A Ditadura nos Trilhos: O Cotidiano dos Ferroviários entre a Repressão e Consenso (1964-1974)
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Sobre este e-book
Quais estratégias utilizaram para sobreviver àquele tempo sombrio?
Qual memória construíram sobre esse passado que não passa?
A obra apresenta as dificuldades enfrentadas pelos ferroviários cariocas, demonstrando como o histórico de luta e mobilização da categoria foi determinante para a intervenção militar na Rede Ferroviária Federal. A autora buscou compreender não apenas de que maneira a violência e a espionagem moldaram a vida cotidiana dos trabalhadores, mas evidenciar a complexidade dos comportamentos sociais durante aquela nova realidade de exceção. Mesmo por meio da autorreivindicação de uma existência comum, a lógica da suspeição recaía sobre os ferroviários, alvos da espionagem e repressão. Foram diversas as estratégias adotadas para sobreviverem e lutarem por direitos. Militantes políticos ou trabalhadores comuns, todos foram considerados potenciais inimigos do regime. A autora Isabella Villarinho lança um novo olhar sobre o cotidiano de trabalhadores no contexto do golpe de 1964 e da ditadura que se seguiu, sem desconsiderar também as batalhas de memória sobre o período, bem como as relações complexas e ambivalentes construídas entre sociedade e ditadura.
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A Ditadura nos Trilhos - Isabella Villarinho Pereyra
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS
Para minha mãe, Eliane, que me ensinou a acreditar e lutar.
AGRADECIMENTOS
O maior agradecimento de todos vai para minha mãe, Eliane. Ela sempre me incentivou a estudar e a lutar pelos meus sonhos. Obrigada pelo apoio incondicional. Sem a sua ajuda, esta pesquisa não existiria. Você é o meu maior exemplo e inspiração. Este livro é, principalmente, para você.
Agradeço à minha orientadora, Janaina Martins Cordeiro. Não só pela dedicação, indicações bibliográficas ou escuta atenta. Mas por toda a paciência, incentivo e oportunidades que me ofereceu desde a graduação. Janaina é uma professora inspiradora, mas, acima de tudo, uma pessoa incrivelmente generosa e acolhedora com todos os seus alunos. Sou eternamente grata e honrada por todos os ensinamentos e, principalmente, por ter ganho uma grande amiga.
À minha família, em especial a meus avós e meu pai. Agradeço ao meu avô Ubiratan e tio-avô Ivan, por inspirarem no tema desta obra e pela contribuição generosa, mesmo que não concordem com o rumo dessa História.
À minha avó Nelly, por sempre me ouvir contar sobre este trabalho
, mesmo sem compreender o porquê ainda não tinha acabado ou o fato de estar estudando tanto e dormindo menos. Ao meu pai, por possibilitar novos voos durante a pesquisa, por me acalmar nos momentos de dúvida e sempre apoiar e acreditar em meu potencial.
Agradeço às amigas que o PPGH-UFF deu-me. Nathália e Rafaela, as pessoas mais inteligentes e dedicadas que conheço, historiadoras incríveis. Obrigada por dividirem comigo as aflições e incertezas, por todo o apoio nos momentos de crise, pela companhia nos eventos acadêmicos, pelas risadas e amizade. Não poderia deixar de agradecer aos amigos que são, também, uma segunda família: Bruna, Anny, Natália, Caio, Thaísa, Rúbia, Bianca, Clarissa e Priscila. Ouviram-me pacientemente falar, reclamar e chorar pelo mesmo assunto. Obrigada por compreenderem minha ausência e fazerem de tudo para que eu não me deixasse levar pelos momentos de desânimo, sempre a postos para oferecer apoio e risadas. À Larissa Sobral, que me ajudou a enfrentar a jornada e acreditar no meu potencial. A torcida de todos foi fundamental.
