Poesia Cura: Antologia Prêmio Absurtos 2021
De Rose Almeida
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Sobre este e-book
SOBRE A ORGANIZADORA
Rose Almeida é paulistana, nasceu em 1976 e é formada em Letras pela USP. Escreve poesia desde a pré-adolescência e foi professora de português na rede pública por mais de uma década. Em 2016 passou a publicar poemas nas mídias sociais. Participou da Antologia Inaugural Patuscada (2016) e da Antologia Ruínas (2020), ambas pela Editora Patuá. Desde 2019 é editora-executiva na Absurtos Editora, onde já editou e lançou diversos títulos, de poetas contemporâneos de todo o Brasil.
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Poesia Cura - Rose Almeida
Vida-vírus
- Adriane Pesovento (Rolim de Moura/RO)
Diga aos defuntos
que não morreram
foi notícia falsa
história inventada
Diga aos mortos que não espalhem que estão vivos
Sussurrem aos ouvidos dos amores, amantes e amados mortos que tudo foi só um sonho ruim
Cantem nos cemitérios para fazer bailar da morte a vida
A doença era mentira
Não existiu?
Braveje aos ouvidos cansados
que essa ausência de cor é cor
Ouvidos verão
Minta, ignore, siga a vida (a)normal, rosne como cão sem dono em tons de bravata e rejúbilo à inverdade
Mantenha-se alheio
Negue o que existiu, existe e o que há de vir!
O tempo de tristeza nunca existiu…
Negue!
Na medida que faz, ele se espalha,
rizoma pelo mundo
Viva a imbecilidade, a ignorância e a estupidez não natural
Brava sabedoria do que não conhece e morre, morre, morre e morre
Depois que a mentira acabar, contaremos os corpos.
Joana 1:29
- Maya Davy (Rio de Janeiro/RJ)
Eu, Agnus Dei [XX]
Profano antigos testamentos:
O destino e fim não é,
Não se realiza nem se basta
Como julgam meus contemporâneos
Os cálices que propomos algumas
Muitas
Marias
Ergo o punhal
Bebo meu sangue
Como meu corpo
E estendo às massas: Comungai!
Espero que se sentem à mesa
enquanto soam as trombetas
Aos dispostos a amar,
[XY XX XXY]
[101000101]
[século XXI],
trago boas novas.
Respira
- Elias Santos (Picuí/PB)
Devassas asas despidas,
Compridas, vastas!
As vossas altas
Valsas perdidas.
Tão lentas de asma,
Sedentas cenas cáusticas
Fixas! Náuseas náuticas,
Tão lentas de miasma.
Horrendas ácidas
Águas fundidas
Sobre árduas feridas
Esperanças glácidas.
Falsas danças frias,
Cansadas, tísicas!
Quase místicas
Surdas asfixias.
Nuas abertas
Crias de dores,
Vivas sem flores
Em almas cobertas,
Quase idos pulmões
Tristes de ira!
[Respirações…]
Calma,
Calma.
Respira.
Há tempo?
- Flávio Sanso (Volta Redonda/RJ)
O tempo parou, dizem
Mas o tempo está na minha barba volumosa
Nos meus cabelos nunca tão crescidos
Na curva que não achata
Na linha que sobe inclinada
Foguete cruel movido a estatísticas mórbidas
Potencial para ser exponencial
Mas pode ser que o tempo tenha parado
Sem abraço, sem beijo, sem paz, sem contato
Talvez eu verseje sobre o campo minado lá fora
Sobre o silêncio e o medo
Sobre as embalagens encharcadas de desinfetante
Ser ou não ser infecto,
a agonia dos quinze dias sempre renováveis
A janela, à janela
Vou versejar sobre a amendoeira
que dança em câmera lenta ao ritmo do vento
Sobre o sanhaço que cisca na antena parabólica
Sobre a beleza indiferente do céu
azulado, amarelado, arroxeado
Enquanto fico sem saber o que foi feito do tempo
Vou versejar sobre o que o tempo (ou a ausência dele) não alcança
Pandemia
- Juliana Filippozzi (São José dos Campos/SP)
A gralha na cordoalha, de cima via de tudo
Num dia não diferente, uma estranheza aparente
O portão que não abriu, o pipoqueiro que sumiu,
O realejo que emudeceu
E os homens, sempre tantos
Foram minguando, migrando pra onde? Sabe-se Deus…
A gralha da cordoalha deu um giro, bateu asas
Voou, voou, voou e nada deles
A praça esvaziada, de cheia só tinha a fonte
E o coro de passarada
O monumento calado, o telhado abobadado
Era tudo feito agora de voz de passarim
Que se ouvia no silêncio do Homem que se foi
A gralha pra cordoalha volta;
Pousa, pega fruta, repousa
Espera té que ficou escuro
E aquele que sempre vinha, não