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Funny Games, Michael Haneke, Contracinema!
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E-book173 páginas1 hora

Funny Games, Michael Haneke, Contracinema!

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Sobre este e-book

Este livro lança um olhar analítico sobre o consumo de imagens de violência por entretenimento na sociedade contemporânea. O ponto de partida dá-se com o longa-metragem Funny Games (1997), dirigido pelo cineasta austríaco Michael Haneke (1942-), que fez com que o autor Thiago Henrique Ramari sentisse "[...] um desconforto crescente, um incômodo que não demorou a se aproximar do limite do insuportável".
IdiomaPortuguês
Data de lançamento16 de set. de 2020
ISBN9786555230871
Funny Games, Michael Haneke, Contracinema!

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    Pré-visualização do livro

    Funny Games, Michael Haneke, Contracinema! - Thiago Henrique Ramari

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO

    Aos meus pais, Valdir e Roseli.

    Prefácio

    Quando convidado para escrever o prefácio deste livro, fiquei emocionado. Digo isso pois é um privilégio escrever um texto que apresente um trabalho que vi nascer, crescer e se transformar. Em outras palavras, traduzir a forma como tudo se desenvolveu é creditar com olhos testemunhais os afetos, os encantos e o labor do qual resulta a publicação desta obra.

    Foi nos cafés e nos debates após sessões de cinema que vi o autor Thiago Henrique Ramari esboçar os primeiros contornos do que viria a ser o seu projeto de pesquisa para o mestrado. Em nossas conversas, Thiago apresentava o seu interesse pela obra do cineasta austríaco Michael Haneke, com o primor de quem entende a linguagem do cinema e, portanto, sabe como desenvolver uma leitura cinematográfica. Benny’s Video, La Pianiste, Caché, Amour, Das weiβe Band, enfim, toda a cinematografia do cineasta promove inquietudes, mas é Funny Games que captura a sensibilidade e o olhar de pesquisador de Thiago. Ele mesmo aponta, na introdução deste livro, o quanto o filme o incomodou e criou um estado de dúvida que o mobilizou à reflexão.

    Com formação em Jornalismo, um senso disciplinar apuradíssimo, uma escrita invejável e um rigor em tudo o que se propõe a fazer, Thiago esboçou seu projeto de pesquisa quando era aluno especial do Programa de Mestrado em Comunicação da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Vi Thiago preparar a apresentação de um artigo para o Encontro Nacional de Pesquisa em Comunicação e Imagem (Encoi), em novembro de 2014, na mesma universidade ­– sua intenção era clara: impressionar um candidato a orientador para conquistar uma vaga definitiva no Programa de Pós-Graduação. Nessa apresentação, lançou as primeiras dúvidas, os primeiros delineamentos e as primeiras impressões do que viria a desenvolver posteriormente: uma leitura contracinemática de Funny Games.

    Ainda em 2014, Thiago foi aceito para o mestrado na UEL e começou a trilhar o caminho teórico e metodológico da sua pesquisa. Um fato interessante é o de que, enquanto pesquisava sobre contracinema, percorreu um caminho paralelo, devido às primeiras leituras que fez de Gilles Deleuze, Maurice Blanchot e Michel Foucault. Nesse trajeto, ele encaixava aspectos teóricos desenvolvidos pelos três filósofos às configurações fílmicas de Funny Games, criando problemas, encontrando respostas e preenchendo lacunas, em um exercício analítico muito refinado. Um dos destaques dessa produção paralela é a apresentação que ele fez do artigo "O olho vendado no buraco da fechadura: a supliciante experiência com o fora em Funny Games", durante o Encontro Anual da Associação de Investigadores da Imagem em Movimento (AIM), que ocorreu na Universidade Católica Portuguesa, na cidade do Porto, em Portugal, em 2016. Viajamos juntos para o país ibérico e, portanto, assisti a tudo de perto.

    Ao mesmo tempo, o contracinema pulsava em Thiago. O referencial teórico, pouco discutido no Brasil, encontrava espaço na pesquisa dele. Várias vezes, quando ia visitá-lo em Londrina, escutava seus apontamentos sobre essa escola cinematográfica. Meu entendimento sobre o assunto era mínimo, mas via ali um conceito interessante, algo novo. E tudo isso ao som de Maria Bethânia ou de Adriana Calcanhotto, cujos LPs e CDs sempre foram trilhas sonoras onipresentes no apartamento de Thiago. Essa forma intensa, de uma pessoa com apurado referencial teórico e uma vontade de fazer o melhor, é que demarca o meu amigo. Isso se reflete, inclusive, na relação que ele tem com o próprio Michael Haneke: sabe-se que poucos são os pesquisadores brasileiros que conseguem a autorização de cineastas para usar imagens dos objetos cinematográficos que analisam; e Thiago tem a autorização de Haneke.

    Depois disso, Thiago focou ainda mais nos estudos para terminar a pesquisa. Passou pela qualificação e, um dia, em meados de 2017, recebi o convite para ser o membro externo da banca de sua defesa pública. Nessa perspectiva, é interessante verificar o caminho deste estudo e como Thiago desenvolve o caráter metodológico. Funny Games, Michael Haneke, Contracinema! traz um amplo debate sobre a sétima arte e a violência, a partir do longa-metragem Funny Games e sob o amparo da teoria do contracinema. As conexões são múltiplas e abarcam autores como Peter Wollen, Catherine Wheatley e Susan Sontag, além de clássicos dos estudos cinematográficos, a exemplo de Noel Burch e Ismail Xavier.

