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O LEITOR E ALGUMAS LEITURAS
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O LEITOR E ALGUMAS LEITURAS
E-book174 páginas2 horas

O LEITOR E ALGUMAS LEITURAS

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Sobre este e-book

Os exercícios de leitura desta coletânea confirmam que o ato de ler engendra um pacto entre o texto, o autor e o leitor. Esse ato pede um mergulho no universo textual. A leitura de texto literário, mais que a leitura informativa, sugere ao leitor que mobilize o processo de significação instituído na rede de relações sígnicas, tecida por signos verbais poéticos. Trata-se de uma rede de relações, cuja proposta é a de que o leitor evoque significados daquilo que parece verdade e parece mentira. Assim se constituindo, provoca novas leituras e outras descobertas. É nesse jogo que os cinco capítulos, contidos nesta coletânea, jogam os leitores, desafiando-os. Assim pensando, Divino José Pinto e Lacy Guaraciaba Machado reuniram textos produzidos por mestrandas, suas orientandas no Programa de Mestrado em Letras: Literatura e Crítica Literária da PUC Goiás. São estudos que se vinculam à Linha de Pesquisa Crítica Literária, Tradução e Transcrição
IdiomaPortuguês
Data de lançamento2 de mar. de 2021
ISBN9786558590415
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    O LEITOR E ALGUMAS LEITURAS - Divino José Pinto

    Pinto

    A DANÇA LITERÁRIA EM

    O ADEUS DE TERESA

    Kênia Cristina Borges Dias[1]

    Divino José Pinto[2]

    A leitura é extremamente importante em qualquer momento da vida humana. Sendo assim, faz-se necessário adquirir o hábito e o gosto pelo ato de ler, pois somente por meio de tais ações consegue-se uma nova concepção de mundo. Para a hermenêutica literária, vários fatores devem ser observados. Diante disso, Jakobson (2007) elucida que, para o leitor conseguir analisar a textura sonora da poesia, deve observar e atender a estrutura fonológica da linguagem.

    Para Boris Tomachevski (2013), as normas métricas são importantes para que seja realizada a comparação e a revelação convencional que rege o sistema dos fatos fônicos, os quais são imprescindíveis ao vínculo entre o poeta e o leitor, portanto, ajuda a compreender o projeto rítmico.

    O poema O ‘adeus’ de Teresa deixa acessível o mote da intertextualidade. Nota-se de imediato, no título, a presença do sexo feminino. Percebe-se que o segundo verso causa uma estranheza ao leitor, uma vez que o autor metaforiza e constrói um lirismo convencional e estabiliza Teresa de Castro Alves. O poema conduz o leitor a adentrar em suas particularidades e descobrir inúmeras riquezas. Portanto, a interpretação tem o poder de descobrir a história, isso porque o papel do leitor se realiza, histórica e individualmente, de acordo com as vivências e a compreensão previamente constituída que os leitores introduzem na leitura (ISER, 1996, p. 78), seja na poesia, no romance ou em quaisquer modalidades textuais.

    É comum ao leitor, ir para o texto com a expectativa de que já o conhece, mesmo que apenas previamente, e os imprevistos o conduzem a reformular as expectativas, bem como reinterpretar todas as leituras já realizadas. Em muitos casos, essa ação não é tão simples como se possa imaginar, haja vista que o leitor vai para o texto com suas próprias normas e valores (COMPAGNON, 2010, p. 146). O poema de Castro Alves, O adeus de Teresa, constitui-se no convite inicial para esse exercício de leitura, por meio da qual são destacados traços relevantes do discurso literário.

    O Adeus de Teresa

    Castro Alves

    A vez primeira que eu fitei Teresa,

    Como as plantas que arrasta a correnteza,

    A valsa nos levou nos giros seus

    E amamos juntos... E depois na sala

    Adeus eu disse-lhe a tremer co’a fala...

    E ela, corando, murmurou-me: adeus.

    Uma noite... entreabriu-se um reposteiro...

    E da alcova saía um cavaleiro

    Inda beijando uma mulher sem véus

    Era eu... Era a pálida Teresa!

    Adeus lhe disse conservando-a presa...

    E ela entre beijos murmurou-me: adeus!

    Passaram tempos sec’los de delírio

    Prazeres divinais gozos do Empíreo...

    ... Mas um dia volvi aos lares meus.

    Partindo eu disse – Voltarei!... descansa!...

    Ela, chorando mais que uma criança,

    Ela em soluços murmurou-me: adeus!