Agradeço aos professores que também me auxiliaram nesse processo: Deivison Amaral, Vinícius Liebel e Daniel Aarão Reis, pela leitura atenta, indicações bibliográficas, conselhos e pelas disciplinas que auxiliaram na construção da dissertação. À professora Larissa Rosa Corrêa, não só por aceitar compor a banca de qualificação e defesa, como também pelas importantes contribuições que alteraram para melhor o rumo da pesquisa. À professora Lívia Gonçalves Magalhães, que, além de ter participado da banca de qualificação e defesa, sempre foi muito generosa e apoiou-me ao longo deste processo.
Agradeço aos funcionários dos arquivos pesquisados para realização desta obra. Thairine, Joyce e João foram incrivelmente generosos, deram dicas preciosas e realizaram as várias pesquisas que solicitei no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro. Marcelo, Gabriel e Ana, do arquivo do 1º Tribunal Regional do Trabalho, separaram livros e caixas gigantes com todo o carinho, torcendo para que eu encontrasse as fontes que tanto precisava.
Aos funcionários da secretaria do PPGH, sempre solícitos e incansáveis, auxiliando da melhor forma os alunos perdidos, realizando um trabalho de excelência. À Juceli Silva, que me acompanha desde a graduação, obrigada por toda a dedicação e por ser a mãezona dos docentes do Instituto de História da UFF.
Aos meus entrevistados, ferroviários apaixonados pela Central do Brasil, que muito generosamente receberam esta jovem historiadora em suas casas e contaram, durante horas, a respeito de suas histórias de vida e sobre um período que não é fácil de se lembrar. Sem a ajuda de vocês, esta obra não teria sido a mesma. Meus sinceros agradecimentos por toda colaboração.
Aos meus incríveis alunos que acompanharam a dupla jornada desta professora de História entre a sala de aula e a pós-graduação. Obrigada por sempre me apoiarem e incentivarem. As palavras de carinho e a torcida a cada etapa concluída deram me ânimo para fazer sempre melhor. Esta obra também é por vocês e para vocês.
À Capes e ao Programa de Excelência Acadêmica da UFF, pela bolsa que tornou possível a realização de minha pesquisa. Foram muitos deslocamentos a arquivos, compra de livros e apresentações em eventos acadêmicos, que só foram possíveis a partir de financiamento. E ao PPGH da UFF, por realizar um trabalho de excelência com professores e funcionários que são o coração do Instituto de História, por me possibilitar aprender e crescer tanto como pesquisadora, por ter me proporcionado os melhores anos e oportunidades de estudo desde a graduação. O investimento na pesquisa científica e educação pública, gratuita e de qualidade sempre será o melhor caminho.
Obrigada a todos, por terem me ajudado a chegar até aqui.
Você deve notar que não tem mais tutu
e dizer que não está preocupado
Você deve lutar pela xepa da feira
e dizer que está recompensado
Você deve estampar sempre um ar de alegria
e dizer: tudo tem melhorado
Você deve rezar pelo bem do patrão
e esquecer que está desempregado.
Você merece, você merece
Tudo legal, tudo vai mal
Cerveja, samba e amanhã seu Zé
Se acabarem o teu carnaval?
[...]
Você deve aprender a baixar a cabeça
E dizer sempre: muito obrigado!
São palavras que ainda te deixam dizer
Por ser homem bem disciplinado
Deve, pois, só fazer pelo bem da nação
Tudo aquilo que for ordenado
Pra ganhar um fuscão no juízo final
E diploma de bem-comportado.
(Comportamento Geral – Gonzaguinha, 1973)
PREFÁCIO
Por quem a história é feita? A pergunta não possui resposta simples ou direta, mas ronda as mentes de historiadores e intelectuais há séculos. Foi em torno dela que o poeta e dramaturgo alemão Bertold Brecht escreveu na década de 1930 um de seus poemas mais conhecidos. Em Perguntas de um trabalhador que lê
, Brecht indagava:
Quem construiu Tebas, a cidade das sete portas? Nos livros estão nomes de reis; os reis carregaram pedras? E Babilônia, tantas vezes destruída, quem a reconstruía sempre? Em que casas da dourada Lima viviam aqueles que a edificaram?¹
Em certo sentido, pode-se dizer que são também com questões como essas que a historiadora Isabella Villarinho Pereyra procura lidar em seu livro, A ditadura nos trilhos: o cotidiano e dos ferroviários. Neste trabalho, Isabella procura desvendar quem eram e como viviam os trabalhadores ferroviários brasileiros durante os primeiros anos da ditadura civil-militar. Sobretudo, seu trabalho indaga sobre as formas a partir das quais o regime afetou a vida cotidiana desses trabalhadores: como sua linguagem e seus conceitos — permeados por valores e ideias como autoritarismo, obediência e vigilância — moldaram a existência cotidiana e criaram expectativas em torno de determinados comportamentos, delimitando o que era considerado aceitável e o que não era.
