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Democracia, Covid-19 e Neoliberalismo: o mundo social no pós- pandemia
Democracia, Covid-19 e Neoliberalismo: o mundo social no pós- pandemia
Democracia, Covid-19 e Neoliberalismo: o mundo social no pós- pandemia
E-book149 páginas1 hora

Democracia, Covid-19 e Neoliberalismo: o mundo social no pós- pandemia

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Sobre este e-book

A história do mundo é marcada por surtos de doenças que tomaram grandes proporções, se espalhando por todas as regiões do planeta. A mais recentemente, um surto de pneumonia provocada por coronavírus, relatado pela primeira vez em dezembro de 2019 na província de Wuhan, na China, que apresentou ao mundo um cenário caótico e desafiador, sem precedentes desde o pós-guerra. Este livro analisa as medidas de enfrentamento à covid-19 adotadas por países europeus e latino-americanos, essencialmente os governos da Argentina, do Brasil, da Espanha e de Portugal, à luz da teoria crítica dos direitos humanos, assumindo o pressuposto de que o neoliberalismo foi posto à prova com a crise pandêmica. Desde a década de 1980, o mundo vive em permanente estado de crise e o neoliberalismo - a versão dominante do capitalismo - foi imposto, sujeitando o mundo cada vez mais à lógica do setor financeiro. A pandemia atual não é uma situação de crise claramente oposta a uma situação normal. Tanto os Estados quanto a sociedade civil são hoje geridos pela lógica do mercado, pela lógica do capitalismo. E a pandemia mostra de forma cruel como o capitalismo neoliberal incapacitou os Estados, que não conseguem responder às emergências. A pandemia, portanto, confere pensar a exceção em tempos excepcionais.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento23 de jun. de 2021
ISBN9786525201429
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    Democracia, Covid-19 e Neoliberalismo - Yanne Teles

    CAPÍTULO I - DEMOCRACIA E NEOLIBERALISMO: O MUNDO SOCIAL APÓS O CAPITALISMO NEOLIBERAL

    DEMOCRACIA E NEOLIBERALISMO: CONCEITUAÇÕES

    Diversos acontecimentos recentes, como o plebiscito da Inglaterra, em que a população votou pela saída da União Europeia, a tentativa de acordo de paz entre o governo da Colômbia e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e a eleição de Donald Trump representam – de distintas formas – o crescimento de discursos abertamente autoritários, anti-humanistas e antidemocráticos, inclusive, a partir da utilização de instituições democráticas para combater a própria democracia.¹

    Vê-se, assim, uma fragilização no modelo hegemônico da democracia liberal, o qual enfrenta a sua maior crise global contemporânea, nas mais diversas partes do mundo. Todavia, o fenômeno é contextualizado e analisado, sem se ater devidamente à sua conceituação.

    Nesse contexto, volta-se a discorrer brevemente sobre os conceitos adotados nas discussões propostas ao longo deste livro. Por democracia, a partir de um estudo de teoria crítica, assume-se a definição proferida por David Sánchez Rubio², o qual descreve-a como:

    Por democracia concebemos não só uma forma de governo, mas também um conjunto de ações, conceitos e mediações que têm como objetivo possibilitar o exercício do poder do povo para o povo (demos), através da luta, do protesto e da reivindicação dos membros de uma comunidade ou sociedade. Com a democracia em voga, a cidadania deve assumir sua responsabilidade e o dever de se autogovernar por seus próprios meios. Todo ser humano deve participar diretamente de tudo aquilo que o afeta no âmbito público (e também no privado, mas agora não iremos analisar este âmbito), sem que isto seja incompatível com o apoio complementar de mecanismos de representação. Por isto, esta ideia de democracia se opõe a qualquer descuido da democracia ou do povo, que a restrinja, como única expressão de si mesma, nas mãos de especialistas ou de um número limitado de cidadãos naqueles espaços onde as relações humanas são desenvolvidas e corrompidas em torno do âmbito público. Democracia entendida como prática plural de controle e exercício do poder por parte de cidadãs/cidadãos soberan@s e como forma de vida, não somente concebida como governabilidade. (p. 211).

