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Ensaios sobre Direito Público contemporâneo: Temas sobre Direito Penal e Direito Processual Penal
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Ensaios sobre Direito Público contemporâneo: Temas sobre Direito Penal e Direito Processual Penal
E-book388 páginas4 horas

Ensaios sobre Direito Público contemporâneo: Temas sobre Direito Penal e Direito Processual Penal

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Sobre este e-book

No ano em que se comemora os 30 (trinta) anos da Constituição Federal brasileira de 1988, os 70 (setenta) anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e os 50 (cinquenta) anos do curso de Direito da Universidade Regional de Blumenau (FURB), esta obra, contando com a participação de diversos colaboradores, é o segundo dos três volumes que formam a coleção 'Ensaios sobre Direito Público', cuja temática central é Direito Penal e Direito Processual Penal. Sob a coordenação geral de Guilherme Christen Möller e a coordenação temática de Cláudia Fernanda Souza de Carvalho Becker Silva, Livia Solana Pfuetzenreiter de Lima Teixeira, e Raul Ribas, reúnem-se, aqui, o total de 10 (dez) capítulos, cada qual representando um assunto explorado dentro dessa temática central, notadamente, 'O tribunal do júri no Brasil e nos Estados Unidos da América: uma comparação entre modelo', por Cláudia Fernanda Souza de Carvalho Becker Silva e Caroline König, 'Estupro de vulnerável: a possibilidade de relativização da vulnerabilidade do maior de 12 anos e menos de 14 anos, a partir de uma análise doutrinária e jurisprudencial', por Cláudia Fernanda Souza de Carvalho Becker Silva e Raquel Mattos Oliveira, 'A infiltração policial como meio de investigação de prova nos crimes organizados', por Cláudia Fernanda Souza de Carvalho Becker Silva e Thaís Aimêe Dalpiaz, 'Considerações sobre a Lei nº 13.434/2017: uma análise da situação da vedação do uso de algemas em mulheres grávidas durante o parto e em mulheres durante a fase de puerpério imediato', por Cláudia da Rosa Hostin, 'Lei nº13.257/16: a prisão domiciliar como proteção à primeira infância', por Cristiane de Azevedo da Silva, 'Lei nº 13.245/2016 e suas alterações no inquérito policial: sistema inquisitorial, acusatório ou misto?', por Cristiane Caroline Krueger, 'A (in)constitucionalidade da súmula 273 do STJ: ampla defesa, contraditório e celeridade processual', por Diogo Gervásio da Silva, 'Os projetos de ressocialização nos estabelecimentos penais seguindo a LEP: ressocialização X ineficácia', por Ianca Eduarda de Fragas, 'O crime de falsa identidade e o princípio da não autoincriminação', Livia Solana Pfuetzenreiter de Lima Teixeira, e 'Enunciado 99 do FONAJE: um estudo sobre a possibilidade de aplicação nas ações penais públicas incondicionadas no âmbito dos juizados especiais criminais', por Maria Eduarda Haas Coutinho.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento28 de abr. de 2022
ISBN9781526006677
Ensaios sobre Direito Público contemporâneo: Temas sobre Direito Penal e Direito Processual Penal

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    Ensaios sobre Direito Público contemporâneo - Guilherme Christen Möller

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    Cláudia Fernanda Souza de Carvalho Becker Silva

    Caroline König

    INTRODUÇÃO

    O Tribunal do Júri é uma instituição que proporciona a participação popular em algumas decisões judicias. É um modo pelo qual os cidadãos podem demonstrar sua reprovabilidade ou aprovação em relação a determinada conduta na comunidade em que vivem e para a qual querem o bem.

    O Júri foi levado aos Estados Unidos pelos britânicos, ainda no período colonial do país. Com o passar dos anos, a instituição foi se desenvolvendo e divergindo de seu modelo de origem. O direito aos Júris criminal e cível foi consagrado na Constituição norte-americana no ano de 1791. É considerado parte integral da história da nação e um dos principais aspectos de sua sociedade democrática.

