Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

Roger Federer: A Biografia
Roger Federer: A Biografia
Roger Federer: A Biografia
E-book391 páginas5 horas

Roger Federer: A Biografia

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

A mais completa e detalhada biografia de uma das maiores figuras do ténis mundial.

Roger Federer é um dos nomes mais famosos no mundo do desporto. E o caso não é para menos: dotado de uma técnica única e de um talento excecional, é considerado por muitos o melhor tenista da história. Entre outros troféus de relevo, tem no currículo 20 Grand Slams e o recorde de semanas consecutivas (237) no primeiro lugar do ranking ATP.
Mas como é que Federer se tornou um campeão? Quais os desafios e as dificuldades que teve de superar para chegar ao topo? Como moldou o seu pensamento e o seu corpo? Quais os seus valores e crenças?
Um dos raros jornalistas com acesso direto ao núcleo pessoal de Federer, René Stauffer apoia-se nas longas conversas que ao longo dos anos foi mantendo com o jogador, a sua família, os seus amigos, treinadores e rivais para nos oferecer uma obra incomparável. Começando na infância em Basileia, na Suíça, onde Roger pegou pela primeira vez numa raquete de ténis, e acabando na conquista do vigésimo Grand Slam, Stauffer revela-nos, de forma surpreendente e apaixonante, todos os segredos que estão na base do sucesso daquele que é um dos desportistas mais bem-sucedidos de todos os tempos.

Instagram: @kathartika.pt
IdiomaPortuguês
EditoraKathartika
Data de lançamento28 de fev. de 2022
ISBN9789895624850
Roger Federer: A Biografia

Relacionado a Roger Federer

Ebooks relacionados

Biografia e memórias para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Categorias relacionadas

Avaliações de Roger Federer

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    Roger Federer - René Stauffer

    Índice

    Índice

    Dedicatória

    Nota do Autor

    Prólogo

    Parte 1 — O Início

    1. O Mundo É Uma Bola

    2. Melhores Amigos

    3. No Exílio

    4. O Sonho da Perfeição

    5. Pelo Próprio Pé

    6. Grüezi, Herr Federer

    7. Entre os Grandes

    8. Sob o Signo dos Anéis

    9. O Violinista

    10. Raquetes Partidas

    11. Momentos Difíceis

    12. A Redenção

    Parte 2 — Altos Voos

    13. Duelos no Texas

    14. No Topo

    15. O Rei da Relva

    16. Na Broadway

    17. Marcas na Terra Batida

    18. Pizza em Basileia

    19. A Saladeira

    20. Rivalidades

    21. Em Busca da Perfeição

    22. A Mona Lisa do Ténis

    23. Sergeant Pepper

    24. A Marca

    25. Uma Família Quase Normal

    26. Cidadão do Mundo

    27. O Filantropo

    28. O Carrossel dos Treinadores

    29. O Guerreiro Pacífico

    30. O Legado

    31. Um Homem de Palavras

    32. Fedfãs

    Parte 3 — O Regresso

    33. O Fim?

    34. Desaparecido

    35. Uma Reviravolta Impressionante

    36. Laver e Outras Lendas

    37. A Longa Espera

    38. A Nova Varinha Mágica

    39. A Bonança Antes da Tempestade

    Parte 4 — No Pináculo da História

    40. Trinta Minutos de Magia

    41. Norman no Meio da Neve

    42. No Cinturão do Sol

    43. O Jantar dos Campeões

    44. O Court das Lágrimas

    45. O Melhor de Sempre

    46. As Homenagens

    Pontos Altos da Carreira

    Histórico em Grand Slams

    Recordes, Marcos e Séries de Vitórias Mais Importantes

    Fotografias

    Notas

    Ficha Técnica

    Dedicatória

    Para a minha maravilhosa esposa Eni

    e a minha adorada filha Jessica

    Nota do Autor

    Quando este livro for publicado, passaram mais de 25 anos desde que vi Roger Federer jogar pela primeira vez num court de ténis. Foram 25 anos repletos de prestações superlativas, durante os quais vi um adolescente de quinze anos transformar-se num homem excecional e num dos maiores, se não no maior, tenista da história — e num dos seres humanos mais admirados do planeta. Por vezes afigura-se-me difícil de acreditar que, durante tanto tempo e tão de perto, eu tenha tido a sorte de acompanhar esta carreira única.

