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Capital Em Chamas - Livro 1 Da Trilogia Omnia Tempus
Capital Em Chamas - Livro 1 Da Trilogia Omnia Tempus
Capital Em Chamas - Livro 1 Da Trilogia Omnia Tempus
E-book593 páginas7 horas

Capital Em Chamas - Livro 1 Da Trilogia Omnia Tempus

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Sobre este e-book

Aaliah voltou para reinar entre os mortais e sua vingança contra aqueles que destruíram seu império e difamaram sua imagem será longa e tenebrosa. Antes de perder seu corpo, prometeu-se que recuperaria suas terras, reergueria seu império, exterminaria os infiéis e traria sua família e povo de volta à vida. Seus objetos de poder foram roubados, sua família está morrendo, uma doença a consome rapidamente e os Deuses Omnia estão voltando a Kera. Tudo que ela queria era se vingar dos mortais que a destruíram. Agora, precisa se proteger dos Deuses que querem se vingar pela destruição que Aaliah causou no começo dos tempos. E acredite, é impossível fugir dos Deuses.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de mai. de 2017
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    Capital Em Chamas - Livro 1 Da Trilogia Omnia Tempus - K. F. Spinni

    PRÓLOGO

    Todo Omnia é um manipulador.

    Enzo Correia

    E

    sta é a frase que mais li nos cadernos de Enzo e Victoria neste último ano enquanto compilei suas histórias. Foram meses juntando várias informações para que a Série pudesse ser passada adiante, como pediram.

    Percebi que a cada dia eles ficavam mais distantes da realidade. Suas memórias se esvaíam deste mundo e se saturavam com as visões de Kera. Suas palavras se confundiam entre línguas daqui e de lá. A escrita surgia em vários alfabetos. Seus pais se preocupavam com a suspeita de esquizofrenia na família, mas eles insistiam que não era necessário ir a um médico, pois a solução de seus problemas não estava em nosso mundo. Realmente era algo preocupante de se ouvir, mas por algum motivo eu não conseguia deixar de acreditar em tudo que me contavam.

    Algumas semanas antes do Enzo entrar em coma, perguntei como as visões e sonhos tinham começado e como ele havia conseguido escrever tantas histórias em tão pouco tempo sobre este lugar que aparentemente existia apenas em sua imaginação. Tudo estava tão vívido em sua mente, que sua resposta foi imediata:

    "Tudo começou depois do meu acidente. Às vezes temos sonhos que parecem ser muito reais, mas o estranho daquele dia, foi que ao acordar eu senti que meu verdadeiro mundo era aquele do sonho.

    Quando estive em Kera pelas primeiras vezes, apenas algumas pessoas conseguiam me ver, mas eu via todo mundo. Ouvia seus pensamentos, sentia suas emoções, vivia suas angústias. Conheço mais as pessoas de lá do que as daqui. Entendo mais do mundo de lá, do que deste aqui".

    Foi assim que tudo começou. Um sonho que o levou a outra realidade. Os médicos diziam que ele tinha passado por uma experiência de quase-morte e isto poderia ter afetado seu emocional. Tentaram remédios e terapias, mas nada resolveu, já que a solução estava apenas dentro dele.

    Como verão ao longo da história, assim como Enzo disse, todo Omnia é um manipulador. Enzo foi capaz de manipular a todos para alcançar seus objetivos e é exatamente isso que mais temo. Temo pelo que ele se transformou e pelo que eu estou me transformando.

    Não estou aqui para transcrever o que Enzo escreveu ou me contou, mas sim, para relatar o que ele foi e no que se transformou em seus últimos dias de vida. A Série mostra como um Omnia mudou o destino de Kera, e não se trata apenas de uma lenda. Trata-se de uma história. Esta é a história de Enzo, o segundo Omnia de Kera.

    PARTE 1

    RAINHA DEUSA

    Vivi isolada por milhões de anos até conseguir recriar o mundo.

    Minhas criações reproduziram-se e cresceram.

    Fortaleceram-se e lhes dei a magia.

    Com o controle sobre a magia, eu pude renascer.

    Então vi meu reino despedaçar-se sob as máquinas monstruosas de minhas próprias criações.

    Agora preciso educá-los. Devo ensinar quem está no controle de tudo.

    AALIAH KNETSI

    ANO 3 ANTES DA QUEDA (A.Q.)

    CAPÍTULO UM

    CAPITAL EM CHAMAS

    Será que nos veremos novamente?

    Nadja Knetsi

    D

    e uma das sacadas do castelo, sentia o cheiro da fumaça dos acampamentos que sitiavam sua capital. Olhava para o horizonte, mas estava perdida em seus pensamentos, que se recordavam de milhares de anos de existência.

    — Rainha? — disse a sacerdotisa, mestra das feiticeiras.

    Aaliah virou-se e respondeu sorrindo:

    — Estamos prontas?

    — A senhora não deve culpar-se pelo que ainda não aconteceu. Conseguiremos nos recuperar.

    Ainda sorrindo, balançou a cabeça para os lados, disse:

    — Não me culpo pelo que acontecerá daqui para frente. Culpo-me por ter deixado isso acontecer novamente.