    O modelo brasileiro de Júri também tem base no modelo britânico, que se alastrou pela Europa após a Revolução Francesa de 1789. O Júri foi instituído no Brasil por decreto em 1822, fazendo-se presente na Constituição Imperial de 1824. Atualmente, encontra-se consagrado na Constituição Federal, integrando os direitos e garantias individuais, com a competência do julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

    A presente pesquisa, portanto, tem como objetivo proporcionar uma análise comparativa entre os modelos norte-americano e brasileiro de Tribunal do Júri, de modo a elencar divergências e convergências entre os modelos.

    1. AS SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS ENTRE OS MODELOS

    1.1. QUANTO À COMPETÊNCIA

    O direito ao Tribunal do Júri está garantido tanto na Constituição brasileira quanto na norte-americana. A Constituição Federal brasileira fixa o julgamento dos crimes dolosos contra a vida como competência do Tribunal do Júri. A Carta Magna norte-americana assegura o direito ao Júri em casos criminais e em casos cíveis; aplicando-se, por regra, em casos criminais caso possa haver pena de prisão e em casos cíveis que ultrapassem o valor mínimo previsto.

    Além da discrepância nas matérias de competência entre os dois modelos de Júri, é importante ressaltar outra: o fato de que aos norte-americanos é dado o direito de abdicar do julgamento por Júri em favor do julgamento por um juiz monocrático, o chamado bench trial[1]. No Brasil, por outro lado, o julgamento por Júri é obrigatório nos casos previsto em lei.

    1.2. QUANTO À PARTICIPAÇÃO NO JÚRO, AO NÚMERO DE JURADOS E ÀS OBJEÇÕES/RECUSAS

    As legislações de ambos os países sendo comparados determinam alguns quesitos mínimos necessários aos seus constituintes para que possam servir no Júri, também enumeram uma série de características, muitas delas idênticas nos dois países, pelas quais eles não podem ser impedidos de participar nele.

    Antes da reforma feita ao Código de Processo Penal[2] brasileiro pela Lei 11.689 de 2008, a idade mínima para participação no Júri era de vinte e um anos. Com a reforma, entretanto, a idade mínima foi diminuída para dezoito anos de idade, mudança que sofreu severas críticas. Contudo, como o fator etário não foi contemplado pelo legislador brasileiro, pode o juiz recusar, sem óbice legal, um jurado que não contar com a maturidade suficiente para o exercício da função.[3]

    No modelo brasileiro, o Conselho de Sentença é formado por sete jurados, sorteados no dia da Sessão do Tribunal do Júri, entre os vinte e cinco jurados sorteados em data anterior. Antes do sorteio dos sete, todavia, devem ser excluídos os jurados suspeitos, impedidos ou incompatíveis. A medida que for feita a seleção e leitura dos sete jurados, pode o Ministério Público e a defesa recusar até três jurados cada, de maneira imotivada.

    Nos Estados Unidos, por outro lado, o Júri deve conter de seis a doze jurados. Em casos cíveis, ele deve ser composto por doze membros, se possível, mas nunca menos do que seis. Em casos criminais, deve ser formado por doze jurados quando a possível pena for superior a seis meses em detenção, não devendo ter número inferior a seis jurados caso se a possível pena for igual ou superior a seis meses em detenção. O número de jurados pode ser diminuído de doze, com a permissão da corte e por determinação das partes.

    No modelo norte-americano, faz-se uso de alguns métodos de seleção: questionamento dos jurados individualmente ou em grupo, pela corte e pelas partes, ou pelo preenchimento de questionários, por exemplo. O objetivo seria de revelar fundamentos para objeções motivadas e para facilitar o uso inteligente das objeções peremptórias (imotivadas). Os requisitos para aceitação de objeções motivadas variam de acordo com a jurisdição, assim como o número de objeções peremptórias para as partes.

    1.3. QUANTO À (IN)COMUNICABILIDADE AO MODO DE TOMADA DE DECISÃO E AO SIGILO DAS VOTAÇÕES/DELIBERAÇÕES

    No procedimento brasileiro, antes do sorteio do Conselho de Sentença, os jurados recebem advertência de que lhes é proibido comunicar-se ou expressar opinião sobre o caso, entre si e com outrem, sob pena de exclusão do Conselho e multa. Em casos cíveis, em algumas jurisdições nos Estados Unidos, é permitido aos jurados que discutam entre si sobre as provas apresentadas, durante os intervalos na sala do Júri, desde que reservem sua decisão final para as deliberações.

