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As Estrelas Que Nos Unem
As Estrelas Que Nos Unem
As Estrelas Que Nos Unem
E-book410 páginas6 horas

As Estrelas Que Nos Unem

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Sobre este e-book

Rachel York tem medo do amor, de ser deixada por quem ama tal como o pai havia feito quando era pequena. Apesar de sonhar em amar e ser amada, afasta esse desejo sempre que regressa à realidade. Foi por isso que planeou ficar escondida no baile mais importante da época. Contudo, esse plano não correu como pretendia, pois tinha caído em cima do Príncipe enquanto se refugiava no escuro da noite.

Ethan Clarkson não acredita que o amor verdadeiro existe. Desde pequeno que concluiu que o casamento é apenas um contrato, mas quando se depara com os lábios de Rachel a meros milímetros dos seus, começa a questionar-se se estaria enganado. 
E foi debaixo das estrelas que ele mostrou que a amava e que Rachel se apaixonou pelo amor dele...

Até deparar-se com uma descoberta que pode ser fatal e observar, novamente, essa luz desaparecer...

Será que o amor verdadeiro brilha por entre a mais profunda escuridão?
IdiomaPortuguês
Data de lançamento4 de jul. de 2022
ISBN9791221368581
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    As Estrelas Que Nos Unem - Raquel Bernardo

    Prólogo

    Ninguém consegue escolher o seu futuro. Ninguém consegue prever o que irá acontecer. Porém, todos nós podemos fazer alguma escolha. E se não for a certa? E se tudo o que pensávamos ser verdade for, na realidade, uma enorme mentira? A vida desde sempre foi uma coisa prodigiosa, contudo, nós não controlamos a nossa vida. Nunca controlámos. Todos os dias somos influenciados pelas ações dos outros. Alguém pode sorrir para nós e fazer-nos sentir as pessoas mais felizes do mundo apenas porque recebemos um sorriso, ou então podemos ser perseguidos por um ladrão que nos assalta e acabar mortos. A primeira é melhor, de facto. Mas não somos nós que escolhemos o que irá acontecer. Somos apanhados desprevenidos. Tanto pelo passado como pelo futuro.

    Era maravilhoso poder admitir que não existem mentiras, nem enganos e que ninguém irá ser traído. Era bom isso acontecer, todavia não é o que acontece.

    Todos nós vivemos numa teia de mentiras. Se não forem as nossas, são as dos outros. Quantas vezes admitimos que algo foi sem querer quando, na realidade, era isso mesmo que queríamos fazer? Quantas vezes fingimos que não ouvimos algo apenas para servir como uma desculpa qualquer? Quantas vezes dissemos mentiras piedosas para não magoar os que amamos? Mas será mesmo isso? Não queremos magoar os outros ou não queremos magoar-nos a nós mesmos?

    Tudo começa com uma mentira.

    E com uma mentira vem um engano.

    Ilusões, erros, deceções. Três palavras sinónimas de engano. Muitas pessoas utilizam ilusões para enganar os restantes. Para benefício próprio? Sim. Abandonam o que é verdadeiro e puro para subirem na vida. Não se preocupam como o engano irá influenciar a vida de todas as outras pessoas. Na realidade, não se preocupam com nada.

    E com uma mentira e um engano vem a traição.

    O pior sentimento que existe é sentir-se traído. Pode ser uma traição de amor, uma traição familiar, uma traição entre amigos, uma traição de um súbdito para com o Rei…Qualquer que seja, uma traição nunca é considerada um acidente. Cair enquanto se corre é um acidente. Engasgar-se enquanto se bebe um sumo de laranja é um acidente. Andar de costas e ir contra uma pessoa é um acidente. No entanto, trair é trair. Mentir é mentir. Enganar é enganar.

    Tudo parte de uma escolha.

    A nossa vida é um complexo de escolhas. Não são só nossas. Não. A vida é uma sopa repleta das mais variadas escolhas que existem. E, infelizmente, as sopas nem sempre são saborosas.

    -O Rei foi assassinado! Apanhem-no! – Ouviu pela quarta vez.

    E quando isso acontece, origina-se uma enorme ruína.

    Más escolhas levam à ruína. Era soberbo admitir que apenas as pessoas que fazem más escolhas sofrem. Era estupendo dizer que nada do que os outros façam nos afetará. Contudo, tudo o que os outros fazem afeta as pessoas ao redor. E o que dizer quando nós somos surpreendidos pelo futuro?