    O ténis começou por ser o meu segundo amor. A minha primeira paixão foi o hóquei no gelo, muito antes de descobrir o Clube de Ténis de Weinfelden, no nordeste da Suíça, onde cresci. O clube tinha três courts e ficava perto de uma fábrica de cerveja e de um ribeiro conhecido como Giessenbach. Escondido atrás de muros e sebes, aquelas instalações de aspeto elegante ostentavam uma atmosfera quase secreta. Naquela época — estávamos nos inícios dos anos 70 — o ténis era um desporto de elites e senti uma atração quase sobrenatural pela modalidade. Como eu já era membro da equipa local de hóquei no gelo, os meus pais não me deixaram ingressar noutro clube desportivo. Por conseguinte, eu e o meu irmão Kurt continuámos a jogar hóquei e a minha irmã mais velha, Jeaninne, foi a única que teve a oportunidade de treinar naquele sítio.

    Graças a ela passei a ter um pretexto para ali entrar e foi assim que começou a minha paixão pelo ténis. Esgueirava-me até aos degraus de betão da pequena bancada que se erguia no telhado das instalações do clube e via a minha irmã jogar. Como nunca ninguém me mandou embora ficava a assistir aos jogos de outros que lá iam para se divertirem, ao mesmo tempo que procurava entender as suas jogadas e me imaginava de raquete na mão, a aplicar as táticas que idealizava.

    A minha irmã apercebeu-se do meu desejo e de vez em quando emprestava-me uma das suas raquetes velhas para, no pátio diante da nossa casa, bater umas bolas contra a parede — a uma curta distância, repetidamente, até a minha pulsação acelerar, o suor começar a pingar e a minha mãe me chamar para jantar. A raquete era magnífica, construída numa madeira brilhante e assinada por um tal de Stan Smith.

    Stan Smith? Naquela época, esse nome era para mim apenas isso mesmo, um nome, mas ainda assim capaz de estimular a minha imaginação. Afinal, que sabia eu sobre o mundo do ténis? Nada. Tínhamos uma televisão a preto e branco com apenas cinco canais, as transmissões de provas desportivas eram raras e, quando as havia, eram de futebol, de esqui ou de boxe. Que aventura quando, a meio da noite, a família inteira se reunia na sala de estar para, cheia de sono, ver se Muhammad Ali continuaria a ser o rei do mundo... Também nos jornais, as referências ao ténis eram quase nulas, ao contrário do que sucedia com o futebol, o hóquei no gelo, o esqui ou a Fórmula 1.

    Não me lembro em que ano assisti pela primeira vez ao torneio de Wimbledon na televisão, mas sei que fiquei imediatamente fascinado pelo Court Central com as suas bancadas cobertas, por todas aquelas instalações de aspeto requintado e idílico, pela atmosfera. O cenário produziu em mim o efeito de uma revelação: Afinal o ténis é importante, tem imensos adeptos! Wimbledon pareceu-me uma catedral, com milhares de pessoas que, tal como eu no CT Weinfelden, seguiam com um misto de concentração e fascínio o voo das bolas e o combate entre aqueles dois rivais solitários. Foi o vislumbre de um mundo cuja existência eu desconhecia. Se eu pudesse experienciar Wimbledon uma vez, uma única vez que fosse, pensei, morreria feliz. Anos mais tarde, quando me tornei jornalista desportivo, a minha primeira notícia sobre o torneio londrino recebeu o título de "Os deuses do ténis instalam-se no seu templo".

    O CT Weinfelden deu lugar a uma urbanização de moradias unifamiliares e foi empurrado para a periferia da cidade. Como poderia eu adivinhar, quando outrora ficava sentado sozinho nos degraus da bancada de betão, que um dia o meu trabalho passaria por cobrir os maiores torneios de ténis do mundo e que o ténis suíço seria varrido por uma enorme vaga de sucessos?

    Quando comecei a escrever sobre ténis no início dos anos 80, acompanhei fascinado o percurso de John McEnroe, de Boris Becker e de Stefan Edberg, que receberam o troféu dourado nos courts relvados de Wimbledon. Quando Heinz Günthardt chegou aos quartos-de-final em 1985 — o ano mágico de Becker —, o ténis suíço viveu um momento decisivo e eu próprio alcancei um ponto alto da minha carreira como repórter.