Mas a jovem pesquisadora não se limita a buscar respostas nas lideranças do movimento operário. Ao contrário, assim como Brecht incitava ainda nos anos 1930, Villarinho procura ir além dos nomes das lideranças e pergunta-se sobre como aqueles que carregaram as pedras
e permaneceram anônimos viveram, sentiram e agiram sob a ditadura, adaptando-se aos novos tempos, aos novos ganhos, às novas lutas e às novas formas de repressão e opressão. A autora encara, assim, com maturidade e desenvoltura teórica, o desafio de estudar o homem comum
, este ator social sempre buscado pela historiografia, porém difícil de ser alcançado. Mas Isabella não só o alcança, como o traz, na figura do ferroviário, para o centro de sua análise. Desloca, nesse sentido, o foco do sindicato, do trabalhador organizado em instituições de classe para se perguntar justamente por aquele outro, cujos rastros deixados na história são menos evidentes, mais difíceis de serem apreendidos.
Fruto da excelente dissertação de mestrado defendida em 2020 no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense (PPGH-UFF), o livro concentra-se, portanto, no ferroviário não sindicalizado, não organizado. Procura compreender como, no dia a dia do trabalho da sociabilidade construída no espaço da ferrovia, homens e mulheres que se autodefiniam como comuns
ajudaram a moldar e a fazer história, mesmo quando apenas
procuraram se adaptar e viver de acordo com os novos tempos. Nele, a autora recupera brevemente a história e as lutas empreendidas pelos ferroviários no Brasil ao longo do século XX para, então, concentrar-se na dinâmica do movimento às vésperas do golpe de 1964 e, sobretudo, durante a ditadura. Nesse ponto, o trabalho desenvolvido por Isabella demonstra toda a sua potencialidade e as contribuições inovadoras que oferece, ao mesmo tempo, à historiografia do movimento operário no Brasil e aos estudos sobre a ditadura militar.
Assim, ao recuperar a história do movimento dos ferroviários nos primeiros anos da década de 1960, Isabella fá-lo em sua complexidade, demonstrando que esses trabalhadores, longe de posições homogêneas ,possuíam referências diversas, muitas vezes opostas. Em um contexto marcado pela Guerra Fria, a autora analisa como os ferroviários inseriam-se também na lógica polarizada — comunismo x anticomunismo; democracia x totalitarismo; bem x mal — que caracterizou o período. Mas além disso, Isabella Villarinho encara outro desafio: o de estudar o movimento operário — sempre a partir do caso dos ferroviários — durante a ditadura e, em particular, durante os anos de chumbo do regime.
A historiografia sobre o movimento operário no Brasil é extensa, diversa e pulsante. Não obstante, quando se trata de lidar com o movimento operário durante a ditadura, os estudos tendem a se concentrar na conjuntura do golpe e na repressão que se abateu sobre os diversos sindicatos e categorias de trabalhadores nos momentos seguintes da instauração do regime. Avançam, quando muito, até outra conjuntura de crise: o ano de 1968 e as greves que eclodiram naquele momento, seguidas da instituição do Ato Institucional 5, em dezembro. Depois, o que se verifica é um salto: perseguidos, massacrados e desarticulados em 1964 e 1968, os movimentos de trabalhadores ressurgiriam transformados, reatualizados em fins da década de 1970, redefinidos, então, como o Novo Sindicalismo. Mas onde estavam e como viveram os trabalhadores durante a ditadura? Aqui reside uma das contribuições mais importantes da pesquisa de Isabella Villarinho: para além dos momentos críticos de 1964 e 1968, a autora recupera o cotidiano dos trabalhadores da Rede Ferroviária Federal na conjuntura complexa dos primeiros anos da década de 1970, que envolvia repressão e milagre; arrocho salarial e expectativas de ascensão econômica e do poder de consumo; suspeição e euforia nacionalista; enfim, anos de chumbo e anos de ouro.