    A respiração tinha-se tornado ofegante e muito rápida, ele não estava habituado àquele tipo de adrenalina.

    O futuro é algo incerto. Incerto porquê? Porque não o controlamos. Uma reposta simples, mas verdadeira. Era muito mais fácil optar por outro caminho quando sabemos que aquela rua em que estamos situados leva a um beco. Infelizmente, não temos essa capacidade.

    Distraído pela tristeza que o percorria, nem reparou que se encontrava num beco sem saída.

    Os guardas aproximavam-se pelo corredor principal e conseguia-se ouvir o bater das solas de mais guardas a subirem as escadas.

    -Não te mexas ou mato-te já! – Apontou-lhe uma adaga.

    Agora estava literalmente entre a espada ou melhor, entre a faca e a parede.

    Era tarde demais. À sua frente, estava aquele homem que vira há pouco. Sem conseguir ter qualquer reação, nem repara que se saltar pela janela ao lado acabaria por apenas quebrar um braço. Mas, provavelmente, mesmo se não tivesse sido ameaçado não iria conseguir fazer nada. Estava em pânico.

    E o que é que acontece quando uma mentira, um engano e uma traição de outra pessoa afeta a nossa vida? Infelicidade. É apenas isso: infelicidade.

    Toda a dor que estava a sentir, não podia equiparar-se ao que iria acontecer a seguir. A visão dele acabou por se restringir a uma enorme quantidade de guardas à volta.

    -Apanhei-o está aqui! O assassino!

    Com o nascimento de mentiras, morre a confiança. O simples ato de acreditar, desaparece. Ao passo que a mentira aumenta, a confiança diminui e quando isso acontece originam-se as dúvidas.

    -Não-não eu não fiz nada… foi ele! – Apontou em direção do homem que estava à sua frente.

    -Vejam! – O olhar dos guardas dirigiu-se para o indivíduo incriminado. - Ele tem vestígios de sangue na mão e está aqui a faca que consegui retirar-lhe para que não matasse mais ninguém! – Ripostou.

    Na mesma porção que a mentira tortura, o engano dói, a traição mata.

    -Não! Isso foi por uma rosa que retirei do jardim! – Olhou para a mão ensanguentada. - Foi você quem o matou!

    -Como se atreve! Mata o Rei e tenta culpar-me? – Virou-se para um dos guardas. – Ele traiu o Rei. Já sabem o que vou fazer.

    Capítulo 1

    Nesta etapa da vida, Rachel nunca pensou que permaneceria assombrada pelas memórias do passado. Novamente, tinha acordado na cama suada e com os lençóis azuis no meio do chão. Sonhara com o pai, outra vez. De facto, não podia denominá-lo de sonho, pois em vez de a fazer feliz apenas a destruía mais. Sim, não era um sonho. Era um pesadelo. E que terrível pesadelo! Ainda não tinham surgido os primeiros raios de sol e voltar a adormecer causava-lhe tanto medo. Os sentimentos de saudade, tristeza, solidão e falta de amor por parte do pai reuniam-se todos no mesmo pesadelo, ao mesmo tempo, em muitas noites.

    Recordava-o como um homem de bela figura e imponente, que não se deixava ir abaixo e que lutava pelo que ele acreditava ser melhor. Lembrava-se de que tinha o cabelo escuro e olhos castanhos como o tronco de uma árvore. Relembrava-se também das várias brincadeiras que tiveram enquanto era pequena e que ela julgava que demonstravam o amor que ele lhe nutria , mas enganara-se. Agora, nem ela mesmo sabia se isso tinha sido apenas imaginação. Se o sentimento nunca foi real, os momentos com o pai tornam-se mera imaginação? Ela não conseguia compreender… os risos, os sorrisos, fora isso tudo uma ilusão? Porque se assim foi, infelizmente, tinha saudades de viver essa ilusão.