    Quando voltei... era o palácio em festa!...

    E a voz d’Ela e de um homem lá na orquestra

    Preenchiam de amor o azul dos céus.

    Entrei!... Ela me olhou branca... surpresa!

    Foi a última vez que eu vi Teresa!...

    E ela arquejando murmurou-me: adeus!

    O poema institui a enunciação manifestada pelo eu lírico, que se expressa na primeira pessoa, uma das qualidades da função emotiva da linguagem. Explicita anseios subjetivos que acarretam emoção e encantamento. Além disso, a musicalidade, o ritmo e as rimas caracterizam-nos também como líricos. Os verbos apresentados no pretérito perfeito do indicativo e a presença de tempos e espaços dão-lhe um caráter narrativo. Cabe mencionar a presença do futuro do presente Voltarei, no 3º quinteto: Partindo eu disse – Voltarei!... descansa!... (ALVES, 1997, p. 53), o mesmo indica uma promessa a ser cumprida, e o imperativo descansa, vem para acentuá-la.

    Cada poeta traz consigo uma bagagem de informações pertinentes ao período a qual pertence, como também características pessoais de cada um. O poema de Castro Alves foi publicado em 1997 no livro Espumas Flutuantes, e o mesmo reflete a sensualidade e o sentimento amoroso do indivíduo adulto, a mulher encantadora, que fascina.

    O esquema rítmico encontrado em O ‘Adeus’ de Teresa é composto por quatro quintilhos de versos decassílabos, sendo onze os versos heroicos, pois possuem a acentuação principal na 6ª e 10ª sílabas (2º, 7º, 8º, 10º,13º,14º, 15º, 17º, 20º, 21º, 22º) e nove são sáficos. Sua acentuação acontece na 4ª, 8ª e 10ª sílabas (3º, 9º, 11º, 16º, 19º e todos os versos que se repetem, ou seja, os estribilhos). Há, também, os versos que possuem uma distribuição rítmica polivalente, tanto na forma heroica quanto na sáfica (5º e 23º), uma vez que eles apresentam cesuras em 4ª, 6ª, 8ª e 10ª sílabas poéticas. As estrofes são separadas por monósticos, versos esses que confirmam os períodos de afastamento dos amantes. Diante disso, é importante ressaltar a importância das normas métricas na análise do poema. Portanto:

    O papel das normas métricas é facilitar a comparação, revelar as características pelo exame das quais podemos avaliar o caráter equipotencial dos períodos do discurso; o objetivo de tais normas é revelar a organização convencional que rege o sistema dos fatos fônicos. Esse sistema é indispensável ao vínculo entre o poeta e seu público, ajuda a compreender o projeto rítmico colocado pelo autor em seu poema. (TOMACHEVSKI, 2013, p. 177).

    Pode-se constatar que as sílabas tônicas se repetem após uma, duas ou mais sílabas átonas, e esse intervalo regulado de sons é que gera a sensação prazerosa ao leitor, portanto, o ritmo precisa agradar aos ouvidos do receptor. No poema de Castro Alves, há a presença de sinérese (entreabriu) e de síncope (co’a), o que Tomachevski (2013) denomina de lipogramático, pois demonstra a preocupação dos poetas quanto à qualidade dos sons no verso, como matéria de um novo problema.

    Segundo Ossip Brink (2013), o movimento rítmico é antecedente ao verso e não se pode compreendê-lo a partir da linha dos versos e somente abarcaremos o verso a partir do movimento rítmico. Sendo assim, ao observar o poema, verificamos que, na 1ª quintilha, o 1º verso, o 2º, o 3º e o 1º monóstico apresentam identidade a partir da última vogal tônica (Teresa – correnteza, seus – adeus), o 4º e o 5º apresentam uma correspondência de sons finais ainda mais perfeita. A partir da última vogal tônica, igualam-se todos os fonemas, vogais e consoantes (sala – fala). O poema é composto de rimas graves (entre oxítonas ou monossílabos tônicos) e agudas (entre palavras paroxítonas), perfeitas (correspondência de sons), emparelhadas nos 1º, 2º, 4º e 5º versos de cada estrofe, alternando-se no 3º com o monóstico, podendo ser representadas por: AABCC. Há presença de rimas ricas (classes gramaticais diferentes) e pobres (mesma classe gramatical), como se pode perceber pela dupla de palavras:

    No verso ‘Adeus’ lhe disse conservando-a presa, percebe-se que o elemento dominante é o eu lírico e o dominado é Teresa, uma vez que o sujeito lírico é o dono da situação, é ele quem decide os momentos de encontro e, até mesmo, as despedidas, enquanto a dominada só chorava, murmurava e soluçava. Nota-se que, na época da produção do poema, o poder de decisão cabia ao homem e, à mulher, somente a obediência. Tomachevski (2013) afirma que o verso livre só tem utilidade pela característica negativa, pois indica a ausência de uma tradição métrica rígida e, portanto, não limita de maneira precisa o número de variações possíveis. Em seu movimento rítmico, o poema rompe com a métrica na construção poética, com as formas nobres, bem como se baseia na violação da tradição.

    A mulher é vista como objeto de prazer, o que pode ser caracterizado pelo uso do gerúndio: corando, beijando, conservando, chorando, arquejando. Empregou-se, também, a oração subordinada adverbial comparativa: Ela, chorando mais que uma criança. Há expressões típicas de natureza romântica: valsa, cavalheiro, orquestra e expressões que enfatizam as sensações: prazeres, delírio, pálida, branca, bem ao gosto do romantismo. Sendo assim, é de suma importância analisar, com mais afinco, elementos simbólicos e metafóricos detectados no poema.

    Simbologia e metáfora no poema

    O poema é uma arte que reflete emoções, sentimentos; é

    uma revelação [...] interior que atravessa abstratamente a realidade perceptível através dos sentidos, é a materialização do desejo de um porto sonhador a traduzir a angústia do poeta à procura do seu próprio ser no mundo. (LIMA, 2012, p. 09).

    O poema tem o poder de influenciar e, para tanto, é necessário conhecer e distinguir significados e significantes. Barthes (2012) assevera que o significado não é uma coisa e, sim, uma representação psíquica da coisa. O poema leva o leitor a refletir sobre a expressão Adeus, destacada entre aspas para acentuar o valor significativo da expressão e também o eu lírico que enfatiza a despedida de Teresa. O termo Adeus, em cada utilização apresenta um valor diferenciado e particular, veja:

    Adeus eu disse-lhe a tremer co’a fala

    E ela, corando, murmurou-me: adeus

    Adeus lhe disse conservando-a presa

    E ela entre beijos murmurou-me: adeus!,

    E ela entre soluços murmurou-me: adeus!

    E ela arquejando murmurou-me: adeus!

    (ALVES, 1997, p. 53)

    A primeira utilização do termo Adeus exibe a intensidade da emoção, o palpitar e – por que não? – o temer; enquanto a segunda dá ao termo a sensação de despedida entre dois namorados, pode-se dizer que é um sinônimo de ‘tchau’ ou ‘até logo’; o murmurar pode ser o não querer dizer o que lhe machucará a alma. Percebem-se recursos expressivos que se mostram nos aspectos sonoros da palavra, o seu sussurro onomatopaico e sua aliteração, o qual confere a feição de enamorada ao termo. O terceiro e quarto emprego do termo adeus demarcam a intensidade do sentimento experimentado diante da separação, da despedida. As últimas ocorrências sugerem o sofrimento pela partida eterna. O ‘adeus’ metaforizado por Castro Alves transcende algo mais significativo que uma simples despedida, pois, sob determinado ponto de vista, a despedida deixou marcas definitivas. A presença do artigo definido ‘o’, gera, como consequência, uma coloração de sentido que confere efeito singular ao sentimento havido entre Teresa e seu amante.

    O termo Adeus empregado no poema é significante que se repete seis vezes, e Chevalier (2016) elucida que esse signo tem muitas acepções; para o autor, o número seis é fundamental na construção do texto, pois ‘seis’

    é o número dos dons recíprocos e dos antagonismos, o número do destino místico. É a perfeição, que se expressa pelo simbolismo gráfico dos seis triângulos equiláteros inscritos num círculo [...] Mas essa perfeição virtual pode abortar e esse risco faz do 6 o número da prova entre o bem e o mal. (CHEVALIER, 2016, p. 809).

    Conforme enfatiza Chevalier, o número ‘seis’ diz respeito às responsabilidades, tanto sociais quanto familiares, do qual emanam vibrações positivas ou negativas. E foi o que aconteceu no poema: um resultado positivo, em primeira instância, e negativo, em segunda. No primeiro momento, Teresa amou e foi amada, porém, posteriormente, foi abandonada. No entanto, ao se realizar no poema, o

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