Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

Colaboração Premiada e Outros Acordos: Análise sistemática e estudo crítico
Colaboração Premiada e Outros Acordos: Análise sistemática e estudo crítico
Colaboração Premiada e Outros Acordos: Análise sistemática e estudo crítico
E-book543 páginas6 horas

Colaboração Premiada e Outros Acordos: Análise sistemática e estudo crítico

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Todos os capítulos do livro partem da premissa de que os acordos no processo penal e no direito público precisam de ser interpretados com base no princípio da ampla defesa (art. 5º, LV, da CR) – única maneira, aliás, de lhes conferir constitucionalidade no direito pátrio.
O leitor pode se regozijar ao encontrar orientações para a elaboração de acordos e ponderações sobre decisões judiciais, que se destinam, de forma primordial, a proteger o investigado, bem como o acusado e o condenado, colocando-os em posição de se defenderem como sujeitos de direitos.
O livro reflete o pensar de operadores do direito convictos de que aquele, envolvido com a persecução estatal, sempre guarda esferas de liberdade. Logo, os modelos consensuais para resolução de causas penais e de direito público devem lhe respeitar múltiplos direitos, em especial, o direito de livremente optar, ou não, por realizar transação, ou negócio jurídico processual.
Em suma, os acordos com o Estado devem ser resultado da escolha do indivíduo frente a sua existência, mediante o exercício do direito da defesa – algo inerente a si, bem assim à essência humana. Agentes públicos devem lhe considerar, portanto, como indivíduo, com autonomia de vontade, inocente por definição jurídico-constitucional (art. 5º, LVII, da CR).
IdiomaPortuguês
Data de lançamento30 de nov. de 2022
ISBN9786586352672
Colaboração Premiada e Outros Acordos: Análise sistemática e estudo crítico

Relacionado a Colaboração Premiada e Outros Acordos

Ebooks relacionados

Direito Penal para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Avaliações de Colaboração Premiada e Outros Acordos

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    Colaboração Premiada e Outros Acordos - Editora Singular

    CAPÍTULO 1

    A AUTONOMIA DE VONTADE DAS PARTES E AS RELAÇÕES PROCESSUAIS

    Ao longo do tempo, a forma de interação entre a vontade das partes e as regras processuais sofreu variações, de acordo com os distintos momentos históricos e com as diferentes características sociais, políticas e ideológicas1.

    A partir do final do século XVIII e início do século XIX, as discussões sobre essa temática começam a ganhar importância. Isso porque, até então

    o processo era visto exclusivamente sob uma ótica privatística, resultante de uma suposta relação contratual – delineada pela litis contestatio – através da qual as partes acordavam em submeter a decisão de seus conflitos de interesses a um terceiro. O processo era visto como um contrato firmado entre as partes2.

    Possível afirmar, portanto, que até o início do século XIX, prevalecia o caráter privatístico do processo, ainda influenciado pela ideia da litis contestatio do direito romano, "um consenso progressivo, ao final do procedimento in iure, verificado entre os litigantes quanto ao objeto da fórmula, e que culminava com o decretum do pretor. O escopo primordial da litis contestatio seria, portanto, o de fixar o ponto ou pontos litigiosos da questão, definindo os lindes da sentença a ser proferida pelo iudex e obrigando os litigantes a respeitá-la"3.

    Ao final do século XVIII, já se verifica certa tendência de reforma do sistema judiciário dos países europeus. De acordo com António Manuel Hespanha:

    os mais ilustres juristas da segunda metade do século XVIII propõem uma profunda reforma judiciária que ponha termo ao ‘despotismo dos tribunais’ (Condorcet, 1743-1794), depositando exclusivamente na mão do legislador a tarefa de interpretar a lei obscura. (...) O fim era o de substituir o caos do direito e da justiça por sistemas jurídicos certos e previsíveis, baseados em códigos sintéticos e sistemáticos e numa doutrina orientada por grandes princípios, evidentes e estáveis4.

    Assim, no período posterior à Revolução Francesa, desapareceram as jurisdições dos senhores feudais, das corporações e das ordens religiosas, consagrando-se a ideia de Justiça como monopólio do Poder Público, que a exercia por meio da atuação do chamado juiz boca da lei, em benefício da ordem pública e da paz social5.

