Notas Sobre a Lei de Improbidade Administrativa
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Sobre este e-book
Dividida em quatro partes, a obra analisa os aspectos da improbidade assim como o seu alcance, indicando ainda as produções normativas anteriores à lei de regência. Aborda também o aspecto material da conduta, apresentando as diferentes modalidades de improbidade previstas, em conexão com os entendimentos das Cortes Superiores.
Em seguida, examina a ação judicial de improbidade administrativa, sua natureza jurídica, seu procedimento, a fase preliminar, a petição inicial, a sentença e todos os demais aspectos processuais. Em sua parte final, o livro trata da aplicação das sanções, do estudo destas em espécie, além de uma coletânea dos principais julgados em ordem cronológica.
A obra é indicada para agentes públicos em geral, advogados, estudantes de Direito e todos aqueles comprometidos com a integridade das instituições públicas.
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Notas Sobre a Lei de Improbidade Administrativa - Thiago de Oliveira Corrêa
Editora Appris Ltda.
1ª Edição - Copyright© 2017 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.
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COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO DIREITO
Dedico este livro aos meus pais, Estevo e Cristina,
por todo o apoio e amor dispensados.
APRESENTAÇÃO E AGRADECIMENTOS
Os atos desregrados cometidos dentro da administração pública comprometem a integridade e a segurança de toda a sociedade. Cuidar com zelo do que é de todos, além de uma imposição constitucional, precisa ser o sentimento condutor de todo agente público.
A Lei de Improbidade Administrativa é a norma produzida para combater os atos ilegais no exercício da função pública, sendo que todos os seus postulados são guiados para esse fim. Os diversos posicionamentos do STF e STJ, ligados tanto ao aspecto material quanto à esfera processual da lei, nos impulsionaram a escrever esta obra. Nela, tentamos vincular ao máximo cada assunto ao pensamento mais atual das Cortes.
Agradeço a Deus, pela inspiração e pelo cuidado permanente.
Agradeço ao mestre e professor Alex de Araújo Pimenta, competente procurador municipal e incentivador desta obra. Agradeço também à querida Dra. Marlene da Silva, combativa procuradora-geral do município de Itatiaia, pelos preciosos ensinamentos. Agradeço a todos que compõem a Procuradoria do município de Itatiaia.
Agradeço a toda a minha família, em especial aos meus pais, a minha querida esposa, Michele, a minha amada filha, Sophia e aos demais familiares, sempre carinhosos e atenciosos.
Agradeço a todos os meus amigos, em especial ao grande parceiro Rodrigo Dias Coelho, pelos ensinos desde a época da faculdade.
Dedico um especialíssimo agradecimento ao meu irmão, Marcos Estevo, por sempre embarcar nos meus projetos, com conselhos e suporte.
À Editora Appris, assim como à equipe que acompanhou e auxiliou na confecção deste trabalho, agradeço pela confiança depositada e pelo carinho dispensado.
E agradeço a você, querido leitor. É um privilégio poder compartilhar este estudo preparado com empenho e seriedade. Obrigado pelo voto de confiança em adquirir nosso humilde trabalho.
Ótima leitura!
PREFÁCIO
Foi com grande satisfação e responsabilidade que aceitei o convite para prefaciar a obra Notas sobre a Lei de Improbidade Administrativa do colega Thiago de Oliveira Corrêa, competente advogado e minucioso pesquisador em uma área de tanta importância para o desenvolvimento social que é o Direito Público.
Ética, moralidade, honestidade, probidade ou quaisquer outros termos que vão ao encontro do inalienável respeito à propriedade pública material ou imaterial há muito vinham sendo destacados no campo teórico ou, tão somente, no plano mais jusfilosófico do dever ser, sem que de fato se tornassem centrais nas preocupações cotidianas de grande parte dos administradores públicos e da população. Com isso, subsistem resquícios de um passado não muito distante, em que uma boa gestão era assim classificada, primordialmente, por seus resultados visíveis, minimizando-se os caminhos legais e éticos para se atingi-los.