    No Brasil, as decisões sobre os quesitos (materialidade do fato, autoria, absolvição ou condenação do acusado, causas de diminuição ou aumento de pena, qualificadora, entre outros) são julgadas através de votação secreta em urnas fechadas. As decisões a respeito de cada quesito ocorrem por maioria de votos entre os sete jurados. A votação é feita na presença do juiz presidente, do Ministério Público, do assistente, do querelante, do defensor do acusado, do escrivão e do oficial de justiça.

    Nos Estados Unidos, somente os jurados se recolhem à sala especial, onde devem debater e deliberar entre si, com o intuito de alcançar um veredito unânime sobre o caso em julgamento. Caso as deliberações se estendam demasiadamente em razão de dissenso entre os jurados, uma decisão não unânime pode ser aceita pela Corte, a requerimento das partes. Neste caso, é necessário esclarecer qual o número de votos necessário a favor do veredito.

    Após a entrega do veredito e antes da dispersão dos jurados, qualquer uma das partes pode requerer a apuração dos votos. Ela ser pode conduzida pelo juiz ou pelo oficial de justiça, que questionará cada jurado individualmente sobre a sua decisão. Assim sendo, a decisão de cada jurado não é secreta como no Brasil.

    1.4. QUANTO ÀS ORIENTAÇÕES AOS JURADOS, SUAS PERGUNTAS E PEDIDOS DE ESCLARECIMENTOS

    Em se tratando das orientações e informações passadas aos jurados, elas acontecem em mais de um momento do procedimento para ambos os países. Os jurados são instruídos sobre o caso em julgamento, sobre a legislação a ser aplicada nele, sobre o quanto podem ou não se comunicar sobre o caso, sobre como devem chegar a suas conclusões e decisões e as maneiras pelas quais estas podem ser expressadas.

    Tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, é permitido que os jurados façam perguntas e peçam esclarecimentos, geralmente por escrito e através do juiz, às partes inquiridas durante o julgamento. Ambos os sistemas priorizam que os jurados recebam e compreendam as informações necessárias para que possam tomar suas decisões.

    1.5. QUANTO À (IN)VIOLABILIDADE DOS VEREDITOS

    Em ambos os sistemas em comparação, as sentenças judiciais proferidas ao final dos julgamentos pelo Júri são passíveis de apelação, sendo então revisadas por um tribunal superior. No Brasil, a decisão tomada pelo Júri não pode sofrer influência ou ser revogada pelo juiz do julgamento. Neste país, em razão da quesitação, torna-se difícil a tomada de uma decisão contra a lei pelo Júri.

    No modelo norte-americano, entretanto, há hipóteses em que o juiz do próprio julgamento pode interferir no veredito entregue pelo Júri, assim como o Júri tem o poder (mas não o direito, ao menos na maioria dos estados) de decidir contra a lei.[4]

    Nos Estados Unidos, existe a chamada jury nullification. Esta prática ocorre quando o Júri rejeita a estrita aplicação da lei de forma proposital, absolvendo o acusado apesar da lei e das provas indicaram sua culpa. Apesar da prática ser alvo de controvérsia, a Suprema Corte norte-americana decidiu que ela tem o propósito de evitar a opressão do povo pelo governo. Jury nullification também pode ocorrer para evitar a injustiça na aplicação de uma legislação geral em situação específica, já que não é possível que haja previsão legal para todas as situações.[5]

    A prática pode ocorrer quando o Júri inocenta um acusado que violou uma lei considerada pelo painel de jurados como injusta; também se apresenta quando o acusado é inocentado de crime de menor potencial ofensivo, no que seria a sua terceira condenação que, devido a three strikes rule[6] em algumas jurisdições, levaria à prisão perpétua; outra hipótese seria quando alguém é inocentado pelo Júri, apesar da justiça da lei usada e de sua aplicação, a fim de punir o Estado, quando o painel acredita que ele agiu de má-conduta grave.[7]

    Muitos autores limitam a prática de jury nullification às decisões do Júri que inocentam o acusado. Já que um juiz pode derrubar uma condenação que seja inconsistente com a lei e com os fatos, um Júri condenatório não possui a mesma oportunidade de negar a lei que um Júri que inocente possui. Entretanto, argumenta-se que algumas condenações, nas quais o Júri vingativamente condenou o acusado, apesar da lei e das provas, também devem ser consideradas como nullification.[8]