    O apontado caráter liberal do processo nesse período decorria muito mais da indiferença do julgador quanto à delimitação fática e jurídica do objeto litigioso, à prova dos fatos, ao drama humano, ao impacto das suas decisões sobre os interesses das partes6, do que a construções teóricas que buscassem consagrar o individualismo característico do período. Como ensina o professor Cândido Rangel Dinamarco:

    naquele mundo ultraliberal, era natural também que o processo fosse visto como o campo onde os particulares travam o duelo de seus interesses substanciais e não um dos possíveis instrumentos para a realização publicística dos preceitos materiais contidos no ordenamento jurídico; era natural que se acreditasse ser escopo do processo a tutela jurídica de direitos ou de interesses privados; e era natural afirmar que a ação é um direito que se exerce contra o adversário, não perante o Estado7.

    Entretanto, esse cenário altera-se, a partir da obra de Oskar von Bülow sobre as exceções e os pressupostos processuais8, vinda a público em 1868, que reconheceu a autonomia da relação jurídico-processual em relação às regras de direito material, inaugurando a chamada escola publicista do processo9.

    Passou-se a admitir a existência de uma relação jurídica de direito público, marcada pela presença do Estado-juiz, que se mostrava distinta e independente da relação substancial litigiosa10. Iniciou-se, assim, a chamada fase autonomista, que permitiu o desenvolvimento de inúmeros estudos sobre institutos relevantes do direito processual civil, como, por exemplo, a ação e suas condições, os pressupostos processuais, o conceito de mérito no processo civil, entre outros.

    Consequentemente, diminuiu-se de forma considerável a margem para admissão da manifestação de vontade das partes no processo judicial. Em verdade, "Bülow voltou-se contra a ‘teoria da mutação’ (Mutationstheorie), segundo a qual as partes poderiam modificar, pela sua vontade, o direito positivo vigente. Para ele, seria impossível imaginar que houvesse um ato de vontade de um sujeito privado que mudasse regras processuais ou suspendesse a eficácia de normas cogentes. Os acordos processuais, fora do que fosse expressamente definido pela lei, significariam ofensa à moldura legal"11.

    Esse modo de pensar a relação processual ganhou, rapidamente, adeptos em toda a Europa, sendo adotado pelos Códigos de Processo Civil da Áustria (1895), da Alemanha (1896), da Hungria (1911), da Noruega (1915), e pela Lei de Procedimento Civil Federal da Suíça (1947)12.

    Além disso, abriu caminho para o desenvolvimento da ciência processual. Na Itália, muitos doutrinadores do final do século XIX e início do século XX aderiram à nova doutrina proveniente das universidades tedescas13.

    Consolidou-se, portanto, o entendimento de que a relação jurídica processual tinha caráter público, o que levou o interesse analítico a se centrar na função jurisdicional e nos atos dos juízes. Firmou-se a ideia de que as normas processuais teriam caráter público e natureza cogente, sobrepondo-se à vontade das partes14.

    Próximo da metade do século XX, no entanto, o cenário começa a se alterar. O mundo se viu imerso em um conflito sem precedentes, que causou a morte de quarenta milhões de pessoas15. Logo após o hasteamento das bandeiras brancas, os países do chamado mundo ocidental buscavam curar seus feridos, enterrar seus mortos e buscar a construção de um modelo de Estado que pudesse promover a paz.

    Nesse contexto, consolidou-se o entendimento de que o Estado deveria existir para servir os cidadãos – e não o contrário. Para tanto, caberia ao Poder Público assegurar o respeito aos direitos humanos e a promoção do bem-estar social.

    Essa nova ideologia não poderia deixar de produzir efeitos no âmbito do processo judicial, encarado como instrumento de exercício do poder estatal16.

    Surgem novas preocupações no campo do direito processual, que ressaltam a necessidade de criação de instrumento apto a garantir a efetiva tutela dos direitos dos cidadãos, ainda que em confronto com a posição do Estado.

    Passa-se a buscar, a partir de então, a figura de um juiz inicialmente inerte, mas que possa atuar de forma imparcial e independente, a partir da provocação dos interessados, assegurando-lhes o acesso a instrumento justo de solução de controvérsias17.

    Valorizam-se, ainda, as ideias de inafastabilidade do contraditório participativo e de garantia da mais ampla defesa, como verdadeiros roteiros, aptos a levar os participantes do processo judicial a resultado mais próximo do justo, com a aplicação concreta das regras do direito objetivo.

    Pode-se constatar, assim, certo movimento pendular, que ora valoriza o interesse privado, ora privilegia o aspecto publicístico da relação processual. De início, o processo era encarado como coisa das partes18, sendo certo que, com o passar dos anos, ganhou força o entendimento de que o direito processual era parte indissociável do direito público, sendo as relações jurídicas processuais marcadas pelo caráter publicístico19.

    No entanto, é preciso reconhecer que o publicismo exacerbado vem sendo mitigado. O pêndulo parece estar se movendo novamente.