    Para o autor, a democracia possibilita o exercício do poder, do povo e para o povo, lastreado pela cidadania e pela participação de todos, não limitada a uma parcela de cidadãos – como os políticos, por exemplo, os quais podem estar sujeitos a um ambiente de relações corrompidas e corrompedoras.

    Por sua vez, as definições conceituais do neoliberalismo são tidas, na literatura, como difíceis de serem sistematizadas, tendo em vista os múltiplos sentidos atribuídos ao termo. De modo a historiar a heterogeneidade de acepções, Andrade³ discorre sobre as principais discussões ligadas ao neoliberalismo, dentre as quais, o Colóquio Walter Lippman e a reunião da Sociedade Mont Pèlerin.

    Desde o Colóquio Walter Lippmann (1938) e a reunião da Sociedade Mont Pèlerin (1947), ele marcou mais um campo de debate que um consenso entre seus partidários. Após as reformas liberalizantes de Pinochet no Chile, foi utilizado de forma pejorativa por intelectuais e militantes para denominar, primeiramente, a política econômica sintetizada pelo Consenso de Washington; depois, uma série de fenômenos políticos, ideológicos, culturais e espaciais; por fim, a própria época e seu zeitgeist. Com isso, o termo deixou de designar um debate entre economistas para ser utilizado apenas por seus críticos, muitos deles não economistas, nem acadêmicos, ganhando um uso amplo e vago (PECK, 2010a; BOAS; GANS-MORSE, 2009; VENUGOPAL, 2015)⁴.

    Em razão de seu sucesso e sua imprecisão, o conceito tornou-se alvo de críticas. Ele é quase sempre empregado sem explicações ou, inversamente, em definições muito variadas, designando fenômenos desconexos e por vezes contraditórios (BOAS; GANS-MORSE, 2009; VENUGOPAL, 2015). É apresentado como onipresente, como uma força estrutural invencível; ao mesmo tempo, não há ninguém que se identifique positivamente com ele (VENUGOPAL, 2015; CLARKE, 2008). A pertinência desses argumentos pode ser discutida. Porém, a despeito de eventuais problemas, o conceito tem importância estratégica por se constituir como uma ideia-força capaz de mobilizar atores políticos e permitir uma troca significativa entre acadêmicos e movimentos sociais. Assim, houve nas duas últimas décadas um esforço teórico para elaborar definições mais precisas. (p. 111-112, grifo nosso).

    Conforme apontado por Andrade, salientado em grifo, por mais que represente um conceito antigo, a sistematização das definições teóricas sobre o neoliberalismo somente despontou nas últimas décadas. Ainda para tal autor, no âmbito das ciências sociais, as conceituações seguem duas linhas diferentes, sendo a primeira voltada a explicar o neoliberalismo como uma política de classe com base em uma ideologia que preconiza a mercadorização, financeirização e exploração do trabalho, a qual é defendida por nomes como Marx e Bourdieu. A outra linha por sua vez, sob o viés de Michel Foucault, busca entender a reestruturação do Estado, a partir da explicação das lógicas normativas e institucionais.³

    Nessa linha, tem-se a definição do fenômeno da "economization, descrito como a promoção não apenas da expansão dos mercados per se, mas do modelo de mercado, com a difusão da concorrência, da forma empresa e de técnicas econômicas de avaliação e ranqueamento para esferas da vida fora do mercado"³.

    Ainda nessa segunda corrente de pensamento, tem-se a visão de Fonseca⁵, o qual assume a definição sintética proferida por Dardot e Laval⁶, que descrevem que o neoliberalismo é um sistema ideológico, sócio/político e econômico que influencia as mais diversas arenas da vida em sociedade: da subjetividade individual à organização econômica dos países e, consequentemente, o sistema político.⁵

    GLOBALIZAÇÃO E EXCLUSÃO SOCIAL

    A desigualdade e a exclusão social constituem um fenômeno antigo, que assumiu diversas nomenclaturas no decorrer dos anos⁷. Constituem uma repetição, sob nova roupagem, de fenômenos às vezes bastante antigos⁸ os quais, sob nomes como intolerância, preconceito, discriminação e marginalização, assumem sua presença independente da época ou sociedade em que se analise⁷.