    Tinha saudades da sua vida no passado onde nada dependia dela e poderia viver feliz nas suas ilusões. Contudo, agora já não era uma criança de treze anos que podia correr atrás de borboletas sem ser repreendida pela sociedade. Ela era Rachel York. Aliás, Miss Rachel York. Uma nobre mulher com direito a um título aristocrático devido a uma união matrimonial entre uma burguesa e um nobre. Era filha de Lady Mary York, uma burguesa com um histórico económico de grande porte, e de Sir Mark York, um nobre cuja morte dos pais lhe deixara uma enorme quantidade de dívidas. Ascendera socialmente pelo casamento dos pais, porém a vida dela nem sempre foi de acordo com os padrões da nobreza. Quando era pequena não vivia numa casa grande nas mais belas ruas, mas sim junto de outras casas modestas da burguesia. Ela era feliz com o pai, a mãe e os dois irmãos ainda pequenos, tal como ela. Contudo, com a saída do pai, a família York, desde então teve a necessidade de utilizar o título que lhe fora atribuído pelo casamento. Logo após a fuga do marido, Lady Mary encontrou-se num estado de depressão profunda provocado não só pelo abandono do marido, mas também pelas consequências que advieram e pela condição de saúde em que se encontrava (estava grávida). A partir daí, a situação económica da família York  desmoronou-se ainda mais, pois grande parte da posse económica de Lady Mary foi utilizada para saldar as dívidas da família do marido logo após o casamento. Se não fosse pelo dinheiro dado pelos pais de Mary, ela estava numa situação precária e triste porque para além de ser gozada por não ter sangue nobre, também seria ridicularizada por ser alguém de não sangue nobre pobre. Porém, atualmente, a situação da família York não melhorara, pois devido a uma enorme epidemia que afetou o Reino de Diemlong, ambos os pais de Mary morreram deixando algumas posses  que foram divididas por Lady Mary e a irmã, Madison Anderson. À medida que os quatro filhos cresciam, os bens materiais esgotavam-se cada vez mais.

    Assim sendo, a mãe decidira que Rachel era a salvação da família. Isto porque as mulheres têm um grande poder de persuadir os homens e, neste momento, a riqueza pertence a eles. No entanto, a filha recusava ser usada como um brinquedo .

    Ela sempre negara as escolhas da mãe, pois sabia perfeitamente como eram os homens na época casamenteira, julgavam-se demasiado sabidos e bonitos para o que na realidade eram. Sou perfeitamente capaz de escolher sozinha, dizia sempre à mãe, não que servisse de bom argumento, mas mesmo assim, dizia-o.

    Muitas vezes, a mãe nem sequer queria saber das informações dos pretendentes da filha, apenas se continham uma boa posição social e se a iam tratar com respeito. Rachel recebia visitas tanto de homens muito mais velhos, como de homens muito mais novos que ela. Os chamados rapazes, mais especificamente. Na altura, não se importou com essa situação, pois acabava, simplesmente, por adquirir mais conhecimentos. Mesmo os que não devia. Ouvia assuntos relacionados com a política e com o território de Diemlong, o que considerava bastante interessante. E culto! Compreender o país onde residia era-lhe fascinante exceto quando o assunto mudava para as classes sociais mais baixas. Rachel achava que quando os homens de meia-idade não tinham nada de bom para dizer de si mesmos preferiam deitar os outros abaixo para se sobrevalorizarem. Coitados dos pobres. – Diziam fingindo tristeza. - Mas, se os pobres são pobres é porque merecem. – Acabavam por concluir. Mas Rachel não concordava. - E nem acredito que os burgueses possam ter uma vida mediana! – Resmungavam como se tivessem motivo de sentir alguma ponta de inveja. – Eles não são nada. Não têm título. Só trabalham na agricultura e a fazer meras trocas comerciais. – Normalmente, Rachel limitava-se a libertar um suspiro para o ar. – Claro que a Miss Rachel é bem-vinda à sociedade. – Diziam quando notavam o seu desagrado. - É mais que bem-vinda. – Corrigiam com um sorriso. Quando chegava esta parte da conversa, cada homem acabava por engolir em seco enquanto a mulher o fintava com os olhos. – A Miss Rachel não é nenhuma burguesa. Foi. Era. Pretérito perfeito ou imperfeito…não interessa. É passado. – E depois, dada a oportunidade de eles se desculparem, saía da sala. Levantava-se sem dar nenhuma desculpa e ia para o quarto. Ouvir regularmente dizerem mal das classes que eram os pilares do Reino de Diemlong era horrível. Ainda por cima porque ela fizera parte desse nível.