    Em busca da plenitude da função do processo judicial e da máxima eficácia do instrumento estatal eleito para efetivação das regras de direito material, parece clara a necessidade de conferir maior importância à atuação das partes. A esse respeito, a lição do professor Leonardo Greco, para quem

    (...) é preciso explorar com mais argúcia os espaços de liberdade que as partes devem poder exercer na relação processual e que foram tão intensamente sufocados pela prevalência de uma sistemática concepção publicista, da qual ainda temos muita dificuldade de nos emancipar, pois somos herdeiros de uma tradição cultural de paternalismo estatal e as deficientes condições de vida e da educação básica da maioria da população brasileira infelizmente não contribuem para que os indivíduos se tornem capazes de dirigir o seu próprio destino, sem necessidade de proteção da autoridade estatal20.

    Em valorosa compilação doutrinária, Antonio do Passo Cabral enumera os precursores desse movimento na primeira metade do século XX, até chegar a Peter Schlosser, a quem é atribuída a paternidade da máxima in dubio pro libertate aplicada ao direito processual, que demonstraria a preferência do ordenamento em favor da conformação do processo à vontade das partes21.

    Prossegue o professor carioca, apresentando os efeitos da ampliação da liberdade no âmbito processual em terras francesas, com especial destaque para o entendimento jurisprudencial, uma vez que foi o fracasso da rigidez do procedimento e dos instrumentos de adaptação existentes que levou os juízes e tribunais a buscarem novas técnicas para assegurar maior flexibilidade22.

    Na Itália, os estudos sobre a autonomia da vontade no processo ganharam corpo a partir da nova redação do artigo 81-bis, do Código de Processo Civil, que introduziu no ordenamento jurídico a calendarização processual23. Nos Estados Unidos, por sua vez, não há grandes estudos sobre o tema, embora se admita a influência ampla das partes no curso do processo, ínsita ao sistema adversarial24.

    Esse movimento também produziu efeitos no Brasil, onde a temática da valorização da vontade das partes passou a contar com maior relevância, a partir das discussões para modernização e reformulação da legislação processual civil. Ao final, a participação efetiva dos litigantes ganhou importância, a partir da consagração da possibilidade de adaptação do procedimento, para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo (artigo 190, do Código de Processo Civil); e da calendarização do processo (artigo 191, do Código de Processo Civil).

    Como se pode ver, a influência da vontade das partes no âmbito do processo judicial parece passar por momento de franca ascensão, influenciada pela busca de efetividade, que atribui papel cada vez mais relevante à conduta processual dos litigantes e a seus respectivos interesses25. Afinal, como esclarece o professor Loïc Cadiet, o processo não é mais nem ‘coisa do juiz’ nem ‘coisa das partes’; ele é às vezes coisa do juiz, porque a jurisdição é um serviço público que implementa uma função estatal; e coisa das partes porque o processo põe em causa interesses privados, os quais o juiz é chamado a decidir26.

    Esse contexto de valorização da autonomia da vontade frente ao caráter cogente e indisponível das relações processuais parece ter influenciado o legislador, que passou a propor ajustes no modelo processual brasileiro, com o deliberado intuito de simplificá-lo27 e de valorizar a cultura da pacificação entre os litigantes, conforme expressamente consignado na Exposição de Motivos do Anteprojeto de Código de Processo Civil, nos seguintes termos:

    2) Pretendeu-se converter o processo em instrumento incluído no contexto social em que produzirá efeito o seu resultado. Deu-se ênfase à possibilidade de as partes porem fim ao conflito pela via da mediação ou da conciliação. Entendeu-se que a satisfação efetiva das partes pode dar-se de modo mais intenso se a solução é por elas criada e não imposta pelo juiz28 29.

    E, de fato, esse propósito acabou refletido no parágrafo 2º, do artigo 3º, do Código de Processo Civil: O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. Comprometida com o projeto de criação de sistema multiportas de solução de controvérsias30, a novel legislação optou pela valorização da atuação direta das partes, como vetor para maior eficiência na solução das controvérsias.

    Consequência imediata e mais visível dessa constatação foi a elevação do negócio jurídico-processual à categoria autônoma, em uma das principais inovações do novo marco regulatório processual civil31. Contudo, a valorização da atuação direta das partes não se limitou a esse aspecto, merecendo destaque também a figura da colaboração processual, dos acordos de não persecução penal e de leniência, que vêm se tornando importantes vias para solução de intrincadas questões relacionadas à entrega de prestação jurisdicional.