Após a promulgação da Carta Cidadã em 1988, refletindo a pluralidade de sentimentos inerentes aos inúmeros atores que a idealizaram, surgiram novos esforços no sentido de promover uma sociedade efetivamente calcada em universais e modernos valores republicanos. Exemplo disso é o fortalecimento das instituições de controle, a reafirmação da relação independente e harmônica entre os Três Poderes e, sobretudo, a determinação para que fossem aperfeiçoados importantes instrumentos de empoderamento cidadão, inclusive junto à administração pública.
A partir daí podemos citar evoluções legislativas decorrentes dos princípios constitucionais administrativos, expressos no artigo 37 – legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, inserido um pouco depois, o da eficiência – como as que regulamentaram o acesso às informações públicas, a responsabilidade fiscal, as licitações e contratos, o conflito de interesses no exercício de cargo ou emprego público, o processo administrativo, bem como a responsabilização administrativa e civil das pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração, a conhecida Lei Anticorrupção.
Nessa esteira, o ordenamento jurídico brasileiro passou a contar também com a Lei Federal n.º 8.429, de 2 de junho de 1992, a conhecida LIA – Lei de Improbidade Administrativa –, instrumento já reconhecidamente eficaz para auxiliar no atingimento de uma nova ordem político-administrativa, diga-se, tão almejada pela sociedade brasileira contemporânea.
É justamente sobre essa lei, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional, que a obra em apreço apresenta de forma detalhada, porém sem perder a objetividade, um aparato dos aspectos mais relevantes, úteis a estudantes e profissionais do Direito que buscam não apenas um competente manual para consulta, mas uma obra imparcial, fidedigna aos entendimentos dos tribunais pátrios e dos maiores doutrinadores da área.
O primeiro capítulo situa o leitor quanto à evolução legislativa no combate à improbidade administrativa e ao alcance do termo, fazendo ainda uma necessária distinção entre as consequências administrativas, civis, criminais e até políticas de atos ilícitos que, de alguma forma, atingem o erário.
Por sua vez, o segundo capítulo coincide com o de mesmo número da lei em questão e disseca as condutas caracterizadoras de improbidade administrativa, abordando cuidadosamente os elementos relevantes e controversos dos artigos 9º, 10, 10-A e 11, que tratam, respectivamente, dos atos que acarretam enriquecimento ilícito, dos que trazem prejuízos ao erário, dos oriundos de concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário, bem como daqueles que violam os princípios administrativos.
No mesmo capítulo, são várias as outras questões que merecem a atenção dos interessados pelo tema e, em especial, dos gestores e operadores do Direito integrados aos entes públicos e, até mesmo, privados – que se relacionam com o Estado. Para que o leitor tenha uma breve noção da seriedade e da complexidade dos temas tratados na obra, pedimos licença para citar uma das teses mais intrigantes abordadas pelo autor: o dano in re ipsa junto ao erário. Por ela, os agentes envolvidos em uma dispensa de licitação indevida estão sujeitos às penalidades da LIA, sem que os cofres públicos tenham experimentado prejuízos efetivos com o ato, bastando a mera presunção.
Ainda no Capítulo II, não foram regradas as linhas para abordar o que há de mais relevante quanto ao dinamismo dos entendimentos relacionados ao nepotismo, à responsabilidade dos pareceristas, à necessidade do elemento subjetivo para as condutas descritas nos artigos 9º, 10-A e 11, à aplicação da lei em tela quando da malversação de bens e recursos públicos destinados às Organizações da Sociedade Civil, por força de parcerias, bem como aos atos de improbidade decorrentes de concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário.
O Capítulo III faz as vezes de um prático manual, dedicado à compreensão dos procedimentos administrativos e judiciais necessários para que sejam aplicados os preceitos instituídos pela mesma lei.
Finalmente, o quarto capítulo traz as sanções e as regras de prescrição. Nele, didaticamente o autor iniciou a abordagem pelas consequências e gradações sancionatórias, então definidas na lei em função de cada uma das condutas elencadas. O estudo conserva-se ilustrado de posicionamentos concretos e paradigmáticos adotados pelo Judiciário, dentro de cada uma das sanções previstas em âmbito civil, administrativo e político.
Portanto, sem dúvidas, é uma obra ímpar, idealizada por quem acompanha e estuda a fundo a realidade dos entes administrativos, constantemente envolvidos em inúmeras controvérsias permeadas nos estreitos limites entre a legalidade e a probidade dos seus agentes no trato das coisas públicas.
