Claridades do sul
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Claridades do sul - António Duarte Gomes Leal
António Duarte Gomes Leal
Claridades do sul
Publicado pela Editora Good Press, 2022
goodpress@okpublishing.info
EAN 4064066406622
Índice de conteúdo
PRIMEIRA PARTE
HYMNO AO SOL
*Á JANELLA DO OCCIDENTE*
*OS SANTOS*
*D. QUICHOTE*
*O PUBLICANO*
*A LYRA DE NERO*
*MYSTICISMO HUMANO*
*OS MONGES DE ZURBARAN*
*A BELLA FLOR AZUL*
*HORA DO MEIO DIA*
*CANTIGA DO CAMPO*
*A AGUIA*
*ACCUSAÇÃO Á CRUZ*
*LUTHERO*
*A TERRA*
*O OURO*
*O BUDA*
*NO CALVARIO*
*HÉLI! HÉLI!*
*AS ALDEIAS*
*BENEFICIOS E PHILOSOPHIA DO SOL*
*DISPUTA*
*AS CATHEDRAES*
*LYCANTHROPIA*
*O PECCADO*
*SONETO D'UM POETA MORTO*
*A UMA JUDIA*
*A VISITA*
*PALACIOS ANTIGOS*
*CAIN*
*A PRIMAVERA*
SEGUNDA PARTE
*ACCUSAÇÃO A CHRISTO*
*DE NOUTE*
*AQUELLE SABIO*
*NA TABERNA*
*OS LOBOS*
*MISERIA OCCULTA*
*LISBOA*
*A SESTA DO SENHOR GLORIA*
*FARÇA TRISTE*
*MADRIGAL DA RUA*
TERCEIRA PARTE
*ANTES DE ABRIR A CARTEIRA*
*A NOUTE DO NOIVADO*
*A TORTURA DAS CHIMERAS*
*TARDE DE VERÃO*
*NA CABECEIRA D'UM LEITO*
*MADRIGAL EXCENTRICO*
*AQUELLA ORGIA*
*MADRIGAL FUNEBRE*
*DEBAIXO D'UMA JANELLA*
*A SELVAGEM*
*A LANTERNA*
*ULTIMA PHASE DA VIDA DE D. JUAN*
*A ULTIMA CEIA DE FALSTAFF*
*FALSTAFF MODERNO*
*NA RUA*
*PHANTASIAS DA LUA*
*O SELVAGEM*
*O AMOR DO VERMELHO*
*A UM CORPO PERFEITO*
*CARTA AO MAR*
*A LENDA DAS ROSAS*
*NO ENTERRO D'UM CORAÇÃO*
*A JOVEN MISS*
*O DOENTE ROMANTICO*
*QUADRA D'UM DESCONHECIDO*
*EM VIAGEM*
*NOUTES DE CHUVA*
*IDYLIO MERIDIONAL*
*DUAS QUADRAS DE DIOGENES NO ALBUM DE LAIS*
*A CAMELIA NEGRA*
*A ULTIMA SERENADA DO DIABO*
*A MUSA VERDE*[1]
*IDYLIO D'ALDEIA*
*CARTA ÁS ESTRELLAS*
*NA FOLHA D'UM LIVRO*
*OS BRILHANTES*
*O ASTROLOGO*
QUARTA PARTE
*OS DEUSES MORTOS*
*DEBAIXO DAS HERVAS*
*A UMA VOZ CELESTE*
*Á POMBA QUE VOOU*
*TRISTISSIMA*
*IDYLLIO TRISTE*
*A UM LYRIO*
*A UMA ANDORINHA*
*ENTRE OS ARVOREDOS*
*CONFISSÃO A UMA VIOLETA*
*A SUA CAMARA*[2]
*HORA MYSTICA*
*JUNTO DO MAR*
*DOENTE*
*N'UM CEMITERIO*
*DESPEDIDA AO SOL*
QUINTA PARTE
*ARANHA*
*NOVA BALLADA DO REI DE THULE*
*PHANTAZIA D'UM ABORRECIDO*
*EL DESDICHADO*
*A VALENTINA DE LUCENA*
*PHANTASIAS*
*A BIOGRAPHIA DE SATAN*
*AGUA FURTADA D'UM ORIGINAL*
*BILHETE D'UM ESTUDANTE*
*A LADY*
*HUMORISMO MYSTICO*
*O CANNIBAL*
*ROMANTISMO*
*AVENTURAS*
*O INCONVENIENTE DE MATAR A MULHER*
*UM BLASÉ*
*O VELHO*