    O texto que você terá o prazer de ler é refinado, uma das potencialidades do autor. Como um artesão, Thiago Henrique Ramari traça cada detalhe com um olhar atento, com percepções inovadoras e rigorosas. Nada escapa. Certamente, esta leitura é um convite a desbravar a inquietude de uma mente que pesquisa, que é disciplinar e que, mesmo quando se trata de um assunto polêmico, traduz-se em afetos e poesia.

    Rodrigo Oliva

    Doutor em Comunicação e Linguagens

    Nota sobre as traduções

    Este livro conta com dezenas de citações diretas de pesquisas publicadas em outros idiomas. Para facilitar a leitura, tais excertos aparecem em português no corpo do texto, a partir de traduções que realizei com o máximo de cautela, a fim de me manter fiel ao pensamento dos autores. Mesmo assim, em todas essas situações, notas de rodapé trazem os trechos originais, para eventuais consultas.

    Também são vários os filmes que cito e que analiso ao longo deste livro. Para ser justo com o processo de criação dos realizadores, optei por utilizar o título original dessas obras, independentemente do idioma, no corpo do texto. Em relação às falas de personagens, reproduzi as legendas em português que constam nas edições em DVD comercializadas no Brasil ou ainda em arquivos de vídeo disponibilizados na internet.

    Sumário

    Introdução

    O cineasta e o filme

    O cinema realista clássico

    Percurso das formas (The Hateful Eight)

    Percurso do conteúdo (Apocalypse Now Redux

    Percurso variante: violência (Natural Born Killers)

    Percurso (in)completo: Funny Games

    O contracinema

    Pós-brechtianismo: Wollen e Wheatley

    Funny Games (Parte 2)

    Considerações finais

    Referências

    Filmografia

    Musicografia

    Índice remissivo

    Introdução

    A reflexão que compõe as páginas deste livro levou sete anos para se consolidar. Desde a primeira vez que assisti ao longa-metragem austríaco Funny Games¹, em 2010, até a conclusão do curso de mestrado, em 2017, busquei respostas para as perguntas que primeiro afligiram-me como cinéfilo e depois como pesquisador. Para muitas delas, encontrei ou desbravei caminhos teóricos a fim de esgotá-las. Para outras, é necessário investir mais tempo, ampliar o escopo da pesquisa, abrir e percorrer novas rotas. É nesse longo processo, tanto o já realizado quanto aquele ainda por realizar, que reside a beleza topográfica do grande mapa que chamamos de ciência. Uma frase atribuída ao dramaturgo, romancista e jornalista irlandês George Bernard Shaw (1856-1950) parece resumir tal experiência: a ciência nunca resolve um problema sem criar outros dez.

    O ponto de partida e o principal objeto de análise do trabalho disposto nesta obra é o thriller² Funny Games, do cineasta austríaco Michael Haneke (1942-). Cheguei à versão de 1997 por acaso, com a ajuda da internet, muito antes de pensar em ingressar em um programa de mestrado. Ao assistir ao filme pela primeira vez, fui pego de surpresa: após um quarto de projeção, passei a sentir um desconforto crescente, um incômodo que não demorou a se aproximar do limite do insuportável. Para chegar ao fim, tive mesmo de enfrentar uma vontade progressiva de abandoná-lo. Depois de tantos anos como cinéfilo, censurei-me pela primeira vez por assistir a um filme de cunho violento. Tal experiência também deixou uma pergunta sem resposta: como um thriller conseguiu me causar tanto mal-estar mesmo isolando a maioria das cenas de assassinato naquele espaço para além dos limites da tela, o chamado extracampo no cinema, ao qual nenhum espectador tem acesso?

    Essa pergunta soava intrigante devido ao contexto cinematográfico da década de 1990, quando a primeira versão de Funny Games foi lançada. Naquela época, o mercado contava com numerosas franquias dos gêneros de thriller e terror (visto, de modo geral, como um thriller mais violento), que atraíam multidões às salas de projeção justamente porque mostravam mortes de maneira explícita. Dentre as mais populares estão A Nightmare on Elm Street, Child’s Play, Friday the 13th, Halloween e Scream. Eu já havia assistido a várias delas, sem sentir qualquer espécie de mal-estar. Ao contrário, o medo que provocavam era contornado pelo prazer, havia algo de bom naquilo tudo, era até possível rir após alguns momentos de sustos. Tal cenário remonta, de acordo com Nogueira (2010, p. 37), a uma revisão do Código de Produção da indústria cinematográfica realizada nos anos 1970, por meio da qual uma vaga de filmes marcados por uma maior liberdade na apresentação explícita de situações de extrema violência viria a tornar-se incontornável.

    Descobri mais tarde, durante a pesquisa, que a diferença entre os efeitos provocados por Funny Games e pelas franquias supracitadas era somente a ponta do iceberg. O impacto que o longa-metragem de Haneke causara sobre mim contrariava mais profundamente o longo trajeto percorrido pela indústria do entretenimento desde que o medo social da morte acidental e prematura começou a inspirar toda a sorte de espetáculos. De acordo com Singer (2004), esse medo, nomeado suspense, era produto de duas transformações germinadas durante a idade moderna: uma delas socioeconômica, que contempla as mudanças tecnológicas que marcaram, sobretudo, a passagem do século XIX para o século XX; e a outra neurológica, acerca das novas experiências perceptivas que essas inovações proporcionaram à população, inicialmente nas grandes cidades do Ocidente.

    Para uma melhor compreensão desse contexto histórico, devo dividi-lo em dois momentos. No primeiro, o suspense, entendido como um medo circunscrito na vida real, disseminou-se pelas cidades mais modernas entre os séculos XIX e

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