Parabéns ao autor pelo esmerado trabalho de pesquisa e à editora pela percepção de que estamos diante de um trabalho que muito tem a acrescentar à sociedade e ao Direito.
Ao caro leitor, mais do que uma boa leitura, desejo ótimas reflexões.
Alex de Araújo Pimenta
Professor Universitário
Mestre em Direito (Unisal-SP)
Especialista em Direito Público e em Sociologia (UGF-RJ)
Autor do livro O Bem Comum na Perspectiva Previdenciária, lançado em 2016 pela Editora Appris
Procurador municipal, de carreira, junto ao Resenprevi – Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Município de Resende-RJ
Sumário
CAPÍTULO 1
ALCANCE DO TERMO IMPROBIDADE
CAPÍTULO 2
ATOS CARACTERIZADORES DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
CAPÍTULO 3
A AÇÃO JUDICIAL POR ATO DE IMPROBIDADE. OS ELEMENTOS PROCESSUAIS
CAPÍTULO 4
SANÇÕES e REGRAS DE PRESCRIÇÃO
REFERÊNCIAS
ANEXO
JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA
CAPÍTULO 1
ALCANCE DO TERMO IMPROBIDADE
Sumário: 1.1.Alcance do termo. 1.2. Improbidade e ilegalidade. 1.3. Improbidade administrativa, crimes contra a administração pública e corrupção. 1.4. Disposições constitucionais e infraconstitucionais. 1.5.Histórico das normas constitucionais e infraconstitucionais relativas à improbidade. 1.6. A constitucionalidade da Lei nº 8.429/92.
1.1 ALCANCE DO TERMO PROBIDADE
A palavra probidade origina-se do latim probitas e probus, significando "integridade de caráter; honestidade; honradez; retidão¹". Há, portanto, incutida na própria estrutura da palavra, o sentido moral caracterizador de um indivíduo honrado, íntegro.
Podemos dar os primeiros contornos jurídicos do tema, baseando-nos na obra de José Afonso da Silva, para quem "a improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem²". Falar em improbidade é, principalmente, falar em imoralidade. A moralidade é algo inato ao exercício da função pública, sendo uma ideia interna, subjetiva, pois todo agente público se pauta por valores próprios, inerentes a sua personalidade.
A moral administrativa não se confunde com a moral social, pois aquela produz efeitos jurídicos, que atingem toda a sociedade. Não obstante, como bem afirma Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
Não é fácil estabelecer distinção entre moralidade administrativa e probidade administrativa.A rigor, pode-se dizer que são expressões que significam a mesma coisa, tendo em vista que ambas se relacionam com a ideia de honestidade na Administração Pública. Quando se exige probidade ou moralidade administrativa, isso significa que não basta a legalidade formal, restrita, da atuação administrativa, com observância da lei; é preciso também a observância de princípios éticos, de lealdade, de boa-fé, de regras que assegurem a boa administração e a disciplina interna na Administração Pública³.
Essas palavras, quanto à dificuldade de se estabelecer distinções ao termo, encontram eco na doutrina:
Há, na doutrina e na jurisprudência, uma dificuldade enorme de se estabelecer os contornos distintivos entre improbidade administrativa, crime de responsabilidade, crime funcional e infração político-administrativa. Isso é compreensível, já que tais categorias apresentam sentidos muito aproximados e, em alguns casos, fundem-se e se confundem. Além disso, o legislador, muitas vezes, utilizou-as afastado de um necessário e saudável rigor técnico⁴ [...].
Quando o agente público se desvia da honestidade, ética, boa-fé etc. valores que devem estar internalizados nas condutas públicas⁵, ele incorre em imoralidade. Esses desvios, quando ligados ao serviço público, caracterizam a improbidade administrativa. Em suma: a improbidade administrativa é um ato praticado por agente público, ou por particular em conjunto com agente público, e que gera enriquecimento ilícito, causa prejuízo ao erário, concede benefício fiscal de forma irregular ou atenta contra os princípios da administração pública.
