As Relações de Gênero nas Lendas Folclóricas Brasileiras do Século XXI
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Sobre este e-book
Este estudo apresenta relevância científica porque poderá contribuir para melhorar as teorias da Educação, dos Estudos Culturais e de Gênero. A sua relevância social se atém ao fato de envolver temas atuais, controversos, pouco estudados e em permanente construção, incentivando o professor a ser também um pesquisador e trabalhar os recursos audiovisuais (vídeos) como estruturadores do currículo, e não apenas como material de apoio pedagógico. O livro é recomendado para professores, educadores, alunos e todos aqueles que se interessam sobre estudos de gênero, e apresenta-se como referência para outros níveis e modalidades da educação escolar, podendo se adequar conforme o nível da educação a ser estudado e favorecer o desenvolvimento de novas habilidades e destrezas para o contexto social contemporâneo em constante transformação, revelando-se como uma excelente opção de estudo.
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As Relações de Gênero nas Lendas Folclóricas Brasileiras do Século XXI - Maria Lúcia Araújo da Rocha
Editora Appris Ltda.
1ª Edição - Copyright© 2018 do autor
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.
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COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO, TECNOLOGIAS E TRANSDISCIPLINARIDADE
Dedico aos meus filhos, Martha, Marco Antonio e Allan, aos meus netos, ao meu esposo, Américo, e a todos aqueles que se interessarem pelo referido estudo.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a DEUS por ter me guiado e inspirado na realização deste livro, aos meus pais, professores (em especial ao Prof. Dr. Carlos Estephanio), colegas, familiares, amigos e àqueles que, de algum modo, contribuíram direta ou indiretamente para a publicação desta obra.
APRESENTAÇÃO
Sempre que me proponho a escrever algo, me convenço de que também deixo marcas de mim, do que sou, do que sinto ou do que pretendo ser. As marcas do que sou refletem os valores internalizados dentro de mim e que foram construídos no decorrer do tempo, seja pela minha família, meu contexto social, pela escola ou pela igreja que frequentei/frequento. Também pelos tantos escritos que li ou leio ou pelos filmes, novelas e desenhos animados a que assisti ou assisto na TV. Alguns valores foram repassados como verdadeiros, porém, muitas vezes necessitei ou necessito desconstruí-los para construí-los novamente. As marcas do que sou, sinto e do que pretendo ser, simbolizam o meu comportamento que é retratado por intermédio de meus gestos que me identificam como uma, duas ou mais formas de ser mulher.
Em uma dessas formas pelas quais me identifico, por vezes, vem a indignação ao observar o que gostaria que fosse transformado e que ainda não pude fazê-lo. Nesse sentido, o que observo no contexto ao qual estou inserida me torna sensível, por às vezes e, de algum modo me sentir injustiçada. Tomando como referência essa capacidade de indignação diante do que se apresenta como uma relação desigual de gênero, principalmente, no contexto educacional é que surgiu a ideia de enveredar pelos estudos das relações de gênero. Além do entendimento de que sempre estou a me questionar diante dos desafios que me cercam e que exercem ou exerceram influência em minha vida de esposa, mãe e profissional.
Desde muito cedo e, sem entender o motivo diante de situações que me inquietavam, já havia uma iminente preocupação com as questões voltadas para a condição à qual a mulher é submetida. O meu olhar volta-se para as posturas heteronormativas com as quais aprendi a conviver desde muito cedo por meio dos valores familiares repassados de que as meninas não podiam brincar com os meninos. Porém, mesmo assim, eu e outras meninas brincávamos com os meninos o jogo de bola de preso
no pátio da escola. Participei da banda marcial da escola do sexto ao nono ano que era em sua maioria, composta pela figura masculina. Em relação ao uso das cores, sempre ouvi e achava natural as cores determinadas para homens e mulheres. A cor azul era para menino e o cor de rosa para menina, muito embora eu lembre de que a cor do enxoval de um dos meus primos foi rosa e eu sempre questionava o motivo dessa escolha. Na escola, nas filas para o recreio, existia a fila dos meninos e a fila das meninas e eu não entendia também o motivo dessa separação.