    A sacerdotisa aproximou-se da rainha e disse em voz baixa:

    — Não aconteceu novamente. Da última vez a senhora não tinha controle da situação e…

    Antes de deixá-la terminar, Aaliah disse:

    — Mas desta vez eu tinha e estava tudo sob meu controle. Todas essas vidas estavam sob meu controle. São pedaços de mim que perdi e foi tudo tão rápido que não consigo nem compreender como aconteceu. Foram milhões de anos de cuidado para que vocês estivessem aqui — uma lágrima escorreu em sua bochecha, mas em seguida sua voz se elevou e sua feição se transformou de tristeza para ódio — e então um animal surge e destrói tudo que construí! Como uma criação pode desejar o que tenho? Como uma criação ousa tomar de mim o que é meu?

    A sacerdotisa afastou-se assustada com a reação de Aaliah, que retornou para a sacada e apoiou-se nas pedras. O silêncio foi quebrado pela mestra:

    — Nem sempre controlamos o que acontece, mas temos o poder de mudar o que se resulta destes acontecimentos. Nós recuperaremos nosso reino.

    A rainha virou-se e ficou tão próxima da sacerdotisa que era possível sentirem a respiração uma da outra. Aaliah tocou o queixo da feiticeira observando os detalhes de seu rosto e cabelos.

    — Ele chegou com seus exércitos conquistando tudo que tenho. Matou meu povo, destruiu minhas cidades e acabou com minha imagem. Da última vez não restou ninguém como cúmplice do fracasso que fui como rainha, mas agora todos em Kera saberão que a Deusa foi derrotada por um mortal. Um mortal com máquinas de ferro e cavalos com armaduras derrotou uma Deusa — terminou Aaliah rindo de si mesma.

    O silêncio da sacerdotisa foi pior que qualquer coisa que ela tivesse dito. Aquele silêncio comprovava a verdade nos fatos. As lágrimas escorriam pelo rosto da rainha, que ouvia a respiração ofegante de sua súdita enquanto tentava encontrar palavras de consolo, mas nada foi dito. Aaliah falou:

    — Não sei o que é pior — minha criação querer me destruir, ou ter que destruir minha própria criação por ela ser uma imagem falha de mim mesma.

    — Talvez os dois juntos. Ter que destruir sua criação, por ela estar querendo te destruir.

    A Deusa riu enquanto achava graça de seus próprios pensamentos.

    — Se os criei à minha imagem e se são uma parte de mim, será que não sou eu que sou tão falha assim?

    A sacerdotisa suspirou. Não sabia o que responder… nunca havia pensado naquilo antes. Abriu a boca tentando consolidar palavras, mas a rainha continuou:

    — Não precisa responder. Existem perguntas que fazemos já sabendo as respostas, e tudo que queremos é ouvir o que nos agrada e não a verdade.

    A rainha sorriu para a sacerdotisa e passou ao seu lado em direção à escada. Sem olhar para trás, disse:

    — Vamos terminar logo tudo isso.

    Chegando à porta do castelo junto com a sacerdotisa, Aaliah avistou as suas outras seis feiticeiras aguardando-a.

    As ruas estavam vazias e fumaça saia de algumas chaminés enquanto os moradores preparavam sua última janta. O sol estava prestes a se pôr, mas a capital ainda permaneceria iluminada por muitos anos.

    Ao verem a rainha, as feiticeiras cumprimentaram-na e uma disse:

    — Senhora, o ideal é começarmos logo. Aqui não será demorado.

    Aaliah sentia a brisa em seu rosto. Depois de milhões de anos sem senti-la, era como se estivesse flutuando. A lembrança de várias vidas sem corpo lhe dava calafrios e sabia que teria que fazer isso novamente.

    A rainha deu alguns passos à frente e parou olhando para o céu. A sacerdotisa era a feiticeira mais poderosa das sete, e foi a primeira a colocar as mãos sobre os ombros de Aaliah. As outras fizeram o mesmo, fecharam os olhos e aguardaram. Respiravam fundo, sentindo o ar impregnado de fumaça. Sabiam que talvez nunca mais voltassem a respirar… e com este pensamento respiravam cada vez mais prazerosamente como se fosse um último abraço de despedida. Abaixaram a cabeça e se concentraram.

    A Deusa ergueu um dos braços e segurou a pedra de seu colar com a outra. Fechou os olhos e as vozes de dentro das casas foram se silenciando aos poucos. Ruídos de pessoas caindo e objetos quebrando ocorriam eventualmente. Era como se a brisa trouxesse a morte a cada casa por onde passava. No silêncio total, o sol se pôs. As lágrimas da rainha caiam no chão de pedras e regavam a tristeza de sua batalha perdida.

    Um estouro foi ouvido inicialmente em uma casa distante do castelo, próxima à muralha. Em seguida outros estouros ecoaram no silêncio e as chamas azuis se alastraram pelos telhados e paredes das casas.

    Grandes pedaços de madeira e pedras voavam com as explosões e o cheiro de carne queimada impregnava o ar.