    O mesmo argumento poderia ser usado nos vereditos de Júris cíveis. Os vereditos cíveis podem ser derrubados e ter seus valores ajustados pelo juiz, não se podendo aplicar a nullification da mesma maneira. Contudo, Júris cíveis que decidem casos em aparente desacordo com a lei, guardam certa semelhança com os criminais que sofreram nullification.[9]

    1.6. QUANTO À OBRIGATORIEDADE DO JULGAMENTO

    No que se refere ao Júri brasileiro, se o juiz sumariante for convencido da materialidade do fato e dos indícios de autoria do crime doloso contra a vida na audiência de instrução - durante primeira fase do procedimento do Júri - e decida por pronunciar o réu, não há outra alternativa senão o julgamento pelo Conselho de Sentença. No sistema norte-americano, todavia, mesmo após a acusação formal pelo Grand Jury, há chances de que o processo não vá a julgamento.

    Antes do julgamento, o acusado pode optar pela declaração de inocência ou de culpa. No segundo caso, o acusado aceita os termos da denúncia e não há necessidade de julgamento. A declaração de culpa pode ser feita espontaneamente ou por causa de um acordo judicial. Tal acordo é feito entre o promotor e o acusado, que deve fazer uma declaração de culpa, a fim de ser condenado por uma modalidade menos gravosa do crime ou de uma sentença mais branda. Esses acordos são um dos motivos pelos quais a maioria dos casos não vai mais a julgamento.

    2. O JÚRI NA ATUALIDADE

    2.1. O JÚRI NORTE-AMERICANO

    Ao se avaliar o caso do Júri norte-americano, vale considerar que foi só nos anos de 1968 (para as cortes federais) e 1975 (para as cortes estaduais) que os jurados passaram a ser selecionados entre uma maior variedade de seções da comunidade. Atualmente, jurados são selecionados aleatoriamente dentre todos os cidadãos adultos. Isso significa que só se tem a experiência de aproximadamente uma geração utilizando os princípios demográficos correntes, para avaliar a performance do Júri.[10]

    Enquanto a ciência social pode medir os índices de numéricos dos julgamentos por Júri, ela não pode medir a qualidade de cada veredito, ou dos vereditos em geral. O alcance ou não da justiça como resultado é irremediavelmente uma questão de opinião. As mais buscadas opiniões são os dos juízes togados, que possuem mais experiência do que qualquer outro sobre o assunto, tendo assistido inúmeros julgamentos do começo ao fim e tendo sido apresentado com as mesmas provas que os jurados.[11]

    Estudos apontam que os juízes concordam com, em média, oitenta por cento das decisões tomadas pelo Júri. Quanto ao entendimento do caso pelo Júri, descobriu-se que, contrário a opinião majoritária, os jurados geralmente entendem os fatos do caso. O Júri é considerado pela maioria dos juízes do país como sendo consciente, entendendo as questões legais e chegando a vereditos justos. Doze cabeças pensam mais do que uma, pois, em conjunto, são mais perceptivas do que o juiz.[12]

    Apesar de todos os elogios que o Júri recebe como instituição, ele tem sofrido declínio. Nas cortes estaduais, o número de casos julgados e resolvidos através do Tribunal do Júri diminuiu entre os anos de 1976 e 2002. A tendência ao declínio foi especialmente significativa em casos criminais graves. Todavia, o número de julgamentos por Júri em casos cíveis aumentou em alguns estados. Nas cortes federais, apesar do declínio nos julgamentos em geral, o declínio dos julgamentos por Júris é menor do que os por juiz monocrático. Tendo o número de julgamentos por Júri diminuído ou não, o Judiciário e o público continuam a saudar a instituição, mesmo que não se concorde com determinados vereditos.[13]

    2.2. O JÚRI BRASILEIRO

    O objetivo do Tribunal do Júri brasileiro é, e sempre foi, a ampla participação popular na administração da justiça. A democracia é exercida no Júri, [...] lugar no qual o cidadão, representando a sociedade, diretamente afirma seu posicionamento quanto a determinado fato submetido a sua análise, sem intermediários, na paz de sua consciência e na busca de auxiliar na construção de uma sociedade mais justa[14].