    Para além destas ofensas que lhe eram ditas sem intenção, apesar de, por vezes, parecerem bastante intencionais, ainda havia as conversas dos rapazes que estavam na idade viril. Cada conversa que tinha com eles era apenas para obter conhecimentos sexuais. Neste tipo de situações, Rachel ficava imensamente grata pela ajuda da mãe. Ao menos tinha um pouco de bom senso. Quando Lady Mary ouvia algum assunto menos próprio expulsava o rapaz pela orelha e, apesar de não o demonstrar, Rachel percebia que a mãe estava a usar todas as forças que tinha para eliminar mais um dos pretendentes da filha. Era engraçado. Tinha de o admitir. Ouvir gemidos dos rapazes que se achavam muitos experientes a serem ecoados desde o sofá da sala até à porta era o ponto alto da visita. O único.

    Escutar conversas insultuosas e íntimas era o máximo que conseguia aguentar. Agora tinha que casar com um deles? Não. Não. Não. Não?

    Muitas das pessoas que conhecia já estavam casadas. Elas sentiam borboletas na barriga e tinham sorrisos deslumbrantes quando eram beijadas pelos maridos. Porém, Rachel não esperava que isso lhe fosse acontecer. Simplesmente era inútil tentar encontrar alguém. Nunca iria casar por conveniência, o poder económico nada teria a ver com o casamento. Já bastava as pessoas da alta sociedade julgarem com má cara o casamento entre Mary York e Sir Mark York, pois diziam que ele apenas casara para puder sair da condição precária que o torturava. Se era verdade, Rachel não sabia. Gostava de acreditar que não, mas o pai fugira já com as dívidas pagas, isso era um facto. Contudo, ainda assim, mesmo se aparecesse alguém razoavelmente decente tinha medo de vir a sentir tamanha tristeza como a mãe. Tinha medo de não ser verdadeiramente amada.

    E esse medo torturava-a.

    Todos os dias.

    Capítulo 2

    Chegara uma carta envolvida num envelope branco com um selo em forma de uma pena dourada.

    Aparentemente, a mãe sabia perfeitamente do que se tratava e foi a correr buscá-la. Rachel interrogava-se do porquê da mãe ter ficado tão feliz de um momento para o outro. Afinal era só uma carta ou não?

    Não. Não era apenas uma carta, pois esta deixou a mãe com um sorriso de orelha a orelha assim que a abriu. Ela tinha decidido que os problemas estavam todos resolvidos, não existiriam nunca mais.

    No entanto, Rachel não parecia muito convencida. Não iria, não queria casar com nenhum homem.

    Sem mais nenhum sítio para ir, decidiu ir imediatamente para o quarto. Era o seu único refúgio de momento. Tentava arranjar argumentos suficientes para ser ouvida e para que fosse realizada a sua vontade, mas não conseguia, pelo menos que fossem convincentes.

    Não podia ficar muito mais tempo lá, já era hora de comer o pequeno-almoço e estava com imensa fome. Ao quinto barulho estranho que a barriga imitiu decidiu instantaneamente descer as escadas.

    Ariel estava tão feliz quanto a mãe. Saltava pelo sofá levantando os pequenos corpúsculos de pó enquanto a mãe continuava focada na cozinha.

    Rachel parou escondida atrás da porta. Será que vou? Não queria ouvir nada em relação àquele assunto. Após alguns segundos, para ganhar coragem, avançou em frente. Queria demonstrar que já era madura o suficiente para fazer as suas próprias escolhas.

    Algumas criadas (muito poucas, pois não conseguiam pagar a um grande número de pessoas) estavam a preparar o pequeno-almoço juntamente com a Lady York que amava cozinhar. Nenhuma riqueza lhe tiraria essa paixão.

    Estavam a preparar um dos seus pratos preferidos, talvez para a seduzir de forma fazer o que a mãe queria.

    Encantada pelo esplêndido cheiro, entrou na cozinha.

    Assim que coloca o pé esquerdo para lá da risca que demonstra o limite entre a sala e a cozinha, forma-se uma nuvem de silêncio bastante densa. Tentou ao máximo ajudar, mas a única coisa que conseguiu fazer foram algumas panquecas pequenas e deformadas. Ela tentava não tirar os olhos das suas tarefas, mas a mãe estava a intimidá-la. Qualquer coisa que fizesse e que não era suposto, ela simplesmente lançava olhares furiosos à filha de forma a obrigá-la a fazer o que ela queria. Rachel não era propriamente desobediente, mas quando algo entrava na sua cabeça simplesmente não cedia e não pretendia fazer isso agora.