    — Vamos — disse a rainha abaixando o braço e virando-se bruscamente sem querer olhar para aquela cena por nem mais um segundo.

    Entraram em um grande salão circular repleto de tapetes nas paredes. Localizado no subsolo do castelo e sem nenhuma janela, o ambiente ficava abafado com as tochas que iluminavam o local.

    Uma abertura na parede mostrava o caminho para os túneis que guardavam a última riqueza da rainha: seu povo.

    — Depois que entrarmos, apenas este tapete ficará sobre a passagem? Vocês têm certeza que será o suficiente para que ninguém encontre o acesso?

    A sacerdotisa respondeu rapidamente:

    — Não se preocupe, minha rainha. Verifiquei várias vezes como fica o fechamento da passagem e é imperceptível. Mesmo que removam a tapeçaria, as pedras se encaixam perfeitamente.

    Passaram pelo vão e sentiram o ar gélido que vinha dos corredores. Aaliah continuou:

    — Minha Caixa está na câmara central e a caixa-chave está onde combinamos?

    — Sim, senhora, tudo conforme solicitado. Esta passagem ficará enfeitiçada e apenas nós conseguiremos movê-la sem esforço.

    A sacerdotisa começou a empurrar a porta, enquanto as grandes pedras se encaixavam perfeitamente no vão, mas o ruído lhes dava arrepios.

    Aaliah entrou em um dos túneis e observou as paredes repletas de espaços horizontais onde seu povo hibernava. Aproximou-se de uma garotinha que repousava serenamente em um dos vãos e tocou sua mão.

    A menina estava pálida e gelada, mas era consequência da hibernação. Como se estivesse em um funeral, beijou sua testa e acariciou seu rosto. Sob suas mãos repousadas sobre a barriga, havia uma pequena pedra preta, a qual manteria a garota viva pelos próximos anos. Lembranças de seu presente se misturavam às incertezas do futuro.

    — Senhora, estamos prontas. Precisamos repousar — disse uma das feiticeiras que ainda aguardava a rainha.

    Caminharam em silêncio pelos túneis até chegarem ao fim de um corredor, onde havia duas portas grossas de madeira. Na sala à direita, Aaliah viu sua filha deitada sobre uma plataforma de pedra. Ela olhava para o teto tranquilamente e ao ouvir sua mãe entrando, sentou-se e sorriu.

    A rainha aproximou-se e abraçaram-se com força. A mãe a beijou na testa e segurou suas mãos.

    — Não chore — disse a filha.

    Sorrindo, Aaliah respondeu:

    — É difícil evitar. Passar por isso de novo… nunca imaginei que seria necessário.

    A garota olhou para baixo por alguns segundos enquanto acariciava as mãos trêmulas da mãe e disse:

    — Você não pode perdoá-los?

    Aaliah ficou séria por um instante e franziu a testa. Limpou as lágrimas e balançou a cabeça em negação.

    — Eles foram um erro. Criei algo falho e como consequência do meu erro, meu povo pode desaparecer. Os bons não podem ser extintos pelos maus.

    — E o que você fará?

    — Acabarei com eles. Preciso desaparecer com os khämmae antes que eles causem estragos maiores em Kera. Se vieram atrás de mim, que os criei e estou acima deles, imagine o que não farão com os povos mais fracos. Preciso achar uma forma de destruir os khämmae e recuperar nosso reino… provavelmente nesta ordem.

    — E será que nos veremos novamente?

    Aaliah suspirou e sorriu:

    — É o que mais desejo. Farei o que for necessário para te ter novamente ao meu lado. Knetsi será novamente o reino mais magnífico de Kera e você será a rainha mais venerada de toda nossa história.

    Nadja riu e complementou:

    — Isso não acontecerá. A mais venerada sempre será você.

    — Não sei se depois disso tudo serei a mais venerada… principalmente se não existirem pessoas que se lembrem de minha existência.

    — Com certeza existirão. Todos que você está salvando aqui serão eternamente gratos pelo que fez. Eles espalharão ao mundo quem você é e como permitiu que eles continuassem a viver.

    Aaliah sorriu e limpou uma lágrima.

    — Espero.

    A sacerdotisa apareceu na porta e disse:

    — Senhoras, as feiticeiras já estão hibernando. Preciso fazer com vocês agora.

    Abraçaram-se novamente e Aaliah ficou ao lado da filha segurando sua mão. A sacerdotisa aproximou-se da garota, entregou-lhe uma pedra preta e pediu que fechasse os olhos. Em alguns segundos, a rainha sentiu a pele de Nadja ficar gelada. Levantou a fina blusa que cobria o braço esquerdo da filha e viu as cicatrizes que reluziam à luz das tochas nas paredes. Olhou para a sacerdotisa e perguntou:

    — E a doença? Continuará crescendo enquanto ela hiberna?

    — Não. A doença não cresce durante a hibernação, mas depois que ela acordar com certeza voltará a evoluir.