    Foi também o início do milagre do ténis do meu país. Günthardt teve de se aposentar aos 27 anos por causa de um problema na anca, mas foi ele que arrancou o ténis helvético da hibernação. Depois veio Jakob Hlasek, que no final da década de 1980 se tornou o primeiro jogador suíço a figurar no top 10 do ténis mundial e a participar num Masters. A seguir foi a vez de Marc Rosset, o campeão olímpico de 1992, que alcançou a final da Taça Davis com Hlasek e se tornou o primeiro semifinalista suíço num torneio do Grand Slam. Aos dezasseis anos de idade, em 1997, Martina Hingis venceu um Grand Slam e converteu a Suíça num país de referência para a modalidade. Ao longo da sua carreira conquistou cinco majors na categoria de singulares e tornou-se a mais jovem número um da história do ténis.

    Até que apareceu Federer, o maior desportista que o nosso pequeno país alguma vez teve e provavelmente virá a ter. Quando Heinz Günthardt atingiu os quartos-de-final de Wimbledon em 1985, parecia-me quase impossível de conceber que um dia um jogador suíço pudesse chegar ao top 10 e/ou à final de um Grand Slam. E a possibilidade de um outro tenista suíço conseguir fazê-lo — como sucedeu com Stan Wawrinka — era algo que fazia parte do domínio do surreal.

    A presente biografia é o meu segundo livro sobre Federer. Das Tennisgenie [O Génio do Ténis] começou por ser publicado em 2006, e foi traduzido e atualizado por diversas vezes. A versão mais recente termina com a conquista do seu 17.º Grand Slam, em Wimbledon em 2012. Quanto mais o tempo passava, mais evidente se tornava que o próximo grande capítulo da história do tenista suíço seria a sua retirada dos courts.

    Mas até os deuses do ténis devem ter ficado impressionados com a determinação de Federer. E assim, numa idade em que a maioria dos jogadores já se retirou, concederam-lhe um regresso que nem ele próprio poderia ter imaginado, permitiram-lhe voltar a conquistar os maiores êxitos e reformular a história do ténis. E, com isso, forneceram-me a motivação e o material para reescrever a sua biografia. Tornou-se claro que um ou dois capítulos adicionais não seriam suficientes para fazer justiça à sua carreira, à sua vida e à sua importância para o ténis. Muita coisa sucedera ao longo dos mais de dez anos que entretanto tinham passado desde o meu primeiro livro, e aqueles novos acontecimentos podiam agora ser avaliados e analisados com bastante mais clareza.

    Graças à sua abertura e acessibilidade, Federer sempre facilitou o trabalho dos jornalistas. Por isso, os meus agradecimentos dirigem-se sobretudo a ele — ainda que não tenha participado ativamente na elaboração desta biografia, o que é perfeitamente compreensível: se não puder dedicar-se a cem por cento a uma coisa, Federer prefere não a fazer. É essa franqueza que faz com que seja tão agradável trabalhar com ele. Os meus agradecimentos vão também para os seus pais, Lynette e Robbie, para Severin Lüthi, Pierre Paganini e Tony Godsick, que, tal como Federer, sabe levar tudo com uma pitada de humor. Agradeço ainda aos inúmeros colegas que partilharam as suas experiências e conhecimentos comigo e que ajudaram a tornar todos aqueles dias, meses e anos no circuito uma jornada inesquecível. O meu obrigado à minha editora, Piper Verlag, em particular a Anne Stadler, Angela Gsell e Steffen Geier. E, por fim, os meus mais profundos agradecimentos vão para a minha maravilhosa família, para Eni e Jessica, que nunca reclamaram por eu estar constantemente a fazer as malas para partir no encalço de Federer.

    Müllheim, março de 2021

    Prólogo

    Mirka, a sua esposa, saltou no camarote e colocou as mãos à frente do rosto. Robert, o seu pai, puxou o boné RF azul para baixo, tapando ainda mais os óculos de sol, e cruzou as mãos por cima do parapeito, como se estivesse a rezar. À volta deles, a multidão nas arquibancadas do Court Central de Wimbledon enlouquecera, quase como se a sua seleção tivesse marcado um golo crucial no Campeonato do Mundo de futebol. Alguns espectadores levantaram um dedo como se quisessem exemplificar que faltava apenas um ponto para que Roger Federer conquistasse o seu nono troféu de Wimbledon naquele bonito e brilhante domingo de verão.