    Por esse motivo, os que criticam o Tribunal do Júri, criticam a própria Democracia, por não acreditarem que as pessoas possam se manifestar diretamente sobre a reprovabilidade (ou não) de determinada conduta, em se tratando do bem da comunidade em que vivem. Critica-se também, no Tribunal do Júri, a possível ocorrência de falhas, não sendo o julgamento técnico, mas motivado pela consciência dos jurados. Este ponto de crítica seria, na verdade, um dos melhores aspectos do julgamento popular, permitir que o cidadão analise diretamente o ocorrido no meio da sociedade em que vive, expressando ou não reprovação, sem se ater aos exageros técnicos e rigores normativos.[15]

    Tendo sua competência de julgar os crimes dolosos contra a vida fixada na Constituição Federal, o número de julgamentos por Júri aumenta e diminui na medida dos números de tais crimes. Sendo cláusula pétrea, o direito ao Tribunal do Júri também só pode ser alterado ou suprimido, hipoteticamente, com a promulgação de nova Constituição nacional.

    2.3. O TRIBUNAL DO JÚRI PELO MUNDO

    Mais de cinquenta países no mundo possuem sistemas de Júri baseados de alguma maneira no modelo Britânico de common law da instituição. Muitos países europeus usam tribunais mistos, formados por juízes e pessoas leigas, para decidir sobre crimes graves. Recentemente, vários países têm introduzido ou reintroduzido o Júri ou outras formas de tomada de decisão por leigos aos seus sistemas legais.[16]

    O Júri parece constituir parte da mudança de regimes totalitários para outros de maior democracia. A Rússia ressuscitou seu Júri no início da década de 1990, com o colapso da União Soviética. O direito ao Tribunal do Júri está incluído em diversas Constituições pós-soviéticas, incluindo as da Armênia, Cazaquistão, Ucrânia e Azerbaijão. De modo similar, com o final do regime ditatorial de Franco, o Júri foi introduzido na Espanha.[17]

    A forma e o procedimento de cada Júri não são completamente idênticos a nenhum outro, mas se desenvolvem a partir dos diferentes sistemas legais das nações, bem como seus históricos sociais e políticos. Outrossim, o interesse internacional e o surgimento de mais sistemas de Júri sugerem a presença de benefícios duráveis do envolvimento direto de cidadãos como tomadores de decisões judiciais. Em especial, o Júri parece trazer mais democracia.[18]

    O mapa a seguir destaca os países e territórios que possuem Júris no modelo common law (em verde) e aqueles que usam outras formas de Júri, sob diferentes sistemas judiciais e nos quais o seu uso é limitado a alguns tipos de crimes (em marrom).

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Ao selecionar parte de um sistema judicial estrangeiro como um dos objetos de estudo, imaginou-se encontrar algumas limitações em se tratando de acesso à bibliografia. Entretanto, após a obtenção de alguns livros eletrônicos sobre o tema, percebeu-se que a dificuldade maior seria encontrar regras gerais ou unificadas sobre o Tribunal do Júri em um país como os Estados Unidos da América, que possui leis estaduais e regras locais diversas.

    A solução surgiu na forma do manual de princípios do Tribunal do Júri compilado pela American Bar Association, assim como no esquema detalhando o procedimento de um Júri criminal em Cortes Federais e do glossário explicativo que o acompanha, elaborados pelo autor Jack King[20]. Quanto a bibliografia relacionada ao Júri brasileiro, a biblioteca institucional e a coleção pessoal foram suficientes para elucidar os aspectos necessários, merecendo destaque especial as obras dos autores Guilherme de Souza Nucci[21] e Adel El Tasse.

    O Tribunal do Júri é uma instituição considerada símbolo de democracia nos países em que está instalada, sendo um modo direto de participação da população em decisões judiciais. Recebe-se a oportunidade de expressar sua aprovação ou reprovabilidade de determinada conduta na comunidade em que se vive.