    De um momento para o outro, enquanto cortava algumas peças de fruta, a mãe lança um grande suspiro para o meio do ar que capta a atenção da jovem mulher. Esta percebeu logo que a mãe estava zangada devido à fugidela para o quarto.

    Mary deu uma grande pancada com o jarro de sumo quando o colocava na mesa. Rachel e Ariel estremeceram, mas a filha mais velha sentiu que aquela tinha sido a forma da mãe demonstrar o quão irritada estava. Tinha conseguido causar-lhe medo, pois sentiu que tinha sido na sua pele que tivera batido, mas não tanto medo quanto sentia quando se encontrava no escuro. Ela nunca percebeu o porquê de sentir medo de uma coisa tão insignificante, mas a verdade é que sentia.

    Quando olhou para as pingas do sumo que foram parar em cima da toalha vermelha, pensou que o sítio delas era na sua boca e não numa toalha. Uma vez que o dinheiro estava a diminuir, deviam aproveitar todos os recursos que tinham ao máximo e não os desperdiçar. Desviou o olhar para a irmã.

    Ariel sentou-se numa cadeira junto da mesa de granito no meio da sala de jantar à espera da comida. Ela tinha os braços cruzados e a cabeça sobre a mesa. Sentia-se cansada por saltar no sofá, mas faria tudo de novo se pudesse. A felicidade que lhe passou pelas veias quando soube que ia a um baile para a celebração da chegada do Duque Coulson fê-la sentir-se nas nuvens. E que melhor maneira de ficar no ar que saltar em cima de um sofá? Agora estava sentada à espera, pacientemente, pela comida.

    Isto não é normal, pensou Rachel. Deve estar mesmo cansada.

    Os três irmãos regressaram a casa mesmo após Rachel colocar as panquecas sobre a mesa e Lucy deixar cair um dos garfos. Eles tinham acabado de apostar numa corrida de cavalos e estavam todos com um sorriso glorioso na face. Afinal, não estavam todos. Nathanael abraçava o irmão mais novo, Michael, enquanto que o Daniel parecia zangado.

    -Não te preocupes, perder não é assim tão duro. – Provocou o pequeno. Daniel lançou-lhe um olhar mortífero como se o quisesse esganar, mas não o fez, não em frente da mãe.

    -Para a próxima és tu que perdes. Vais ver. – Ripostou Daniel fazendo Michael rir demonstrando claramente que duvidava que aquilo fosse alguma vez acontecer.

    Contudo, após todos se reunirem na mesa, esta felicidade foi interrompida quando Mary decidiu falar com a filha.

    -Morrerias se o conhecesses? – Perguntou sem conseguir conter-se mais. As criadas saíram em sinal de respeito. – Isto é uma grande oportunidade para nós.

    Tal como Mary, Rachel também não fez o mínimo esforço para se conter. Se a mãe queria saber qual a sua opinião ela dir-lhe-ia. Começou por fazer um suspiro demasiado alto para que  ela entendesse que morreria logo caso isso acontecesse. Não iria entregar-se a um homem desconhecido.

    Há pouco tempo, tinha lido numa coluna muito conhecida de caprichos e fofoquices, que os bailes eram utilizados, principalmente, para as mães organizarem casamentos e Rachel não pretendia casar. Como tal, não tinha qualquer desejo de ir a nenhum baile nem de conhecer o esperado Duque.

    O país onde residia não podia conter homens mais idiotas. Começava tudo pela figura mais glorificada, o Príncipe Ethan, que não prestava atenção à situação precária do povo obrigando-os a pagar elevados impostos. De seguida, eram os homens mais velhos que não sabiam quando parar de seduzir meninas inocentes (isto até devia ser proibido!) e faziam pouco dos pobres e, por fim, os homens mais novos que apenas desejavam o corpo das mulheres.

    -Para a Família York. - Cantarolou feliz a mãe ignorando o suspiro da filha.

    Rachel tapou a cara com a mão. Mentalmente repreendia-se por não ter sido ela a agarrar primeiro a carta, pois assim poder-lhe-ia ter pegado fogo e eliminado o convite. Burra, burra, burra…

    Iremos realizar um baile, esta quinta-feira, em nome do Duque Coulson, que esteve ausente da sua casa natal durante muito tempo enquanto descobria as maravilhas londrinas. Convidamos a sua família a estar presente neste grande evento. Talvez, quem sabe, o Duque peça a mão da sua filha em casamento!