Fazia leituras dos artefatos culturais – Gibis – nos quais nas histórias, havia clubes masculinos que impediam a entrada de meninas, o que alimentava a teoria de que a menina era um ser inferior ao menino e não devia estar no mesmo espaço que eles. Além disso, assistia aos episódios de desenhos animados – representados por famílias tradicionais denominadas de heterossexuais pelo fato de cada uma ser composta por um homem e uma mulher e os filhos gerados desse casamento, representando bem a família típica do século XX, diferentemente de algumas famílias do século XXI. Nesses mesmos desenhos, um dos personagens masculinos se apresentava em conflito com o outro, por não respeitar as diferenças
do outro, chamando-o de nanico
, devido à sua baixa estatura. Mesmo assim, o desenho fazia um apelo à violência contra os animais, em que eles sempre se queixavam do trabalho que executavam. Também, na adolescência, fazia leituras de fotonovelas em revistas, assistia a novelas no rádio e posteriormente na TV, por meio de histórias de amor com um final feliz,
enquanto me preparava para casar e cursar o magistério. Este, que conforme a minha família era um trabalho de mulher
, porque você além de ser professora, também poderia exercer o papel de dona de casa
, estabelecendo assim, o meu papel como mulher na sociedade. O que reafirma a feminização do magistério,
ainda tão em evidência, mesmo naquele momento já tendo passado 30 anos de sua estabilização no Brasil.
Cursei o magistério, lecionei no referido curso com a denominação de normal médio e ainda como professora do curso presenciei (no meu contexto) a sua extinção. O que se torna evidente, na contemporaneidade, é que, mesmo com as novas orientações pedagógicas surgidas no decorrer do tempo, a feminização do magistério
se faz presente e de maneira muito resistente, na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental.
Quando de minha graduação em Letras, sempre me via tentada a fazer análise do discurso de charges, tidos como humorísticos e que versavam sobre mulheres. Na verdade, estavam travestidos de humor, porém apresentavam estereótipos de gênero, em que sempre se encontrava uma forma de debochar da condição feminina por meio do riso. Um discurso que, quando legitimado, passava/passa a circular na cultura como verdadeiro. Observa-se que a mulher vive a conquistar o seu espaço na sociedade, porém, quando ela avança nas suas conquistas, quase sempre, acaba sendo ridicularizada a partir de práticas institucionais
nas relações entre os sujeitos
, sociedade e também pela mídia. O que significa que as conquistas femininas são consideradas avanços nos modos como elas se apresentam na sociedade e os recuos são as formas estereotipadas como elas são representadas. Avanços e recuos causados por discursos reacionários de instituições que ainda prevalecem na sociedade contemporânea e que são veiculados pela mídia. Muitos embates ainda serão travados para que a mulher possa sair dos limites da família e seja um agente transformador da sociedade e da história em igualdade com o homem.
Educada para ser uma garota bem-comportada
, que deveria fazer o magistério e ser preparada para o casamento, já sentia que deveria seguir o mesmo caminho das mulheres da família. O que de fato ocorreu, e eu me identifiquei com o magistério, tendo iniciado minha carreira profissional ainda muito jovem, como professora do ensino fundamental e posteriormente do ensino médio, no curso do normal médio e do ensino superior, em curso de formação de professores.
Assim como a vida profissional, a vida pessoal exerceu/exerce influência na constituição de minhas identidades, porque não possuo apenas uma, não represento uma só mulher e sim, várias mulheres
. Na vida pessoal sempre em diálogo e discussões sobre temas educacionais por estar sempre rodeada de professores na família e no contexto social. Como professora do ensino fundamental já me preocupava com os conteúdos ofertados às crianças. No trato com os temas transversais, muitas vezes não concordava com o conteúdo de algumas histórias infantis, porém não entendia como contestá-los porque ainda não tinha a consciência de que, além de ser profissional, eu teria também que ser uma pesquisadora, ser uma professora reflexiva. O que pude fazer, ainda como professora de um curso do normal médio, lecionando Disciplinas Pedagógicas, sempre atenta às diferenças
visualizadas entre as turmas, assim como nos materiais didáticos ofertados aos professores em formação, no Laboratório de Apoio Didático – LAD –, sempre utilizado.
Torna-se necessário assistir a filmes, vídeos com desenhos animados, ler livros paradidáticos com histórias infantis, revistas, entre outros, para trabalhar a transdisciplinaridade e despertar um novo olhar para que professores(as) em formação possam ter um novo entendimento do contexto em que estão inseridos. Fazer parceria com universidades, unindo os fundamentos de uma disciplina e outra, transcendendo e perpassando-as, no sentido de compreender a realidade educacional e os problemas mais complexos da contemporaneidade, não vislumbrando apenas o conhecimento de uma determinada disciplina, mas a aquisição de um conhecimento mais amplo. Assim, cria-se um profissional melhor preparado para atender as necessidades do século XXI e com capacidade para concorrer no competitivo mercado de trabalho contemporâneo.
Movida pela curiosidade e por me sentir instigada a investigar temas atuais e controversos e pouco estudados no currículo, como os referentes aos estudos de gênero, foi que me senti motivada a realizar este estudo, sendo constituída por meio de traços que trago da família e de outras pessoas com as quais convivi e convivo e que revela essas múltiplas identidades que carrego.