    Os modelos de Tribunal do Júri nos EUA e no Brasil, a princípio, tiveram suas origens no modelo britânico. Os ingleses o trouxeram diretamente para a sua colônia na América do Norte, onde ele se desenvolveu de maneira singular, devido às condições locais distintas. No Brasil, o Júri chegou depois de ter se espalhado pela Europa após a Revolução Francesa, em 1789.

    Ambos os países têm o Tribunal do Júri como direito constitucional. Nos EUA, o julgamento por Júri em casos criminais está descrito na Sexta Emenda Constitucional e o Júri em casos cíveis, na Sétima Emenda Constitucional. No Brasil, o Júri é garantido pelo artigo 5o da Constituição Federal[22], pelo qual recebe a competência do julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Pode-se observar que as competências dos modelos são demasiado distintas.

    O direito de ser jurado é garantido a ampla parcela da população que já atingiu a maioridade penal, garantindo um Júri com mais diversidade, sendo poucos os casos de exclusão, tanto no Brasil, quanto nos EUA. Apesar dos painéis de julgamento nos dois países serem compostos por um número diferente de jurados, sendo sete no Brasil e de seis a doze nos EUA, o processo de seleção é bastante semelhante. Os jurados são selecionados dentre os cidadãos residentes na jurisdição de origem da disputa e, tanto a acusação, quanto a defesa, têm a oportunidade de recusar alguns deles.

    Mais um ponto em comum aos dois modelos é a possibilidade que os jurados possuem de pedir esclarecimentos ou fazer perguntas, por intermédio do juiz, aos que forem inquiridos na sessão do Tribunal do Júri. Os jurados recebem instruções sobre as normas legais a serem consideradas no julgamento do caso.

    Aos norte-americanos é proporcionada a chance de, se assim o quiserem, serem julgados por um juiz monocrático, ao invés de um Júri. Os brasileiros, por outro lado, possuem o direito-dever de julgamento por Júri nos casos de crimes dolosos contra a vida. Além disso, no sistema brasileiro, estando presentes a materialidade dos fatos e os indícios de autoria, não há outra alternativa se não o julgamento por Júri. Em contraste, as normas americanas permitem as declarações de culpa e/ou os acordos judicias, fazendo com que o caso seja resolvido antes de ser levado ao Júri.

    No procedimento brasileiro, é vedado aos jurados comunicar-se com qualquer outra pessoa, inclusive os outros membros do Conselho de Sentença, sobre o caso sendo julgado. A votação ocorre de maneira secreta e a decisão é feita por maioria, na presença do juiz, do Ministério Público, do defensor do acusado, entre outros, em sala especial. Nos EUA, somente os jurados se recolhem à sala particular, para deliberar em conjunto e procurar chegar na almejada decisão unânime. Contudo, apesar das deliberações ocorrerem em sigilo, qualquer uma das partes pode requere a apuração dos votos.

    A proteção dos vereditos está garantida nas Constituições dos objetos de estudo, mas eles não são, de fato, invioláveis. Além de passíveis de apelação, como os brasileiros, os vereditos norte-americanos ainda podem ser derrubados pelo juiz presidindo o Tribunal, podendo ele reverter a decisão de um Júri criminal quando acreditar que o acusado foi condenado mesmo quando a lei e as provas estavam a seu favor. Quanto ao Júri cível, também pode intervir, mudando os valores de indenização a ser recebida, por exemplo. O Júri criminal norte-americano também pode decidir por inocentar um acusado que, de acordo com a lei e as provas, deveria ser condenado. Essa última prática é conhecida como jury nullification.

    Dados sobre os julgamentos nos EUA demonstram que o número de casos de uso do Tribunal do Júri vem sofrendo declínio, sendo que a grande maioria dos casos é resolvida por acordo judicial. Apesar disso, a instituição do Júri é muito respeitada, inclusive pelos juízes, que concordam com a grande maioria dos vereditos proferidos pelo Júri.

    No Brasil, tendo o Júri a competência de julgar os crimes dolosos contra a vida, seu uso só declinaria com uma correspondente queda no cometimento de tais crimes. O Júri é considerado uma das instituições mais democráticas no país. Através dele, os cidadãos podem manifestar a reprovabilidade de determinada conduta na comunidade em que vivem.