    -Maravilhoso! – Disse a mais pequena.

    -Horrível. Querias tu dizer. – Corrigiu a irmã.

    Rachel observou o olhar matador que a mãe lhe dirigiu.

    -Continuando… - Disse a mãe enquanto tentava encontrar a última palavra que lera com o dedo no papel. – Aqui está. – Fez uma pausa antes de recomeçar. – "Também vai estar presente a Rainha Emily e o seu filho, o belo Príncipe Ethan! Esperamos por todos os membros da família York, Duquesa Jessie". – Quando a mãe acabou de ler a carta, esboçou um sorriso ainda maior do que o que tinha quando a pegou surgiu na cara.

    Os olhos estavam a olhar para o teto e Rachel percebeu que a mãe provavelmente estaria a pensar como é que a filha deveria ir vestida uma vez que iria estar lá o Príncipe e o Duque. Não podia ser pior, os dois na mesma sala, no mesmo espaço, ao mesmo tempo.

    -Isto é fantástico! – Exclamou a mãe cheia de energia.

    Uma troca de olhares surgiu entre Rachel e os seus irmãos. Ariel tinha um olhar feliz e contente por, pela primeira vez, ter oportunidade de ver o desejado Príncipe Ethan e um Duque importante enquanto que Rachel sentia-se completamente revoltada por saber que a mãe a obrigaria a ir a este baile. Esperava que os seus irmãos a ajudassem principalmente o Nathanael uma vez que também já tinha estado em situações casamenteiras como esta. Ariel era muito mais ligada à fantasia do que Rachel, isso acontecia porque não era tão madura quanto a irmã. À medida que a pequena desejava encontrar alguém belo para casar, a irmã mais velha atrasaria isso o mais possível, não queria que os homens desaparecessem da sua vida, mas não se importava de os ver longe. Após a fuga do pai, sabia que tinha que ter cuidado. Teria que casar com alguém que amasse verdadeiramente. Ou talvez, não? Assim, caso a deixasse, ela não sofreria. Contudo, não casar parecia, ainda assim, a melhor opção.

    Desejava encontrar o amor verdadeiro, mas sabia que isso nunca iria acontecer. Isso era só nos livros, nos contos, nas lendas… não na vida real. Cada vez que pensava em algo assim, sentia-se completamente receosa.

    Os cabelos castanhos espessos da pequena Ariel, tal como os do pai e os dos irmãos, ainda estavam a balançar de um lado para o outro. Inacreditavelmente, Rachel tinha tido as mesmas características que a mãe e avó.

    Após ter permitido que Ariel demonstrasse toda a sua felicidade, Lady Mary arranjou o vestido verde e colocou alguns dos fios de cabelo para trás do ombro. Inspirou algum ar e falou:

    -Acho que já sabem o que é que isto quer dizer, não sabem? – Olhou para os filhos.

    Ariel sorriu e afirmava que sim com a cabeça, Rachel cruzava os braços e encostara-se desleixadamente na cadeira e, bem… os rapazes da casa estavam mais preocupados em torturar o pequeno Daniel. Para Rachel, só a ideia de ir a um baile com os seus pretendentes era aterrador quanto mais com o Príncipe.

    -Já falta pouco tempo! – Exclamou Ariel demasiado feliz. Levantou-se da cadeira e começou a saltitar em redor da sua querida mãe.

    Devia ter mesmo apanhado aquela carta primeiro, pensou.

    Lady Mary abraçou a filha mais nova e pegou-a ao colo beijando-lhe as bochechas.

    Rachel estava quase a explodir de raiva, mas sabia que a mãe não iria ceder, muito menos se fosse mal-educada. Respirou fundo e endireitou-se como uma verdadeira Miss.

    -Mãe… - Disse tentando soar o mais bondosa possível. – Não me faça isso, por favor, suplico-lhe. – Ela até ponderou a ideia de se colocar de joelhos, mas não o fez, pois não queria demonstrar a ninguém que poderia descer assim tão baixo.

    – Eu quero o que é melhor para ti… – Começou antes de pousar a filha no chão.

