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Encontro entre Suas e Sinase: a medida socioeducativa em meio aberto no CEDECA Sapopemba
Encontro entre Suas e Sinase: a medida socioeducativa em meio aberto no CEDECA Sapopemba
Encontro entre Suas e Sinase: a medida socioeducativa em meio aberto no CEDECA Sapopemba
E-book300 páginas3 horas

Encontro entre Suas e Sinase: a medida socioeducativa em meio aberto no CEDECA Sapopemba

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Sobre este e-book

Este trabalho versa sobre a conjugação da proteção integral, da proteção social e da proteção sociojurídica nas medidas socioeducativas em meio aberto, tipificadas na proteção social especial de média complexidade do Sistema Único de Assistência Social (Suas). Embora as medidas socioeducativas em meio aberto tenham sido alocadas no Suas como demanda da proteção social, constata-se a escassez de diálogo entre a área da política da Assistência Social e a área sociojurídica na afirmação das proteções sociais do/a adolescente em cumprimento de medida socioeducativa. Com base na experiência pessoal e dos Serviços de Medida Socioeducativa em Meio Aberto executados pelo Cedeca Sapopemba, busca-se identificar as manifestações, presentes e ausentes, da proteção social para com adolescentes a quem se atribui a autoria de ato infracional. Pretende-se, outrossim, compreender como a proteção social e a proteção integral foram incorporadas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA); de que forma se aplicam nas medidas socioeducativas; e como o Suas e o Sistema de Justiça atuam para assegurar essas proteções, enquanto sistemas vinculantes das medidas socioeducativas em meio aberto. Pois esse horizonte não é ainda concepção apaziguada na sociedade brasileira e sim um objetivo a ser perseguido na defesa dos direitos dos/as adolescentes
IdiomaPortuguês
Data de lançamento11 de fev. de 2022
ISBN9786525222240
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    Para quem quer entender melhor como trabalhar as medidas socioeducativas em meio aberto, o livro é essencial.

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Encontro entre Suas e Sinase - Valdênia Aparecida Paulino Lanfranchi

capaExpedienteRostoCréditos

Dedico aos/às educadores(as) que atuam na defesa dos direitos dos/as adolescentes vítimas da necropolítica.

PREFÁCIO

Aldaíza Sposati

Valdenia Paulino Lanfranchi, especialista de reconhecida vivência da matéria, aqui nos põe face a sua profunda reflexão sobre o real, os direitos, a proteção social e a justiça e, aos mesmos tempos nos convoca para que discutamos, ou, melhor rediscutamos, o conteúdo da proteção integral ao adolescente e sua face interdisciplinar. A direção da proteção integral, para além de um princípio orientador dos dispositivos reguladores do trato jurídico da criança e do adolescente, é um princípio fundante da regulação de atenções, procedimentos e cuidados a serem incorporados no âmbito das políticas governamentais, em especial as de corte social.

O Estatuto da Criança e do Adolescente -ECA, aprovado em 1990, segue a promulgação da Constituição Federal de 1988, que por sua vez, aprovou um novo campo de direitos sociais, a seguridade social, direito cidadania, e sob duas formas: a contributiva e a não contributiva de proteção social. O curto espaço de tempo entre essas duas grandes regulações dificultou que o entendimento e possiblidades da seguridade social e suas políticas se fizessem presentes no detalhamento do ECA quanto às atenções à criança e ao adolescente do ECA. Dito de outro modo, a análise do real que embasou o ECA derivou das constrições de um formato de Estado e de políticas sociais, pré CF-88.

Essa constrição de alcance da assistência social no texto do ECA fica patente quando passa a ser refugada como campo de proteção social, e de política social, permanecendo porém a presença como trabalho de um assistente social. Ali se desenvolve uma compreensão mimetizada, onde essa política social e seus direitos sociais são sobrepostos pelo trabalho do profissional assistente social . Não se fazendo ainda presente a aprovação da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, pois, sua primeira versão, produzida pelo Congresso Nacional com o apoio do IPEA foi vetada pelo então presidente Collor em 1990, a construção da LOAS não foi considerada na construção do ECA. Pelo contrário havia por parte de frações de militantes em prol do ECA, a consideração de que tal política seria uma versão de um processo de tutela e de assistencialismo. Pode-se, portanto, afirmar que no momento da promulgação do ECA não estava apaziguada a relação entre as atenções direcionadas para criança e adolescente pela assistência social como partes componentes da proteção integral.

