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... no dos outros é refresco...
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E-book89 páginas1 hora

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Sobre este e-book

"Tião vira a moça pela primeira vez fazia mais de um mês, quase dois, quando fora contratado para podar as laranjeiras plantadas no fundo do quintal da mansão judia da Três Rios e topara com ela perto do forno para o qual estava levando para assar os pães para o próximo shabat. Três olhadelas maliciosas e pronto: o fogo da espada do guardião do Paraíso se iluminou e não houve outro jeito senão se lascarem no meio daquela noite no galpão do quintal, no chão debaixo da mesa onde estavam sendo laceados os sapatos da família para seu casamento... Ora, o casamento, na cabeça de Sarah, era muito fácil de resolver: comunicava ao pai Moshe e ao noivo Efraim que não ia mais haver casamento e pronto... E ela se casava com o Tião do Ó e pronto... Casavam assim de se pegarem vez em quando, sem papel nenhum, que nenhum dos dois queria repetir nem a proximidade cotidiana do matrimônio Schwartz nem a distância incomodada do casal das Neves. Era bastante moderninha e ousada e espevitada a Sarah da loja de tecidos do Seu Moshe Schwartz."
IdiomaPortuguês
EditoraEDUEL
Data de lançamento1 de jun. de 2016
ISBN9788572168533
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    ... no dos outros é refresco... - Carlos Fonseca

    capítulo

    primeiro capítulo

    [primeira temporada]

    [Começa com a exibição, por cerca de 20 segundos, da vinheta da história, tendo como fundo musical trecho do refrão da canção escolhida para tema do produto. Num fade out a tela fica toda preta, e então entra a mensagem/legenda:

    Mais ou menos sessenta anos antes...

    Diretor: – Cohta!! Luuzish! Cââmerash!! Aaaçãuô!!]

    – Abre um pouco essas pernas, mulher. Vou entrar em você pianinho, tocando uma cuíca legal!...

    – Vem, vem, meu negón, vem com tudo... Ah! Dança o Havah Naguilah na minha parraíso, vem! Vai! Vem! Vai! Vem! Uh!

    E foi tão assim que Tião das Neves, vulgo do Ó, fez uma festa com as primícias que ia colhendo de Sarah Schwartz, aquela sardentinha ruiva da mansão judia da Três Rios. E arranjaram um problemão para os dois.

    Sarita, como a chamavam por causa da artista violetera espanhola, 17 anos, filha única de Moshe Schwartz, proprietário do estabelecimento loja de tecidos Ao Fino Tato, estava noiva pra casar com Efraim Moretsohn, jovem rebento promissor da fábrica de fios e linhas Aurora. Já estava até tudo encomendado pro casamento dali a pouco mais de um mês, mas Moshe era mineiro de Sabará e gostava de tudo pronto adiantado para nada ficar atrasado. Já os preços todos ajustados com as doceiras e cozinheiros kosher do restaurante do Abraão, salão de festas alugado, horários na sinagoga acertados, convites já distribuídos, vestidos e roupa nova de todo mundo já providenciados, os sapatos também novos já laceando com os panos úmidos dentro lá em cima da mesa no galpão do fundo do quintal. (Ninguém nunca entendeu essa coisa de só comprar sapatos apertados no pé e deixá-los por vários dias com aquele pano molhado dentro até os pés entrarem neles confortavelmente. Tinha qualquer coisa confusa a ver com a saída do Egito, mas era assim o costume, e pronto...). Os enfeites de cabeça para as mulheres já tinham sido encomendados às italianinhas bordadeiras da Mooca, que elas sabiam fazer pequeninas flores de tule e cetim que eram um primor... Toda a roupa preta dos homens já estava sendo confeccionada pelo pai do Abraão do restaurante, que era alfaiate de mão cheia e tesoura certeira aquele um lá... E agora a bela e esfuziante Sarah aprontava essa: sem que ele soubesse ou pudesse suspeitar, colocava na cabeça do afável Efraim de sedosa barba ruiva esses chifres gigantescos e suados e cheios de ahs e vens e vais...