Nada disso escapa ao olhar atento da pesquisadora, que, se não pode deixar de notar a simpatia de alguns ferroviários pelo regime, também reconhece que a presença constante de agentes da repressão no local de trabalho instituiu, no cotidiano dos trabalhadores, uma dinâmica muito específica que incluía medo, desconfiança e a necessidade de se enquadrar em determinados padrões comportamentais julgados adequados.
Para trabalhar com a noção de cotidiano, fluida e às vezes difícil de ser apreendida, Isabella Villarinho mobilizou não só extensa bibliografia relativa ao campo da História do Cotidiano — sobretudo a Alltagsgeschichte alemã —, mas também da História Social e da Micro-História. Sobretudo, esteve atenta às nuanças e às particularidades que envolvem a abordagem do cotidiano de pessoas comuns em contextos de ditaduras ou autoritarismos. Mas a autora também não se furtou a analisar — de forma cuidadosa e instigante — os processos de construção das memórias dos ferroviários sobre a ditadura. Assim, encarou os desafios colocados pelo tempo presente e demonstrou, com sensibilidade, os meandros dessas memórias em um momento de profunda inflexão para o país e de reabilitação da ditadura em determinados meios sociais e políticos.
A ditadura nos trilhos é, também, o resultado de uma ampla e primorosa pesquisa de fontes. Villarinho demonstrou-se, ao longo de dois anos, incansável na busca de documentos que lhe permitisse reconstituir o cotidiano dos trabalhadores ferroviários nos 10 primeiros anos da ditadura: memórias, biografias, autobiografias, entrevistas, processos trabalhistas, acervos da repressão, arquivos do movimento sindical. A essa pluralidade de fontes, a historiadora lançou olhares individualizados, reconhecendo a especificidade dos conjuntos e oferecendo, a cada um, o tratamento metodológico adequado.
O livro que o autor tem em mãos é resultado de uma pesquisa
original e robusta. Um esforço inteligente, perspicaz e, ao mesmo, tempo muito sensível no sentido de compreender como a ditadura conseguiu estabelecer-se no centro da vida cotidiana de trabalhadores e trabalhadoras do Brasil, mobilizando não apenas corações e mentes, mas também força e poder coercitivo.
Boa leitura!
Janaina Martins Cordeiro
Professora adjunta de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense
Lista de abreviaturas e siglas
Sumário
Introdução 19
CAPÍTULO 1
Crise política e a mobilização ferroviária durante
o governo João Goulart 39
1.1 Sindicalismo, associativismo e anticomunismo: a organização dos ferroviários entre disputas políticas (1950-1960) 40
1.2 Os ferroviários cariocas e o golpe civil-militar de 1964 55
CAPÍTULO 2
A Rede Ferroviária Federal e a ditadura: repressão,
vigilância, adesão e processos de adaptação 77
2.1 O Sistema de Segurança e Informações da Rede Ferroviária Federal: o caso
da Estrada de Ferro Leopoldina 91
2.2 O Setor de Segurança Nacional da Estrada de Ferro Central do Brasil 99
2.3 O cotidiano de trabalho entre a vigilância e repressão 116
CAPÍTULO 3
Os ferroviários em tempos de milagre 127
3.1 A modernização autoritária e o cotidiano de trabalho 128
3.2 Os anos de chumbo entre esquecimento e silêncio 150
CAPÍTULO 4
Nos trilhos da democracia 171
Fontes 189
REFERÊNCIAS 197
Introdução
A primeira metade da década de 1960 no Brasil foi um período de expressiva mobilização social. O governo João Goulart enfrentou desde o início grande resistência de setores específicos da sociedade. Relacionado ao contexto internacional de Guerra Fria, a coalizão formada em oposição ao seu mandato reunia membros da Igreja, militares, burguesia e políticos com o objetivo de barrar a transformação do país no que muitos deles consideravam uma República Sindicalista
ou uma nova Cuba
².
