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Brasil: Alguns Intérpretes, Novos Olhares
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E-book409 páginas5 horas

Brasil: Alguns Intérpretes, Novos Olhares

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Sobre este e-book

O livro Brasil, alguns intérpretes, novos olhares é uma coletânea de artigos sobre alguns dos principais intérpretes do Brasil: Manoel Bomfim, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Junior, Antonio Candido, Florestan Fernandes, Celso Furtado e Darcy Ribeiro. O objetivo é analisar aspectos de suas principais obras, não abordados na expressiva fortuna crítica sobre elas. Por seu conteúdo, baseado na leitura atenta das obras de referência e em uma linguagem acessível, este livro é uma contribuição importante especialmente para os que buscam entender o Brasil com base nesses autores.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento12 de ago. de 2019
ISBN9788547319809
Brasil: Alguns Intérpretes, Novos Olhares

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    Brasil - Homero de Oliveira Costa

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição - Copyright© 2018 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS

    APRESENTAÇÃO

    Este livro é uma coletânea de artigos sobre alguns livros clássicos do pensamento social e político brasileiro. Como toda e qualquer coletânea, ela é seletiva e, neste caso, os autores analisados são Manoel Bomfim, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Junior, Antonio Candido, Florestan Fernandes, Celso Furtado e Darcy Ribeiro. Talvez com exceção de Manoel Bomfim, são autores cujos nomes e obras estão consolidadas e consagradas, dentro e fora da universidade e compõem um expressivo panorama de interpretações do Brasil no século XX.

    Todos produziram extensa obra e sobre os quais há publicada uma imensa fortuna crítica, mas o objetivo deste livro é o de se fazer uma análise mais específica sobre uma das principais obras de cada autor. Não se trata, portanto, da análise sobre o conjunto das obras, mas de algumas delas. Assim, as obras referenciadas são América Latina, Males de Origem (1905), de Manoel Bomfim, Casa Grande & Senzala: Formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal (1933), de Gilberto Freyre, Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda, Formação do Brasil Contemporâneo (1942), de Caio Prado Júnior, Formação Econômica do Brasil (1959), de Celso Furtado; Os parceiros do Rio Bonito: Estudo sobre o caipira paulista e a as transformações dos seus meios de vida (1964), de Antonio Candido, Integração do Negro na Sociedade de Classes (1964) e Revolução Burguesa do Brasil: Ensaios de Interpretação Sociológica (1975), de Florestan Fernandes e O Povo Brasileiro: Formação e Sentido do Brasil (1995), de Darcy Ribeiro.

    O livro reúne artigos dentro de um conjunto muito vasto de possibilidades, mas tem por objetivo expor, mesmo que de maneira sucinta, alguns aspectos centrais de algumas das obras importantes para a interpretação do Brasil.

    O primeiro artigo, Manoel Bomfim, herança parasitária e libelo anticolonial, de André Augusto de Paula Barbieri, é sobre um dos livros mais originais publicados no Brasil. Trata-se de América Latina, Males de Origem. É o rebelde esquecido, no dizer de Ronaldo Aguiar, autor de uma excelente biografia de Manoel Bomfim¹. O livro se destaca por sua originalidade, inserida no contexto no qual prevaleciam teorias racistas com influência entre intelectuais brasileiros².

    É de Manoel Bomfim a primeira e mais consistente crítica às teorias racistas, condenando o racismo e suas teorias como anticientíficas herdeiras de valores retrógrados dos colonizadores. Sua importância está na aceitação de mestiçagem, destacando os seus aspectos positivos, retomada depois por Gilberto Freyre em Casa Grande & Senzala (1933).

    Manoel Bomfim critica as concepções sobre uma pretensa inferioridade racial. No artigo o autor mostra como essas concepções racistas se ligavam aos interesses de dominação neocolonial dos países europeus e Portugal em particular. Para Bomfim, eram etnologias privativas das grandes nações salteadoras. O objetivo do artigo é o de analisar a forma como Manoel Bomfim trata das teorias da inferioridade racial e o conceito de parasitismo colonial para a interpretação das origens nacionais e que colocam Manoel Bomfim como um dos mais importantes e mordazes analistas (e críticos) dos efeitos negativos da colonização ibérica e do atraso das elites brasileiras.