Outro destaque necessário é o de que o ECA não se posicionou pela defesa da natureza pública e estatal da política de atenção social à criança e ao adolescente, conforme registra seu artigo 86, pois ali se considera que a atenção à criança e ao adolescente deveria se dar por um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios . Note-se que não fica claro, naquele momento, e até hoje não se tem claro, como de fato uma organização não governamental pode garantir a efetivação do direito social. A construção do artigo 86 baseia-se em uma soma de partes ativas, mas de naturezas diversas sem apontar claramente formato da articulação entre elas.

Esse descompasso ficou claro pela correção que foi feita pela Lei 13.257 de 2016, que alterou a redação original que considerou as políticas e programas de assistência social de caráter supletivo aos que deles necessitem. Sua substituição ganhou a redação de:" II - serviços, programas, projetos e benefícios de assistência social de garantia de proteção social e de prevenção e redução de violações de direitos, seus agravamentos ou reincidências".

O artigo 90 ao definir que "as entidades de atendimento são responsáveis pela manutenção das próprias unidades, assim como pelo planejamento e execução de programas de proteção e socioeducativos destinados a crianças e adolescentes", coloca em um só plano a reponsabilidade estatal com a da sociedade civil.

O texto original do ECA faz patente demonstração do delay entre uma legislação e outra (LOAS-ECA) o que dá centralidade, pertinência, legalidade e legitimidade ao objeto de análise e a autoria dessa discussão por Valdenia Paulino Lanfranchi, que tem sua trajetória de luta marcada pela militância na sociedade civil, sem se descurar da exigência de que o Estado cumpra com a sua responsabilidade. Ela realiza essa discussão a partir da experiência de um Centro de Defesa de Direitos da Criança e do Adolescente, o CEDECA Sapopemba e nesse ambiente agrega, aos estudos e análises com bases teóricas, o pensar e viver na voz e presença dos próprios adolescentes. A vertente democrática e inovadora é parte de seu compromisso de vida.

É importante destacar que a construção e o conteúdo do Estatuto da Criança e do Adolescente se assentam em duas principais forças. A primeira delas se constitui pela postura de exigência para que ocorresse (e ocorra) a supressão da violência, prepotência, discriminação contidas nas regulações e ações até então existentes, apresentando a necessária e densa crítica à orientação punitiva e disciplinadora. Essa era a direção que, até então, orientava o conteúdo dos dispositivos e o formato das atenções públicas e privadas em relação à criança e ao adolescente. A segunda grande força se constitui - para além da crítica - no conhecimento resultante de experiências inovadoras, que iluminaram a construção do Estatuto da Criança e do Adolescentes para a direção da utopia da proteção integral às crianças e aos adolescentes brasileiros, propagando a aplicação de atenções provedoras de condições para um ser em desenvolvimento.

Após três décadas de maturação e enfrentamento de dificuldades para fazer com que a realidade das regulações, sua aplicação e ação fossem alteradas - validando a utopia da proteção integral – torna-se necessário balizar a dinâmica da convivência dessas duas forças, avaliando se ocorreu, ou não, em seu convívio, a presença do princípio da proteção integral e nela, da criança e do adolescente como sujeitos de direitos.

Em nossa sociedade, a introjeção de orientações hierárquicas, patriarcais, discriminadoras, apartadoras, excludentes parecem perdurar no tempo, mas, além disso, parecem construir forte muro de contenção que, não raro, se mostra intransponível para possibilitar que se enxergue o que ocorre. Sabe-se que essa resistência não diz respeito tão só ao trato do adolescente pois, de fato, ela é parte de manutenção de um dado poder na sociedade do capital, que trava a universalidade do reconhecimento social dos direitos do outro. Vive-se sob camadas de reconhecimento de direitos que vão desde o: sabe com quem está falando, até a frase atribuída a Jair Messias Bolsonaro: o Bolsa Família nada mais é do que um projeto para tirar dinheiro de quem produz e dá-lo a quem se acomoda. (In Gambiarra Eleitoreira. Folha de S. Paulo. A2 em 30-10-2021).

Valdenia Paulino Lanfranchi, desde adolescente, é militante de movimentos de luta para reconhecimento social dos adolescentes. Sim, vida de luta pelo reconhecimento social e a proteção social. Sua vida acadêmica é de fato uma mediação para ampliar sua força de luta que, apesar de adolescer em Sapopemba, espalhou-se por diversos territórios no Brasil e fora dele. Assim também seu trajeto de vida acadêmica se alargou, pois começou na Pedagogia, seguiu para o Direito e, no doutorado, chegou ao Serviço Social.

