Balanço Instável Do Coração
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Balanço Instável Do Coração - Ana Isabel Fonseca
saudade
Nem sempre o amor
O amor nem sempre chega de repente. Nem sempre basta virar numa esquina, cruzar os nossos olhos com outros olhos e PUM!, já está, seta do cupido em cheio nas entranhas. Às vezes, o amor requer tempo, paciência, respeito. Às vezes, é preciso construí-lo como a uma casa (com chão, parede e teto) e depois decorá-lo (com camas, tapetes e cadeiras).
Uma vez na vida, se tivermos sorte, conhecemos alguém que muda todas as regras do jogo. Colocamos em causa o que tomávamos por certo, o que sabíamos e não sabíamos, o que somos e não somos, o que sentimos e como agimos. Uma vez na vida, se tivermos sorte, esse alguém fica. Com ele aprendemos que nem tudo é simples e plano e que o mundo pode ter as formas que nós quisermos.
Crescemos, evoluímos, experimentamos; pela primeira vez, vivemos .
E sse alguém nem sempre chega de repente. Às vezes, já lá está, mesmo ao nosso lado, à distância de um toque, de um olá, queres tomar um café. Às ve zes, esquecemo-nos, passamos por ele sem dar importância, mas está la, à espera, paciente e oportuno como só o destino é.
Nós não sabemos, mas devemos agarrar esse alguém com toda a força, pois nem sempre se repete a oportunidade. A vida surpreende-nos, mas, às vezes, só nos surpreende uma vez e nós não sabemos se o que vai, volta.
O meu alguém não surgiu de repente. Não bati com ela numa esquina nem reparei nela por acaso no meio de uma multidão. Já aqui estava, sempre aqui esteve. Ao meu lado, atrás de mim, à minha frente. Sorridente, carinhosa, atenta. Tão constante que quase não dei por ela, ate que PUM!, a seta acerta-me em cheio. Depois de tanto tempo, sem como e sem porquê, sem certos ou errados. Este amor foi construído lentamente, sem pressa, incerto e tímido como quem brinca, mas tem medo de partir. Construí-lhe casas, jardins e muralhas. Sem saber, construí-lhe castelos na areia, castelos no ar, castelos nas nuvens, castelos em mim.
Este amor não me surpreendeu num dia qualquer mas apanhou-me desprevenida, veio de lado, de cima, de frente, do ar, da chuva, do vazio, e atingiu-me em cheio onde mais dói.
Depois disso, deixou de importar que horas são, se é noite ou faz calor, e para que servem palavras como estas.
Estavas aqui, mas não te chamei. Encontrei-te, mas não te procurava. Vieste, mas não te pedi.
Construíste também uma casa para mim? Construíste castelos para este amor? Também te passei despercebida? E agora? Vês-me agora como eu te vejo?
O amor nem sempre surge de repente.
O meu sempre esteve aqui.
Não vi.
Agora vejo.
Não vás.
Obsessão
Obsessão: s.f., do latim obsessio, -onis, cerco, assédio, bloqueio, peri go iminente; importunação perseverante; perseguição diabólica; ideia fixa; preocupação contínua.
Atirei o dicionário para o chão. Ela disse que eu estou obcecado, mas eu sei que não. Como pode a paixão que eu sinto ser comparada a uma perseguição diabólica? E como pode ela pensar isso de mim?
Talvez lhe tenha telefonado demasiado ultimamente… Talvez lhe tenha batido à porta de madrugada mais do que uma vez... Talvez a tenha seguido um dia ou outro… Talvez tenha pedido a amigos em comum para intercederem por mim junto dela... Talvez…, mas isso faz de mim um obcecado? Um louco? Porquê? E não será o amor sinónimo de loucura?
A verdade é que não suporto a sua ausência. Magoa-me regressar todos os dias a uma casa silenciosa e vazia, dói-me acordar e não a ver ao meu lado, a sorrir, a olhar para mim.
E o que posso eu fazer? Eu tentei, tentei arrancá-la do meu coração, tentei continuar como se a minha vida não tivesse acabado, como se eu não estivesse morto por dentro!
Mas ela não me quis ouvir… Ela não quis saber. Fui ter com ela, tentei dizer-lhe que sem ela não havia mais nada, que eu sozinho não era capaz, e o que fez ela? Riu-se. Afastou-se de mim e deixou-me sozinho, sozinho sem o seu sorriso