    O segundo artigo O ‘ser’ mulher à luz da Casa Grande & Senzala, de Gilberto Freyre, de Luciana do Nascimento Simião e Rosimeyre Fonseca da Silva, analisa o papel da mulher no período colonial, mais especificamente a forma como ela é percebida e analisada por Gilberto Freyre. Se é inegável a importância da obra, que põe abaixo os determinismos geográficos e raciais e a compreensão de que as raízes do atraso do país se devia a ser tropical e mestiço, mostrando como era anticientífica a afirmação da superioridade ou da inferioridade de uma raça sobre outra, construindo sua análise e interpretação tendo a cultura como chave explicativa, por outro lado, as autoras chamam à atenção a forma como Gilberto Freyre analisa o papel da mulher. Adotando a perspectiva de gênero, para elas o livro Casa Grande & Senzala (1933), se é de fato uma obra de referência para compreender o Brasil e sua formação, a constituição da família no regime patriarcal e escravocrata, foco da pesquisa e interpretação, não há o destaque para a opressão sofrida pelas mulheres. Para elas, Gilberto Freyre obscurece, suaviza ou negligencia o conjunto das violências perpetradas às negras e às índias, passivizando-as e/ou erotizando-as.³

    O terceiro e o quarto artigo analisam alguns aspectos do livro Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda. Publicada em 1936, é uma obra de referência para se compreender o processo de formação do país. Muito já se escreveu sobre o livro. Há hoje uma imensa fortuna crítica sobre a obra, passível de muitas leituras, como a discussão sobre o Estado brasileiro, das relações entre público e privado, o patrimonialismo, a ideia da necessidade de uma separação entre esferas públicas e privadas para a modernização do Estado, que tornaria mais racional burocrática e eficaz a administração pública etc.

    No terceiro artigo, O legado português em Raízes do Brasil, Rodrigo José Fernandes de Barros se propõe a analisar em que consiste esse legado. Como ressalta o autor, Raízes do Brasil procura compreender o sentido do país e, dentre os elementos fundantes, o legado português, que é o objeto de análise do artigo.

    No quarto artigo, "Dualidades e dicotomias em ‘Raízes do Brasil’ de Sérgio Buarque de Holanda", Lara Agra Nunes destaca as influências de Max Weber na construção da obra, que fundamenta os argumentos do autor. Baseado nos tipos ideais de Max Weber, descreve as raízes da construção do Brasil por meio de dicotomias, ou pares antagônicos, constituindo seu pensamento com conceitos polares e complementares, como afirma Antonio Candido⁵, que no prefácio do livro em 1967 afirma que Raízes do Brasil é construído sobre uma admirável metodologia dos contrários, que alarga e aprofunda a velha dicotomia da reflexão latino-americana. Em vários níveis e tipos do real, nós vemos o pensamento do autor se constituir pela exploração de conceitos polares (CANDIDO, 2006, p. 239).Esse uso se dá a partir de um jogo dialético entre ambos, o que chama de pares antagônicos de Sérgio Buarque como complementares na construção das raízes do Brasil, aproveitando o critério tipológico de Weber, focaliza em pares e não em multiplicidades, dando dinamismo aos conceitos e justificando sua interação no processo histórico, mostrando a sua manifestação nos aspectos mais diversos que estruturam o livro: trabalho e aventura; rural e urbano; semeador e ladrilhador; liberalismo e caudilhismo e norma impessoal e impulso afetivo.

    Neste último encontra-se uma das ideias-chave do autor, a de homem cordial, imaginário que perpassa toda a obra e é fundamental para analisar e compreender o Brasil e os brasileiros e a maneira como se constrói sua autoimagem. Weber usa o conceito de tipos ideais para fundamentar sua análise e serviu de referência a muitos autores, obras, estudos e pesquisas posteriores. A autora analisa alguns aspectos da obra de Sérgio Buarque de Holanda a partir das comparações que ele faz e também dessa dicotomia que perpassa toda a obra.