    Eram 18h18 em Londres. Federer e Djokovic digladiavam-se há mais de quatro horas, mas o momento-chave parecia ter finalmente chegado. O suíço estava a liderar por 6-7, 6-1, 6-7, 6-4, 8-7 e 40-15. Tinha conquistado os seus últimos dois pontos com ases. O seu vigésimo primeiro Grand Slam estava pousado numa bandeja de prata à sua frente — só precisava de ganhar um dos dois pontos seguintes. Era o dia 14 de julho de 2019 e Federer estava prestes a sagrar-se, aos 37 anos e 340 dias de vida, o campeão mais velho de um Grand Slam na Era Profissional.

    Mas o ténis raramente é um jogo de lógica. Lideranças aparentemente definitivas podem desaparecer num abrir e fechar de olhos. Por vezes, o desporto pode ser difícil e, até, injusto. Federer executou o serviço. A bola atravessou o ar, tocou no cimo da rede e saltou para o seu lado do campo.

    Mais um centímetro acima e poderia ter sido um ás, comentou ele posteriormente. O Novak já estava a mover-se para o outro lado. Teria sido o seu 1431.º ás em Wimbledon. Mas agora tinha de fazer um segundo serviço. Djokovic devolveu-lhe uma bola profunda e Federer fugiu à esquerda para bater uma direita inside-out, mas não foi suficientemente rápido e a sua pancada saiu para lá da linha lateral. O primeiro match point evaporara-se.

    Mas no segundo match point, Djokovic voltou a devolver o serviço e, após um ataque indeciso do seu adversário, disparou um brilhante passing shot cruzado.

    Quarenta e cinco minutos depois acabou tudo. Federer tinha perdido o terceiro tie-break do dia (3-7) e, com ele, a mais longa final de Wimbledon da história, que durara quatro horas e cinquenta e sete minutos. O tie-break do quinto set, uma novidade introduzida pela organização do torneio, havia resolvido a contenda. Federer podia ter conquistado mais pontos (218-204) e iluminado o encontro com um ténis mais ofensivo, mas vacilara no momento mais importante.

    O choque resultante daquela oportunidade perdida foi intenso — embora não tão doloroso quanto a derrota em cinco sets contra Rafael Nadal naquele mesmo estádio em 2008. Quando, na conferência de imprensa, um colega meu lhe pediu para fazer uma comparação entre as duas derrotas, foi como se tivesse esfregado sal numa ferida aberta. Federer respondeu com um sorriso: Obrigado por me avivar essas memórias.

    No entanto, a pergunta fazia sentido. Em 2019, o controlo emocional de Federer tinha sido substancialmente diferente do daquele chuvoso domingo de julho de 2008, quando colapsara de dor e desalento depois de ser deposto como rei da relva. Naquela época o sofrimento fora notório, talvez porque as circunstâncias também tivessem sido ligeiramente diferentes. Em 2008 ele sentira que o título lhe havia sido arrancado em circunstâncias desvantajosas: a crescente obscuridade tinha sido a maior delas, impedindo-o de ver devidamente a bola e levando-o a cometer erros críticos.

    Além do mais, onze anos antes, no auge do seu reinado nos courts de relva, era ele o favorito. Agora era o outsider que desafiava o número um do ranking, o mais velho finalista de um Grand Slam em 45 anos, um pai de quatro filhos prestes a completar 38 anos. Superara todas as expectativas ao chegar tão longe no torneio. A derrota tinha sido dura, obviamente, mas sabia que só podia culpar-se a si mesmo.

    Federer resumiu o seu estado de espírito com uma palavra que raramente lhe saía da boca: irritação. Perdi uma oportunidade incrível, declarou depois do jogo. Mal consigo acreditar. Sinto-me irritado. Mas é preciso olhar em frente, colocar o assunto de parte e extrair o que houve de bom. E a verdade é que houve muitas coisas boas. Claro que é doloroso, mas não quero ficar deprimido durante muito tempo por causa de um grande jogo de ténis.

    A fim de reorientar a sua mente e de ultrapassar a desilusão, iniciou um passeio de carrinha pela Suíça com a família logo que regressou a casa.

    O certo é que uma nona vitória em Wimbledon teria oferecido um requinte especial à fase final da sua carreira. Desde o seu regresso após uma cirurgia ao joelho em 2016 — que poderia ter ditado o seu adeus definitivo ao ténis — conquistara três títulos do Grand Slam (dois em Melbourne e um em Wimbledon). A 18 de fevereiro de 2018, depois de um interregno de mais de cinco anos, subira novamente ao primeiro lugar do ranking mundial, sendo o jogador mais velho a conseguir semelhante proeza. Andre Agassi, a quem roubara esse registo, era três anos mais novo.