    Esses fenômenos estão intrinsecamente ligados à questão da globalização⁹, sendo esta última entendida como as características atuais do processo de desenvolvimento do capitalismo em nível mundial, enquanto que a exclusão, de forma simples, pode ser definida como a consequência mais visível e imediata da globalização⁹ (p. 170).

    Nesse sentido, há diversas críticas na literatura sobre contextos que buscam unir e integrar a globalização – vista sob a ótica do neoliberalismo – e os fenômenos de exclusão. Dentre estes, tem-se Limoeiro-Cardoso¹⁰, a qual apregoa que:

    A noção de globalidade remete a conjunto, integralidade, totalidade. A palavra ‘global’ carrega consigo esse mesmo sentido de conjunto, inteiro, total. Sugere, portanto, integração. Desse modo, ou por esse meio, o uso do termo ‘global’ supõe ou leva a supor que o objeto ao qual ele é aplicado é, ou tende a ser integral, integrado, isto é, não apresenta quebras, fraturas, ou hiatos. Globalizar, portanto, sugere o oposto de dividir, marginalizar, expulsar, excluir. O simples emprego de ‘globalizar’ referindo-se a uma realidade que divide, marginaliza, expulsa e exclui, não por acidente ou casualidade, mas como regularidade ou norma, passa por cima desta regularidade ou norma, dificultando a sua percepção e mesmo omitindo-a. Consciente e deliberadamente, ou não, a utilização da palavra nestas condições tem exatamente tal eficácia. (p. 106).

    A partir de uma análise semântica dos termos e de suas definições, como aquela proposta por Limoeiro-Cardoso¹⁰, vê-se que, no neoliberalismo, há nítidas incongruências do modelo de desenvolvimento e as possibilidades de minoração ou suplantação das desigualdades. Na verdade, constituem faces antagônicas, se esbarrando – em muitos momentos – na própria nomenclatura atribuída aos termos.

    Como forma de propor uma nova abordagem para o fenômeno, Boaventura de Sousa Santos¹¹ discorre sobre a globalização contra-hegemônica, a qual, na sua opinião, constitui uma oposição à globalização neoliberal, esta sim, centrada na integração e nas lutas contra a exclusão social, capaz de promover uma redistribuição de recursos.

    Designo por globalização contra-hegemônica o conjunto vasto de redes, iniciativas, organizações e movimentos que lutam contra as consequências económicas, sociais e políticas da globalização hegemónica e que se opõem às concepções de desenvolvimento mundial a esta subjacentes, ao mesmo tempo que propõem concepções alternativas. A globalização contra-hegemônica centra-se nas lutas contra a exclusão social. Atendendo a que a exclusão social é sempre produto de relações de poder desiguais, a globalização contra-hegemônica é animada por um ethos redistributivo no sentido mais amplo da expressão, o qual implica a redistribuição de recursos materiais, sociais, políticos, culturais e simbólicos. (p. 7)

    Boaventura de Sousa Santos¹¹ também evidencia que a globalização é oposta à inclusão social, retirando direitos sociais das parcelas mais vulneráveis e marginalizadas da população. Essa ordem social capitalista foi responsável pela emergência, dentre outros, de um fenômeno social conhecido como desperdício social que também exclui essas pessoas de um trabalho assalariado, tendo em vista que não correspondem a um grupo útil para a expansão do capitalismo⁷.

    O MUNDO SOCIAL APÓS O CAPITALISMO NEOLIBERAL

    Inúmeros autores se propõem a tecer ensaios teóricos relacionados a questão do mundo social após o capitalismo neoliberal, dentre os quais, Fariñas Dulce e D’Ambroso¹², os quais relatam que o projeto de tomada do Estado pelo capital impõe-se como um projeto de consequências imprevisíveis. Tais teóricos comungam da proposta de Streeck¹³, de que o mundo social após capitalismo neoliberal é um cenário apocalíptico para humanidade. Será um mundo que dependerá da motivação de um indivíduo em cooperar com outro(s) em um espaço dominado pelo medo e pela ganância¹².

    Aliado à globalização, houve a emergência de um mundo que almeja a desmedida acumulação de capital, proliferando-se, assim, as grandes empresas transnacionais e o monopólio de mercado. Nesse contexto, a dominação se dá a partir da lógica da compra e

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