    O quinto, sexto e sétimo artigos tratam de Caio Prado Júnior e Florestan Fernandes, abordando aspectos distintos de suas obras. No quinto artigo, "Caio Prado e a formação étnica do Brasil", Ana Karla Pontes propõe analisar a visão do autor em relação a formação étnica do Brasil, mais especificamente no livro Formação do Brasil Contemporâneo (1942). Como salienta Fernando Henrique Cardoso

    O enfoque da obra está na relação entre a Colônia e a Metrópole [...] em vez de perder-se na discussão estéril e falsa sobre a qualidade ‘feudal’ das instituições coloniais ou sobre a réplica moderna do mesmo equívoco – o que existiu um modo de ‘produção escravista’ – Caio Prado traça com segurança o mapa da mina: sem que se compreenda a natureza da economia mercantilista, não se pode entender o sentido da economia colonial [...] e foi a escravidão moderna, isto é, capitalista-comercial, que mercantilizou não a força de trabalho, mas o homem, lucrando no comércio de escravos, e foi como mostram vários autores, através de monopólios régios, dos estancos, que a economia metropolitana se viabilizou [...] (CARDOSO, 2013, p. 145).

    Mas há outros aspectos importantes como a questão étnica, destacada pela autora, que analisa este aspecto da obra, a partir da questão indígena, da contribuição portuguesa e da condição dos negros. No livro Formação do Brasil Contemporâneo, no capítulo em que descreve a vida social e política da Colônia, Caio Prado destaca o caráter heterogêneo da população brasileira, reunidos, segundo ele, por acaso e sem outro objetivo senão a realização de uma vasta empresa comercial

    [...] três raças e culturas largamente díspares, de que duas, semibárbaras em seu estado nativo, e cujas aptidões originárias ainda se sufocaram, fornecerão o contingente maior: raças arrebanhas pela força e incorporadas pela violência da colonização [...] cuja única escola foi quase sempre o eito e a senzala. (PRADO JR., 2001, p. 341).

    No sexto artigo "A formação do Brasil contemporâneo de Caio Prado Junior e sua atualidade", Angelo Girotto e Djaniro Acipreste analisam o livro A formação do Brasil Contemporâneo, que, publicado em 1942, segundo os autores, ainda se mantém como referência para a compreensão do Brasil. Como afirmam os autores, Caio Prado Junior recorre ao passado colonial, usando a abordagem dialética ao relacionar as condições do passado e o reflexo de suas conclusões na atualidade. Para eles

    O Sistema colonial, pare a fórceps esse rascunho de nação, totalmente e fortemente engendrado da necessidade mercantilista, oferecendo um mínimo de visão social orbitando em torno dos interesses na metrópole, sendo através deste processo de colonização que o Brasil estabelece seus pilares de unidade cultural e social diferente, sem conseguir romper com os parâmetros europeus, hegemônicos no mundo ocidental, busca determinar que o sentido da colonização brasileira que foi de servir à produção de bens totalmente voltados para o mercado externo, ditados pelos interesses e rentabilidade da Coroa.

    É de se destacar que, ao tratar do sentido para colonização, para os autores, Caio Prado Junior (2011)

    É um dos primeiros, se não o primeiro intelectual, a aplicar a teoria Marxista na análise da história do Brasil, portanto sendo necessárias algumas elucidações iniciais ao seu conceito propriamente dito, embora Octávio Brandão seja tido como o primeiro a usar o método de Marx em Agrarismo e Industrialismo (1925) tendo como cenário a conjuntura histórica do Brasil nos anos 1920.

    No sétimo artigo, A revolução brasileira: uma análise a partir de Caio Prado Jr. e Florestan Fernandes, Daniele Gomes de Lima pretende contribuir para a recuperação da importância da discussão teórica em torno da viabilidade histórica da transformação social partindo Caio Prado Jr. e Florestan Fernandes,

    [...] visto que nos oferecem elementos [...] para entendermos o desenvolvimento econômico, político e social a partir da forma particular pela qual o modo de produção capitalista se realiza no Brasil e sua posição subalterna no sistema capitalista mundial.

