Internato
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Internato - Omar Carline Bueno
INTERNATO
Omar Carline Bueno
Todos os direitos reservados ao autor
©2020 de Omar Carline Bueno
Título original em português:
INTERNATO
Revisão:
Omar Carline Bueno
Capa:
Omar Carline Bueno
ISBN: 978-65-00-07764-3
É PROIBIDA A REPRODUÇÃO
Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida, copiada, transcrita ou mesmo transmitida por meio eletrônico ou gravações, assim como traduzida, sem a permissão, por escrito, do autor. Os infratores serão punidos pela Lei nº 9.610/98.
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
Este trabalho dedico ao meu queridíssimo amigo Paulo Pinto Joazeiro, cuja memória muito contribuiu para que algumas histórias não fossem esquecidas.
Agradeço aos meus superiores por terem me passado conhecimento e sabedoria.
Claudinê Luiz Pessoto
Cônego Luiz de Campos
Irmã Leonor
Irmã Paulina
Luís Antônio Razera
Luís Carlos Moura
Luiz Carlos Daólio
Margarida M. Campos de Souza
Monsenhor Bruno Nardini
Monsenhor Elclides Sena
Nelson de Luccas
Padre Antônio Faur Ramech Saab
Padre Paschoal Brasiliano Canoas
Um agradecimento especial ao amigo José Cláudio Grego, que jamais deixou que esquecêssemos aqueles tempos dourados.
Homenagem especial aos amigos que direta ou indiretamente fizeram parte dessas histórias.
Adebrail Moranza
Alberto Severino Belini
Antônio Carlos Mondini
Antônio Aparecido Fadel
Benedito Carlos de Almeida
Edenir de Oliveira
Gessé de Campos Camargo
João Mário Cerqueira
José Carlos Míssio
José Mafra David
José Maria Stifter
José Roberto de Camargo
Manoel Francisco Tortorella
Marco Antônio Bueno
Paulo Pinto Joazeiro
Pedro Luiz Stahl
Rubens Reinaldo Nogueira
Sebastião Antônio Braga
Prefácio
Certa vez, aprendi com o autor da obra que prefacio, que um livro se vende pela capa. Não estou seguro se a leitura de Internato, de Omar Carline Bueno, está ou não em convergência com essa afirmação. Mas posso seguramente afirmar que, ao lê-lo, somos levados a uma imensidade de imagens e possibilidades que daria margem à criação de muitas capas, tornando o ato de ler criativo, empático e cheio de imaginação.
Se recorrermos ao imaginário popular, influenciado por memórias de tempos passados, os internatos sempre foram fontes de inspiração para a escrita literária. Descritos em obras como O Colégio das Quatro Torres, da escritora inglesa Enyd Blyton, como lugares rígidos, repressivos, austeros e taciturnos para os quais se arquitetam planos de fuga em um constante anseio à liberdade, os internatos continuam sendo um fértil cenário para uma boa narrativa que aguça a curiosidade do leitor.
Longe de reproduzir o mesmo efeito repressor de outrora, Omar Carline Bueno, de forma leve e intimista, nos traz o ambiente de sua infância, cheio de peripécias, conflitos e dilemas tão próprios de sua época, ao mesmo tempo em que nos remonta ao nosso próprio passado, fazendo-nos, em muitos momentos, revivê-lo. Esconder-se, roubar um doce na geladeira, fazer um desenho maroto com a caricatura de um professor, roubar um chiclete, fazer guerrinhas de bolas de papel, tudo isso somado já fez parte da vida de muitos de nós quando crianças, tirando o fato de que, na narrativa, o autor conta com o internato como coadjuvante, o que faz toda a diferença e traz novas nuances àquilo que poderia ser corriqueiro.
Com uma escrita acessível e ao mesmo tempo sofisticada, Omar se lança à composição de uma literatura memorialista, gênero difícil e pouco comum na nossa literatura, trazendo suas memórias como esquetes da vida e conjugando o exercício da memória ao ofício de usar a palavra voltada a um fazer artístico capaz de conquistar o leitor. Com a mesma dinâmica dos antigos folhetins, publicados semanalmente, o enredo prende a atenção, articulado em capítulos curtos e até certo ponto independentes com a completude dos episódios.
As memórias, forma de narrativa pela qual o eu-narrador nos leva ao passado, evoca pessoas, acontecimentos e fatos representativos para o seu processo de subjetivação e, o que mais nos motiva ao ler cada passagem é a diversidade de caminhos e escolhas que não nos prende a uma trama cronológica, distanciando o texto do papel de simples depositário de fatos revividos do passado. Com isso, o leitor perpassa por um tempo fluido, por crônicas de uma vida que são a alquimia necessária para não apenas lembrar do passado, mas refletir o presente e tantas mudanças que a vida contemporânea nos trouxe. É nesse momento de retrotopia que nos arriscamos até mesmo a questionar alguns juízos de valor: seriam tais mudanças boas, ruins?
Muito além de cumprir com uma poética na evasão do tempo e no direcionamento da trama, não nos esqueçamos de fazer uma leitura do traço social que na obra se insere, delineados em momentos de opressão e liberdade, tão próprios de um caminho formativo não só em um Internato, mas em todo e qualquer tipo de instituição educadora e que fez de nosso autor um sujeito político, vanguardista, dialógico e de grande sensibilidade artística.
Ricardo José Orsi de Sanctis
Doutor em Educação pela Universidade de Sorocaba e Professor de Teoria Literária na Universidade Paulista
Introdução
Sempre existiram vários tipos de internatos. Doentes ficam internados em hospitais. Militares, muitas vezes, ficam internados em seus quartéis. Mas talvez os mais famosos foram criados pela Igreja Católica, que no Concílio de Trento, em 1502, criou os Seminários para a formação acadêmica de seus padres.