    Nota-se que, no processo penal, a possibilidade de o envolvido na persecução penal poder transacionar direitos nasce a contar da perspectiva de que o faz no plano do exercício da ampla defesa (art. 5º, LV, da CR), pois, sem essa premissa constitucional não se poderia compreender a validade e a eficácia de institutos pertinentes à colaboração processual e aos acordos de não persecução penal. Como se verá no decorrer deste estudo, a referida premissa será essencial para interpretação e aplicação das regras jurídicas sob análise.

    É a partir da busca por novas formas de pensar, revisitando temas e reinventando métodos32 – da qual a valorização da atuação do investigado, do acusado, das partes no âmbito das relações processuais é importante exemplo –, que se poderá alcançar maior efetividade, tornando o processo mais eficaz e, ao final, justo, sempre que garantidos direitos e garantias constitucionais.


    ¹ A esse respeito, segue o trecho da obra de Piero Calamandrei, dedicada à análise das relações entre as instituições sociais, políticas e processuais: También el proceso no es sino un aspecto de esta vida, y las leyes procesales no son outra cosa que uma frágil red a través de cuyas malas pressiona y a veces desborda la realidade social. Proceso y democracia. Tradução para o espanhol de Hector Fix Zamudio. Buenos Aires: EJEA, 1960. p. 49.

    ² JARDIM, Afrânio Silva. Da publicização do processo civil. Rio de Janeiro: Liber Juris, 1982. p. 73-74.

    ³ TUCCI, José Rogério Cruz; AZEVEDO, Luiz Carlos de. Lições de história do processo civil romano. 1. ed. 2. tir. São Paulo: RT, 2001. p. 100.

    ⁴ HESPANHA, António Manuel. Cultura Jurídica Europeia: síntese de um milênio. Coimbra: Almedina, 2015. p. 349.

    ⁵ A esse respeito, são valorosas as lições de Niceto Alcalá-Zamora y Castillo, na obra Notas relativas al concepto de jurisdicción. Estudios de teoría general e historia del proceso (1945-1972). México: Unam, 1974. t. I, p. 33.

    ⁶ GRECO, Leonardo. Publicismo e privatismo no processo civil. São Paulo, Revista de Processo, ano 33, n. 164, p. 29-56, out. 2008.

    ⁷ DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. 3. ed. v. 1. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 41.

    ⁸ BÜLOW, Oskar von. Teoria das Exceções e dos Pressupostos Processuais. 2. ed. Tradução Ricardo Rodrigues Gama. São Paulo: LZN, 2005.

    ⁹ Remo Caponi utiliza a expressão terremoto para sinalizar a importância do movimento de independência e consolidação do direito processual, que teve origem na Alemanha. Autonomia privata e processo civile: gli accordi processuali. Civil Procedure Review, v. 1, n. 2, jun. 2010, p. 44.

    ¹⁰ Von Bülow não foi, na realidade, o primeiro a intuir a existência dessa relação processual. Antes dele, já tinha sido feita referência a esta na obra de Bethmann-Hollweg, que ele próprio cita. Seu mérito indiscutível foi o de apresentar sistematicamente a teoria da relação processual, que antes fora objeto de um simples aceno. Vieram depois sérias disputas a respeito (a relação é linear, angular ou triangular?) e até se contestou a validade da descoberta, mas é uma verdade reconhecida pelos processualistas de hoje que a teoria da relação jurídica processual foi o marco inicial da independência do direito processual como ramo autônomo da árvore do direito. Só a partir daí é que foi possível o desenvolvimento científico do direito processual e o encaminhamento da solução de suas questões fundamentais (especialmente daquelas referentes aos seus institutos básicos: jurisdição, ação, defesa e processo). DINAMARCO, Cândido Rangel. op. cit. p. 41-42.

    ¹¹ CABRAL, Antonio do Passo. Convenções Processuais. Salvador: Jus Podivm, 2016. p. 99-100.

    ¹² CAPPELLETTI, Mauro Amparo. Proceso, ideologias, sociedad. Buenos Aires: Ediciones Juridicas Europa-America, 1974. p. 43-45.

    ¹³ Entre muitos, a título de exemplo, Giuseppe Chiovenda defendia o caráter público da relação jurídica de direito processual, admitindo os acordos processuais de maneira muito restrita, afirmando que la presenza dunque di um organo dello Stato nel processo fa si, che soltanto in pochi casi siano validi gli accordi delle parti per regolare a modo loro il rapporto processuale, in guisa che la parte possa pretendere di fronte ala parte il rispetto dell´accordo. Principii di diritto processuale civile. Napoli: Jovene, 1965. p. 105.