    Para isso, a autora opta pela perspectiva marxista que se fez necessária para a apreensão do sentido da revolução brasileira, pois como afirmou Lênin, o marxismo não é nada mais do que a análise concreta de situações concretas. E ambos permitem avançar na análise da realidade brasileira como forma de subsidiar a prática política revolucionária.

    O oitavo, nono e décimo artigos tratam de Celso Furtado, um dos mais destacados pensadores brasileiros do século XX⁹. Autor de vasta obra, uma das mais importantes foi o livro Formação econômica do Brasil (1959), no qual formula uma interpretação do Brasil a partir da construção de uma complexa relação entre teoria e história. Analisa as transformações internas da economia brasileira desde o período colonial, comparando com os Estados Unidos, evidenciando alguns mecanismos específicos da sociedade escravista brasileira. Entre outros aspectos, qualifica a economia do Brasil nos séculos XVI e XVII como economia escravista de agricultura tropical, e no período pós-abolição da escravatura e início da República, a formação de um mercado interno e a dinâmica que levaria o país à industrialização e ao desenvolvimento, destacando as diferenças entre a produção colonial (escravagista) e a cafeeira (fundamentalmente em São Paulo e Rio de Janeiro), com a redução da mão de obra e o trabalho assalariado, com a importante presença de imigrantes, que levaram a mudanças em todo o processo produtivo.

    No oitavo artigo, "Ocupar e espoliar: colonização e desenvolvimento nas Américas a partir da perspectiva furtadiana", Pedro Henrique Alcântara, tendo como referência Formação econômica do Brasil (1959) de Celso Furtado, analisa outro aspecto: as diferenças econômicas no processo de colonização entre as colônias do Sul e as do Norte do continente americano e os impactos dos modelos econômicos, revelando quais os elementos impeditivos de um e estimuladores em outro no processo do desenvolvimento econômico, a colonização do continente para o sistema de comercio mundial, o modelo de exploração colonial (tendo como exemplo o caso do Brasil) e as características das colônias de povoamento do Norte.

    No nono artigo, A Transição Industrial Brasileira Segundo Celso Furtado, de Leon Karlos F. Nunes, também tem como referência o livro Formação Econômica do Brasil (1959) de Celso Furtado, mas faz outra leitura: trata-se da interpretação sobre o processo de industrialização do Brasil. Para o autor, os elementos que compõem essa obra ligam o desenvolvimento econômico do Brasil a uma perspectiva de processo histórico, o que permite entender cada contexto como expressão de múltiplas determinações e também resgata a economia para o escopo de uma ciência social – um esforço relevante numa época em que o afã tecnocrata do neoliberalismo tenta a todo custo transformá-la numa ciência exata, distante da história e da política. Nunes vai elencar os aspectos mais relevantes da análise furtadiana da industrialização brasileira e mostra a contribuição de outros estudiosos sobre o tema e destaca a influência de Keynes¹⁰ no pensamento de Celso Furtado.

    O décimo artigo é de David Soares de Souza: O desenvolvimento do capitalismo no Brasil e o passado como proposta de futuro: leituras de Florestan Fernandes e Celso Furtado, em que procura mostrar como o Brasil se estrutura econômica e socialmente a partir do processo de efetivação do trabalho assalariado e do lugar ocupado pelos negros escravizados na transição e consolidação deste modelo. Para o autor, embora surgido como expansão do capitalismo, o Brasil não era, necessariamente, capitalista, uma vez que participou durante séculos do processo de acumulação de capital no Ocidente por meio de práticas que não se coadunam com a forma moderna de exploração, a saber: a compra e venda da força de trabalho. Essa concepção se contrapõe à de Caio Prado Junior para quem o Brasil é capitalista desde a origem, vinculando à aparição do capitalismo a esfera da circulação, que teria ocorrido entre 1500 e 1700. A referência para a leitura do autor são os livros Formação Econômica do Brasil (1959) de Celso Furtado e A Integração do Negro na Sociedade de Classes (1964) e Revolução Burguesa no Brasil – Ensaio de interpretação sociológica (1975) de Florestan Fernandes.