SEXTA PARTE
*FARRAPOS*
*AOS VENCIDOS*
*O MUNDO VELHO*
*AOS VENCEDORES*
*A CANALHA*
*O NOVO LIVRO*[4]
*ALGUMAS PALAVRAS*
PRIMEIRA PARTE
Índice de conteúdo
INSPIRAÇÕES DO SOL
HYMNO AO SOL
Índice de conteúdo
Vous prêtres! qui murmurez, vous portez ses signes sur tout votre corps: «votre tonsure» est le disque du «soleil,» votre «étole» est son zodiaque, vos «chapelets» sont l'embléme des astres et des planétes.
VOLNEY (LES RUINES)
Eu te saudo ó Sol, bello astro amigo!
(Tão pontual ha tantos centos d'annos)
Mais reluzente que um broquel antigo,
Mais dourado que sceptros de tyranos;
Avé, heroica luz! viva e sonora,
Vestindo o mundo, emquanto aos ceus erguidas,
As florestas extensas dão gemidos,
E o duro mar se chora!
Eu te saudo, ó astro das batalhas!…
Por que atravez das cruas dissenções,
Douras o pó que se ergue das mortalhas.
E levantas os nossos corações!
E por isso, ainda hoje, e eternamente,
Os romanticos te hão de a ti saudar,
—E os tristes sempre irão, á luz poente,
Ver-te morrer no mar!
Tu és a Voz; a Côr; as Harmonias
Accordam com as tuas claridades;
És quem benze as aldeias e as cidades,
E quem fases cantar as cotovias;
És quem inspira extranhas theorias,
És forte, são, consolador e bom!
Tem a lua silencios e elegias;
—Mas tu a Côr e o Som!
Eu te saudo, ó astro dos guerreiros!…
Eterno confessôr de madrigaes,
Que desgellas os densos nevoeiros,
Que alegras as sonoras capitaes;
Que dás valor nos campos marciaes,
E força e amor aos aldeões trigueiros,
E que incitas os tigres carniceiros
A beber nos caudaes!
Desde a Chaldea ás tristes solidões,
Tens tido cultos, templos levantados,
E velhos ritos barbaros sagrados,
E alegres, sensuaes religiões!…
Tu foste Mithras, nome cabalistico,
Baal, Agni, Apollo (invocações)
—E hoje Christo—teu nome occulto e mystico—
Fere inda os corações!
Quem contará, ó luz, tuas bondades?…
E o amor no qual o coração abrasas,
E as tuas funeraes solemnidades
Á ideal palpitação das azas?…
Quem nos livra das flexas do pecado?
Quem faz na intima terra o diamante?
Quem gera o monstro, a pomba, o lyrio amado,
E a idea extravagante?
Ave! pois, asto caro dos valentes…
Da Força, Vida, Gloria, da Paixão,
A flexa d'ouro aos corações ardentes,
Astro amigo das lutas e da Acção!
Ave! e em dias crús d'expiação
Vae, e beija—nas hervas relusentes—
Os que morrem, vencidos combatentes,
—A espada inda na mão!
