Sorrisos Amarelos: Histórias de jovens mulheres orientais no Brasil
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Sorrisos Amarelos - Marina Yukawa
www.eviseu.com
LIVRO-REPORTAGEM
APRESENTAÇÃO
Sorrisos Amarelos: histórias de jovens mulheres orientais no Brasil é um livro-reportagem que narra as histórias de cinco jovens mulheres descendentes de orientais que vivem no Brasil — especificamente na região metropolitana de São Paulo — e que sofrem, ou já sofreram, violência, assédio e preconceito devido ao estereótipo que carregam por suas origens.
A partir das histórias dessas mulheres orientais, escancaram-se os problemas específicos que elas vivem: como são vistas, o que se espera delas, o que é imposto para elas e do que são limitadas simplesmente por serem mulheres orientais. Trata-se de um universo envolto em passividade, subserviência, submissão, fragilidade, amabilidade, comedimento e pureza. Também são consideradas um tipo de mulher a ser experimentado.
Para tratar de histórias tão íntimas e humanas, o estilo jornalístico formal de texto teve que ser abandonado, dando lugar ao modo intimista de narrar próximo da literatura, mas sem deixar de preservar os fatos. Com isso, pretende-se conseguir capturar com sensibilidade a essência de cada uma das personagens, seus sorrisos e suas lágrimas, além de gerar empatia e sensibilidade no leitor para problemas corriqueiros, porém velados. Sorrisos amarelos são sorrisos forçados, que escondem sofrimento, assuntos pouco abordados até então e que merecem respeito e muito tato.
Espera-se instigar reflexões sobre o tema e sobre a vida das mulheres orientais no Brasil, e mostrar que elas podem viver histórias similares, mas que são únicas em suas individualidades. As personagens contaram suas próprias experiências em longas conversas — mais que entrevistas — e puderam expor seus sentimentos e reações diante dos casos de violência e preconceito que vivenciaram.
Em Romancista como Vocação, Haruki Murakami diz que para criar personagens de um romance, é necessário olhar com cuidado e atenção as pessoas, enfim, tudo à volta. E refletir sobre tudo. Falei ‘refletir’, mas não há necessidade de julgar as coisas (...)
¹. E, tão próxima do romance, a autora foi ouvinte e confidente de cada uma das personagens, preocupada em assimilar suas imagens para ser capaz de reproduzi-las em narrativas. Não havia necessidade de chegar a conclusões sobre as trajetórias e escolhas de cada uma. Refletir é o mote: gerar empatia, solidariedade e ternura através das palavras.
1 MURAKAMI, Haruki. Romancista como Vocação; p. 64. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2017.
PRÓLOGO
Escrever é como tomar um banho frio num dia de verão dos trópicos. O corpo quente e suado pede por um refresco, mas hesita diante da água gelada. Seu desejo é de meter o corpo todo na ducha e misturar sua matéria à da água, mas quando avança para fazê-lo, a espinha arrepia e você volta atrás. Estica o pé, sente a temperatura, se encolhe, tremendo. Tenta então o braço, sonda, espera que o quente e o gelado se tornem um. Enrola. Vai e volta, até que, mais tempo, menos tempo, se entrega à água.
Aconteceu o mesmo com as histórias daqui. Quis ouvi-las, saber delas e contá-las. Ansiei por isso, ao mesmo tempo que temi por elas. Temi encará-las, enfrentá-las e materializá-las em palavras, invenção que nunca conseguirá — por mais que tentemos e insistamos — expressar com totalidade e exatidão aquilo que vivemos, sentimos e sofremos. Deito os dedos curtos e gordos sobre o teclado, a chuva de palavras por vezes jorra vigorosa, por vezes se resume a uma garoa inofensiva. Escrever é reescrever, é brigar com a água gelada que seu corpo febril tanto deseja e tanto rejeita. É jogar fora os sedimentos que acompanham as enxurradas de palavras, aparar, lapidar, enxugar o corpo finalmente fresco e arrepiado que sai do banho. Nossas toalhas nem sempre são macias e fofinhas. Depois que entramos no banho, relutamos em sair.
É difícil falar do outro. Vivemos em mundos particulares e somos extraterrestres uns dos outros. Caminhar por terras longínquas e desconhecidas — histórias e vivências alheias — faz meu estômago embrulhar de ansiedade. A mudança de gravidade faz o passo fraquejar e meu corpo parece não ser mais meu. As paisagens do outro mundo, tão diferentes do meu, me encantam e me assustam ao mesmo tempo. São ótimos quadros, mas como pintá-los? Os olhos não parecem suficientemente precisos; os ouvidos não ouvem como deveriam. São muitas coisas para olhar, muitas coisas para lembrar. A memória falha.
Mais difícil que falar do outro é falar de si mesmo. É difícil falar de mim. O planeta em que habito é familiar somente até certo ponto. Nas planícies, conheço de cor cada tom de verde, cada nuance, cada particularidade do solo onde durmo e acordo todos os dias. Conheço os seres que habitam as florestas, converso com eles. No entanto, distantes montanhas escabrosas e mares tenebrosos jamais explorados, cercados por nuvens negras e trovejadas assustadoras, são partes de mim complicadas de descrever, ou mesmo de entender.
É preciso falar de mim, entretanto. É através dos meus olhos falhos e dos meus ouvidos imprecisos que as histórias são aqui contadas. Sensibilidade e racionalidade minhas que escolhem, recortam e selecionam acontecimentos, palavras e sensações de outras pessoas. E as minhas escolhas, recortes e seleções estão ancoradas nos acontecimentos, palavras e sensações que eu já vivi. Portanto, falo um pouco de mim. De mim, exatamente, não. Mas de uma pessoa muito