    Um dos grandes intelectuais do Brasil no século XX foi Antonio Candido, autor de vasta obra, e uma delas, considerada uma das mais importantes, é Os parceiros do Rio Bonito: Estudo sobre o caipira paulista e a as transformações dos seus meios de vida, publicado em 1964 pela editora José Olímpio. O livro resulta de uma tese de doutorado em Ciências Sociais defendida pelo autor em outubro de 1954 na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo. A obra está dividida em três tópicos: o estudo dos meios de vida do caipira paulista (a pesquisa foi feita no município de Bofete) numa perspectiva histórica, ou seja, a vida caipira tradicional, desde o Brasil colônia; na segunda parte, o momento em que realizou a pesquisa (tempo presente no final dos anos 1940 e início dos anos 1950) e por fim uma análise dos processos de mudança, no qual, entre outros aspectos, defende a necessidade de uma reforma agrária. Para ele, houve uma mudança substantiva na vida do caipira, na qual a subordinação de uma economia de autossuficiência anterior para uma economia capitalista resultou numa crise social e cultural, com impactos significativos na vida do caipira e de sua cultura.

    É desse livro que tratam o décimo primeiro e décimo segundo artigos. No décimo, José Cláudio da Silva Vasconcelos destaca a influência de Max Weber na construção da obra. No artigo "Antonio Candido e a influência weberiana: o caso de Os Parceiros do Rio Bonito", demonstra como ele foi influenciado por Max Weber e, mais especificamente, no que concerne à ascese religiosa:

    Max Weber focaliza as sociedades capitalistas mais complexas compostas por indivíduos escolarizados e mais qualificados, enquanto Antonio Candido trabalha com uma sociedade mais simples e formada por caipiras (interior de São Paulo).

    Para o autor é evidente a correlação entre ascetismo religioso e aquisição capitalista pelos integrantes dessas distintas sociedades: em Weber, essa ascese religiosa se vincula ao protestantismo; em Candido, ela contém orientação católica.

    No décimo segundo artigo, A questão agrária no ‘Parceiros do Rio Bonito, de Antônio Cândido, e o diálogo com Caio Prado Junior, Cesar José de Oliveira faz uma análise comparativa entre as obras, destacando suas afinidades quanto à questão agrária, e mais particularmente quanto à defesa de ambos de uma reforma agrária. O artigo analisa as três partes da obra (a vida caipira tradicional, a situação presente, e análise da mudança), destacando os aspectos mais relevantes que estabelecem a interface com a questão agrária. Como diz o autor

    Para Caio Prado Junior, a questão agrária brasileira é caracterizada pela elevada concentração da propriedade da terra. É ela que impõe a intensa exploração da força de trabalho e, por conseguinte, proporciona baixíssimo nível de acesso aos bens materiais e culturais produzidos pela humanidade e destaca que onde predomina uma estrutura fundiária caracterizada pela concentração da terra, geralmente, há elevada oferta de mão de obra, precárias condições de trabalho e sub-remuneração. Nessas condições, o agente que demanda mão de obra encontra bastante espaço para impor as regras que lhes são mais favoráveis nas relações de trabalho.

    Em relação ao livro de Antonio Candido, embora o enfoque não seja especificamente a questão agrária, é possível estabelecer um diálogo com Caio Prado Junior na medida em que em ambos, apresentam muitos aspectos que propiciam uma análise sobre a realidade agrária.

    Assim, desde a colonização, com o uso intensivo do trabalho escravo, e mesmo depois da proclamação da República, que não altera substancialmente à situação dos pobres e excluídos, a estrutura agrária e as relações sociais de produção em geral e de trabalho, continuaram como afirma o autor do artigo

    [...] marcadas pela exclusão de uma significativa parcela da população rural do acesso à terra, por relações de trabalho de superexploração, pelo predomínio da miséria e pela falta de perspectivas dignas para os deserdados do campo.