    Salvatore Satta, por sua vez, negava com maior ênfase a possibilidade da vontade das partes produzir efeitos no processo, ressaltando o caráter público e francamente indisponível da relação processual. Contributo alla dottrina dell´arbitrato. Milano: Vita e Pensiero, 1931. p. 43.

    Enrico Tullio Liebman também se posicionava contra a existência de negócios jurídicos de caráter processual, ressaltando a previsibilidade legal dos atos jurídicos, que reduziria os espaços para a interferência da vontade das partes. Manual de direito processual civil, v. 1, Rio de Janeiro: Forense, 1985. Tradução e notas de Cândido Rangel Dinamarco, p. 227.

    ¹⁴ Ao estudar o fenômeno do aumento do publicismo no processo, Pedro Henrique Pedrosa Nogueira enumera objeções à valorização da vontade das partes: "i)a incorporação da figura tipicamente privatística ao processo poderia ser fonte de equívocos e poderia atingir a própria autonomia do Direito Processual quanto à disciplina das formas processuais; ii) os atos negociais celebrados fora do processo não teriam propriamente efeitos processuais ligados à vontade do agente (os efeitos desses atos para o processo sempre seriam ex lege); iii) as declarações negociais não produziriam efeitos imediatamente, mas somente após a intervenção ou intermediação judicial; iv) os negócios jurídicos com relevância processual (v.g. alienação da coisa litigiosa) seriam para o processo meros fatos". Negócios jurídicos processuais: análise dos provimentos judiciais como atos negociais. Tese de Doutorado. Salvador: JusPodivm, 2010. p. 138.

    ¹⁵ Sobre o tema, vale a leitura da obra A Segunda Guerra Mundial – Os 2.174 dias que mudaram o mundo, de Martin Gilbert. Rio de Janeiro: Editora Casa da Palavra, 2014.

    ¹⁶ Como escreve o professor Leonardo Greco, a Assembleia parlamentar europeia, reunida em 1949, da qual participavam Winston Churchill e vários homens públicos perseguidos pelo nazifascismo, fez a crítica da inoperância e da submissão a que se confinou o Judiciário durante os regimes de força. Daí nasceu a proposta de criação de uma Corte supranacional de Direitos Humanos, para que estes não ficassem no papel e para que os juízes nacionais se conscientizassem, diante de quaisquer ameaças, que um poder mais alto os apoia e os sustenta, no cumprimento de sua mais nobre missão. op. cit. p. 41.

    ¹⁷ No plano processual, consegue-se essa participação mediante a observância do princípio do contraditório. Assim, desde que o legislador assegure às partes o direito de participar da formação do provimento jurisdicional, influindo no seu conteúdo, nenhum mal há em reforçar a autoridade do juiz no processo, a fim de que ele também contribua para que o instrumento alcance efetivamente os resultados desejados. Constitui o contraditório o tempero e a compensação necessários a evitar que a autoridade do magistrado seja transformada em arbítrio. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do Juiz. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2009. p. 77.

    ¹⁸ MOREIRA, José Carlos Barbosa. Privatização do processo? Temas de direito processual, sétima série. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 12.

    ¹⁹ Como ensina o professor Cândido Rangel Dinamarco, consolidou-se a ideia de que a função jurisdicional teria maior amplitude, extrapolando a tutela do direito objetivo, anotando-se a existência de escopos sociais (pacificação de conflitos, promoção da igualdade) e políticos (afirmação do poder estatal, proteção da liberdade individual, fomento à participação dos cidadãos na vida política do país) ao processo. A instrumentalidade do processo. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 163 et seq.

    ²⁰ op. cit. p. 55.

    ²¹ op. cit. p. 114-116.

    ²² op. cit. p. 118.

    ²³ Sobre o desenvolvimento dos acordos na Itália, remete-se à obra de Titina Pezzani, intitulada Il Regime convencionale delle prove. Milano: Giuffré, 2009. Digna de menção, ainda, o Supplemento dela Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile denominado Accordi di parte e Processo, publicado no ano de 2008.

    ²⁴ DODGE, Jaime L. The limits of procedural private ordering. Virginia Law Review, v. 97, n. 4, jun. 2011. p. 732.

    ²⁵ A esse respeito, esclarecendo que a dicotomia poderes dos magistrados x vontade das partes está relacionada à divisão de trabalho ao longo do processo, cf. MOREIRA, José Carlos Barbosa. O problema da divisão de trabalho entre juiz e partes: aspectos terminológicos. Temas de direito processual, quarta série. São Paulo, 1989.

    ²⁶ Prefácio à obra de Antonio do Passo Cabral. Convenções Processuais. Salvador: JusPodivm, 2016. p.12.