Para enveredar nos estudos de gênero há necessidade de uma preparação mais adequada e atualizada do professor, o que requer que ele(a) seja também um pesquisador(a). O que envolve disposição e compromisso por parte deles(as), além de um maior investimento no capital humano por parte de órgãos oficiais. Mesmo no entendimento de que o governo não tem poupado esforços nessa ordem, ainda assim, há necessidade de que haja ampliação nos investimentos em cursos de Formação de Professores.
Acrescidos a esses fatores o enfoque é dado à disposição e curiosidade dos professores para exercer também o papel de pesquisadores. Muitas vezes, esses se deparam com alguns conteúdos que causam estranhamento e que são disponibilizados em materiais pedagógicos para cursos de formação. Materiais que às vezes, circulam sem maiores preocupações com o público ao qual vão ser direcionado, tampouco com os valores que repassam e que, às vezes, passam despercebidos. O que pode acarretar em consequências negativas na aprendizagem de crianças que estão em fase de formação e que deve ser questionado.
Essas influências negativas observadas nos conteúdos de artefatos culturais, como filmes, vídeos de desenhos animados, entre outros, costumam representar diferenças voltadas para classe, etnia, gênero, relações de poder e estereótipos. Nestes, quase sempre, há uma legitimação de desigualdades, tanto no que está explícito quanto no que está implícito. O que não impede que possam ser recriados a partir de novos olhares e em tempos distintos.
O contexto contemporâneo remete ao desafio de pensar que o currículo deva ser um lugar de pesquisa, em que professores e alunos busquem compreender questões a serem resolvidas, na perspectiva de mudanças sociais, desenvolvendo novas habilidades e destrezas exigidas em uma sociedade em permanente transformação. Para que sejam preenchidas essas lacunas no campo profissional, é necessário que se possa utilizar de estratégias que se contraponham a conceitos preestabelecidos, já internalizados e que necessitem ser desconstruídos. Nessa perspectiva há necessidade de que o professor possa ser conhecedor de novos saberes, apropriados às exigências da educação do século XXI, na necessidade de aprender a se deparar com incertezas em meio a certezas.
Entender as representações e deslocamentos de identidades femininas faz ver que, à proporção que a vida social vai sendo intermediada pela globalização de estilos, lugares, imagens da mídia (dentre outros), mais as identidades vão sendo fragmentadas. Uma análise cultural na defesa da igualdade de direitos entre homens e mulheres introduzida na educação brasileira por meio de pesquisadores resulta em novas possibilidades teóricas, analíticas e metodológicas em diversas áreas e disciplinas, na introdução da mídia escrita e televisiva na educação e no currículo. O que contribui para um estudo mais amplo do currículo, de modo que se possa transcender o que se pensa e diz, na escola ou em outros espaços educacionais.
Este livro é o resultado de uma pesquisa com as perspectivas teóricas de estudiosos como Stuart Hall, Guacira Louro, Foucault, entre outros e na análise de conteúdos de imagens em artefatos culturais visuais de desenhos animados disponibilizados como material para serem utilizados como estruturadores do currículo. Estes, disponibilizados na TV ESCOLA, a partir de vídeos para o Programa Nacional de Formação Continuada em Tecnologia Educacional (ProInfo Integrado) com uma série
de cinco lendas folclóricas brasileiras. Estas que, em alguns de seus conteúdos representam produções de verdades construídas pela cultura na geração de relações desiguais de gênero. São identificadas identidades fixas femininas com valores que carecem de ser desconstruídos. O fato de se desconstruir visões femininas estereotipadas vem a favorecer o autoconhecimento e a compreensão do sujeito na desconstrução de diferenças.
São análises de imagens do sujeito feminino e também do masculino, que, em suas representações, ora recuam, ora avançam, em relação ao tempo atual. Analisam-se as formas como o gênero feminino é representado por meio de traços do contexto em suas diversas formas. Não há um entendimento de que haja uma forma hegemônica de se viver as feminilidades, assim como as masculinidades, sendo importante transcender às posturas hegemônicas, no sentido de compreender como são fixadas as polaridades e as relações de poder nelas estabelecidas em uma atenção ao fato de que, a essas relações de poder precedem atribuições de diferenças. Ainda, é estabelecida referência a um poder que circula e se encontra nas práticas institucionais, assim como nas relações entre os sujeitos, não sendo fixo.
Ao trazer esse jogo de poder das representações de feminilidades, vislumbraram-se considerações de Hall, de que estas sempre se encontram