    Daí que tanto Caio Prado Junior (então membro do Partido Comunista do Brasil) como Antonio Candido (docente na Universidade de São Paulo) defenderem uma reforma agrária como uma necessidade para propiciar condições de vida digna aos agricultores (as) excluídos das dinâmicas econômicas em curso no Brasil. E o aspecto relevante em relação a essa temática é que passados quase sete décadas, a questão agrária brasileira, apontada por Caio Prado Junior e Antonio Candido permanece como um problema a ser solucionado.

    O décimo terceiro artigo é de Larissa Nunes Paiva, que em O caráter de classe e raça no Brasil: reflexões sobre a integração do negro na sociedade discute o caráter de classe e de raça no Brasil e, mais especificamente quanto ao negro, tendo como referências os livros Casa Grande & Senzala (1933) de Gilberto Freyre, Formação do Brasil Contemporâneo (1942) de Caio Prado Junior e A integração do negro na sociedade de classe (1964) de Florestan Fernandes.

    O décimo quarto Um olhar sobre O Povo Brasileiro: formação e sentido do Brasil de Darcy Ribeiro, de Robson Vasconcelos Carvalho, trata de uma obra inspirada metodologicamente pelo materialismo histórico e dialético de Karl Marx. Como diz o autor do artigo, Darcy Ribeiro que considera esta a sua obra principal, debruça-se sobre sua gente, sua cultura e formação étnica, histórica e econômica, e aponta os caminhos para a superação dos males causados pelas raízes coloniais, contribuindo assim com apontamentos para que o país siga a sua verdadeira vocação, inserida nos contextos da América Latina e do mundo.

    No prefácio do livro, Darcy Ribeiro afirma que o concebia como síntese de estudos anteriores,

    [...] com todas as ambições de ser um retrato de corpo inteiro do Brasil, em sua feição rural e urbana, e nas versões arcaica e moderna, naquela instância que, a meu ver, era de vésperas de uma revolução social transformadora.

    A tentativa seria a de formular uma teoria geral, cuja luz nos tornasse explicáveis em seus próprios termos, fundada em nossa experiência histórica. Para ele,

    [...] as teorizações oriundas de outros contextos eram todas elas eurocêntricas demais e, por isso mesmo, importantes para nos fazer inteligíveis. Nosso passado, não tendo sido o alheio, nosso presente não era necessariamente o passado deles, nem nosso futuro comum. (RIBEIRO, 1995, p. 13).

    Segundo Darcy Ribeiro

    Nos faltava, por igual, uma tipologia das formas de exercício do poder e militância política, seja conservadora, seja reordenadora ou insurgente [...] efetivamente, falar de liberais, conservadores, radicais, ou de democracia e liberalismo e até revolução social e política pode ter sentido em outros contextos: no nosso não significa nada, tal a ambigüidade com que essas expressões se aplicam aos agentes mais diferentes e às orientações mais desconexas". (RIBEIRO, 1995, p. 15).

    Para ele

    [...] faltava ainda teoria da cultura que seja capaz de dar conta da nossa realidade, em que o saber erudito é tantas vezes espúrio e o não saber popular alcança, contrastantemente, altitudes críticas, mobilizando consciências para movimentos profundos de reordenação social. (RIBEIRO, 1995, p. 15).

    Para Darcy Ribeiro o que faz dos brasileiros um povo novo, mas nesse sentido o

    Novo porque surge como uma etnia nacional, diferenciada culturalmente de suas matrizes formadoras, fortemente mestiçada, dinamizada por uma cultura sincrética e singularizada pela redefinição de traços culturais dela oriundos. (RIBEIRO, 1995, p. 17).

    Ou seja, uma gente nova,

    [...] um novo gênero humano diferente de quantos existam. Povo novo, ainda porque é um novo modelo de estruturação societária, que inaugura uma forma singular de organização socioeconômica, fundada num novo tipo de escravismo e numa servidão continuada ao mercado mundial.(RIBEIRO, 1995, p. 17).