    Aaliah passou os dedos sobre as marcas que formavam texturas na delicada pele da garota. Eram as marcas da morte… maldosamente lenta e de cura desconhecida, contra a qual lutavam desde o nascimento de Nadja.

    A rainha levantou sua própria manga e ao longo de todo seu braço direito havia as mesmas marcas, porém muito mais grossas e em tom roxo.

    — E o que acontecerá quando meu corpo morrer?

    A sacerdotisa balançou a cabeça negativamente e a mesma dúvida da rainha surgiu em sua mente.

    — Não sei, minha rainha. Nossos corpos são apenas uma representação de nossa mente e acredito que essa doença que consome vocês duas esteja associado às suas essências e não ao corpo.

    Aaliah suspirou e colocou ambas as mãos sobre o braço da filha. Fechou os olhos e se concentrou. Aos poucos, as cicatrizes começaram a desaparecer da pele de Nadja e as marcas na rainha se espalharam grosseiramente pelo antebraço. A Deusa respirava ofegante enquanto a doença queimava sua pele, destruía suas veias e se impregnava em seus ossos. Seus gemidos foram ouvidos pelos corredores, mas não havia mais ninguém além da sacerdotisa para ouvi-los.

    Soltou bruscamente os braços da filha, deixando marcas pela força. Levantou novamente sua manga e viu que todo seu braço estava avermelhado e inchado como se algo tivesse caído sobre ele. Cobriu-se rapidamente tentando esquecer a doença que a consumia e pela última vez nas próximas centenas de anos, beijou Nadja enquanto dizia em seu ouvido: Amo você.

    Deitou-se na plataforma ao lado e retirou seu colar com uma pedra vermelha e preta. Entregou nas mãos da feiticeira, que disse:

    — Te aviso assim que eles partirem e estivermos seguras.

    — Se o primeiro plano não der certo, a senhora perderá novamente seu corpo. É a melhor forma de conseguirmos manter sua habilidade forte o suficiente para entrar em contato com outras pessoas.

    — Já estou ciente disso. Terei que recuperar meu corpo depois…

    — Exato. O mais importante é que eu consiga ampliar o seu poder. Você poderá interagir normalmente pelos sonhos, mas se quiser aparecer enquanto a pessoa estiver acordada, deve ser muito rápido e com pouca frequência. Pense que cada segundo que conseguir ser vista por alguém, são minutos a menos que seu povo se manterá vivo.

    A rainha via em sua mente todas as instruções que deveria seguir para que tudo desse certo. Aquela era sua única oportunidade para recuperar seu povo e manter tudo que tinha conseguido até aquele momento.

    Fechou os olhos e disse:

    — Eu voltarei para acordar vocês. Estou pronta.

    A sacerdotisa tocou-a na testa e imediatamente seu corpo ficou dormente e sua mente confusa. Não sentia mais a plataforma e não sabia se estava dentro ou fora de seu corpo. Os sons sumiram e o frio se dissipou. Abriu os olhos e estava em pé assistindo à cena.

    Sobre a plataforma, seu corpo repousava. Sabia que não era apenas aquele pedaço de carne… Era muito mais do que aquilo. Ela era uma Deusa.

    As labaredas azuis foram vistas à distância por todo o acampamento junto com a intensa fumaça preta que manchava o céu. Os guerreiros levantaram de seus postos para entender o que acontecia.

    O general correu para a tenda do rei e entrou sem aviso:

    — Rei, venha ver, rápido.

    Gladis levantou-se enfurecido pela interrupção de sua refeição já se preparando para gritar com o general, quando puxou o pano de sua tenda e viu as chamas que tomavam conta da cidade.

    — Mas que… — disse o rei passando a mão nos cabelos que restavam atrás da cabeça.

    — Não sabemos o que aconteceu, senhor. Ouvimos uma série de estalos e logo em seguida o fogo começou a espalhar-se por toda a cidade. Nunca vimos chamas dessa altura e não estamos ouvindo gritos.

    O rei cheirou o ar como se estivesse farejando uma presa e disse:

    — Sinto cheiro de carne queimando. Tem gente lá dentro pegando fogo. Como essa louca fez isso?

    O general simplesmente balançou a cabeça sem saber como responder.

    Gladis começou a andar em direção à muralha enquanto revivia suas batalhas em outras cidades dos aköul. Aquilo era algo novo e até o momento, incompreensível. O castelo no centro da cidade estava todo apagado e parecia uma sombra fantasmagórica no meio das chamas que consumiam as casas. Um mar de fogo cercava a antiga morada da rainha, que provavelmente não viu outra alternativa a não ser acabar com tudo.

    — Que porcaria — dizia o rei repetidamente enquanto apoiava as mãos com os dedos cruzados atrás da cabeça.

    — Senhor, o que faremos agora?

    Gladis virou-se para o general e respondeu:

    — Preparem os homens, vamos entrar ao amanhecer. Pode ser uma armadilha e é melhor agirmos antes que ela consiga fazer qualquer coisa. Continuem atentos durante a noite, pois não sabemos do que ela é capaz. Enquanto eu não a vir morta, não estarei em paz.