Confesso que esse foi um encontro histórico em minha vida, pois me permitiu refletir sobre a dinâmica histórica do real na vida de um adolescente assentado em um dado território periférico de uma metrópole.

Com toda sua experiência, Lanfranchi coloca como hipótese analítica a seguinte afirmação: "A separação entre proteção integral, proteção social e proteção sociojurídica leva à fragmentação e não ao fortalecimento da defesa dos direitos do/a adolescente e enfraquece a sua condição de sujeito de direito. A falta da conjugação entre as formas de proteção ao/à adolescente e sua família, nas várias fases do percurso do/a adolescente durante a apuração, aplicação, execução da MSE-MA, e a pós-medida, reduz a defesa dos direitos do/a adolescente."

A unidade entre os propósitos de proteção que, efetivamente devem se complementar, é colocada em discussão para que se demonstre que a fragilidade dessa articulação leva ao risco de fragmentação de propósitos e pode restringir o reconhecimento da criança e do adolescente como sujeitos de direitos.

Sua reflexão toma como base um serviço socioassistencial de média complexidade, direcionado para a aplicação da medida socioeducativa em meio aberto ao adolescente, isto é, a medida de prestação de serviço à comunidade e a de liberdade assistida. A autora reconhece os direitos socioassistenciais que para ela se instalam sob o guarda-chuva dos direitos fundamentais. Reafirma que o ECA afirma três identidades fundamentais para ao alcance dos direitos, ao explicitar: quem são os sujeitos de direitos; quais são os direitos fundamentais; quem tem o dever de assegurá-los. Talvez aqui Lanfranchi tenha expressado um tanto de sua utopia esperançosa, pois de fato, o dever de assegurar direitos, diria que é ainda mais intenção do que efetivação para nossas crianças e adolescentes, sobretudo se vivem na periferia e se são pretos ou pardos. Não temos suficiente cultura jurídica para efetivar punição ao racismo e à discriminação, como afirma o Prof. Adilson Moreira em suas reflexões (Pensando Como um Negro: Ensaio da Hermenêutica Jurídica, Ed. Contracorrente, 2019).

Por tratar da reflexão desenvolvida no vínculo entre a proteção social e a proteção integral, entendida como "um direito constitucional regulamentado pelo ECA, cuja efetividade só pode se dar com a garantia de todos os direitos fundamentais, incluindo os direitos socioassistenciais", o estudo, de modo crescente, segue apresentando ambientes e situações que permitiriam visibilidade a tais vínculos.

A relação socioeducativa na aplicação da MSE – MA, ao que se mostra, dificilmente encontra construção pela lógica do direito, humano ou social. A proteção social ao adolescente a quem é atribuída autoria de ato infracional mui raramente tem presença quando no primeiro momento em que o adolescente sofre a apreensão policial. Inexistem unidades integradas de acolhida do/a adolescente, que entre o local de apreensão e a Delegacia do Distrito de Polícia correspondente, permanece sob a proteção dos agentes da polícia, em trânsito ou no prédio de uma Delegacia para adultos. Poucas são ainda as cidades que contam com Delegacia Especializada em Infância e Adolescência, em ínfima quantidade e implantada uma equipe interinstitucional e interprofissional para exercer a primeira acolhida do adolescente. Trata-se aqui da ação interdisciplinar, articulada entre os diferentes agentes do Sistema de Garantia de direitos -SGD com vistas a alcançar todas as diversas dimensões da proteção do/a adolescente a quem se atribui a autoria de ato infracional. É de se lembrar que é exigência posta pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo-Sinase, a implantação das Delegacias Especializadas e de Núcleos de Atendimento Inicial -NAIs.

A ausência dessa articulação registra um primeiro momento de ruptura entre a presença e prevalência da proteção integral, proteção social e proteção sociojurídica. Não raro o/a adolescente passa horas em um carro de polícia até ser apresentado em uma delegacia, que opera com o conceito e trato de transgressões de adultos, o que não raro contém medidas de violência. Essa situação faz com que a autora reitere o já apontado na tese de doutorado de Fabiana Vicente de Moraes (que pesquisou processos jurídicos de adolescentes, sob investigação de autoria de ato infracional) e afirma que: a medida socioeducativa não tem início com a sentença judicial, pois antes disso ocorre a apreensão do/a adolescente e a tramitação judicial do processo de apuração, que pode ter o seu tempo dilatado para meses e ano, período em que os direitos do adolescente em ter um acompanhamento raramente ocorrem, ficando sua atribuição delegada para a família. (Direitos do/da adolescente em risco na apuração de autoria de ato infracional na cidade de São Paulo, Ed. Pedro & João, 2020).