    ²⁷ Merece referência a posição de Fernando da Fonseca Gajardoni, que, como muitos outros estudiosos, critica o resultado da reforma legislativa, por considerar que em vez de simplificar o direito processual civil, tornando-o mais claro e compreensível, as alterações acabaram tornando o processo mais complexo. O Modelo presencial cooperativista e os poderes e deveres do juiz no novo CPC. In: O Novo Código de Processo Civil – Questões Controvertidas. São Paulo: Atlas, 2015. p. 136.

    ²⁸ Exposição de Motivos do Anteprojeto de Código de Processo Civil. Brasília, 08 de junho de 2010. Disponível em: https://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf. Acesso em: 2 nov. 2017.

    ²⁹ O incentivo à composição foi inspirado pelas reformas do processo civil alemão, sintetizadas pelo professor José Carlos Barbosa Moreira, já anteriormente, por força de uma lei de 1999, os órgãos legislativos dos ‘Lander’ tinham sido autorizados, sob determinadas circunstâncias, a exigirem, como requisito de admissibilidade da ação, que se realizasse prévia tentativa de conciliação extrajudicial. Doravante, nos termos do art. 278, deve o tribunal, em princípio, levar a efeito a tentativa, ordenando o comparecimento pessoal de ambas as partes. O órgão judicial discutirá com elas a situação, poderá formular-lhes perguntas e fazer-lhes observações. Os litigantes serão ouvidos pessoalmente e terá cada qual a oportunidade de expor sua versão do litígio. Se ao tribunal parecer adequado, caber-lhe-á propor às partes que se submetam a uma mediação extrajudicial, com suspensão do processo. Caso a tentativa de conciliação tenha êxito, o feito se extinguirá por transação. Breve notícia sobre a reforma do processo alemão. In: Revista de Direito Comparado Luso-Brasileiro, n. 23, publicação semestral do Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, Rio de Janeiro, 2003. p. 29.

    ³⁰ O conceito de sistema multiportas foi desenvolvido pelo Professor Frank E.A. Sander, da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard. A matéria foi tratada, pela primeira vez, em conferência realizada em 1976, cujo objetivo consistia no tratamento que deveria ser conferido aos problemas enfrentados pelos juízes na administração da justiça. KESSLER, Gladys; FINKELSTEIN, Linda J. The evolution of a Multi-Door Courthouse. In: Catholic University Law Review, v. 37, p. 577, 1988. De acordo com essa perspectiva, a via judicial seria apenas uma entre diversos mecanismos existentes para a solução de controvérsias. Juntamente com o processo contencioso, deveriam existir outros instrumentos à disposição do jurisdicionado – tais como a conciliação, a mediação, a arbitragem –, e que poderiam ser utilizados dependendo das circunstâncias envolvidas na situação concreta. A perspectiva apresentada por Sander intrigou o juiz H. Carl Moultrie, que atuava na Corte Superior do Distrito de Colúmbia, e passou a defender que, por meio do sistema multiportas, os cidadãos poderiam ter acesso mais fácil à Justiça.

    O inovador sistema então proposto apresentava vantagens interessantes. Aqueles que se sentissem intimidados pelo processo de natureza contenciosa, ou não dispusessem de recursos para o custoso procedimento existente em território norte-americano, poderiam recorrer à mediação ou à arbitragem. Os métodos alternativos de solução de controvérsias reduziriam o número de processos e julgamentos e, ao mesmo tempo, permitiriam que os juízes se dedicassem com mais cuidado aos casos que seguissem a via do litígio. De forma paralela, o envolvimento das partes na solução das controvérsias poderia lhes proporcionar conhecimento mais profundo acerca das consequências advindas de suas decisões, conferindo maior legitimidade ao resultado do processo.

    ³¹ É bem verdade que as convenções em matéria processual já contavam com previsão no ordenamento jurídico brasileiro, podendo-se destacar a suspensão convencional do processo, a dispensa da audiência, o adiamento do julgamento em segundo grau, entre outros. Contudo, os dispositivos que legitimavam a manifestação da vontade das partes estavam dispersos pelo Código de Processo Civil e pela legislação esparsa, sem a existência de cláusula geral. A esse respeito, merece destaque o entendimento de Flávio Luiz Yarshell, no artigo Convenção das partes em matéria processual: rumo a uma nova era? In: CABRAL, Antonio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa (coord.). Negócios processuais. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 63.

    ³² BONÍCIO, Marcelo José Magalhães. Proporcionalidade e processo: a garantia constitucional da proporcionalidade, a legitimação do processo civil e o controle das decisões judiciais. São Paulo: Atlas, 2006. p. 16.