    Aaliah observou os guerreiros khämmae entrando em sua cidade na manhã seguinte e como esperado, os invasores não encontraram nada além de cinzas e silêncio.

    Sua população estava segura enquanto seu tempo não terminasse, já que a hibernação lhes daria cerca de oitocentos anos de vida. Segurou seu braço direito e apertou-o com força tentando reduzir a queimação e a dor. Quanto tempo duraria com aquela doença?

    Sem nunca se apagar, a capital arderia em chamas até que a Deusa encontrasse alguém que a ajudasse a reconquistar suas terras, libertar seu povo e reassumir seu trono. O plano estava feito e faltava apenas esta pessoa.

    Nos anos seguintes, Gladis Aife manteve seus guerreiros nos arredores da cidade, na esperança de que Aaliah e as feiticeiras ainda estivessem escondidas em Ltarea. O rei suicidou-se cinco anos depois, contaminado pela loucura e por sentimentos incontroláveis de culpa. O que ele não imaginava, é que a causa de seus pesadelos repousava tranquilamente na Capital em Chamas.

    PARTE 2

    DEFININDO O FUTURO

    Existem momentos cruciais no tempo que são propícios para que o futuro seja totalmente alterado.

    Observei por centenas de anos cada um destes momentos e acompanhei as pessoas que eram essenciais para meu plano.

    Com cada sonho, redefini o futuro, sempre na direção que eu queria.

    Meu tempo está terminando e estou muito perto do meu objetivo.

    Esta é minha penúltima interferência.

    Na próxima, estarei de volta para reinar e será para sempre.

    AALIAH KNETSI

    ANO 414 DEPOIS DA QUEDA (D.Q.)

    CAPÍTULO DOIS

    FRAQUEZAS E FRACASSOS

    Você precisa entender o que é sofrimento.

    Täira A’lia

    O

    s passos de Möria ecoaram pelo corredor da cúpula de reuniões. Pelas pisadas lentas, os generais já se sentiram mais tranquilos, convictos de que o rei tinha todas as informações que poderiam passar. O silêncio tomou conta da sala quando uma sombra se projetou no chão do lado de fora.

    — Bom dia.

    Os quatro generais e seus respectivos assistentes levantaram-se. Em formato de teatro com uma mesa redonda central, a cúpula servia era utilizada para tomarem as decisões que impactassem toda a cidade. O teto em forma de abóboda tinha o mapa-múndi pintado em alto-relevo e entre a porta principal e a plateia, um grande mapa da cidade foi esculpido no piso.

    — Bom dia, senhor — responderam juntos.

    Möria sentou-se na maior cadeira da mesa, que ficava de frente para a plateia. Os generais e assistentes sentaram-se quando Täira, a conselheira do reino, entrou para dar um recado ao rei:

    — Senhor, Kemenï já está acordado. Deseja que eu o chame?

    — Sim, pode chamar. Obrigado.

    Täira era a conselheira mais jovem da história de Kharon e com apenas trinta anos, já era referência nos Reinos Unidos por suas orientações. Os outros reinos também tinham conselheiros, porém nenhum deles, mesmo que mais velhos, se igualavam à jovem. Sua pele negra revelava sua origem tisiol, um dos povos mais influentes de Kera.

    — Senhores, meu filho chegará em breve, então vamos aguardar para discutirmos a questão das guerras. Gostaria de antecipar o assunto do aniversário da cidade e os reforços de segurança.

    O general comandante começou:

    — Se a guerra terminar até lá, teremos um número maior do que o normal de visitantes. Como o senhor já tem ciência, após a unificação dos reinos tivemos muitos comerciantes se mudando para a cidade, o que aumenta ainda mais a circulação. Realmente precisaremos de outra estratégia.

    — E o que vocês sugerem?

    O comandante continuou:

    — Sugiro que o exército imperial permaneça na cidade até a comemoração e que os reinos Isten e Poisien contribuam com mil guerreiros cada. Temos espaço para alojar todos eles e seria o suficiente para controlarmos o evento.

    Möria olhava para a parede e balançava a cabeça positivamente. Os participantes da reunião aguardavam em silêncio por uma resposta, já acostumados com a espera. Após alguns segundos, ele finalmente disse:

    — Concordo. Consigo fazer essa solicitação ao Imperador e aos outros reis. Pedirei para que cheguem uma semana antes, então estejam preparados para acomodá-los e treiná-los.

    Antes que o comandante pudesse retrucar, Täira entrou na sala com um garoto de nove anos. Kemenï sentou-se ao lado direito do pai e a conselheira à esquerda. O rei explicou aos novos participantes:

    — Estamos discutindo o reforço de segurança do aniversário da cidade. O comandante sugeriu mil guerreiros de Isten e mil de Poisien, além do contingente que já recebemos do exército imperial. Temos alojamentos para todos e pedirei que cheguem cerca de uma semana antes para podermos treiná-los.

    O garoto perguntou:

    — Então teremos aniversário neste ano? Finalmente!

    O rei sorriu e respondeu passando a mão na cabeça do filho:

    — Provavelmente a guerra terminou e faremos o possível para que não recomece.