Hoje em dia, não se justificam mais a existência de internatos integrais na linha educacional acadêmica. A escola integral
, que foi instituída nos tempos atuais, é um modelo de semi-internato, onde os alunos passam o dia na instituição e vão para casa no final do dia.
Mas, não é difícil de se encontrar, até mesmo em livros de romances, as histórias de crianças e jovens que eram enviados para internatos por serem rebeldes ou não se encaixarem nos desejos das famílias. Nesse caso, o internato era bem visto pela sociedade, como uma escola disciplinar e com boa educação regular, religiosa, moral e cívica.
Também não é difícil de se encontrar histórias de jovens, que, por desilusão amorosa, decidiam ser freiras ou monges se internando em conventos e mosteiros.
Essa obra é daquelas em que o autor pode dizer: acreditem, eu estive lá.
Nesse livro, Omar enquadra muito bem duas fases que foram importantes na história do Internato.
Aqui, é colocado o Seminário Menor, onde preparavam-se adolescentes e jovens, nos antigos cursos ginasial e colegial, para posterior ingresso em outro internato, o Seminário Maior, para a formação acadêmica superior e finalmente sacerdotal.
No entanto, tais histórias estavam por terminar, mudando radicalmente o sistema, na metade dos anos 60. E é aí que o Omar entra com uma série de crônicas, de certa forma autobiográficas, fazendo um verdadeiro relato duplo sobre como funcionava o internato, o corpo docente e administrativo, bem como a rotina diária da comunidade.
Antigamente, quando se passava em frente a uma instituição, como foi o Seminário, uma enorme construção, cercada por quatro muros, as pessoas se perguntavam: como se vive fechado aí dentro? Então, o Omar mostra. O que poucos poderiam imaginar é que ali funcionava uma verdadeira comunidade, estruturada e organizada, ainda que não se mirasse o objetivo longínquo e final, que era a realização de uma possível vocação sacerdotal.
É uma obra para ser vista com olhar e mente juvenis
.
Leve-se em consideração a fase da vida de um pré-adolescente e de sua adolescência como passagem para a juventude. O que podem parecer casos corriqueiros, hilários ou mesmo de caráter pessoal, nada mais são do que a verdade, na convivência de centenas dessas criaturas, ainda descobrindo o mundo, por uma perspectiva totalmente diferente do comum e do ambiente familiar.
Conforme o leitor vai se aprofundando na leitura, vai percebendo que também cresce na imaginação o amadurecimento e as brincadeiras vão dando lugar a responsabilidades.
Por fim, o drama do jovem Omar em se definir e se enquadrar na sociedade, deixando para trás um objetivo frustrado ou sendo empurrado a dar um salto entre vocações.
Assim, chegar ao final da leitura, é perceber, com certeza, o gosto, às vezes doce, às vezes amargo, da história de qualquer ser humano.
José Cláudio Grego
Eu também estive lá
.
José Cláudio Grego é Administrador de Empresas, empresário e autor do romance "Adeus Seminário".
Espera a sua vez
Eu devia ter entre oito e nove anos. Naquela época eu frequentava a catequese da igreja Nossa Senhora das Dores, pois minha mãe era católica fervorosa e sempre nos manteve, eu e meus irmãos, na crença e na fé.
Era assim todos os dias. De manhã ia à escola e após o almoço ia para a igreja. Aos domingos e dias santos, lá estava eu ajudando nas missas e cerimônias.
Na semana santa a igreja promovia solenidades e belíssimas cerimônias, que apesar de longas eram muito bem ensaiadas. E foi em um desses ensaios que as coisas se complicaram para o meu lado.
O Monsenhor Mariano, pároco da igreja, era quem comandava as cerimônias e pra ele, tudo tinha que sair perfeito. Era uma igreja muito rica, localizada em um bairro nobre da cidade e seus paroquianos eram pessoas bem abastadas.
O altar, durante essas comemorações, chegava a conter perto de cem coroinhas. Não que todos eles participassem da catequese, mas costumavam aparecer por conta das prendas distribuídas pelo Monsenhor Mariano. Além das balas após os ensaios, ganhávamos um grande pão doce na quinta-feira santa, que representava a última ceia, e um ovo de páscoa após a cerimônia do sábado de aleluia. Assim, muitas crianças de poucas posses vinham de longe por conta de tais mimos. Dessa forma, as cerimônias atraiam pessoas de outros bairros só por conta da estrutura e beleza dos eventos.
Mas foi em um desses ensaios que eu me dei mal. Hoje seria considerado uma atitude agressiva e digna de processo, mas na época, onde o politicamente correto
ainda não existia, e convenhamos, era uma época muito mais feliz, tudo passou como uma forma de educar. E acreditem, era assim mesmo que as coisas aconteciam.
Na última parte de um dos ensaios, todos os coroinhas, que não estivessem ajudando no altar, ficavam nos primeiros bancos da igreja. Após o padre finalizar, todos saíam dos bancos, seguindo os que desciam do altar, e se dirigiam para o fundo da igreja por onde saíam, finalizando assim a cerimônia. Porém, tudo numa certa ordem, ou seja, do primeiro banco para o último, e em fila. Depois, como recompensa, recebiam balas com a promessa de voltarem no dia seguinte para novo ensaio.
Eu deveria estar no quarto ou quinto banco, portanto, pela regra e pelos ensaios constantes, eu deveria esperar a minha vez. Acontece que eu, pensando em me dar bem, e imaginando