    CAPÍTULO 2

    DA COLABORAÇÃO PREMIADA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: PANORAMA E CRÍTICA DO NOVO INSTITUTO

    2.1. Marco normativo da colaboração premiada no ordenamento jurídico brasileiro

    O instituto da colaboração premiada, não raras vezes, é visto como algo recente no ordenamento jurídico brasileiro, que acabou por ser adotado de maneira inovadora em casos atuais de notória exposição midiática. Contudo, a ideia da justiça negocial não se mostra nova no processo penal brasileiro e, por meio do contorno histórico conduzido a seguir, pode-se notar que a colaboração premiada já foi regulada em variadas legislações e aplicada em distintos casos anteriores à deflagração das operações policiais mais recentes.

    Nesse sentido, embora os regimes legais apresentem variações na denominação do instituto e na disciplina de seus efeitos na esfera penal, todas as disposições que abordam o tema apresentam igual propósito, qual seja, conceder determinado benefício àquele que esteja disposto a colaborar com a investigação criminal.

    O instrumento negocial surge, pela primeira vez, no artigo 8º, parágrafo único, da Lei Federal nº 8.072/90 (Lei de Crimes Hediondos), ao dispor que o participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços. Apesar de já delimitar a existência do instituto, tal diploma legal, embora vigente, não traz qualquer previsão quanto ao procedimento a ser adotado ou quaisquer aspectos processuais.

    Em 1995, a promulgação da Lei Federal nº 9.034/95 veio acompanhada da possibilidade de redução da pena na hipótese de a colaboração espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais. Referida legislação, porém, foi revogada pela Lei Federal nº 12.850/13, que será analisada ainda neste tópico.

    Naquele mesmo ano, o instituto da colaboração premiada passou a ser previsto também, sob a mesma redação, na Lei Federal nº 7.492/86 e na Lei Federal nº 8.137/90, que disciplinam, respectivamente, crimes contra o sistema financeiro nacional e contra a ordem tributária, que assim dispõem: nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou coautoria, o coautor ou partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços.

    Embora a redação de tal dispositivo fosse categórica sobre a necessidade de a confissão ser espontânea, novamente não havia qualquer disciplina sobre os aspectos processuais e sobre a expansão do instituto, o que somente veio a ocorrer com a promulgação da Lei Federal nº 9.613/98. Referido diploma legal, em seu texto original33, facultava ao juiz penal a possibilidade de não aplicar a pena, ou substituí-la por restritiva de direitos, em face dos indivíduos colaboradores.

    Seguindo a linha de ampliar o instituto, a Lei Federal nº 9.807/99, em seus artigos 13 e 14, vigentes até o momento, previu a possibilidade de a colaboração premiada resultar em duas alternativas: perdão judicial e redução da pena de um a dois terços, conforme se verifica abaixo:

    Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a consequente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:

    I - a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;

    II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada;

    III - a recuperação total ou parcial do produto do crime.

    Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.

    Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um a dois terços.

    Art. 15. Serão aplicadas em benefício do colaborador, na prisão ou fora dela, medidas especiais de segurança e proteção a sua integridade física, considerando ameaça ou coação eventual ou efetiva.

    § 1o Estando sob prisão temporária, preventiva ou em decorrência de flagrante delito, o colaborador será custodiado em dependência separada dos demais presos.

    § 2o Durante a instrução criminal, poderá o juiz competente determinar em favor do colaborador qualquer das medidas previstas no art. 8o desta Lei.

    § 3o No caso de cumprimento da pena em regime fechado, poderá o juiz criminal determinar medidas especiais que proporcionem a segurança do colaborador em relação aos demais apenados.

    Até aquele momento, portanto, os dispositivos que disciplinavam o mecanismo ainda não traziam previsões sobre o procedimento a ser adotado e tampouco concebiam a colaboração premiada como um instituto estabelecido entre os atuantes na persecução penal, o que somente começou a ser desenhado com a Lei Federal nº 10.409/2002 (Lei de Entorpecentes), ao dispor, em seu artigo 32, §2º, que "o sobrestamento do processo ou a redução da pena podem ainda decorrer de acordo entre o Ministério Público e o indiciado que, espontaneamente, revelar a existência de organização criminosa, permitindo a prisão de um ou mais dos seus integrantes, ou a apreensão do produto, da substância ou da droga ilícita, ou que, de qualquer modo, justificado no acordo, contribuir para os interesses da Justiça".

    Foi somente com a promulgação da Lei Federal nº 12.850 (Lei de Organizações Criminosas), no ano de 2013, que o legislador trouxe inovações sobre a regulação do instituto, denominando-o colaboração premiada e dispondo sobre o seu regime procedimental.