    Täira tocou o braço do rei e disse:

    — Creio que seja sensato solicitarmos reforços de cavalaria também. Tivemos uma queda no número de cavaleiros e ocorreram casos onde não conseguimos recuperar alguns bens roubados, pois os ladrões fugiram a cavalo. Com o grande número de visitantes que teremos, precisaremos de mobilidade e velocidade.

    O comandante ajeitou-se na cadeira e olhou para Täira tencionando a mandíbula.

    — Exato, senhor. Era exatamente isso que eu iria sugerir antes de Kemenï entrar — disse sorrindo estranhamente. Um dos outros comandantes suspirou e coçou a cabeça.

    — Verei qual reino pode nos fornecer cavalaria.

    Todos concordaram e o comandante ficou ereto na cadeira e ajeitou sua armadura enquanto olhava para Täira. O rei continuou:

    — Não tivemos movimentação nenhuma dos exércitos dos aköul nas últimas duas semanas. Nossos olhos das estradas viram os acampamentos da fronteira sendo desmobilizados e seguindo de volta à capital do Império Ksoriano. Os navios dos portos do norte também permanecem sem movimentação. Existe mais alguma informação que desconheço?

    Todos balançaram a cabeça negativamente, exceto Täira, que olhava para os generais em silêncio. Após alguns segundos, tocou novamente o braço do rei e disse:

    — Notamos movimentação de tropas da capital para a região leste do império aköul. Existem centros de treinamento da força naval por lá, então é possível que Agmar esteja refazendo seus planos prevendo ataques por mar.

    Möria concordava em silêncio. A conselheira continuou:

    — Toda a antiga região dos isköul, que era controlada por nós entre nosso Império e o Império aköul, permanece sem líderes ou governos definidos. As tropas que partiram de nossas fronteiras estão se espalhando em várias cidades maiores, o que pode indicar uma possível unificação. Eles se organizaram em reinos autônomos, mas nada impede Agmar de forçá-los a se juntar à causa contra nós.

    O rei passou a mão na barba rala e disse:

    — Então existe a possibilidade de mudança de estratégia de Agmar para fortalecer seu exército e tentar outro ataque.

    — Sim. Talvez o fracasso nestas batalhas o mobilize em uma direção diferente. Pode ser uma tentativa de se recuperar e continuar a guerra — respondeu a conselheira.

    O comandante levantou-se bruscamente, fechou os punhos e apoiou-se sobre a mesa dizendo:

    — Senhor, não temos certeza alguma de que qualquer uma dessas… ideias… acontecerá. A movimentação de tropas não significa que todo este plano esteja em ação. — Os outros generais permaneciam imóveis e mudos.

    O rei levantou o braço e balançou a mão pedindo que se sentasse.

    — Não se preocupe. É bom termos uma análise das possibilidades, mesmo que elas não se concretizem. Nada será feito até termos fatos para tomar uma decisão. Continuaremos com a programação para o aniversário e ficaremos atentos ao movimento das tropas aköul, tanto a leste, quanto nos reinos abandonados isköul.

    Möria colocou a mão na nuca do filho e disse a todos:

    — Solicitarei as tropas de reforço e até lá peço que garantam a segurança da cidade, pois amanhã voltaremos a abrir os portões do sul. Atenção redobrada nas vistorias e nas movimentações dentro da cidade — disse aos generais, que concordaram e levantaram-se para sair.

    O comandante passou ao lado de Täira olhando diretamente para ela, que se manteve em silêncio, pensativa. Kemenï levantou-se da cadeira e sentou-se no colo do pai, que o abraçou e disse:

    — Preste atenção, pois um dia terá que tomar estas decisões, certo?

    O garoto riu e segurou a mão da conselheira, que sorriu de volta.

    — Você está bem? Desculpe-me pela atitude do comandante — disse Möria à Täira.

    — Já me acostumei a ser incômoda — respondeu rindo.

    — Pessoas incômodas são aquelas que fazem o mundo girar. Seja para frente, seja para trás.

    Ambos riram e levantaram-se. A conselheira disse:

    — Creio que temos uma cerimônia no final do dia. Gostaria de resolver alguns assuntos com o senhor antes.

    — Vamos até minha sala e conversamos. Kemenï, está livre até o final do dia. Venha para a cerimônia de seus irmãos.

    O garoto saiu correndo da sala e rei e conselheira seguiram para a segunda reunião do dia.

    Möria segurava um gêmeo em cada braço em frente ao altar da gigantesca catedral. Construída na cobertura da torre central da cidade, era o lugar mais próximo do céu que o rei Gladis conseguiu chegar.

    Centenas de pessoas assistiam à cerimônia, quando a jovem conselheira subiu no altar e pediu a todos que ficassem em silêncio.

    — Estamos aqui para desejar a estes dois garotos nossos votos de felicidade. Esta cerimônia representa a força de nossa civilização e o vínculo que criamos entre nós, para protegermos uns aos outros. Todos que estão marcados, fazem parte do todo, mesmo sendo totalmente únicos.

