentações carnais e enganado à mãe. Tentava educar a filha longe das tristezas de sua mãe, lutando para que Fernanda não sofresse, nem passasse por tudo que ela passava.
* * *
— Bom-dia, mamãe! Como à senhora está demorando a sair de sua cama quentinha, eu vim ajudá-la a acordar, assim como faz, 6
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quando eu estou com preguiça de levantar. Eu já estou abrindo a janela. Quem sabe os raios do sol mais brilhantes dos últimos dias não lhe ajudem a despertar e... Vamos fazer o nosso café da manhã? Por favor, mamãe, acorde! Eu vou a um passeio da escola... Esqueceu?... Mamãe, mamãe?! Acorde!
Os gritos doloridos de Fernanda podiam ser ouvidos ao longe. Em pouco tempo, a casa dela estava cheia de pessoas.
Custoso foi arrancar Fernanda, que estava agarrada ao corpo da mãe.
O caixão descia a sepultura lentamente, enquanto uma jovem perdida em seus pensamentos jogava uma última rosa e olhava tristemente para o céu e perguntava-se: por que Deus estava fazendo isso com ela. Havia-lhe levado a avó e, antes que pudesse superar essa dor causara uma ainda maior arrancando-lhe sua querida mamãe.
— Olha para mim, querida!... Sou sua madrinha e não ficará sozinha no mundo. Não vai mesmo. Vou levar você comigo.
Cuidarei como se fosse a minha filhinha. A filha que eu nunca tive. Eu sou sua segunda mãe. Você será muito feliz lá em casa.
— Eu estou indo com a senhora, não estou — assentiu Fernanda, com lágrimas nos olhos.
— Vamos fechar essa casa e depois veremos o que fazer com ela — disse a madrinha de Fernanda.
— Quero deixar meus animais com a vizinha — declarou Fernanda, baixinho.
Fernanda conversou com a vizinha sobre a necessidade de se afastar um pouco da casa onde vivera com a mãe. Talvez não voltasse mais para morar. Pediu à vizinha que cuidasse das coisas da mãe, enquanto decidia o que fazer.
Partiu com a madrinha.
Tristes dias foram vividos por Fernanda na casa da madrinha. Assim que chegaram, a comadre de sua mãe lhe dera as tarefas: arrumar a casa, lavar a louça, lavar e passar as roupas, fazer a comida... Como ia mesmo perder o ano letivo, deixasse a 7
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escola para o ano seguinte.
Certo dia, o filho da madrinha aproximou-se de Fernanda, enquanto ela arrumava o quarto dele, e disse:
— Eu não lembrava mais de você, mas sempre foi bonitinha. Agora, está mais linda do que nunca. Linda! Linda!
Linda!
— Tire sua mão do meu cabelo! — instou Fernanda, encarando o rapaz.
— Não posso admirar seus cabelos — proferiu o rapaz.
— Eu vou falar para a madrinha — declarou Fernanda, alterada.
— Falar o quê, Fernanda — procurou saber a madrinha, entrando no quarto.
— O seu filho...
— Seja boazinha com ele — falou a madrinha, interrompendo Fernanda e passando a mão numa mesa em sinal de sujeira.
— Eu odeio vocês — gritou Fernanda, retirando-se.
— Fernanda, não seja irritante! Você está sozinha no mundo e nós somos sua família — disse a madrinha aos berros.
Fernanda, na casa da madrinha, dormia com medo, acordava com medo, circulava pela casa com medo... E, trabalhava feito uma condenada.
Ela sempre recordava a vida maravilhosa que tivera e chorava tristemente.
Sabia que era órfã e que não havia nenhum parente a quem pedir socorro.
Pensara muito antes de fazer o que fez.
A madrinha ficou irritadíssima, vendo Fernanda com a mala na mão, que sem esboçar sorriso, saía da casa, em que fora tão humilhada, prometendo nunca mais voltar.
Eu tenho uma casa. Só preciso de um trabalho
, pensou Fernanda, enquanto contava o dinheiro, que a vizinha lhe dera antes de partir com a madrinha, para tentar comprar a passagem de 8
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volta à sua terra natal.
* * *
Fernanda desembarcou em frente ao sítio em que morava desde que nascera. Abriu o portão com muito cuidado. Mal pôde conter as lágrimas. Agarrando-se à porta, girou a chave na fechadura e em alguns instantes estava adentrando em casa.
Aspirou ao aroma da habitação que era jasmim. Foi abrindo as janelas. Cada uma que abria o sol penetrava e descortinava móveis que continham toda uma história de vida e um caminho de poeira subia ao céu através dos seus raios. Ela teve a impressão de que alguém a olhava. Queria que fosse a mãe que estivesse ali a dizer-lhe como proceder, assim como fizera durante os felizes anos em que viveram bem juntinhas. Sentiu uma saudade enorme, e chorou copiosamente. Não percebeu quando a vizinha entrou e aproximando-se lhe abraçou. Fernanda ficou soluçando nos braços de uma amiga querida sua e de sua mãe.
— Você voltou! — disse a vizinha, abraçando e beijando Fernanda. — Eu sabia que iria voltar.
— Em poucos dias, eu passei de princesa à escrava —
sussurrou Fernanda, enxugando as lágrimas. — Não sei se precisava passar por tudo isso, mas acredito que tenha amadurecido o suficiente para tomar conta de minha vida sozinha... Aqui é o meu lugar.
— Eu sei — exprimiu à vizinha, fazendo Fernanda se sentar bem pertinho dela. — Você já está grandinha. Pode cuidar muito bem de si. Eu vou ajudá-la. Você é jovem e vai se recuperar bem rápido.
— Nunca vou esquecer minha mãe — falou Fernanda.
— Eu bem sei disso — afirmou à vizinha, tristonha. —
Quando minha filha chegar da escola, eu peço para que venha 9
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dormir em sua casa. Ela estava muito triste. Vai ficar feliz da vida com sua volta.
— Eu também — disse Fernanda, esboçando um sorriso. —
Eu vou ocupar o resto da minha tarde com uma faxina nesta casa.
— Eu vou te ajudar — declarou à vizinha.
— E as galinhas? E a minha vaquinha? — perguntou Fernanda, num assalto. — A senhora cuidou direitinho deles, eu tenho certeza. Nossa! Eu já me havia esquecido os meus bichinhos. Também, com uma madrinha daquelas...
— Eu sabia que não se ia adaptar, por isso fiz questão que levasse aquele dinheirinho, para qualquer precisão — proferiu a vizinha, pensativa. — Eu cuidei muito bem dos seus animais. Eu os deixei aqui mesmo.
— Obrigada por tudo! — agradeceu Fernanda, beijando a vizinha.
Fernanda saiu correndo para o quintal, e foi matar as saudades dos seus animaizinhos. Depois que olhou todos com carinho, é que veio ajudar a vizinha a arrumar a casa. As duas deixaram tudo limpinho.
O sol começava a encobrir, quando Joana, a filha da vizinha, muito animada veio ver sua amiga tão querida. Desde pequenininha que Fernanda brincava com Joana. As jovens se abraçaram emocionadas.
* * *
— Vai voltar a estudar, não vai? — perguntou Joana.
— Acredita que não perdi muito? — inquiriu Fernanda, desanimada.
— Todos aqui sabem que perdeu a sua mãe — falou Joana.
— Sabem que precisava de um tempo. Eu tenho certeza que nossos professores não são insensíveis... Deve voltar à escola e 10
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continuar os estudos. A vida não parou Fernanda, só porque sua mãe se foi. É horrível ouvir isso. Eu quero levar muitos anos