*Á JANELLA DO OCCIDENTE*
Índice de conteúdo
O mundo oscilla
(Luthero)
Os deuses ou são mortos ou caídos,
Quaes duros aldeões dormindo as sestas,
Ou andam pelos astros perseguidos
Chorando os velhos tempos das florestas,
Os reis ressonam nas devassas festas:
Já os fructos do Mal estão crescidos:
Ó Sol, ha muito que tu já nos crestas!
E aos nossos ais o Ceu não tem ouvidos!
Ha muito já que o Olympo está vazio,
E no seio d'um astro immenso e frio
É morto o Deus do Testamento Velho.
Apenas sobre o mundo eterno e afflicto,
Procura Fausto o x do infinito,
E Satan dorme em cima do Evangelho.
*OS SANTOS*
Índice de conteúdo
Les saints arrachaient leurs auréoles.
(Dubois)
Viam-nos caminhar, exilados da luz,
As grandes povoações, as rochas, as paisagens.
E os corvos, os fieis amantes das carnagens,
Estos magros heroes, paladins de Jesus.
Andavam rotos, vis, os pés chagados, nús.
Finavam-se a rezar ante as santas imagens,
E ouviam-nos bradar no meio das folhagens:
—Ó arvores em flor! vós sois esquife e cruz!
Onde estaes hoje vós? nas grutas dos planetas,
Inda hoje rezaes, ó pallidos ascetas,
Luzes vivas da Lei! martyres solitarios?
Na terra não; que ha muito a Materia nos nutre,
E nem no Ceu talvez;—no entanto o negro abutre
Tem saudades de vós nas cristas dos calvarios!
*D. QUICHOTE*
Índice de conteúdo
A Luciano Cordeiro
O que é isto?
Nos tempos medivaes dos campeões andantes,
E das balladas como a do bom rei de Thule,
Andava D. Quichote em busca de gigantes,
Magro, tristonho, ideal, crente Fausto do Sul.
Batalhador juiz da Virtude e do Crime,
Defendendo o opprimido, a mulher, o ancião,
Corria o mundo assim, ridiculo e sublime,
Em seu magro corcel, sob arnez de cartão.
Cheio de tradições, o velho mundo absorto,
Da banda do meio dia, ouvia o seu tropel,
E como insectos vis sobre um cavallo morto,
Riam as multidões do ultimo fiel.
Ia triste a scismar, com a alma abatida,
Nos caminhos do mal rasgando as illusões,
Magro Fausto do Sul, buscando a Margarida,
Cheio de apupos vis, d'escarneos e irrisões.
Vinha de batalhar espancado e abatido,
Cheio de contusões e lodos d'atoleiros,
E ao pé montando um burro, e o escudo já partido,
Sancho Pança a Materia, e o rei dos escudeiros!
Vinha sereno e grave, escarnecido e exangue,
Emmagrecido e caalmo em meio dos estorvos,
—Vinham ladrar-lhe os cães, e pressentindo sangue,
Grasnavam-lhe em redor bandos negros de corvos.
Sancho Pança fiel, vasculhava a escarcella,
E ascultava a borracha emmudecida emfim;
Em quanto o Heroe scismava, inclinado na sella,
Na conquista ideal do escudo de Membrin.
Paravam aldeões, lavradores crestados;
Vinham á porta as mães, fiando o linho fino;
E os magros charlatães viam passar, pasmados,
Na sombra d'um cavallo o extremo paladino.
Dançavam os truões; as sujas enxurradas
Com a lodosa voz, perguntavam: Que é isto?—
Satan n'um corucheu, dizia ás gargalhadas:
—Ó campeão do Bem! ó victima do Christo!
*O PUBLICANO*
Índice de conteúdo
Ils erraient sales et immonds, et avaient des dévotions hypocrites
(Dubois)
Um graõ doutor da Lei dizia ao publicano,
Junto ao atrio do templo, em tempos da Judea,
Tambem tu vens orar, publicano sereia,
A tua casa ardeu, ou deu na vinha o damno?
Jejuas tu agora e resas todo o anno,
Tu que