    Täira pegou um pedaço de madeira finamente detalhado do tamanho de uma pena. Sua ponta não era afiada, mas permitia precisão na hora de desenhar o pequeno símbolo na lateral do pescoço dos garotos. Segurou com a outra mão um pote de vidro com um líquido transparente e preparou-se para fazer a marca.

    — Com esta marca, nosso jovem Maöen se tornará parte de nós, e nós faremos parte dele. O ajudaremos a ser único, assim como ele nos ajudará a sermos iguais.

    O rei colocou o bebê de um ano no altar acolchoado e a conselheira começou a fazer a marca do lado direito de seu pescoço, próximo às costas. Sua delicada mão fazia o símbolo com precisão, mesmo cheio de pontos, curvas e retas. Naquele momento a tinta transparente não poderia ser vista, mas dentro de alguns dias o tom avermelhado revelaria a marca da família real. O símbolo, uma espada envolta em arcos de chamas em frente às duas luas de Kera, representavam o poder do desconhecido sobre o poder humano. Fora criado em oposição ao símbolo da família do tirano Gladis Aife, que era uma espada em chamas atravessando as duas luas.

    Assim que terminou, acenou para Möria, que colocou o outro filho no altar.

    — Com esta marca, nosso jovem Väli fará parte de nós, e nós faremos parte dele. O ajudaremos a ser único, assim como ele nos ajudará a sermos iguais.

    Kemenï observava atentamente a precisão do desenho invisível de Täira. Passou a mão na lateral de seu pescoço e sentiu a marca que ele também tinha.

    — Agora que nossos filhos têm nossa marca, podemos estar seguros de que sempre que precisarem, poderão contar conosco, assim como poderemos contar com eles.

    A jovem beijou a testa das crianças e as colocou no colo do pai. Agradeceu a presença de todos e aguardou enquanto a catedral se esvaziava lentamente.

    Quando não havia mais ninguém, sentou-se em um dos degraus do altar e abaixou-se segurando a cabeça com ambas as mãos. Balançava para frente e para trás fazendo pressão na nuca com os dedos. A respiração acelerou-se, seu corpo ficou dormente e sentiu vontade de vomitar. Algo tocou seu ombro e quando se virou, viu apenas uma sombra passando rapidamente pela lateral da catedral a vários metros de distância.

    Assustou-se e rastejou para trás tentando entender o que era aquela sombra, mas estava sozinha ali.

    Levantou-se rapidamente, mesmo sem sentir suas pernas, e saiu pelo corredor central olhando para os lados. Passou pela grande porta de madeira e o sol a cegou momentaneamente. Caminhou apressadamente enquanto tentava retomar seus sentidos por completo. Desceu a escada tropeçando em alguns degraus e pulando outros. Os sons se transformaram em ruídos grosseiros e as imagens ficaram nubladas. O brilho das armaduras reluzia como grandes tochas em seu caminho.

    Algumas pessoas perguntavam se ela estava bem e outras apenas se distanciavam balançando a cabeça para os lados enquanto ela passava. Ninguém poderia ajudá-la.

    Buscou em seu bolso a chave de seu quarto e após várias tentativas, conseguiu entrar. Trancou-se e ficou de costas sobre a pesada porta. O silêncio reinou e o cheiro de flores inundou seus sentidos. De olhos fechados, não sabia se estava em pé ou deitada. Tudo girava.

    Lentamente a respiração voltou ao normal e tornou a sentir seu corpo. Abriu os olhos e estava sentada do outro lado do quarto, sem saber como tinha caminhado até lá. Não se assustava mais com isso. De onde estava via sua cama do lado direito e à esquerda havia um espaço vazio com um tapete vermelho escuro e um armário de madeira preta.

    Engatinhou até o armário e colocou a mão sob ele tateando pelas bordas até ouvir um clique. Algumas engrenagens se moveram e a porta se abriu. O cheiro de sangue velho inundou seus sentidos misturando-se às flores-do-campo que queimavam ao lado de sua cama. Täira fechou os olhos e suas mãos tremeram ao tocar a porta semiaberta. Deslizou os dedos pela lateral e abriu-a lentamente. O rangido a fez arrepiar-se e sorrir ao mesmo tempo, como se estivesse retornando ao local onde estivesse segura.

    Seus olhos abriram-se e suas ferramentas revelaram-se. Tocava cada uma delas recriando as cenas vividas repetidas vezes. Não havia nenhuma ferramenta que não tivesse várias lembranças, mas raras lembranças não exigiram pelo menos uma ferramenta.

    Desta vez ela poderia utilizar uma mais fraca. Uma que não agisse tão profundamente em seu ser.

    Pegou uma pequena faca ainda manchada de sangue e fechou o armário. Levantou-se no centro do tapete e tirou suas roupas, jogando-as ao lado da cama. Em sua pele, as cicatrizes eram marcas de todas suas fraquezas não corrigidas. Olhava para a parede de pedras que continha o símbolo da religião de sua tribo. Ajoelhou-se, fechou os olhos e abaixou a cabeça.