    O Tribunal do Júri está presente em mais de cinquenta países e pode ser considerado um indicativo de democracia. Logicamente, a instituição tende a se desenvolver e mudar de acordo com a realidade da lei, da política e da sociedade do país. Além disso, o interesse internacional e o surgimento de mais sistemas de Júri sugerem a presença de benefícios duráveis do envolvimento direto de cidadãos nas decisões judiciais. Em especial, o Júri parece trazer mais democracia.

    REFERÊNCIAS

    BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: . Acesso em: 31 out. 2016.

    ________. Decreto-lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: . Acesso em: 31 out. 2016.

    DWYER, William L.. In the Hands of the People: The Trial Jury's Origins, Triumphs, Troubles, and Future in American Democracy. Livro eletrônico. New York: Thomas Dunne Books, 2004.

    EL TASSE, Adel. Tribunal do júri: fundamentos, procedimento, interpretação em acordo aos princípios constitucionais, proposta para sua modernização. Curitiba: Juruá, 2004.

    ________; GOMES, Luiz Flávio. Processo penal IV: júri. Livro eletrônico. São Paulo: Saraiva, 2012.

    KING, Jack. Glossary of Terms and Flow Chart for Jury Trials. Anatomy of a Jury Trial, Washington DC, v. 14, n. 9, p. 11-14, jul. 2009.

    NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

    VIDMAR, Neil. Jury Systemas Around the World. Anatomy of a Jury Trial, Washington DC, v. 14, n. 9, p. 28, jul. 2009.

    ________; HANS, Valerie P.. American Juries: The Veredict. Livro eletrônico. New York-NY: Prometheus Books, 2007.

    ----------

    [1] Assim como the bar, barra de separação da sala de audiências, representa os advogados, the bench (banco ou bancada ocupada pelo magistrado) representa os juízes.

    [2] BRASIL. Decreto-lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: . Acesso em: 31 out. 2016.

    [3] EL TASSE, Adel; GOMES, Luiz Flávio. Processo penal IV: júri. Livro eletrônico. São Paulo: Saraiva, 2012.

    [4]VIDMAR, Neil; HANS, Valerie P.. American Juries: The Veredict. Livro eletrônico. New York-NY: Prometheus Books, 2007.

    [5]VIDMAR, Neil; HANS, Valerie P.. American Juries: The Veredict. Livro eletrônico. New York-NY: Prometheus Books, 2007.

    [6] Three strikes rule é uma regra existente em algumas jurisdições norte-americanas. Ela dita que um indivíduo condenado judicialmente três vezes deve receber a pena de prisão perpétua.

    [7]VIDMAR, Neil; HANS, Valerie P.. American Juries: The Veredict. Livro eletrônico. New York-NY: Prometheus Books, 2007.

    [8]VIDMAR, Neil; HANS, Valerie P.. American Juries: The Veredict. Livro eletrônico. New York-NY: Prometheus Books, 2007.

    [9]VIDMAR, Neil; HANS, Valerie P.. American Juries: The Veredict. Livro eletrônico. New York-NY: Prometheus Books, 2007.

    [10]DWYER, William L.. In the Hands of the People: The Trial Jury's Origins, Triumphs, Troubles, and Future in American Democracy. Livro eletrônico. New York: Thomas Dunne Books, 2004.

    [11]DWYER, William L.. In the Hands of the People: The Trial Jury's Origins, Triumphs, Troubles, and Future in American Democracy. Livro eletrônico. New York: Thomas Dunne Books, 2004.

    [12]DWYER, William L.. In the Hands of the People: The Trial Jury's Origins, Triumphs, Troubles, and Future in American Democracy. Livro eletrônico. New York: Thomas Dunne Books, 2004.

    [13]VIDMAR, Neil; HANS, Valerie P.. American Juries: The Veredict. Livro eletrônico. New York-NY: Prometheus Books, 2007.

    [14] EL TASSE, Adel. Tribunal do júri: fundamentos, procedimento, interpretação em acordo aos princípios constitucionais, proposta para sua modernização. Curitiba: Juruá, 2004, p. 23.

    [15] EL TASSE, Adel. Tribunal do júri: fundamentos, procedimento, interpretação em acordo aos princípios constitucionais, proposta para sua modernização. Curitiba: Juruá, 2004, p. 23-34.

    [16]VIDMAR, Neil; HANS, Valerie P..

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