    Com o objetivo de quebrar o recorde do tenista norte-americano, decidira participar no ATP 500 de Roterdão — que viria a realizar-se em fevereiro de 2018 — a fim de obter os poucos pontos de que ainda precisava. Depois de ter cumprido a sua missão com uma vitória no torneio e de ter alcançado o lugar cimeiro da classificação pela quarta vez na carreira, brincara no Twitter: "Pelos vistos sou o tenista mais velho a chegar ao primeiro lugar do ranking. Não sei se alguém já mo tinha dito, pois ando a ouvir um bocado mal..."

    Em abril desse mesmo ano fora distinguido pela quinta vez em Monte Carlo pela Academia Laureus com o prémio de melhor desportista mundial do ano e, conforme era esperado, recebera no Sporting Club, das mãos de Boris Becker, o troféu que distinguia o regresso do ano. Era como se estivesse a viver um sonho, do qual só acordará em Indian Wells, após 17 vitórias seguidas desde o início da temporada: apesar de ter obrigado Juan Martín del Potro a salvar três match points, acabará por perder a final desse torneio contra o argentino. Em junho, aquando do início da temporada de relva, uma pequena lesão na mão direita provocar-lhe-á dores ao longo dos meses seguintes. Por mais que se esforce por manter o elevado nível com que iniciara o ano, desperdiça outro match point nos quartos-de-final de Wimbledon e é eliminado por Kevin Anderson no Court 1 depois de ter estado a liderar por dois sets a zero.

    Em 2019 reencontrou a sua forma e tornou-se o segundo jogador depois de Jimmy Connors a conquistar, no torneio do Dubai, o 100.º título ATP. Depois ganhou o Masters 1000 de Miami pela quarta vez, voltou a competir na terra batida de Roland Garros após um intervalo de quatro anos e alcançou as meias-finais, onde foi derrotado por Rafael Nadal — a primeira derrota depois de cinco vitórias consecutivas contra o seu rival de longa data. Seguiu-se a conquista, pela décima vez, do torneio de relva de Halle, na Alemanha, e o apuramento para a décima segunda final de Wimbledon com uma vitória emocionante, em quatro sets, sobre Nadal.

    Mas apesar de, mais uma vez, ter dado mostras de classe, inteligência e elegância contra Djokovic, não conseguiu materializar nenhum daqueles dois fatídicos match points. Fazendo uma análise retrospetiva, esse torneio marcou uma viragem na sua carreira, uma queda do céu. Não lhe foi fácil ganhar nos meses seguintes. Dos seis torneios que ainda disputou nesse ano, venceu apenas um — o Swiss Indoors em Basileia. E depois do Open da Austrália em janeiro de 2020, no qual não teve a menor hipótese contra Djokovic nas meias-finais, sobretudo devido a problemas nos adutores, puxou o travão de mão. No dia 19 de fevereiro — e apanhando toda a gente de surpresa — foi submetido a uma cirurgia no joelho direito, que andava a incomodá-lo há já algum tempo.

    O seu regresso estava previsto para junho de 2020, mas tal não se verificou: por um lado, o processo de cicatrização foi lento e acabou por ser necessária uma segunda operação em maio; por outro lado, a disseminação da Covid-19 obrigou a que, em março, a temporada fosse provisoriamente interrompida. Federer assistiu de longe — nomeadamente da Suíça — ao cancelamento de Wimbledon e à décima terceira vitória de Rafael Nadal em Roland Garros, que permitiu que este último lhe igualasse o recorde de vinte Grand Slams.

    Nas poucas entrevistas que concedeu durante esse período, descartou qualquer hipótese de poder vir a retirar-se. Com a sua persistência característica, agarrou-se à ideia de que ainda seria capaz de provocar grandes ondas no circuito e de continuar a divertir os fãs de ténis. Os dois encontros de exibição nos quais participou provaram que a sua popularidade continuava em alta: no dia 23 de novembro de 2019, 42517 espectadores compareceram na Praça de Touros da Cidade do México para vê-lo jogar contra Alexander Zverev; algumas semanas depois, a 7 de fevereiro de 2020, 51954 espectadores aglomeraram-se no estádio de futebol da Cidade do Cabo a fim de assistirem ao primeiro ‘Match in Africa’, que o opôs a Nadal. Nunca um jogo de ténis atraíra tamanha multidão. A receita de três milhões de euros reverteu a favor da Fundação Roger Federer, que a investiu em projetos educativos na região. Foi a primeira vez que Federer jogou na África do Sul, a terra natal da sua mãe — e seria a última vez que pisaria um court de ténis no espaço de muitos meses.