    -Eu não me quero apaixonar, mãe! Não vou casar por dinheiro. –Assim que libertou os seus pensamentos em palavras sentiu um aperto no coração ao ver a mãe ficar com doces lágrimas no rosto.

    -Rachel... – Disse limpando com o tecido de um lenço a face. – Eu não quero que tenhas medo do amor e te recuses a casar. Achas que eu não oiço o que dizem por aí? Aquelas mulheres desmioladas? – Apontou para janela. – Eu e o teu pai eramos felizes juntos e custa-me acreditar que ele me usou pelo dinheiro dos meus pais. – Durante um minuto Mary permaneceu sem dizer nada como se ela mesma tivesse a duvidar do que estava a dizer. – E mesmo que tenha sido por isso que casou comigo, não significa que acontecerá contigo. Não precisas de ter medo. O amor existe…– A voz da mãe começou a falhar ao mesmo tempo que abanava as mãos no ar como se quisesse livrar-se de todas as memórias que a atormentavam.

    Sim, o amor existia. Rachel sabia-o. Os homens tinham amor pelo corpo das mulheres, pela bebida, pelos jogos e pelo dinheiro. Pensar que aprendeu isto devido ao exemplo do pai causava-lhe um aperto.

    -Mas… - Tentou dizer antes de ser interrompida.

    -Mas nada. Já disse o que tinha a dizer. – Disse a mãe determinada. Mary decidiu avançar alguns passos até ficar mais perto da filha. – Tu vais ter que encontrar um homem para a tua vida. – Ao observar a filha encolher-se com tal informação tocou-lhe na face. - Precisas de tentar, Rachel, precisas de te esforçar a encontrar um marido. Por nós, por ti. – A filha sentiu as palavras ecoarem na mente. Por ti dissera a mãe… Não. Ela não precisava de nenhum marido.

    Rachel procurava ajuda de alguém. Olhou para as criadas, que se encontravam a espreitar pela porta da cozinha, mas elas fingiram que não a viram. Na verdade, todas tinham imenso respeito por Lady Mary, afinal era ela a patroa e não Rachel. A única salvação da rapariga eram os irmãos, mas nem aí obteve resposta. E bolas! Todos eles sabiam o quanto Rachel odiava ir a bailes! Ariel permaneceu calada não se importando com a careta que a irmã mais velha lhe fez e os três rapazes, apesar de notarem na súplica de ajuda da irmã, não disseram nada, mais parecia que não tinham ouvido a conversa. Apenas conseguiu observar Anthony formular a palavra desculpa nos lábios, Daniel a olhar para o colo e Michael a encolher os ombros como se não se importasse. Neste momento, estava sozinha e tinha que escolher entre duas opções: aceitar o convite ou continuar a ripostar e acabar por ser obrigada a ir ao baile de uma maneira ou outra. Não tinha mais nenhuma opção, preferia escolher em vez de ser obrigada. Odiava que lhe dessem ordens.

    -Está bem. – Disse por fim entredentes. A mãe estranhou a resposta firme e rápida da filha, mas não disse nada. Sabia que tinha ganho nesta pequena luta e continuar com a conversa só estragaria o resto da manhã. Fez um sorriso rasgado a ambas as filhas e começou a pensar como seria um casamento perfeito.

    O resto do pequeno-almoço permaneceu muito calmo. Estavam todos mais ocupados nos seus próprios pensamentos do que preocupados em falar sobre as mais recentes fofoquices ou mexericos. A mãe pensava como poderia organizar o seu tempo no baile para apresentar todos os homens a Rachel. Ariel imaginava perdidamente como seriam os lábios do Príncipe se estivessem pintados de vermelho. Seriam mais sedutores? Nathanael notara que a irmã estava chateada. Mais que isso, furiosa. Daniel pensava qual seria o próximo cavalo que poderia ganhar a corrida no River Races. Seria o Trovão? Michael ainda estava feliz por ter ganho a aposta. E Rachel, a nossa pobre Rachel, estava a pensar em mil maneiras de se vingar de todos os irmãos. Mas mais importante que ignorar os imprestáveis dos seus irmãos era, na realidade, ignorar os seus pretendentes e o Príncipe. O Príncipe era demasiado fácil de ignorar, ele nunca iria reparar numa recém-nobre sabendo que tinha outras raparigas que lhe lambiam as botas e que tinham uma posição na nobreza maior que a dela.

    Após ter lançado outro olhar furtivo à irmã, estava com um ar pensativo.