    Vale frisar que referida legislação, embora torne evidente as regras para os mecanismos da colaboração premiada, ainda apresenta falhas e insuficiências, decorrentes da tentativa de adaptar a justiça consensual a processo penal construído a partir de um sistema mais próximo ao acusatório, regido pelo princípio da obrigatoriedade, que se dissocia do objetivo negocial.

    Daí, sob o ponto de vista aqui defendido, interpretar-se a colaboração processual a contar de direitos e garantias individuais, tais como a ampla defesa, a presunção de inocência e a não autoincriminação, o que permite se evitarem equívocos na aplicação da lei.

    O advento da Lei Federal nº 13.964/19 (Pacote Anticrime), a seu turno, veio acompanhado de importantes inovações na temática da colaboração premiada, cujas principais alterações e introduções serão ora discutidas, em conjunto com seus reflexos para os casos atuais.

    2.2. Natureza Jurídica

    2.2.1. Meio de prova ou meio de obtenção de prova?

    O estudo de problemas empíricos atinentes ao acordo de colaboração premiada não deve ser precedido apenas da compreensão de seu marco normativo, mostrando-se necessário também estabelecer a sua natureza jurídica. Resgatar a essência do instituto não se exibe, pois, mero exercício teórico, ou intelectual.

    Ao contrário, situá-lo dentro do universo do processo penal permite identificar com maior facilidade quais princípios e regras deverão reger sua utilização. A natureza jurídica desponta, portanto, como ferramenta essencial à praxis – em especial considerando-se que a legislação pertinente ainda não conta com previsões detalhadas o suficiente a instrumentalizar a solução de todas as questões que podem advir da utilização do acordo de colaboração premiada.

    Por se tratar de instrumento que viabiliza a obtenção de informações acerca de ilícitos penais dos quais o colaborador premiado participou, deve-se classificar a colaboração premiada mediante análise de seu papel probatório. Por esse motivo, os debates acerca da natureza jurídica do acordo de colaboração premiada acabaram centrados em definir se constituiria ele meio de prova ou meio de obtenção de prova.

    Distingui-los mostra-se tão simples quanto essencial. Os meios de prova são veículos materiais que traduzem e introduzem fatos e informações nos autos, servindo de maneira direta como subsídio à reconstrução da realidade no curso do processo. Os meios de obtenção de prova, por sua vez, são instrumentos que servem à busca dos meios de prova, ou seja, ferramentas que podem ou não resultar na colheita de elementos que sirvam à demonstração da verdade e ao convencimento do juiz penal.

    Significa dizer que, enquanto o meio de prova tem o condão de influenciar de maneira direta a cognição e a decisão do magistrado, como é o caso de um documento ou de uma testemunha, o meio de obtenção de prova é ferramenta que auxilia na identificação e aquisição da prova, a exemplo do que acontece com uma quebra de sigilo bancário ou medida de busca e de apreensão.

    No que tange ao acordo de colaboração premiada, a natureza jurídica vê-se sinalizada no contexto da Lei Federal 12.850/2013. No artigo 3º de tal diploma, que lista os meios de obtenção de prova disponíveis à investigação das atividades de organizações criminosas, elenca-se, no inciso I, o acordo de colaboração premiada. De igual maneira, os artigos dedicados ao acordo de colaboração premiada estão inseridos no Capítulo II da Lei das Organizações Criminosas, intitulado Da Investigação e dos meios de obtenção de prova.

    Em 2019, com as alterações promovidas na Lei das Organizações Criminosas por meio do denominado Pacote Anticrime (Lei Federal 13.964/2019), seu artigo 3º-A passou a contar com a seguinte redação: o acordo de colaboração premiada é negócio jurídico-processual e meio de obtenção de prova, que pressupõe utilidade e interesse públicos.

    Note que, antes mesmo que isso fosse inserido de maneira expressa na legislação vigente, já se ventilava, no âmbito do Supremo Tribunal Federal que a delação premiada seria apenas um caminho, um instrumento para que a pessoa possa colaborar com a investigação criminal, com o processo de apuração dos delitos34.

    Diante da distinção realizada anteriormente acerca dos meios de obtenção de prova e meios de prova, pode-se concluir que, na prática, a colaboração premiada mais se assemelha à medida preparatória de cunho probatório (similar, e.g., à busca e à apreensão) e não, como por vezes se quer fazer parecer, à prova testemunhal. Isso significa que, muito embora não sirva, de maneira isolada, a provar fatos e a formar o convencimento do juiz quanto à versão acusatória, a

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1