O administrador probo é aquele que possui retidão de conduta, atendendo às exigências de honestidade, lealdade e da boa-fé. A prática da improbidade administrativa é, então, uma desonestidade qualificada. Nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho:
A falta de moralidade administrativa pode afetar vários aspectos da atividade da Administração. Quando a imoralidade consiste em atos de improbidade, que, como regra causam prejuízos ao erário público, o diploma regulador é a Lei nº 8.429, de 2/6/1992, que prevê as hipóteses configuradoras da falta de probidade na Administração⁶ [...].
Falar que um agente público é probo é afirmar que essa pessoa tem honradez e integridade no seu dia a dia. Tanto a probidade quanto a moralidade integram a ciência do dever-ser e, na esfera da administração pública, orientam o comportamento dos agentes.
Dentro do Direito administrativo pátrio, cada autor escolhe uma forma de conceituar a atitude desonrosa que deságua em improbidade. Alguns doutrinadores limitam o tema à ciência do Direito, isto é, aos princípios jurídicos da administração pública, afirmando que a probidade seria um subprincípio da moralidade administrativa.
Wallace Paiva Martins Júnior⁷ considera que ímprobo é o agente desonesto, que se utiliza da Administração Pública para angariar [...] vantagens em detrimento do interesse público, atuando com menosprezo aos deveres do cargo
.
Já na visão de outros autores, para alcançar a completude da definição, faz-se necessário beber de fontes diferentes. Por exemplo, Luiz Alberto Ferracini⁸ afirma que a ciência da moralidade abrange princípios e conclusões mais amplos, sendo um poder criado a partir das exigências racionais da natureza humana. Para ele, a improbidade revelaria uma qualidade humana que não atende ao bem comum, agindo com indecência e falta de caráter, tornando-se um ato tido como amoral
.
Mas todos concordam que as condutas que a Lei tenta coibir trazem, em regra, algum prejuízo, sempre conectado ao exercício da função pública e em desfavor do interesse público primário. E desde os escritos de John Locke em sua famosa obra Dois Tratados do Governo Civil, a ideia de rechaçar condutas que trazem prejuízos já se fazia presente, ainda que timidamente. O pensador inglês alertara sobre a necessidade de se combater qualquer atentado que fosse leviano ou maldoso e que se dirigisse contra a liberdade e a propriedade das pessoas.
O gestor público não é proprietário dos bens que administra. A ele não é dada a possibilidade de dispor desses bens como lhe convenha. Cabe-lhe, sim, praticar atos administrativos revestidos de motivação válida, com benefícios para toda a coletividade.
Voltando aos ensinos de Maria Sylvia Zanella Di Pietro⁹, a ilustre professora afirma que a improbidade encerra lesão à probidade e à moralidade administrativa, acrescentando que, quando tratada como infração, a improbidade ganha um sentido mais extenso e preciso, abarcando os atos imorais ou desonestos, assim como os atos ilegais. Aduz ainda que, na Lei nº 8.429/92, a violação à moralidade seria apenas um dos aspectos da improbidade.
Importantes também são as palavras do professor Diogo de Figueiredo Moreira Neto¹⁰ quanto ao alcance do termo probidade e da Lei nº 8.429/92:
Este dever, simplesmente de probidade, ou de probidade administrativa, como se lê na Constituição (art. 37, p. 4°), vem a ser a particularização do dever ético geral de conduzir-se honestamente (honeste vivere).O referido mandamento constitucional prevê lei federal (Lei n° 8.429, de 02 de junho de 1992), que define os atos de improbidade administrativa, simples e qualificados (9°, 10 e 11) e estabelece penas específicas, independentemente das cominadas em outros diplomas. Trata-se de outro dever comum, que assume maior rigor quando se trate de servidor público, que terá bens públicos sob sua guarda e a seu uso, assim como poderá ter interesses de repercussões patrimoniais, ora mais ora menos importantes, sob sua esfera de decisão. A honestidade funcional se impõe sobre todos os aspectos e a cada instante, jamais devendo aproveitar-se o servidor das prerrogativas funcionais e das atribuições em que está investido para obter vantagens para si próprio ou para terceiros, a quem pretenda favorecer. Além das penalidades disciplinares, quase sempre de grau extremo, aplicadas em caso de quebra desse dever, estão ainda previstas consequências políticas, de suspensão de direitos políticos; administrativas, de perda da função pública; civis, de indisponibilidade dos bens e de ressarcimento ao erário, e criminais, pois se tipificam vários ilícitos, como o peculato, o emprego irregular de verbas ou rendas públicas, a concussão, a corrupção passiva, a facilitação de contrabando ou descaminho e a prevaricação. Existe obrigatoriedade legal de declaração de bens e rendas para o exercício de cargos, empregos e funções públicos, de investidura temporária ou permanente, conforme mencionado, visando dar transparência ao dever de probidade (Lei n°. 8.730, de 10 de novembro de 1993).