Por ser tratado como herdeiro direto do getulismo e ter uma grande base de apoio entre grupos trabalhistas, a chegada do então vice-presidente ao poder significava para segmentos conservadores da sociedade um passo perigoso em direção ao comunismo. A articulação das direitas para impedir a sua posse, a oposição à campanha da legalidade, bem como a imposição do parlamentarismo como manobra para retirar poderes diretos do presidente não conseguiram enfraquecer as mobilizações sociais por reformas profundas na economia, educação e política.
Trabalhadores urbanos, camponeses, estudantes e oficiais de baixa patente das forças armadas ganharam as ruas em busca de melhores condições de vida e transformação na política. A partir da auto-organização em sindicatos, associações e centrais intersindicais, os trabalhadores reafirmaram seu papel nas mobilizações contra o golpismo das direitas e o patronato. No entanto, essas mobilizações não ocorreram prematuramente. Entre a década de 1950 e o golpe de 1964, houve uma fase de ascensão significativa do movimento sindical, com o crescimento das greves, a visibilidade dos sindicatos na opinião pública, e a participação na formulação de pautas políticas para o país por meio da realização de congressos e encontros nacionais³.
A crise política iniciada com a renúncia do ex-presidente Jânio Quadros e a tentativa de impedir a posse de Jango foram amplamente combatidas pelo movimento sindical. De acordo com Lucília Delgado, as principais manifestações de rua no ano de 1961 tiveram caráter político, em defesa da legalidade do governo⁴. Em agosto, trabalhadores e estudantes do Rio de Janeiro deflagraram greve geral; em Niterói, então capital do estado, dez mil trabalhadores fizeram passeata pela defesa da Constituição e a posse do presidente; os ferroviários da Estrada de Ferro Leopoldina entraram em greve pelas liberdades democráticas e sindicais. Em setembro, marítimos, têxteis, bancários, petroleiros, metalúrgicos e outros setores também decretaram greve para garantir a posse de Goulart⁵.
A unificação de várias categorias profissionais demonstrou que a mobilização dos trabalhadores não se dava apenas por melhores condições de trabalho, mas atuavam efetivamente na política, lutando pela conquista de seus direitos e permanência da democracia. Nesse sentido, a criação do Comando Geral de Greve foi significativa, com o objetivo de unir diversas categorias para coordenar o movimento paredista a favor da legalidade, que em 1962 culminou na criação do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT). A partir dessa organização ampla de diferentes categorias, foram constituídos grupos intersindicais como o CGT e o Pacto de União e Ação (PUA)⁶, importantes na mobilização dos trabalhadores no pré-1964.
Lucília Delgado Neves ainda demonstra que as principais reivindicações do movimento sindical naquele contexto fizeram parte da luta do CGT. Reuniam não somente pontos de caráter corporativo (melhoria de salário e condições de trabalho), como também condições de vida (diminuição do custo de vida e melhoria na alimentação, educação e saúde), além de propostas políticas e econômicas para o país. Ao longo do governo Goulart, o então Comando Geral de Greve participou ativamente na luta pelo retorno do presidencialismo e, após a sua transformação em CGT, apoiou a construção das Reformas de Base, principalmente nos pontos ligados à lei de greve, à lei antitruste e à reformulação da legislação sindical⁷.
O retorno ao sistema presidencialista em janeiro de 1963 e o lançamento do programa das Reformas de Base representaram a esperança de resposta às reivindicações populares. O programa reunia ações como o projeto de reforma agrária mediante indenizações, alteração no preço dos aluguéis, extensão do voto aos analfabetos e militares de baixa patente, nacionalização de setores estratégicos e a limitação das remessas de lucro ao exterior⁸.
Nesse sentido, as propostas de João Goulart e a mobilização popular em torno das reformas representavam grave ameaça aos interesses da elite econômica, transformando os trabalhadores