    Essa servidão, no entanto, faz também do brasileiro um povo velho, no sentido em que se conforma como um proletariado externo, como um implante ultramarinho de expansão europeia que não existe para si mesmo, mas como um provedor colonial feito para gerar lucros exportáveis para o mercado mundial.

    Então, qual a nossa singularidade?

    Do ponto de vista da cultura e da sociedade, somos conformados como herdeiros de uma tradição civilizatória europeia ocidental, com coloridos herdados dos indígenas americanos e dos negros africanos, residindo aí a singularidade dos brasileiros em relação aos portugueses. (RIBEIRO, 1995, p. 17).

    A unidade étnica brasileira recebeu o que ele qualifica como três forças diversificadoras: a ecológica, a econômica e a da imigração, distinguindo-os como caboclos (Amazônia),sertanejos (Nordeste), crioulos (litoral) caipiras (Sudeste e centro) e gaúchos (Brasis sulinos), e caracteriza o povo brasileiro como uma etnia nacional, um único povo, um povo-nação reunido num estado uniétnico.

    Analisando historicamente o Brasil, ressalta quanto às velhas classes dirigentes, um dos seus grandes méritos, talvez o único mérito indiscutível, foi manter a unidade nacional, derrotando movimentos separatistas. No entanto, destaca que esse processo só foi possível por meio de lutas cruentas, de um continuado genocídio e de um implacável etnocídio contra negros e indígenas. Para ele,

    Essa unidade resultou de um processo continuado violento de unificação política, logrado mediante um esforço deliberado de supressão de toda identidade étnica discrepante e de repressão e opressão de toda tendência virtualmente separatista. (RIBEIRO, 1995, p. 20).

    O livro O povo brasileiro tem a intenção de contribuir para a compreensão do Brasil:

    [...] primeiro, pela análise do processo de e gestação étnica que deu nascimento aos núcleos originais que, multiplicados, vieram a formar o povo brasileiro. Depois, pelos estudos das linhas de diversificação que plasmaram os nossos modos regionais de ser. E finalmente, por via da crítica do sistema institucional, notadamente a propriedade fundiária e o regime de trabalho – no âmbito do qual o povo brasileiro surgiu, cresceu, constrangido e deformado. (RIBEIRO, 1995, p. 23).

    Como destaca o autor do artigo, Darcy Ribeiro detalha o processo de mestiçagem que resulta na formação multicultural brasileira, no que ele chama de criatório de gente, onde se formaram os Brasis: crioulo, caipira, sertanejo, caboclo e os sulinos. De igual modo, o artigo narra o passo a passo do violento desenvolvimento econômico e social, dentro do que Darcy Ribeiro chama de moinho de gastar gentes, a partir dos ciclos do açúcar, ouro, algodão, café, borracha, gado e agricultura. O modus operandi deste moinho tem bases no escravismo, latifúndio, catolicismo e monocultura. Destaca a empresa Brasil, formada por raízes agromercantis, tecnológicas e industriais, com a formação de classes dominantes empresariais, burocráticas e militares. O resultado, ao longo dos séculos, é um povo que é novo, pelas variantes culturais e velhos, por ser um implante ultramar. Mesmo assim, como diz o autor, melhor do que poderia ser uma nova Roma, por ser tropical e possuir vocação e destino de líder continental.

    No que diz respeito à descoberta e colonização do Brasil, mostra que não fomos descobertos, mas achados, invadidos ou conquistados, pois já se considerava a existência da terra nova, e mostra como tais processos, de maneira contínua, violenta e não-deterministas sofreram dialeticamente influências por meio de diferenciações (ecológica, econômica e de imigração) e homogeneização (via efeitos de urbanização, industrialização, comunicação de massa, tecnologia e ideologia).

    No décimo quinto Formação do capitalismo e da burguesia e do Brasil: breves considerações, Juliana Carla da Silva Góes faz algumas considerações gerais

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