Essa afirmação de Lanfranchi demonstra que essa constatação deriva da observação de operadores ligados ao SUAS e acresce ainda que: "a medida socioeducativa, quando em meio aberto, é orientada por um PIA, que deve aliançar a passagem da atenção sociojurídica do adolescente, relativa ao âmbito da Justiça, para a atenção socioeducativa e socioprotetiva, no âmbito do serviço socioassistencial específico de proteção social especial de média complexidade sob a responsabilidade dos Creas".

Lanfranchi faz questão de aprofundar, em seu texto, as raízes dessa discriminação de trato apontando o patriarcalismo como presença de fonte autoritária da discriminação racial no trato do povo brasileiro. Aborda a concepção de hierarquia moral de Jessé de Souza e mostra que a ela se associa a lógica da sociedade do capital, que considera a demanda de proteção social como uma demonstração de fraqueza, da qual a responsabilidade social do Estado não deve se ocupar.

Assim, a autora vai construindo argumentos analíticos que mostram, com a presença de diálogo com diversos autores, o que nomina de: hibridez da ação do poder judiciário, pois a ele compete o acompanhamento da medida, com vistas à responsabilização do/a adolescente, mas também, lhe cabendo a observância do aspecto protetivo pertinente à medida.

Após enveredar por toda essa argumentação sociojurídica, Lanfranchi situa a experiência do Cedeca Sapopemba, reconstituindo sua trajetória desde 1991, em diálogo com iniciativas da Igreja Católica em defesa dos direitos à proteção da criança e do adolescente. Seu segundo capítulo faz significativo registro histórico dando luz às primeiras experiências de trato do adolescente como sujeito de direitos. Mas não só do resgate histórico se constitui esse capítulo segundo, pois ele traz a história de vida na relação do adolescente Beto com o CEDECA Sapopemba. Trata-se de uma abordagem riquíssima, pois examina questões postas nesse processo sob múltiplos olhares, sentimentos e interpretações.

Seguindo as curvas dos caminhos da adolescência de Beto, a autora mostra a dinâmica da proteção-desproteção social que cercam sua vida e faz destaques analíticos ao longo da reconstrução dos fatos. Segue explorando o acesso ou a interdição de acesso a cada um dos direitos sociais pelo adolescente e sua família, mostrando a desarticulação e o esgarçamento de propósitos.

Após um profundo e complexo mergulho na vida e vivência do menino Beto em Sapopemba, a autora se aproxima e aguça sua escuta junto a adolescentes em cumprimento de medida e, de outro lado, a operadores de dois serviços socioassistenciais de MSE – MA do Cedeca Sapopemba, vinculados ao Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS, e a agentes desse CREAS, que realizam a supervisão técnica dos trabalhos desses serviços. Esses serviços são contratados com a Prefeitura de São Paulo, a partir dos padrões determinados pelo MROSC – Marco Regulatório da relação entre Estado e Organização da Sociedade Civil. Lanfranchi realizou entrevistas não só com operadores, estendendo-as aos gerentes dos serviços e os supervisores do CREAS. Interessante a interdisciplinaridade desses 11 entrevistados com formação em pedagogia, psicologia, serviço social, sociologia e direito.

A autora nos transmite o fato de que essa forma de aproximação possibilitou constatações, percepções:

- quanto ao formato do trabalho socioeducativo durante a MSE-MA: os operadores desenvolvem atividades e resgatam os elementos que afiancem as segurança sociais de acolhida e de convívio, mediante visitas as famílias, conversas, com seus membros, encontros de coletivos de famílias, encontros com pessoas do convívio do adolescente, como namorados/amigos/as e trabalhos de sensibilização na comunidade.

- quanto à ocorrência de manifestações de desproteção social: a submissão à violência policial, o não acolhimento do adolescente na escola; a precarização da atenção à saúde mental e bucal; a ausência de acesso a documentação pessoal; dificuldade em emprego, a ausência de oferta de serviços de esporte e cultura e a desproteção comunitária pela ausência dos serviços públicos; inexistência de segurança alimentar.

- quanto à articulação entre as atenções dos serviços de atenção social: a questão se põe para além da dimensão de articulação entre os serviços, pois eles nem existem para serem interconectados. Esse conjunto de ausências de atenções é apontado como um forte motivo pelo qual o adolescente entra em condição de proteção especial.