    Em dezembro de 2020 provocou um rebuliço na Suíça com uma declaração enigmática aquando de uma das suas raras aparições públicas. Depois de ter sido eleito o melhor atleta suíço dos últimos setenta anos pelo público, disse em direto na televisão, no momento em que recebeu o prémio: Espero que ainda consiga mostrar alguma coisa no próximo ano. Caso contrário, foi um final incrível.

    Alguns dias mais tarde — a nova temporada nem sequer tinha começado — anunciou que não competiria no Open da Austrália. Foi a primeira vez que não participou no torneio desde o início da sua carreira, mas não se tratou de um sinal de que estava na iminência de pousar as raquetes. Com efeito, no início de março de 2021 regressou ao circuito, num pequeno torneio em Doha, após uma pausa de treze meses, cheio de expectativas e motivação.

    Federer está determinado em afastar o espectro da reforma o mais que puder, como se vivesse segundo as palavras de Dylan Thomas:

    Não vás tão gentilmente nessa boa noite escura,

    Os velhos deveriam arder e bradar ao fim do dia;

    Raiva, raiva contra a morte da luz que fulgura.

    Parte 1 — O Início

    1. O Mundo É Uma Bola

    Sábado, 8 de agosto de 1981. Na Alemanha e na Suíça, a canção Bette Davis Eyes, de Kim Carnes, liderava os tops de vendas. A primeira página do jornal Neue Zürcher Zeitung, desprovida de quaisquer imagens, fazia manchete com o título "Carências e impaciência na Polónia". Na secção de desporto era referido que a alemã Ulrike Meyfarth, saltadora em altura e antiga campeã olímpica, batera em Rhede o recorde nacional de 1,96 metros logo à primeira tentativa e que o tenista espanhol José Higueras fora eliminado do torneio de Indianápolis.

    No dia anterior, Robert Federer tinha começado a participar numa competição de ténis, o Torneio Bosco, realizada nas instalações de uma pista de gelo artificial, e alcançara a final em pares com o seu parceiro Heini Baumgartner. À noite subiu para cima da sua motocicleta e regressou a casa, em Birsfelden, para ver como está a esposa, Lynette, cuja gravidez se encontrava num estado avançado. Continua tudo na mesma, tranquilizou-o ela. Assim sendo, respondeu Robert, vou dar um salto a Rheinfelden. Esse seu interesse devia-se à ocorrência, nessa pequena localidade, de um outro evento, o Torneio Satus, no qual participavam muitos dos seus conhecidos.

    O serão de sexta-feira revelou-se bastante agradável. O ambiente no clube era de boa disposição e foi melhorando com o passar das horas. Quando, às duas da manhã, se ouviu tocar o telefone — nessa altura ainda não havia telemóveis —, um dos presentes atendeu, mas como não percebeu do que se tratava, decidiu desligar. Ao observar a cena, Robert Federer teve um pressentimento: e se fosse Lynette? Poucos segundos depois o telefone voltou a tocar e dessa vez foi ele quem atendeu. "Só me lembro de ouvir a Lynette dizer: ‘You better come home’."

    Assustado, Robert regressou rapidamente a casa e de lá seguiu com a mulher para o Hospital Cantonal de Basileia. Uma vez aí, ponderou procurar parceiros de cartas para ocupar o tempo de espera que acreditava ter pela frente, mas entretanto aconteceu tudo muito depressa. Às oito e meia da manhã, Lynette deu à luz o seu segundo filho: um menino, com 3,71 quilos e 54 centímetros. Os pés dele eram enormes, recordou ela. Pretendendo um nome que fosse fácil de pronunciar em inglês, os pais decidiram chamar-lhe Roger. O próprio Federer irá preferir a pronúncia inglesa do seu nome à pronúncia francesa. "Sou ‘Ródjer, declarou ele, aos dezassete anos de idade. Rogê’ é demasiado meloso, é horrível."