Ademais, a noção de bem comum parece estar intimamente ligada ao que se pretende proteger quando a Lei de Improbidade Administrativa apresenta as condutas proibitivas.
Nas palavras gabaritadas do professor Alex de Araújo Pimenta¹¹:
O Estado deve ter como objetivo primordial a promoção do bem de todos ou do bem comum. É isso que justifica a sua existência, quer a Constituição formal o diga, ou não
. A Carta Cidadã, embora somente utilize a expressão bem comum explicitamente uma única vez, no artigo 225, quando abre o capítulo sobre o meio ambiente, bem, aliás, universal e de relevância ímpar para a sobrevivência dos seres humanos, é repleta de preceitos em que se percebe essa concepção... Desde os próprios fundamentos dos direitos sociais, até em preceitos que aludem essencialmente ao direito privado, como o direito à propriedade, notamos a sua presença, por exemplo, ao conjugá-la com sua função social (artigos 5º XXII e XXIII).
Assim, o dever de cuidar da coisa pública é sempre absoluto para o gestor, fundamentando o princípio da indisponibilidade do interesse público.
Isso significa, ainda, que a conduta daquele que trata do que é público precisa estar fundada nos princípios administrativos, especialmente nos que foram elencados pela Constituição Federal (chamados de Princípios Administrativos Constitucionais Explícitos): legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
1.2 IMPROBIDADE E ILEGALIDADE
Frequentemente, a palavra improbidade liga-se à própria noção de ilegalidade. Na história, as sociedades mais civilizadas valem-se do vocábulo ilegalidade para reprimir as ações contaminadas por desonestidade e deslealdade, eventualmente cometidas por seus agentes públicos. Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça já esclareceu que os conceitos de improbidade e de ilegalidade não se misturam. Conforme salientou o ministro Napoleão Nunes Maia Filho¹², as condutas que levam à ilegalidade e à improbidade não são conexas, pois trazem significados diversos. A improbidade é uma ilegalidade qualificada pelo intuito nocivo do agente, pois esse atua com desonestidade.
Assim, quando o agente pratica um ato ilegal, nem sempre terá cometido um ato ímprobo. Para um ato ilegal ser caracterizado como um ato de improbidade é necessário que seja praticado com desonestidade, malícia, dolo ou culpa grave.
Ao interligamos a improbidade aos princípios norteadores da administração pública, destaca-se o princípio constitucional da moralidade, como bem informado por Cleber Mason¹³:
Com efeito, o bem jurídico que a Lei de Improbidade (Lei 8.429/1992)busca salvaguardar é, por excelência, a moralidade administrativa que deve ser, objetivamente, considerada: ela não comporta relativização a ponto de permitir só um pouco
de ofensa. Daí não se aplicar o princípio da insignificância às condutas judicialmente reconhecidas como ímprobas, pois não existe ofensa insignificante ao princípio da moralidade. Vige, em nosso sistema jurídico, o princípio da indisponibilidade do interesse público, a que o Poder Judiciário também está jungido.
Na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, encontramos a ratificação das palavras do ilustre promotor, anteriormente referidas¹⁴:
REsp 892.818/RS. Relator: Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma. Data do julgamento: 11/11/2008, publicado no Dje em 10/02/2010. Como o seu próprio nomen iuris indica, a Lei 8.429/92 tem na moralidade administrativa o bem jurídico protegido por excelência, valor abstrato e intangível, nem sempre reduzido ou reduzível à moeda corrente. A conduta ímproba não é apenas aquela que causa dano financeiro ao erário. Se assim fosse, a Lei da Improbidade Administrativa se resumiria ao art. 10, emparedados e esvaziados de sentido, por essa ótica, os