- quanto à capacidade do trabalho realizado ter como resultados provocar alterações na situação: maioria dos entrevistados considera que o trabalho realizado com o adolescente não consegue modificar sua condição de vivência de desproteção social. Pelas informações coletadas entende-se que essa fragilidade é atribuída a um princípio básico da própria proteção social. Ela ocorre pela complementariedade e não pela segmentação. Consideram que o SUAS ainda apresenta modo de gestão fragmentado. Não articula os serviços que mantem e nem se articula a atenções das demais instituições. Essa fragilidade do SUAS mostra sua imaturidade para manter relação de pactuação entre os que operam com população avizinhada.

- quanto ao tempo de tramitação institucional: o tempo da justiça não manifesta modo coordenado face ao tempo do trabalho social, gerando dificuldades na dinâmica da atenção.

Toma-se ainda para destaque o entendimento e a distinção que é feita entre proteção integral e proteção social. Estaria uma inserida em outra? Foi uma hipótese levantada, mas ao que parece mais familiar é que a proteção social está afeta à política de assistência social e a proteção integral aos direitos fundamentais constitucionais. Essa dualidade de entendimento não se manifesta somente quanto à compreensão da proteção social e integral, pois a autora indica que há um desconhecimento do SUAS pela Justiça e, de certa forma, caberia apontar o vice-versa presente nessa relação.

Na escuta dos adolescentes, aplica técnicas de abordagem coletiva como o mapa falado e o grupo focal. Conclui-se que a fala dos adolescentes foi marcada por relatos da violência policial não só com o próprio adolescente, mas com seus familiares, suas mães, quando nas delegacias de polícia. Angustiante foi receber dos adolescentes o entendimento de que não têm muito com o que, ou com quem, contar e que seguros se sentem somente em casa. A humilhação vivenciada na relação com agentes policiais é referida, e nela a presença de assédio sofrido por meninas.

A escuta dos adolescentes mostrou que não se sentem protegidos. Essa constatação coloca em plano de interesse conceitual, mas não factual a relação entre proteção integral e proteção social face ao sentimento de desproteção social manifesto pelos adolescentes.

Atente-se que esses são resultados após 30 anos de vida do ECA e num ambiente de forte defesa de direitos.

A autora conclui que embora proteção integral implique na adoção dos princípios de universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos fundamentais, nem todos pensam do mesmo modo, quer com seu conteúdo, quer com sua completude. Esta heterogeneidade, contudo, não é exclusiva do campo jurídico, pois, no campo social o que se percebe é que nem todos os agentes do SUAS dão a devida importância à aplicação das medidas socioeducativas, embora potencialmente o SUAS seja um lócus de ampliação da proteção social. Face a essa possível capacidade, considera que foi um acerto a decisão histórica em manter aplicação de MSE – MA no SUAS. Esse processo é compartido, mas não de forma igualitária ou horizontal. Os agentes sociais se mostram submetidos à lógica da justiça, que guarda distância com a lógica socioeducativa.

Essa distância tem por expressão RET, termo cunhado a partir de pesquisa realizada pelo Núcleo de Seguridade e Assistência Social-NEPSAS da PUCSP com a equipe do Departamento de Serviço Social da PUCRJ. (RIZZINI, SPOSATI, OLIVEIRA-Adolescência, direitos e medidas socioeducativas em meio aberto. Cortez Editora.SP.2019.)

Ela faz referência à manifestação replicada, quase mantra, expressa pelos Juízes em suas sentenças, afirmando que a MSE – MA se dará por cumprida ao atingir o adolescente a: Ressocialização, a Educação e o Trabalho-RET. Para além do discutível sentido da expressão ressocialização, note-se que as condições objetivas do pretendido RET – a começar pela mostra deste estudo quanto ao rechaço nas escolas aos adolescentes sob MSE – MA – não resultam de vontades pessoais, muito menos das dos adolescentes, na medida em que implicam em condições concretas e objetivas. Discussões realizadas sobre esse tema, envolvendo promotores do Ministério Público, tem levado a um novo sentido do RET- Resistencia, Emancipação, Transformação, que encontra mais ressonância no processo socioeducativo. Afinal, a lógica da perpetuação da desigualdade econômica social não resulta de atitude individuais de adolescentes.

Lanfranchi sublinha a inexistência de fundamentação legal para que ocorra a sobreposição entre a justiça

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