    Enquanto murmurava palavras incompreensíveis, balançava para frente e para trás. Eventualmente ficava imóvel e abria os olhos sentindo que alguém estava atrás dela. Mesmo sem olhar, sabia que algo se movimentava de um lado para o outro do quarto, com passos inaudíveis, mas com presença opressora. Arrepiava-se e tremia segurando a faca com força, até que estivesse sozinha novamente.

    Recitava as palavras que talvez a salvassem um dia, parando quando o calor de uma mão misteriosa era sentido em suas costas, junto a uma respiração ofegante em seus ouvidos. Abaixou-se tentando fugir e queria gritar, mas sabia que nada resolveria. A única solução para acabar com tudo aquilo estava se tornando cada vez mais sedutora, mas por enquanto teria que se conter com seus instrumentos. Uma lágrima escorreu e caiu no tapete, já repleto de marcas de suas tentativas fracassadas de mudar quem era.

    Fechou os olhos e passou a mão sobre sua barriga em busca de alguma cicatriz já recuperada pelo tempo, até que encontrou uma de tamanho ideal. Falou em voz baixa:

    — Você precisa entender o que é sofrimento.

    Ergueu a faca e respirou fundo enquanto a ponta gelada tocava sua pele.

    CAPÍTULO TRÊS

    DESTRUINDO UM IMPÉRIO

    Preciso te contar qual a melhor forma de destruir um império.

    Hatlor Ksori

    O

    general Khoman retornara há alguns dias da batalha na fronteira entre o império Ksoriano e o império khämmae, conhecido como Reinos Unidos. Já descansado da viagem, estava elaborando a nova estratégia que daria mais força aos exércitos e finalmente garantiria a conquista de uma das maiores cidades de Kera: Gladis Aife.

    Os imperadores aköul, Adhija e Agmar, estavam em busca desta conquista há 2 anos e um dos motivos do fracasso eram as ordens dadas pelo próprio imperador. Apesar do general explicar que a movimentação exigida por Agmar não traria a conquista, Khoman não tinha alternativa a não ser seguir as ordens. Ele havia perdido recursos e guerreiros e seu avanço fora imperceptível. Agora teria que lidar com a ira da imperadora e ainda assim não poderia se colocar contra o imperador, pois isso acabaria com todas suas oportunidades de continuar vivo. Ele sabia demais sobre o império e se não servisse mais, teria que ser descartado para não causar problemas futuros.

    Hatlor, filho mais velho dos imperadores, entrou na sala do general sem bater à porta. Vários mapas estavam espalhados sobre uma grande mesa e Khoman se debruçava sobre eles fazendo anotações.

    — Khoman, como estão os planos a oeste?

    Erguendo-se lentamente enquanto repassava sua estratégia recém-traçada nos mapas, respirou fundo e disse:

    — Estou reposicionando nossas tropas que estavam na fronteira. Se quisermos avançar, teremos que regredir e recuperar o fôlego.

    O príncipe, em seus vinte e três anos, não tinha experiência em guerras, mas sua visão da estratégia de ataque era consistente e inovadora e com um pouco de treino conseguiria ótimos resultados. Apontando para algumas cidades, disse:

    — Estas quatro cidades aqui são boas para mantermos nossas tropas. Existem alguns governadores que podemos ter como aliados. Porque você não posicionou nenhuma frente nelas?

    — Não temos mantimentos nestas áreas para suprir os exércitos. Pretendo levar nossos guerreiros a estas cidades depois de conquistarmos estas oito regiões — disse Khoman indicando várias áreas circuladas. — Quando tivermos o controle delas, conseguiremos manter os homens vivos para treinarem enquanto fechamos as alianças com as grandes cidades ao redor. Todas essas regiões são compostas de pequenos vilarejos que conseguimos dominar com facilidade e isso fará pressão nos governadores para que cedam às nossas demandas.

    Hatlor cruzou os braços concordando com a estratégia do general.

    — Interessante e bem similar ao que eu faria. Você já disse isso ao meu pai?

    — Não. Ele estava em viagem no leste e creio que tenha retornado apenas hoje. Estou organizando as ideias para repassar com ele.

    — Entendi.

    O príncipe colocou as mãos atrás do corpo e caminhou de um lado ao outro da sala.

    — Sabe, Khoman, tem algumas coisas que precisam mudar às vezes.

    Hatlor parou e se debruçou na mesa, como o general estava antes, e continuou:

    — Quando vemos potencial nas pessoas, temos que investir nelas para que cresçam cada vez mais. Veja meu pai: ele tem potencial, mas não consegue ter destaque com o que faz.

    Desta vez foi o Khoman que cruzou os braços enquanto observava atentamente o jovem.

    — O que você quer dizer com isso, garoto?

    — Quero dizer que eu, você e meu pai, não conseguimos fazer algumas coisas porque estamos subordinados a outras pessoas que não querem que tenhamos sucesso.

    — Essa conversa de novo — disse o general em voz baixa. — Estamos falando de quem?

    — De quem você acha?

    O general incomodou-se com a pergunta retórica. Da

    Está gostando da amostra?
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