    O nascimento do filho não impediu Robert de disputar, e de ganhar, a final de pares nessa tarde. Naquela época, ele e a mulher participavam em muitos torneios: A nossa vida social girava em torno do ténis relembrou Robert. Sobretudo quando ainda não tínhamos filhos. Participávamos no Torneio Bosco, no Torneio Birsegg, nos Campeonatos de Basileia... Andávamos sempre a competir.

    Robert e Lynette eram jogadores que se destacavam a nível regional. Na classificação da Federação Suíça de Ténis ele alcançou o nível R3 do ranking e Lynette chegou à categoria R2.1 Tínhamos ambos um estilo de jogo relativamente ofensivo e não gostávamos de ficar parados na linha de fundo, referiu Robert, a quem os seus amigos tratavam por Robbie. "A Lynette tinha uma esquerda em slice muito forte, tal como o Roger veio a ter mais tarde." Só que com duas crianças pequenas em casa — Diana nascera dois anos antes — não tiveram outro remédio que não abrir mão de muito do tempo que dedicavam ao seu hobby.

    Os dois conheceram-se em 1970 em Kempton Park, perto de Joanesburgo, na África do Sul. Robert Federer é originário de Berneck, uma localidade situada num vale atravessado pelo rio Reno, no cantão de Sankt Gallen, no extremo nordeste da Suíça, não muito longe do lago Constança e da fronteira com a Áustria. Após a sua formação como técnico de laboratório, mudou-se para Basileia, a capital suíça da produção química, antes de começar a percorrer o mundo. O facto de ter ido para a África do Sul com 24 anos de idade foi uma coincidência. E coincidência foi também o facto de por lá ter encontrado outro emprego, voltando assim a trabalhar para o seu antigo empregador, que possuía uma sucursal em Kempton Park. Foi na cantina da empresa que Robert conheceu Lynette Durand, seis anos mais nova do que ele. Ela era filha de um encarregado de fábrica, um homem que prestara serviço militar na Europa durante a Segunda Guerra Mundial e cuja família, além do africânder, também falava inglês. Lynette crescera naquela zona, formara-se numa escola comercial e trabalhava como funcionária administrativa: para além disso, andava a poupar dinheiro para um dia visitar a Europa.

    Lynette era uma desportista talentosa e motivada. Jogava hóquei em campo e integrava uma seleção regional, mas acabou por desistir desse desporto, pois devido às muitas pancadas que a sua prática envolvia começou a ter problemas nas pernas. Na companhia de Robert, descobriu o ténis no Clube Suíço de Joanesburgo.

    Em 1973, mais por capricho do que por qualquer outra razão, o jovem casal decidiu mudar-se para a Suíça, onde passou a residir num apartamento de três assoalhadas em Basileia. De início, a adaptação àquele país mais pequeno e mais frio não foi fácil e sentiram saudades da África do Sul. Em dezembro casaram-se e recomeçaram a trabalhar para a Ciba Geigy. Para além disso, dedicaram-se cada vez mais intensamente ao ténis no CT Ciba, o clube patrocinado pela própria empresa, sediado em Allschwil. Assim que tiveram disponibilidade financeira, mudaram-se para um apartamento melhor, na periferia da cidade, primeiro para Birsfelden, depois para Riehen e finalmente para Münchenstein, onde as crianças irão passar a maior parte da infância.

    Lynette celebrou o seu maior sucesso como tenista em 1995, quando, integrada numa equipa do CT Old Boys, ganhou um título do campeonato suíço de seniores. A verdade é que, mesmo sendo mãe de duas crianças, o ténis continuou a ser a sua paixão. Tornou-se posteriormente treinadora de juniores no CT Ciba e, ao longo de mais de dez anos, colaborou na organização do Swiss Indoors, um torneio de classe mundial realizado em Basileia, que todos os outonos tem lugar num pavilhão chamado Sankt Jakobshalle situado a apenas dois quilómetros de distância. Era a responsável pela emissão de passes para jogadores, funcionários, representantes oficiais e jornalistas, e foi precisamente num pequeno escritório localizado num dos cantos do piso térreo que muitas vezes encontrei aquela mulher sempre amável e elegante — nessa altura eu não fazia evidentemente a mais pequena ideia de que o seu filho se tornaria o melhor jogador da história do ténis. Só vários anos depois é que soube, através de um colega meu que andava a trabalhar num artigo sobre a vida privada de Roger, que a sua mãe era aquela simpática senhora do escritório de acreditação do Swiss Indoors.

    A habilidade que Roger tinha para o manuseio de bolas surpreendeu os pais desde muito cedo.

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1