    Teria que arranjar um esconderijo perfeito. Teria e iria arranjar alguma solução para este problema.

    Tal como em muitos bailes anteriores, procurava sempre uma escapatória para evitar todos os seus pretendentes e possíveis pretendentes. No baile da Duquesa Evalor decidiu esconder-se por várias horas entre os arbustos do jardim e, surpreendentemente, resultou.

    Conseguia sempre o que queria e isso não ia mudar, muito menos agora. Acabaria de qualquer forma a ignorar todas as pessoas indesejadas naquele baile, principalmente a mãe.

    Capítulo 3

    Caros leitores, não sabem o quão estou ansiosa pelo regresso do Duque Coulson Jaston! Soube que ele acabou os seus estudos na Universidade de Oxford e tenciona encontrar alguém que lhe mostre quais as novidades do nosso país. E saibam que ele irá estar presente no mais recente baile que será realizado pela Duquesa Jessie no Castelo da Rainha Emily Harrons. Devo alarmar-vos, meninas e meninos, que esta será uma outra oportunidade de as mães casamenteiras colocarem mãos à obra. Desejo-vos boa sorte!

    Vossa Autora do Bright News

    Tal como sempre, antes de um grande evento, a mãe de Rachel fazia questão de lhe comprar um novo vestido. Mesmo sabendo que era para o magnífico baile, Rachel, tal como todas as outras mulheres no mundo, nunca iria recusar receber um vestido novo. Cada vez que usava um sentia-se uma verdadeira princesa. Descendia de uma família de burgueses o que fazia com que tivesse uma vida meramente razoável, mas nunca tão boa como uma princesa e muito menos como uma Rainha. Ela sabia as diferenças óbvias entre ambos os títulos: o trabalho seria bem maior, os vestidos ainda mais bonitos e acabaria por ter a posição que todas as mulheres querem ter, a de Rainha.

    Exceto Rachel.

    Ela gostava de uma vida simples, dentro do possível, claro, a vida de uma pessoa nobre não era de todo a mais simples. Todas as pessoas da alta sociedade eram obrigadas a estarem sempre no seu melhor, a terem uma educação excecional e deviam saber o que dizer em todas as ocasiões e, mais importante que tudo o resto, saber comportar-se e nunca perder a calma. Ainda precisava de melhorar em relação à última parte porque, tal como a mãe, tinha um temperamento muito forte e não suportava atrevimento. Não admirava que ela nunca se tivesse apaixonado, todos os homens eram demasiado atrevidos. Noutras mulheres eles deviam ter um efeito sedutor, malandro e romântico, mas para Rachel eles eram simplesmente repugnantes.

    Ambas as mulheres entraram numa loja não muito cara da cidade e ambas sabiam que não podiam gastar dinheiro que não tinham e essa era a principal razão de a mãe desejar que a filha casasse com alguém de muita riqueza, mas ao mesmo tempo que tivesse bom coração e que fizesse a filha feliz, mas, para isso, a filha precisava de tentar e permitir que tal acontecesse.

    A mãe imaginou a filha num vestido pomposo e barroco como estava na moda. No entanto, Rachel nunca iria desejar comprar um vestido demasiado decorado nem colorido, não queria parecer como a filha da Duquesa Fiorbitt que ganhara a alcunha de arco-íris.

    Na entrada, estava um tapete rosa-claro e conseguia-se ouvir sons de pássaros que acalmaram os nervosismos de Rachel, pois achava que a mãe a obrigaria a vestir um vestido estupidamente enorme.

    -Bem, filha, por onde queres começar? – A mãe já se aproximava da ala dos vestidos e Rachel achou melhor segui-la, para todos os efeitos, assim poderia condizer a cor das unhas ao vestido.

    -Pelos vestidos. – Disse apressando o passo.

    Rachel ultrapassou a mãe e dirigiu-se à parte mais longínqua da loja. Por detrás dela e da mãe estava uma trabalhadora, certamente da burguesia, que iria ajudar caso necessário. Era magra e muito alta, tinha o cabelo curto e uma fita métrica num dos bolsos da camisa. O seu gosto de moda não parecia ser nada do género de Rachel e preferia nem sequer perguntar-lhe nada em respeito de opiniões. A senhora estava a usar uma saia comprida roxa e uma camisola vermelha. Rachel interrogava-se como é que uma mulher

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