Divórcio Liminar: Técnica processual adequada para sua decretação
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Sobre este e-book
A hipótese que guiará a presente obra é a de que o Código de Processo Civil oferece técnica processual adequada para a tutela do divórcio. No entanto, essa técnica não se encontra expressamente delineada e, por isso, não há previsão objetiva no Código a respeito da decretação liminar do divórcio. Essa omissão da lei não deve impedir o exercício do direito, nem a sua tutela pelo Poder Judiciário.
Para que essa hipótese se sustente, faz-se necessária a compreensão de diversos institutos. Antes de mais nada, o primeiro capítulo apresentará uma descrição completa do problema que se pretende enfrentar e o estado atual do tema nos tribunais. Para tanto, parte-se da Emenda Constitucional nº 66/2010, a chamada Emenda do Divórcio, com enfoque no debate doutrinário e jurisprudencial a respeito do tema do divórcio liminar".
Os autores.
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Divórcio Liminar - Marília Pedroso Xavier
1
A ORIGEM DO PROBLEMA NA LEI
E NA JURISPRUDÊNCIA
Para dar início a este trabalho de pesquisa, o primeiro passo é identificar claramente o problema. Quando se trata de divórcio judicial, a discussão deve passar pela Emenda Constitucional 66/2010 e compreender seus efeitos sobre o divórcio no direito brasileiro. Na trajetória do instituto, também será necessário avaliar como foi desenvolvida a tese do divórcio liminar e as decisões já proferidas a respeito do tema. Por fim, verifica-se se existe algum precedente vinculante sobre o assunto.
1.1 A Emenda Constitucional 66/2010 e o divórcio liminar
O ponto de partida deste trabalho é, certamente, a Emenda Constitucional 66/2010, também chamada de Emenda do Divórcio. Não há dúvida de que o Direito de Família era um até 2010 e, após a Emenda, alterou-se substancialmente. A redação original do art. 226, § 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil era a seguinte: O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos
. Com a emenda, a regra passou a ser que O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio
.
Com acerto, Rodrigo da Cunha Pereira, afirma que a Emenda representou o coroamento de uma luta histórica pelo divórcio no Brasil, que durou quase dois séculos
.¹ Nesse mesmo sentido, Maria Berenice Dias sustenta que essa alteração constitucional teve o condão de alterar também o paradigma de todo o direito das famílias. Para a autora, a dissolução do casamento sem a necessidade de implemento de prazos ou identificação de culpados dispõe também de um efeito simbólico: deixa o Estado de imiscuir-se na vida das pessoas, tentando impor a mantença de vínculos jurídicos quando não mais existem vínculos afetivos
.²
Antes de 2010, portanto, o divórcio dependia de prévia separação judicial por mais de um ano ou de comprovação da separação de fato por mais de dois anos. Ou seja, mesmo quando consensual, a decretação do divórcio exigia a verificação jurisdicional para ser decretado, independentemente da substancial manifestação de vontade das partes. Com a Emenda Constitucional 66/2010, esses requisitos deixaram de existir e o divórcio passou a ter como requisito apenas a vontade dos cônjuges.
A melhor doutrina não tardou a afirmar que essa alteração constitucional tinha eficácia imediata e que não dependia de qualquer regulamentação infraconstitucional para se tornar aplicável.³ Essa é a interpretação contemporânea das normas constitucionais⁴ e não há, na atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, qualquer fundamento que negue essa tese. Deste modo, o divórcio passava a ser direto, sem a mediação da separação judicial ou de fato. Um primeiro problema decorrente dessa questão, porém, é que a alteração da Constituição não exige a mudança das regras infraconstitucionais e, por conta disso, cabe aos intérpretes solucionar conflitos de regras positivadas pela legislação.⁵ Foi disso que a doutrina e a jurisprudência se ocuparam, após a Emenda do Divórcio.
O primeiro tema que gerou ampla discussão doutrinária foi o possível fim da separação judicial. Polarizados, autores sustentavam, de um lado, a inconstitucionalidade ou a inutilidade da separação judicial⁶ e, de outro, a permanência do instituto no ordenamento jurídico brasileiro.⁷ A posição que prevalece, até o momento, é a de que a Emenda Constitucional 66/2010 não revogou os artigos do Código Civil que tratam da separação judicial, em virtude de dois acórdãos do Superior Tribunal de Justiça.⁸ O Supremo Tribunal Federal não tratou do tema, até o momento, de modo que ainda há espaço para futuras alterações nesse entendimento.
O presente texto não enfrentará a referida discussão. Com ou sem a separação judicial, o que será demonstrado é que a tese do divórcio como direito potestativo permite àqueles que querem se divorciar que o façam independentemente da manifestação do cônjuge. Os capítulos seguintes se ocuparão de demonstrar esse ponto.
Por ora, o que deve ser investigado é o desenrolar dos entendimentos a respeito do divórcio, propriamente dito. Tartuce destaca que a alteração do art. 226, § 6º, da CRFB/88, modificou as modalidades de divórcio.⁹ Até então, eram reconhecidas duas hipóteses para tanto. A primeira, denominada de divórcio indireto ou por conversão, referia-se à hipótese em que o divórcio era precedido por uma separação judicial, extrajudicial ou por medida cautelar de separação de corpos. Se consensual, esse divórcio indireto podia ser realizado extrajudicialmente; se litigioso, o divórcio deveria ser judicial. A segunda hipótese era do divórcio direto, incidente quando havia separação de fato do casal por mais de dois anos, também podendo ser extrajudicial ou judicial.
Após a Emenda do Divórcio parece haver unanimidade no que diz respeito à extinção do divórcio indireto. Não há mais por que preservar essa classificação, uma vez que o divórcio independe de qualquer período de separação, judicial ou de fato. Esta alteração também foi incorporada pelo CPC/15, nos arts. 731 e 733, sendo excluída qualquer menção a requisitos prévios ao divórcio. Tem-se, por isso, apenas o divórcio direto ou, na ausência de outra classificação,