    Tião vira a moça pela primeira vez fazia mais de um mês, quase três, quando fora contratado para podar as laranjeiras plantadas no fundo do quintal da mansão judia da Três Rios e topara com ela perto do forno para o qual estava levando para assar os pães pro próximo shabat. Três olhadelas maliciosas e pronto: o fogo da espada do guardião do Paraíso se iluminou e não houve outro jeito senão se lascarem no meio daquela noite no galpão do quintal, no chão debaixo da mesa onde estavam sendo laceados os sapatos da família para seu casamento... Ora, o casamento, na cabeça de Sarah, era muito fácil de resolver: comunicava ao pai Moshe e ao noivo Efraim que não ia mais haver casamento e pronto... E ela se casava com o Tião do Ó e pronto... Casavam assim de casas separadas e de se pegarem vez em quando, sem papel nenhum, que nenhum dos dois queria repetir nem a proximidade cotidiana do matrimônio Schwartz nem a distância incomodada do casal das Neves. Era bastante moderninha e ousada e espevitada a Sarah da loja de tecidos do Seu Moshe Schwartz.

    No outro dia de manhãzinha, logo depois de o pai sair pro estabelecimento da loja de tecidos, Sarah levou a mãe para um canto da cozinha e, sem pestanejar nem eufemizar, contou-lhe o que fizera com o Tião lá embaixo da mesa:

    – Mamele, o Tião, aquele jardineiro que tia Esther mandou aqui... Pois é, ele tão grandão, tão forte, tão másculo, tão suado, e sua Sarah quis que ele me comesse a pe...

    Rebeca Schwartz bufou – Sa! – ficou vermelha e branca de raiva...

    – ... rereca...

    ... ao adivinhar, mas logo ouvindo, o que estava nas reticências e na voz baixa e desenxabida da fala da filha. Fuzilou-a com um olhar que Sarah nunca mais esqueceu e bem seria capaz de matar em seu coração toda aquela coisa toda confusa que sentia por Tião. Duas lágrimas escorreram pelo seu rosto e fizeram um estrondo quando caíram sobre as pequeninas flores do estampado de seu vestido com um decote que anunciava o suave volume daqueles seios que Tião, mas não Efraim, tocara com as mãos e a língua ásperas no escuro do galpão.

    – ... e não saia de seu quarto até que seu pai lhe diga o que vai ser... Mas se previna: ninguém vai passar as mãos na sua cabeça...

    As palavras gritadas por sua mãe ainda ressoavam em seus ouvidos quando ela se deu conta, ainda em sua cama, ao despertar, de que a cena não passara de imaginação ou sonho. Mas servira para alertá-la do que muito provavelmente aconteceria se relatasse à sua mãe o que houvera entre ela e Tião. Depressa resolveu que não diria nada a ela nem a ninguém. Afinal, ela e Tião bem sabiam que tão logo não haveria uma outra vez. Sua virgindade se fora e com ela toda a possibilidade de uma outra primeira vez. Teria que resolver isso com Efraim, e mais ninguém.

    Levantou-se e foi para a cozinha mais muda que a maçaneta da porta, tomou seu café e saiu para o quintal, tomar um pouco de sol. Rebeca estranhou o silêncio da filha, mas deixou por conta do nervosismo com a preparação do casamento. Recostada ao pilar que sustentava o telhado da varanda, brincando com o pé direito na mancha de sol que pintava de luz os pelos de Rousseau, o vira-latas que trouxera da rua para casa já há alguns anos, Sarah sentiu um arrepio gelado de desgraça a lhe percorrer a espinha quando olhou para o galpão e viu, pela porta entreaberta, a mesa debaixo da qual ela e Tião trocaram seus calores. Tinha que resolver o que fazer, mas era melhor esperar um pouco seu coração se aquietar e sua língua encontrar as palavras certas para um bom encaminhamento da questão.

    E assim passou o tempo e chegou a véspera do casamento e suas regras não vinham. Sarah então se desesperava um pouco mais a cada dia de atraso das regras e de adiantamento das providências para o casamento. Mais um era menos um nessa matemática que estava tendo de aprender. Era pouco tempo, podia deixar por conta de uma gravidez pouco menor –

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